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MECÂNICA DOS FLUIDOS I (CPG - M) 1 Nelson Manzanares Filho

r
1. VETORES E TENSORES EM COMPONENTES CARTESIANAS Φ = Φ (r , t ) ⇒ campo da grandeza Φ.

De forma geral, as grandezas da mecânica dos fluidos (e da mecânica do


1.1 Introdução - Campos Tensoriais contínuo, em geral) são caracterizadas por entes matemáticos conhecidos por tensores. A
noção de tensor generaliza os conceitos de escalar e vetor, normalmente estudados nos
No estudo dos meios contínuos em geral, e na Mecânica dos Fluidos em cursos de álgebra e cálculo vetorial. Uma definição rigorosa do caráter tensorial de uma
particular, a variação das grandezas físicas envolvidas é caracterizada matematicamente grandeza foge ao escopo deste texto. Todavia, é necessário saber que esse caráter está
por campos tensoriais de diversas ordens. ligado a certas propriedades de invariância da grandeza, ao se efetuar uma
No presente texto, salvo menção explícita em contrário, será admitido que os transformação de coordenadas: as alterações das componentes de uma grandeza tensorial
fenômenos a serem descritos matematicamente ocorrem num espaço euclidiano mediante uma transformação de coordenadas seguem regras bem definidas. Além disso,
tridimensional (o chamado espaço físico real). Um ponto nesse espaço será definido por essas propriedades dependem também da ordem do tensor que caracteriza a grandeza
um sistema de coordenadas mutuamente ortogonais, as chamadas coordenadas em questão. Se o campo de uma certa grandeza apresentar valores que sejam tensores,
cartesianas (x1, x2, x3). O tempo de ocorrência dos fenômenos será considerado por exemplo, de ordem m, será dito que a grandeza é caracterizada por um campo
independente das coordenadas espaciais (situação clássica), sendo caracterizado pela tensorial de ordem m.
variável real contínua t. O valor de uma certa grandeza genérica Φ será descrito por uma No presente texto, salvo menção explícita, todas as grandezas físicas de
função contínua e suficientemente suave das coordenadas e do tempo, o chamado campo interesse serão caracterizadas por campos tensoriais válidos (isto é, que seguem as
da grandeza Φ. A notação empregada neste texto não fará distinção entre o valor da propriedades de invariância adequadas). Algumas dessas grandezas são de natureza
função e o símbolo da própria função, isto é: escalar (os valores do campo são escalares; por exemplo: campo de temperatura), sendo
caracterizadas por um campo tensorial de ordem zero. Outras grandezas são de natureza
Φ = Φ ( x1 , x 2 , x 3 , t ) ⇒ campo da grandeza Φ. (1.1) vetorial (os valores do campo são vetores; por exemplo: campo de velocidades), sendo
caracterizadas por um campo tensorial de ordem um. As noções de escalar e vetor são
A base de vetores ortonormais imprescindíveis em qualquer estudo sistemático da mecânica dos fluidos. Entretanto, elas
x2
direta para esse espaço é representada por não são suficientes para um estudo mais completo do movimento geral de um fluido.
tempo t r r r
{e1 , e2 , e3} . Trata-se da base cujos vetores Certas grandezas essenciais na mecânica dos meios contínuos não podem ser
r são ortogonais, unitários (módulos iguais caracterizadas apenas por escalares ou vetores, exigindo o emprego de campos tensoriais
r r
e2 a um), e seguem a regra da mão direita. de ordem mais alta. É o caso, por exemplo, do campo de tensões num fluido (forças
r Essa base será denominada base canônica superficiais de contato, por unidade de área), cujos valores são tensores de ordem dois
r e1
e3 (Fig. 1.1). Um ponto do espaço pode ser (ou de segunda ordem).
x1 A fim de tornar mais claras essas noções, os casos acima mencionados serão
caracterizado pelo raio vetor, ou vetor
r exemplificados e comentados a seguir, juntamente com a introdução de certas notações
x3 posição, r , cujas componentes são as
próprias coordenadas do espaço. De importantes, e que serão simplificadas e mais exploradas no decorrer do texto:
Fig. 1.1 Sistema de Coordenadas acordo com a álgebra de vetores r
Cartesianas e Raio Vetor
geométricos usual, escreve-se: a) Campo de temperatura T , T = T ( r , t ) : campo escalar (ordem zero). Nesse caso, a
caracterização completa do campo exige apenas uma função de valor real. Ou seja, basta
3 uma única componente, que não se altera mediante transformações de coordenadas. O
∑x e
r r
r= i i (1.2) campo apresenta magnitude, mas nenhuma direção (ordem = número de direções ⇒
i =1 ordem zero).

É possível, então, adotar uma outra notação para o campo da grandeza Φ:

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r r r r
b) Campo de velocidades U , U = U ( r , t ) : campo vetorial (ordem um). Nesse caso, a antigos e novos. Essas relações, sendo obedecidas, definem a invariância dos vetores
cartesianos (tensores cartesianos de 1a ordem), sendo dadas por (Aris, 1989):
caracterização completa do campo num sistema de coordenadas qualquer exige três
funções de valor real (três componentes). Essas componentes sofrem alterações mediante 3

∑l
rotações do sistema de coordenadas, segundo regras que mantém o valor do campo
U j' = ij U i (1.4 b)
invariante (vetor). O campo apresenta magnitude e uma direção (ordem = número de
i =1
direções ⇒ ordem um), exceto no caso do vetor nulo (magnitude zero, direção
indefinida). A notação utilizada neste texto para as grandezas vetoriais será “uma seta
onde lij representa o co-seno do ângulo entre o eixo antigo xi e o eixo novo xj’.
sobre uma letra”. Sendo (U1, U2, U3) as componentes físicas do vetor velocidade
r Grandezas representadas com um índice, mas que não se transformam segundo essas
U segundo um certo sistema de coordenadas ortogonal cartesiano (x1, x2, x3), cuja base relações, não são vetores.
r r r
canônica {e1 , e2 , e3 } , escreve-se:
rr rr rr r
c) Campo de tensões τ , τ = τ ( r , t ) : campo tensorial (ordem dois). Nesse caso, a
3
r
∑U e
r caracterização completa do campo num sistema de coordenadas qualquer exige nove
U= i i (1.3)
funções de valor real (nove componentes). Como no caso dos vetores, as componentes
i =1
dos tensores de ordem dois sofrem alterações mediante rotações do sistema de
coordenadas, segundo regras que mantém o valor do campo invariante (tensor). O campo
Observações:
apresenta magnitude e duas direções (ordem = número de direções ⇒ ordem dois),
1) A ordem de um tensor (número de direções) eqüivale ao número de índices exceto no caso do tensor nulo (magnitude zero, direções indefinidas). A notação
utilizada neste texto para as grandezas tensoriais de ordem dois será “duas setas sobre
necessários para representar as componentes. No caso de vetores, há uma única rr
direção envolvida e, portanto, basta um único índice para representar as uma letra”. Sendo τij as componentes físicas do tensor τ segundo um certo sistema de
r
componentes. coordenadas ortogonal cartesiano (xi), com base canônica { ei }, e sendo um outro
2) Os vetores também podem ser representados na forma de matrizes colunas (3x1) ou sistema do mesmo tipo, representado por um apóstrofe (‘) - analogamente ao caso dos
matrizes linha, (1x3). Essa notação, é chamada de notação matricial, em contraste vetores - escreve-se:
com a notação de índices apresentada na expressão anterior (preferida neste texto),
que é chamada de notação indicial. Esta notação admite ainda uma simplificação de
rr
3 3 3 3

∑∑ ∑∑ τ
rr r r
grande utilidade operacional, a ser introduzida no item 1.2.
r τ= τ ij ei e j = ij ' ei ' e j ' (1.5 a)
3) É importante destacar que as componentes (Ui) e a base { ei } dependem do sistema i =1 j =1 i =1 j =1
r
de coordenadas (xi), mas o vetor U é invariante. Dado um novo sistema de
r r
coordenadas (xi’), cuja base canônica é { ei ’}, as novas componentes físicas de U As componentes (τij) e (τij’) do tensor nos sistemas original e antigo relacionam-se
através dos co-senos diretores lij dos ângulos entre os eixo coordenados antigos (xi) e
serão denotadas por (Ui’), mas a representação em termos de combinação linear dos
novos (xj’). Essas relações, sendo obedecidas, definem a invariância dos tensores
vetores de base será análoga:
cartesianos de 2a ordem, sendo dadas por (Aris, 1989):
3
r
∑U ' e '
r 3 3
U=
∑∑ l
(1.4 a)
i i
τ pq ' = ip l jq τ ij (1.5 b)
i =1
i =1 j =1

sendo que as componentes (Ui) e (Ui’) do vetor nos sistemas original e antigo
relacionam-se através dos co-senos diretores dos ângulos entre os eixos coordenados Grandezas representadas com dois índices, mas que não se transformam segundo essas
relações, não são tensores de 2a ordem.

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Observações: A título ilustrativo, a Fig. 1.2 pode ser utilizada para concretizar o conceito de
tensor no caso específico das tensões que atuam num material. Um bloco material, em
1) No caso de tensores de segunda ordem, há duas direções envolvidas, sendo forma de paralelepípedo, com arestas paralelas aos eixos coordenados, é isolado do
necessários dois índices para representar suas componentes. A notação empregada restante do meio contínuo circundante (por exemplo, um fluido). Esse meio exerce forças
nas expressões anteriores é a notação indicial. superficiais (de contato) sobre as faces laterais do bloco. Em cada face, o vetor da força
2) Os tensores de segunda ordem também podem ser representados com a notação superficial correspondente pode ser normalizado pela área da superfície da face,
matricial, por meio de matrizes quadradas (3x3). Nesse caso, o 1o índice refere-se ao resultando a grandeza conhecida como tensão na face (cuja dimensão é a de força por
número da linha e o 2o índice ao número da coluna (referentes à posição que a unidade de área). É conveniente considerar
componente irá ocupar na matriz). Para tensores de ordem maior do que dois a
x2 τ22 as três faces principais, cujos versores
notação matricial é impraticável, e a notação indicial torna-se a única alternativa τ21 normais, apontando para fora do bloco,
adequada para representar as componentes do tensor. Mesmo no caso de vetores e τ23 τ12 coincidem com os vetores da base canônica.
r
tensores de 2a ordem, o emprego da notação indicial traz uma economia de esforços τ11 Seja f i a tensão atuante na face i (isto é, na
na manipulação e dedução das expressões matemáticas de importância na mecânica τ32 r
face cujo versor normal é ei ). Seja τij a
dos fluidos (conforme ficará claro oportunamente).
rr
τ31 τ13 r
1) Dúvidas comumente surgem ao se deparar com a expressão ei e j nas somatórias em τ33 x1 componente do vetor f i segundo o eixo
r coordenado xj. Note-se que os valores de τij
(1.5). No caso de vetores, costuma-se concretizar a idéia do vetor unitário ei da
x3 dependem da especificação de duas direções:
base canônica, como sendo um vetor geométrico de módulo unitário, orientado Fig. 1.2 Componentes do
r a direção da face e a direção da componente
segundo o eixo coordenado xi. Na representação matricial, mais abstrata, ei eqüivale Tensor das Tensões da tensão que atua na face, as quais por sua
a uma matriz coluna com valor 1 (um) na linha i e valor 0 (zero) nas demais linhas. vez dependem do sistema de coordenadas
rr
Já a expressão ei e j não admite uma representação geométrica tão simples. Todavia, escolhido. É possível reunir todas essas informações, pontualmente, dentro do escopo do
rr rr
sua representação matricial é também esclarecedora: representa-se ei e j por uma chamado tensor das tensões, τ , representado por:
matriz quadrada com valor 1 (um) na linha i e coluna j e valor 0 (zero) em todas as
rr 3 3

∑∑ τ
demais posições da matriz. rr
rr
2) A expressão ei e j é, por vezes, denominada diada unitária da base canônica, τ= ij ei e j (1.6)
i =1 j =1
enquanto que um tensor cartesiano de 2a ordem qualquer, considerado como uma
combinação dessas diadas, é denominado diádica. Alguns autores preferem reservar
A grandeza invariante que realmente caracteriza o estado de tensões do meio contínuo,
o termo tensor para as componentes e tratar os termos diada e diádica no contexto rr r
acima descrito. Neste texto, o termo tensor será preferencialmente utilizado para em todos os seus pontos, é o tensor das tensões, τ , e não as próprias tensões, f i .
r
designar a grandeza invariante, destacando que a mesma pode ter várias Embora os vetores f i , uma vez estabelecidos, sejam invariantes (pois são vetores), eles
representações cartesianas análogas, isto é, representações com diferentes r
dependem da especificação dos versores normais às faces, e j , j=1,2,3. A única grandeza
componentes, segundo diferentes sistemas ortogonais cartesianos e suas
correspondentes bases canônicas, porém satisfazendo relações bem definidas de invariante capaz de reunir todas as informações necessárias sobre as forças superficiais
rr
invariância. Contudo, por abuso de linguagem, será permitido utilizar expressões do
rr num certo ponto de um fluido é τ . Mais precisamente, o campo de tensões superficiais
tipo “tensor τij”, para se referir às componentes do tensor τ numa dada base rr rr r
no fluido será caracterizado por uma função de valor tensorial de 2a ordem, τ = τ ( r , t ) .
canônica. Da mesma forma, será permitido dizer “vetor Ui”.

Uma representação física do tensor das tensões (versão preliminar)

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rr
Observação: Na representação matricial do tensor das tensões, τ , as componentes τij 3) A convenção de soma se aplica a toda e qualquer expressão indicial, e não apenas
situadas na diagonal (i = j) referem-se às tensões normais, enquanto aquelas situadas fora àquelas envolvendo vetores da base canônica (como as vistas até agora). Por
da diagonal (i ≠ j), referem-se às tensões tangenciais ou cisalhantes. exemplo: AiBi = A1B1 + A2B2 + A3B3 , σii = σ11 + σ22 + σ33.
4) Os índices repetidos uma única vez são chamados de índices mudos e indicam a
1.2 Simplificação da Notação Indicial: Convenção de Soma de Einstein. soma, de acordo com a convenção. Por outro lado, os índices que aparecem apenas
uma vez são chamados índices livres, e servem para representar uma de três
A notação indicial empregada nas expressões de (1.2) até (1.6) envolvem possibilidades (índice igual a 1, 2 ou 3). Quando a expressão monomial em questão
somatórios com índices variando de 1 até 3 (no caso de espaços abstratos n-dimensionais representar as componentes de um certo tensor, sem envolver os vetores da base
os índices variariam de 1 até n). Em todas essas expressões, esses índices aparecem canônica, o número de índices livres presentes na expressão eqüivalerá à ordem do
repetidos. Não é difícil perceber que cada repetição de índice acompanha um símbolo de tensor associado. Exemplos (onde bi e ai representam componentes de vetores; τij e
somatório referente àquele índice (o contrário não é necessariamente verdadeiro). σij representam componentes de tensores de ordem dois) (i) τijbj representa as
Freqüentemente, as manipulações algébricas envolverão muitos somatórios, com componentes de um vetor; (ii) aibi representa um escalar; (iii) τijσij representa um
diversos índices repetidos. Buscando simplificar a notação indicial, torna-se conveniente escalar; (iv) aibj representa as componentes de um tensor de ordem dois.
adotar a seguinte convenção de soma (introduzida pela primeira vez por Einstein em seus
estudos sobre a relatividade geral): No presente curso, apenas componentes cartesianas ortogonais de vetores e
tensores serão empregadas. O estudo mais geral de tensores em coordenadas curvilíneas
Convenção de soma: Sempre que numa certa expressão indicial monomial (dada por não será tratado. Todas as expressões tensoriais desenvolvidas neste curso também terão
produtos de grandezas com índices genéricos), um certo índice aparecer repetido uma caráter invariante segundo mudanças de sistemas de coordenadas curvilíneas, mas os
única vez, subentende-se que um somatório de monômios está sendo efetuado com a resultados serão obtidos apenas com base em coordenadas cartesianas. Sempre que
variação do índice de 1 até 3 (considera-se que o símbolo de somatório não esteja possível, será conveniente evitar o emprego de qualquer tipo particular de sistema de
presente na expressão). Essa convenção será adotada daqui por diante, a menos de coordenadas e trabalhar diretamente na forma invariante (sem a notação indicial).
menção explícita em contrário.
1.3 Operações Básicas da Álgebra Vetorial e Tensorial
A convenção da soma permite eliminar todos os símbolos de somatório nas
expressões do item anterior, e outras muito mais complicadas e que irão aparecer mais a O objetivo básico deste e dos próximos itens deste capítulo é proporcionar ao
frente, simplificando bastante a notação e possibilitando economia de esforços. Por leitor uma habilidade operacional com vetores e tensores de 2a ordem, principalmente no
exemplo, a representação de vetores e tensores de segunda ordem poderá ser feita da que se refere ao emprego da notação indicial, da convenção da soma e de símbolos
seguinte forma: especiais que facilitam a manipulação algébrica das expressões. Ao adquirir tal
habilidade, o leitor estará apto a verificar a validade de inúmeras identidades da álgebra e
r r rr rr do cálculo vetorial e tensorial. Com isso, será possível atingir os objetivos finais de
U = U i ei e τ = τ ij ei e j (1.7 a b)
desenvolver, analisar e aplicar as equações da Mecânica dos Fluidos nas suas formas
gerais e particularizadas.
Observações: Neste item, serão considerados conceitos algébricos. Os aspectos de cálculo
serão considerados nos próximos itens.
1) Deve-se atentar para o limite da soma: sempre 3 (três) no presente texto.
2) Índices repetidos mais de uma vez não representam soma. Por exemplo, σiii pode 1.3.1 Produto escalar entre dois vetores
representar uma das componentes de um tensor de ordem 3 com os mesmos índices
r r
(σ111 ou σ222 ou σ333) mas não significa σ111 + σ222 + σ333. O produto escalar entre dois vetores geométricos A e B é representado por
r r
A ⋅ B e é definido por

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r r
A ⋅ B = A B cos α (1.8) de Kronecker pelo seu outro índice e, em seguida eliminando o delta. No caso, o único
índice mudo da penúltima expressão em (1.11), e que também aparece no delta, é o
r r índice i. Aplicando a regra de substituição, o índice i no restante da expressão é
onde A e B representam os módulos de A e B e α é o menor ângulo entre os vetores. O substituído pelo outro índice do delta (j, no caso), gerando o resultado desejado.
produto escalar goza das seguintes propriedades: É conveniente enunciar a regra de substituição:
r r r r
a) comutativa : A⋅ B = B ⋅ A Regra de substituição: Sempre que o delta de Kronecker ocorrer numa expressão em
r r r r r r r
b) distributiva : A⋅( B + C) = A⋅ B + A⋅ C que um de seus índices é mudo, esse índice poderá ser substituído, no restante da
expressão, pelo outro índice do delta. Em seguida, o delta de Kronecker é eliminado da
r r r r r r expressão.
O produto escalar em geral não goza da propriedade associativa : ( A ⋅ B ) C ≠ A ( B ⋅ C ) .
Essa regra é bastante geral e será de utilidade no desenvolvimento e verificação
O produto escalar entre os vetores da base canônica é dado por de inúmeras expressões tensoriais.

r r ⎧1, i = j
ei ⋅ e j = ⎨ . (1.9) 1.3.2 Produto vetorial entre dois vetores
⎩0, i ≠ j
r r
O produto vetorial entre dois vetores geométricos A e B é representado por
É conveniente atribuir um símbolo especial a esse resultado, denominado de delta de r r
Kronecker, e denotado por δij: A × B e é definido por
r r r
⎧1, i = j A × B = A B sen α k (1.12)
δi j = ⎨ (1.10)
⎩0, i ≠ j r r
onde A e B representam os módulos de A e B , α é o menor ângulo entre os vetores e
r r r
O delta de Kronecker representa as componentes de um tensor de 2a ordem especial, k é um vetor unitário perpendicular ao plano definido por A e B , orientado segundo a
r
denominado tensor identidade. regra da mão direita (palma da mão direita com o dedo indicador no sentido do vetor A ,
r r r
Considere-se agora a representação de um vetor U segundo suas componentes girando sobre o vetor B , com o polegar na perpendicular indicando o sentido de k ). O
r r
num certo sistema de coordenadas ortogonal cartesiano, U = U i ei . A projeção desse desenvolvimento algébrico a seguir eliminará as eventuais dificuldades de aplicação da
vetor segundo o eixo coordenado xj produz a componente j do vetor: regra da mão direita. O produto vetorial goza das seguintes propriedades:
r r r r r r
r r r r A× B= − B× A
U ⋅ e j = (U i ei ) ⋅ e j = U i ( ei ⋅ e j ) = U i δ i j = U j (1.11) a) anti-simétrica :
r r r r r r r
b) distributiva : A × ( B + C) = A × B + A × C
O desenvolvimento acima pode ser verificado desenvolvendo as expressões
termo a termo (lembre-se da convenção de soma) e aplicando a definição do delta de O produto vetorial em geral não goza da propriedade associativa :
r r r r r r
Kronecker. Entretanto, a última passagem em (1.11) evidencia uma propriedade bastante ( A × B) × C ≠ A × ( B × C ) .
geral e útil do delta de Kronecher, denominada regra de substituição. Note-se que, para
um dado j, os termos da soma em i com i ≠ j serão nulos, restando apenas o termo com i
O produto vetorial entre os vetores da base canônica é dado por
= j. Sem desenvolver os termos, o resultado poderia ter sido obtido formalmente,
substituindo no restante da expressão (fora o delta em questão) um índice mudo do delta

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r r r
ei × e j = ε ijk ek , A regra mnemônica para aplicar (1.15) é simples. Um índice que aparece em ambos os
ε’s é destacado. Os demais índices são transportadas para os δ ‘s em cada um dos termos
do segundo membro alternadamente: primeiros e segundos índices no 1o termo; índices
onde εijk representa o chamado símbolo de permutação, definido por
externos e internos no 2o termo.
⎧ 1, para ijk empermutação cíclica de 123 1.3.4 Produto interno entre um tensor de 2a ordem e um vetor

ε ijk = ⎨ -1, para ijk empermutação acíclica de 123
⎪ 0, para ijk comqualquer repetição de índices O produto interno entre um tensor de 2a ordem e um vetor (ou vice-versa) será

aqui definido de maneira heurística, efetuando o “produto escalar” dos vetores de base
mais próximos. A notação de produto interno é a mesma que a de produto escalar.
Formalmente:
Através do símbolo de permutação, o produto vetorial pode ser escrito na
notação indicial como r rr r r r r r r r r
A ⋅ τ = ( Ai ei ).(τ jk e j ek ) = Ai τ jk ( ei . e j ) ek = Ai τ jk δ i j ek = Ai τ ik ek
r r r
A × B = Ai B j ε ijk ek . (1.13)
Observe-se a analogia entre o produto interno “vetor X tensor” e o produto matricial
Note-se a convenção da soma sendo aplicada aos três índices mudos i, j e k, perfazendo entre uma matriz quadrada (tensor) e uma matriz coluna (vetor) dando origem a uma
um total de 3x3x3=27 termos. Destes, porém, 21 são nulos, devido a alguma repetição de matriz coluna. Trata-se, portanto, de uma transformação linear efetuada pelo tensor sobre
índices. Os seis termos restantes referem-se às três permutações cíclicas de 123 (123, o vetor, resultando um vetor do mesmo espaço.
231, 312) e às três permutações acíclicas de 123 (213, 132, 321). O produto interno está associado a uma contração na ordem das grandezas
envolvidas, assim como o produto escalar. O produto interno pode sempre ser definido
O produto vetorial pode também ser representado na forma de um determinante para tensores de ordem maior ou igual a um. O resultado será um tensor cuja ordem
simbólico: eqüivale à soma das ordens dos tensores envolvidos no produto menos 2.

r r r 1.3.5 Algumas definições e propriedades dos tensores de 2a ordem


e1 e2 e3
r r r r r rr
A × B = A1 A2 A3 = ( A2 B3 − A3 B2 ) e1 + ( A3 B1 − A1 B3 ) e2 + ( A1 B2 − A2 B1 ) e3
a) Tensor identidade Ι
B1 B2 B3
(1.14) É o tensor de 2a ordem cujas componentes eqüivalem aos valores do delta de
Kronecker:
1.3.3 Relação entre os deltas de Kronecker e os símbolos de permutação rr
r r r r
Ι = δ ij ei e j = ei ei
Uma relação interessante pode ser estabelecida entre os δ ‘s e ε’s, de utilidade
na verificação de identidades envolvendo produtos vetoriais múltiplos e a operação
diferencial de rotacional (item 1.4). Essa relação pode ser demonstrada com base na O produto interno envolvendo o tensor identidade é comutativo e neutro. Seja Φ um
teoria de determinantes, ou então simplesmente verificada caso a caso (o que não é tensor de ordem maior ou igual a um. Então:
conveniente). Ela será apresentada aqui sem demonstração: rr rr
Φ ⋅ Ι = Ι ⋅ Φ = Φ (fica como exercício para o leitor verificar a validade dessa
ε ijk ε lmk = δ il δ jm − δ im δ jl (1.15) expressão no caso em que Φ é um vetor)

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rr
b) Tensor transposto τ T r r
Gradiente de um campo escalar φ = φ ( r , t ) ⇒ Notação: ∇ φ
rr rr rr rr
τ = τ ij ei e j ⇒ τ = τ ji ei e j
T
r r ∂φ
∇ φ = ei ⇒ Resultado: Campo vetorial (1.17)
Eqüivale a trocar as linhas pelas colunas da matriz representativa do tensor. ∂ xi

r r r r r
c) Tensor simétrico e tensor anti-simétrico Divergente de um campo vetorial U = U ( r , t ) ⇒ Notação: ∇⋅U
rr rr rr rr
Um tensor τ = τ ij ei e j é dito simétrico se τ = τ T (τij = τji) ; e é dito anti-simétrico se r r
rr rr
r r r ∂U r ∂ (U j e j ) r r ∂U j ∂U j ∂ Ui
∇⋅U = ei ⋅ = ei ⋅ = ( ei ⋅ e j ) = δi j = (1.18)
τ = - τ T (τij=-τji). Qualquer tensor de 2a ordem pode ser decomposto de maneira única ∂ xi ∂ xi ∂ xi ∂ xi ∂ xi
numa parte simétrica e noutra anti-simétrica, tal que o tensor seja dado pela soma das
duas partes. Fica como exercício para o leitor calcular as partes simétrica e anti-simétrica ⇒ Resultado: Campo escalar.
de um dado tensor de 2a ordem.
r r r r r
Rotacional de um campo vetorial U = U ( r , t ) ⇒ Notação: ∇ ×U
1.4 Operações Básicas do Cálculo Vetorial e Tensorial: Gradiente, Divergente e r r
Rotacional r r r ∂U r ∂ (U j e j ) r r ∂U j ∂U j r
∇ × U = ei × = ei × = ( ei × e j ) = ε i jk e (1.19)
∂ xi ∂ xi ∂ xi ∂ xi k
As operações diferenciais básicas do cálculo vetorial e tensorial podem ser
realizadas de maneira direta utilizando a notação indicial. Para isso, é necessário
introduzir o operador nabla por meio de índices, numa expressão válida para sistemas ⇒ Resultado: Campo vetorial.
de coordenadas ortogonais cartesianas:
Comentário: Observe bem a seqüência das operações em (1.18) e (1.19). O leitor deve
r r ∂ procurar entender cada passagem. Note-se que os resultados coincidem com aqueles
∇ = ei Operador nabla (1.16) aprendidos nos cursos de cálculo vetorial. Convém, neste ponto, comentar alguns
∂ xi aspectos operacionais: a) ao se manipular uma expressão indicial, deve-se inicialmente
escrever as grandezas e os operadores de tal forma que um mesmo índice não apareça em
Atente-se para a convenção da soma: trata-se de uma soma de operadores. O mais que uma grandeza ou operador. Caso contrário, ocorreriam repetições de índices
operador nabla opera sobre campos tensoriais de ordem qualquer, e de diversas maneiras. indevidas. Esse comentário vale também no caso em que uma certa grandeza ou operador
Várias operações diferenciais do cálculo vetorial podem ser definidas a partir do aparece mais que uma vez numa mesma expressão: de início, deve-se tratar todas as
operador nabla. As principais são as operações de gradiente de um campo escalar, grandezas ou operadores evitando as repetições indevidas de índices; b) as operações
divergente de um campo vetorial e rotacional de um campo vetorial. Todas essas algébricas de produto escalar e vetorial são realizadas formalmente entre os vetores da
operações diferenciais podem ser estendidas formalmente para campos tensoriais de base canônica, empregando as definições de δ e ε ; c) na seqüência, deve-se aplicar as
ordem mais alta. definições e regras introduzidas nesse curso: definição do delta de Kronecker e do
As operações podem ser definidas sem apelo à notação indicial e sem a símbolo de permutação, regra de substituição, regra dos δ ‘s e ε’s (1.15). Tomando
utilização das técnicas de manipulação algébricas introduzidas neste texto. Todavia, são cuidado com cada um desses aspectos, não haverá maiores dificuldades na manipulação
exatamente estas técnicas que se deseja que o estudante domine, dada a facilidade que de índices em expressões muito complexas, e que de, outra forma, seriam de difícil
elas proporcionam. Logo, as operações serão introduzidas já fazendo uso dessas técnicas. dedução.

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MECÂNICA DOS FLUIDOS I (CPG - M) 8 Nelson Manzanares Filho

Para o desenvolvimento das equações básicas da Mecânica dos Fluidos são Seja V o volume de uma região do espaço limitada por uma superfície fechada
ainda necessárias outras operações diferenciais, descritas a seguir. S. Seja ϕ um campo tensorial de ordem maior ou igual a 1, contínuo e suave em todos os
pontos de V e S. O versor normal, apontando para fora do volume, em cada ponto da
r
Operador Laplaciano ⇒ Notação: ∇ 2 superfície S é denotado por n . Os elementos de volume e de área são devotados por dV e
dA, respectivamente. Então:
O operador Laplaciano é definido formalmente como sendo o “divergente do operador r
∫ ∫
r
nabla”, podendo ser aplicado a campos tensoriais de qualquer ordem ∇⋅ϕ dV = n .ϕ d A (1.23)
V S
δ ij
r r ⎛ r ∂ ⎞ ⎛ r ∂ ⎞ ⎛⎜ 678 r r ∂2 ⎟

∂2
∇ = ∇⋅∇ = ⎜ ei
2

⎟ ⋅⎜ e j ⎟ = ( e ⋅ e ) = (1.20) b) Teorema de Stokes
⎝ ∂ x i ⎠ ⎝ ∂ x j ⎟⎠ ⎜⎜ ∂ x i ∂ x j ⎟⎟ ∂ x i ∂ x i
i j
⎝ ⎠ r
Seja S uma superfície, com vetor unitário n exterior, aberta num certo contorno
r r r
r r r r r limite dado por uma curva fechada simples C . Seja U = U ( r , t ) um campo vetorial
Gradiente de um campo vetorial U = U ( r , t ) ⇒ Notação: ∇U
contínuo e suave em S e C. O elemento de área de S é dA e o elemento de contorno
r
r r orientado de C é ds , tal que o interior do contorno fique à esquerda do percurso. Então:
r r r ∂U r ∂ (U j e j ) ∂U j r r
∇ U = ei = ei = e e (1.21)
∂ xi ∂ xi ∂ xi i j r r r r r

S
( ∇ × U ) ⋅ n dA =

C
U ⋅ ds (1.24)

⇒ Resultado: Campo tensorial de ordem dois


rr rr r r rr
Divergente de um campo tensorial de ordem dois τ = τ ( r , t ) ⇒ Notação: ∇⋅τ

r r r δ ij
r rr r ∂ τr r ∂ (τ jk e j ek ) 678r r ∂ τ jk r ∂τ r
∇⋅ τ = ei ⋅ = ei ⋅ = ( ei ⋅ e j ) e = ik ek (1.22)
∂ xi ∂ xi ∂ xi k ∂ xi

⇒ Resultado: Campo vetorial.

1.5 Teoremas Integrais

Alguns teoremas integrais serão de grande utilidade no desenvolvimento das


equações básicas da mecânica dos fluidos.

a) Teorema de Gauss (teorema da divergência)

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