Daniel Santos
1. Introdução
Haá uma quantidade incontaá vel de fatores que contribuem
direta ou indiretamente na formaçaã o de elementos
culturais em uma civilizaçaã o. O nosso objetivo de
conhecer e
entender um pouco mais sobre aspectos da cultura
semíática e heleê nica naã o foge a essa regra. Uma opçaã o
para fazermos este tipo de investigaçaã o eá partir dos
coá digos legais do mundo antigo e observar a
maneira como cada povo preferiu lidar com seus problemas
e lutou para defender suas estruturas culturais.
1.2.a. Decálogo
O primeiro e mais fundamental coá digo legal registrado
nas Escrituras eá o “Decaá logo ou os Dez
Mandamentos” (DM), o qual aparece pela primeira vez em
Ex 20:2--17 e posteriormente em Dt 5:6--21.
O estilo apodítico na segunda pessoa singular (naã o
mataraá s!) eá raro no antigo testamento e desconhecido
no antigo oriente proá ximo.
O DM foi entregue por Deus ao povo de forma
“falada” (cf. Ex 20:18--19), foi entregue na sua forma
escrita a Moiseá s em Ex 31:18, e finalmente
entregue ao povo na forma escrita (Ex 34:29--32). EÉ
bom lembrar que a forma escrita entregue ao povo
eá uma maneira simboá lica de dizer, pois os israelitas
naã o tinham uma coá pia particular da lei em suas casas.
2.1. ROUBO
O modo mais comum de infringir o direito de
propriedade eá o roubo. A seriedade desta ofensa
pode ser facilmente deduzida pelo modo detalhado como eá
tratado em todos os coá digos legais no AOP, inclusive nas
leis do antigo testamento.
Se um homem cortar uma arvore no pomar de alguém, ele terá que pesar e pagar vinte
siclos de prata.
Se uma pessoa que comprou um bem que havia sido extraviado não puder apresentar a
pessoa de quem comprou ou uma testemunha que assistiu o ato da compra, mas o
proprietário original do que foi extraviado apresentar a pessoa de quem comprou ou a
testemunha da compra, então a pessoa que comprou o bem extraviado é um ladrão e
deve ser morto; o dono original do bem poderá ter de volta aquilo que lhe pertence. (CH
§10)
Se um escravo por acaso receber algum bem da esposa de um homem, eles [as
autoridades] cortarão fora o nariz e as orelhas daquele servo, eles devolverão o bem ao
dono, e aquele marido cortará a orelha de sua própria esposa. Se ele não cortar a orelha
de sua esposa, então eles não lhe restituirão o bem roubado nem cortarão as orelhas e o
nariz do servo.
DECÁLOGO
A simplicidade do oitavo mandamento eá algo sem
paralelo no mundo antigo.
Não roubarás. (Ex 20:15; Dt 5:19)
Se se achar alguém que, tendo roubado um dentre os seus irmãos, dos filhos de Israel, o
trata como escravo ou o vende, esse ladrão morrerá. Assim, eliminarás o mal do meio de
ti. (Dt 24:7)
porque, de fato, fui roubado da terra dos hebreus; e, aqui, nada fiz, para que me
pusessem nesta masmorra. (Gn 40:15)
CÓDIGO DA ALIANÇA
O coá digo da aliança funciona como uma aplicaçaã o
mais detalhada e contextualizada do decaá logo em
geraçoã es especíáficas na vida de Israel.
1
Se alguém furtar boi ou ovelha e o abater ou vender, por um boi pagará cinco bois, e
quatro ovelhas por uma ovelha
2
Se um ladrão for achado arrombando uma casa e, sendo ferido, morrer, quem o feriu
não será culpado do sangue. 3Se, porém, já havia sol quando tal se deu, quem o feriu
será culpado do sangue; neste caso, o ladrão fará restituição total. Se não tiver com que
pagar, será vendido por seu furto.
4
Se aquilo que roubou for achado vivo em seu poder, seja boi, jumento ou ovelha, pagará
o dobro. (Ex 22:1–4)
CÓDIGO DE SANTIDADE
Não furtareis, nem mentireis, nem usareis de falsidade cada um com o seu próximo; (Lv
19:11)
2.1.c. Conclusão
Quando comparado com os demais coá digos legais do antigo
oriente proá ximo, as leis bíáblicas tratando do roubo
saã o bem mais sucintas e abreviadas. Poreá m, como vimos,
isso naã o significa que o tema tenha sido tratado de
maneira trivial.
As penalidades prescritas para o roubo na Bíáblia saã o muito
mais humanas que a maioria das leis do antigo
oriente proá ximo, e nunca aplicando mutilaçaã o, espancamento
ou morte como penalidade.
Neste sentido, as leis do antigo testamento saã o bem
mais alinhadas com as leis Hititas, ainda que o
coeficiente de restituiçaã o seja bem diferente:
2.2. COBIÇA
Conforme vimos ateá aqui, privar ao quem do seu
direito de propriedade era uma praá tica inaceitaá vel no Antigo
testamento. O mesmo era verdade para outros povos
ao redor de Israel. Todavia, As leis do Antigo
testamento vaã o muito mais aleá m quando tratam da
cobiça, que eá o desejo de querer possuir
algo que naã o lhe pertence. Mesmo que seja necessaá rio
definir com clareza o significado de cobiça, naã o
temos como negar a importaê ncia que o antigo testamento
coloca neste assunto.
Ex 20:17
Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não
cobiçarás a mulher do teu próximo, nem
o seu servo, nem a sua serva, nem o seu
boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma
que pertença ao teu próximo.
Dt 5:21
Não cobiçarás a mulher do teu próximo.
Não desejarás a casa do teu próximo, nem
o seu campo, nem o seu servo, nem a
sua serva, nem o seu boi, nem o seu
jumento, nem coisa alguma do teu próximo.
2.2.c. Conclusão
Cobiça eá entendida no Antigo Testamento como um
primeiro passo rumo a um pecado mais grave. Ao
proibi--lo, o Senhor coloca eê nfase nos pensamentos
do mesmo modo como coloca nas açoã es. Romanos 7:7
confirma esta conclusaã o quando associa este mandamento
com pensamentos que, embora presentes em nossa mente,
naã o seriam detectados como pecado se a lei naã o
dissesse.
2.3. PERDA DA PROPRIEDADE
Uma situaçaã o muito comum no mundo antigo trata
da experieê ncia de perder um bem que estava no
poder do dono ou aos cuidados de outros (i.e.,
empreá stimo). A maá xima popular “achado naã o eá
roubado” naã o se aplicava em muitas sociedades no
mundo antigo.
CÓDIGO DA ALIANÇA
O coá digo da aliança assume o mesmo
princíápio baá sico das leis babiloê nicas e hititas de
que o bem extraviado deveria ser devolvido ao seu
dono.
(Ex 23:4–5)
Se encontrares desgarrado o boi do teu
inimigo ou o seu jumento, lho reconduzirás.
Se vires prostrado debaixo da sua carga o
jumento daquele que te aborrece, não o
abandonarás, mas ajudá--lo--ás a erguê--lo.
CÓDIGO DA ALIANÇA
NO caso das leis do Antigo Testamento, haá muita
semelhança neste particular. Veja alguns casos que revelam
igual preocupaçaã o com situaçoã es de uma cultura urbana.
Ex 21:28–32
28
Se algum boi chifrar homem ou mulher, que morra, o boi será apedrejado, e não lhe
comerão a carne; mas o dono do boi será absolvido. 29Mas, se o boi, dantes, era dado a
chifrar, e o seu dono era disso conhecedor e não o prendeu, e o boi matar homem ou
mulher, o boi será apedrejado, e também será morto o seu dono. 30Se lhe for exigido
resgate, dará, então, como resgate da sua vida tudo o que lhe for exigido. 31Quer tenha
chifrado um filho, quer tenha chifrado uma filha, este julgamento lhe será aplicado. 32Se
o boi chifrar um escravo ou uma escrava, dar-se-ão trinta siclos de prata ao senhor
destes, e o boi será apedrejado.
CÓDIGO DEUTERONOMISTA
O caso tratando da propriedade construíáda fora de
padroã es que garantissem a segurança eá tambeá m um
exemplo da cultura semíática imersa num contexto
urbano.
Dt 22:8
8
Quando edificares uma casa nova, far-lhe-ás, no terraço, um parapeito, para que nela
não ponhas culpa de sangue, se alguém de algum modo cair dela.