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Ventres de aluguer e ética

Izéquia Pinto
(Licenciatura em Gestão de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais)

O termo ventres de aluguer designa uma técnica de procriação artificial na qual, uma mulher aceita
carregar no ventre uma criança para um casal infértil, comprometendo-se, após o nascimento, a entregar a
esse casal (Cardwell & Kirkhope, 1998: 386). Entretanto, é uma técnica que levanta inúmeras questões.
Entre elas: Quem é a mãe? Será a genética (doadora do óvulo) ou a uterina (a hospedeira)? Ou será que
mãe é quem cria, educa e dá amor? Será legítimo proceder-se a um contrato? Não se estará, deste modo, a
tratar a criança como uma simples mercadoria? Por outro lado, se não existir um contrato e a mãe
hospedeira, após o parto, quiser a criança? Será legítimo ficar com ela?

A Igreja Católica se opõe a esta técnica de combate à infertilidade. De acordo com Garcia (1995), a
posição da igreja católica ficou bem clara após a publicação em 1987 de “um conjunto de ensinamentos
confessionais”, designado Congregação para a Doutrina da Fé. Este documento apresenta dois princípios
base contra ás técnicas biomédicas, “a procriação humana exige a colaboração responsável dos esposos
com o amor fecundo de Deus” e “o dom da vida humana deve realizar-se no matrimónio, através dos
actos específicos e exclusivos dos esposos, segundo as leis inscritas nas suas pessoas e na união”.

As entidades religiosas, de um modo geral, tem tido a preocupação de evitar banalizações dos direitos
humanos, tais como o direito a vida, da sociedade conjugal, a filiação natural, pois hoje se especula a
possibilidade de escolha de melhores embriões, que não possuam probalidade de futuramente serem
doentes, enfim, discute-se inclusive as questão de não entrega do bebé pela gestante aos pais biológicos e
a recusa destes, caso a criança possua deficiências.

Éticamente, na questão dos ventres de aluguer, ignora-se, pura e simplesmente, a instrumentalização do


corpo da mulher, atribui-se sem discussão superioridade ao laço genético sobre o laço afectivo de 9 meses
de gestação e, ainda mais controverso, a criança é tratada como uma “coisa”, mero prolongamento do
progenitor, argumento que não se ouve desde a escravatura.

Em suma, a mulher que empresta o seu ventre para gerar um ser que não é seu, vai sentir-se sempre mãe
da criança que deu à luz, mesmo não tendo sido com o seu “material genético”, porque uma mulher não é
uma máquina, uma mulher tem sentimentos muito profundos que se criam ao longo dos nove meses que
um feto se vai desenvolvendo dentro do seu corpo. Portanto, pode ser penoso para essa mulher ter que
entregar esse “filho” ao casal que a contratou para prestar esse serviço, mesmo sabendo desde o inicio que
o desfecho seria esse.

Referências bibliográficas
Berlinguer, G. & Garrafa, V. “O mercado humano: a comercialização de parte do corpo humano”. 2 ed.
Brasília. Ed. Universidade de Brasília, 2001.
Cardwell, M. S. & Kirkhope, T. G. (1998). “Maternidade de aluguel”. 4 ed. St. Luis: Mosby.
Garcia, J. L. de O. (1995). “As Mulheres Telefonam ás Cegonhas. Família, Procriação e Bioética no
Espaço Público”. Tese de mestrado em Sociologia. Lisboa: ISCTE.

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