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Matéria KC-390.

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INDÚSTRIA
Ao fundo O primeiro KC-390 de produção em série,
de matrícula (oculta) FAB 2852 e ostentando o
prefixo temporário PT-ZNX, decola para mais uma
exibição aérea no Salão Aerospacial Internacional de
Paris, em julho último. A aeronave foi cedida pela FAB
à Embraer, para substituir o primeiro protótipo (PT-
ZNF), dado como perdido depois de um incidente em
maio de 2018 (Foto: Matti Blume, Wikipedia Creative
Commons CC-BY-SA 4.0).

Trans
sp

Ultimamente, duas notícias têm agitado o mercado n ALEXANDRE FONTOURA


mundial de aeronaves de transporte militar: a entrega dos Força Aérea Brasileira prepara-se para receber as primeiras unidades de
primeiros KC-390 de produção em série para a Força Aérea
Brasileira (FAB), em outubro próximo, e o fechamento do
primeiro contrato de exportação da aeronave, para
Portugal, no mês de agosto deste ano. Não se deve
esquecer, entretanto, do peso que a maior indústria
A um total de 28 Embraer KC-390 encomendados para a substituição dos
veteranos Lockheed C-130M Hercules. Os exemplares que serão entre-
gues pela Embraer à FAB provavelmente terão as matrículas FAB 2853
e FAB 2854, uma vez que o FAB 2852, primeiro de série, foi cedido pela FAB à
Embraer em 2018, para a conclusão dos testes previstos no programa de de-
senvolvimento, em substituição ao primeiro protótipo (PT-ZNF), que saiu da
aeronáutica do mundo, a Boeing, terá nos esforços de pista em Gavião Peixoto (SP) quando realizava ensaios, em 5 de maio de 2018.
marketing e no suporte ao KC-390 em nível mundial, em Essas duas primeiras unidades, às quais se somará o FAB 2852, tão logo
função da sua associação com a Embraer, numa joint os ensaios em voo sejam finalizados, serão provavelmente operadas pelo
venture destinada a promover as vendas da aeronave. 1º Esquadrão do 1º Grupo de Transporte (1º/1ºGT), o Esquadrão Gordo.

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KC-390:
a (r)evolução no
nsporte Aéreo Militar

Em relação aos C-130, a Aviação de Transporte da FAB passou por algumas enquanto as Bases Aéreas foram transformadas em Alas, mantendo sob sua su-
reformulações e reestruturações nos últimos anos. Em 2013, por exemplo, foi de- bordinação as Unidades Aéreas sediadas em cada uma delas.
cidido concentrar todos os Hercules em uma única base aérea, com o objetivo de Assim, a Base Aérea do Galeão se tornou a Ala 11, e nela ficaram sediados o
minimizar os custos de manutenção e melhorar a capacidade operacional. Neste 1ºGTT (Esquadrão Coral e Esquadrão Cascavel), o 1º/1ºGT (Esquadrão Gordo), o
sentido, naquela ocasião, o 1º Grupo de Transporte de Tropas (1ºGTT), com seus 1º/2ºGT (Esquadrão Condor), o 2º/2ºGT (Esquadrão Corsário) e o 3ºETA (Esquadrão
dois esquadrões, o Coral e o Cascavel, foi transferido da Base Aérea dos Afonsos Pioneiro). Entretanto, em 29 de dezembro de 2017, este último foi transferido para
(RJ) para a Base Aérea do Galeão (RJ), onde já estava sediado o Esquadrão Gordo. a Ala 12, na Base Aérea de Santa Cruz, também no Rio de Janeiro.
Com a reestruturação administrativa adotada a partir de dezembro de 2016, Com essa transferência, os três esquadrões equipados com C-130 passaram
o Comando da Aeronáutica extinguiu o Comando-Geral de Operações Aéreas a atuar de forma totalmente integrada, levando à retirada dos emblemas de uni-
(COMGAR), o Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (COMDABRA), as qua- dades das aeronaves, que passaram a ser operadas em pool. Assim, os esqua-
tro Forças Aéreas (I, II, III e V FAe) e os Comandos Aéreos Regionais (I, II, III, IV, V, VI e drões Gordo, Coral e Cascavel não foram extintos, e seus tripulantes mantive-
VII COMAR). Neste processo, o COMGAR foi substituído pelo Comando de Preparo ram e permaneceram usando os códigos-rádio originais e as bolachas nos
(COMPREP), e o COMDABRA pelo Comando de Operações Aeroespaciais (COMAE), uniformes. A diferença é que, agora, as missões são realizadas com qualquer

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KC-390 permitirá a integração de Asas


Rotativas, Reconhecimento, Caça,
Transporte e Patrulha. Um exemplo é
o fato de que o KC-390 poderá ser
equipado com o pod de reconheci-
mento Rafael Litening, já usado pelos
caça-bombardeiros A-1 (AMX) sedia-
dos na Ala 4, em Santa Maria (RS), e
que também será parte do arsenal de
armas e equipamentos dos futuros
caças multifuncionais F-39E/F Gripen,
em operação na FAB a partir de 2021.
Também estão presentes no Grupo
Kilo pilotos de F-5M, uma vez que o
KC-390 tem a capacidade de reabas-
tecer em voo tanto os F-5M como os
A-1, bem como os helicópteros H-36
Caracal, o que justifica também a pre-
sença de pessoal da Aviação de Asas
Rotativas. Do mesmo modo, a partici-
pação das Aviações de Patrulha e de
Reconhecimento no Grupo Kilo é jus-
tificada por outros equipamentos e
sistemas encontrados em aeronaves
desses dois segmentos. O radar AESA
do KC-390 (o Leonardo Gabbiano
T20), por exemplo, possui modos Spot
SAR, e seu modo ar-mar permite ras-
trear mais de 200 embarcações si-
multaneamente, podendo ser usado
não só para busca de embarcações
inimigas, mas também para combate
a atividades ilegais como pesca pre-
datória, pirataria e derramamento de
óleo.
Um exemplo da preparação da
equipe do Grupo Kilo foi o 1° Curso de
Acima Por ocasião de seu aeronave que esteja disponível. A expectativa Emprego da Aviação de Transporte (CEAT), realizado na Ala 2 no período de 30 de
anúncio, na LAAD 2007, o KC- é que, com a entrada em serviço do KC-390, as abril a 15 de maio de 2018, e que teve como principal objetivo justamente pre-
390 ainda apresentava três unidades sejam equipadas com o novo parar o pessoal do Grupo Kilo. O CEAT capacitou oficiais e graduados de diversas
diversas características em avião e voltem a ter identidade própria. especialidades em ações da Força Aérea características da tarefa de sustentação
comum com o EMB190, como ao combate, entre elas: assalto aeroterrestre; evacuação aeromédica; infiltração e
as asas (que diferiam apenas Grupo Kilo exfiltração aérea; transporte aéreo logístico; Defesa Química, Biológica, Radiológica
pelo ângulo anedro, ou diedro Além da transferência de todos os C-130M e Nuclear (DQBRN); salto livre operacional; lançamento aéreo de material; e apro-
negativo), profundores e
e KC-130M para a Ala 2, em Anápolis (GO), onde ximações e decolagens táticas.
deriva vertical, como visto na
concepção artistica da devem operar até o final de 2023(1), em 2016 o O KC-390 traz muitas capacidades e tecnologias exclusivas, que permitirão não
Embraer, na foto ao alto. Na Comando da Aeronáutica criou, com sede tam- apenas uma evolução, mas também uma verdadeira revolução na Aviação de
LAAD 2009, entretanto, a bém na Ala 2, o Grupo Kilo, responsável pelo Transporte da FAB e na de países que vierem a adquirir a aeronave, como veremos
maquete exibida já mostrava desenvolvimento de toda a doutrina opera- mais adiante.
a nova configuração, com cional e dos manuais da nova aeronave, sendo
novas asas e profundores, e composto por 12 oficiais aviadores e 30 gra- O contrato de Portugal
cauda em “T”. A designação duados das diversas aviações da FAB. Deste Ao lado da Argentina e República Tcheca, Portugal é um dos países que di-
também havia sido alterada modo, os primeiros tripulantes do KC-390 não videm com o Brasil, por meio da Embraer, o desenvolvimento do KC-390. A parti-
de C-390 para KC-390, são apenas pilotos de transporte, incluindo cipação lusitana no programa do KC-390 passa pela empresa OGMA, que desde
evidenciando a capacidade também aviadores vindos de esquadrões de 2004 tem 65% de seu capital controlado pela Embraer, que tem no país duas ou-
multifuncional (Foto:
reconhecimento, de patrulha, de asas rotativas tras fábricas, localizadas em Évora, a 135km de Lisboa. Uma delas fabrica aero-es-
Segurança & Defesa)
e até da aviação de caça. A ideia é que o Grupo truturas em metal para suas aeronaves, incluindo os E-Jets, Legacy e Phenom; a ou-
Kilo possa agregar os conhecimentos das di- tra produz partes em material composto, como o estabilizador horizontal do
versas aviações e consolidá-los na doutrina da aeronave. KC-390. Além disso, nas instalações da OGMA, em Alverca, foram desenvolvidos e
Isso é necessário, uma vez que a capacidade multidisciplinar do são produzidos diversos componentes do KC-390, incluindo os sponsons do trem

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Ao fundo O Primeiro-Ministro
de Portugal, António Costa, na
apresentaç̃ao do KC-390 na
sede da Embraer em Alverca,
em 4 julho 2016 (Foto Clara
Azevedo/Ministério da Defesa
de Portugal)

de pouso principal, portas do trem de pouso e 56% da seção central da fuselagem. dos à aquisição de equipamentos de guerra eletrônica à Elisra, subsidiária da em-
Neste sentido, ganha destaque a decisão tomada na reunião do Conselho de presa israelense Elbit Systems, e €66.388.172,00 serão usados para o apoio lo-
Ministros do Governo de Portugal, realizada no último dia 11 de julho, sobre a aqui- gístico dos motores junto à International Aero Engines AG (IAE) e a aquisição de
sição de cinco aviões KC-390, com a publica- equipamentos junto ao Governo dos Estados Unidos, para instalação pela Embraer
ção da Resolução nº 120/2019, que aprova as nas aeronaves, além de outros itens, inclusive para emprego no solo, em apoio à
Abaixo Longe de ser uma despesas referentes a essa aquisição, no Diá- operações dos aviões. As aeronaves serão entregues pela Embraer, à razão de uma
desvantagem, o avançado rio da República. O documento detalha as por ano, entre 2023 e 2027.
glass cockpit ProLine Fusion da despesas envolvidas na aquisição das aero- Na nota oficial divulgada em 11 de julho, o Conselho de Ministros do Governo
Rockwell Collins é, na verdade, naves, a um custo total de €827 milhões de Portugal, destacou: “O Conselho de Ministros aprovou hoje a aquisição de
uma vantagem sobre a (US$932 milhões), dos quais €606.158.571,00 cinco aeronaves KC-390, assim como a contratação dos serviços de sustentação lo-
concorrência, pois além de ser
são referentes às aeronaves propriamente di- gística das aeronaves e do simulador de voo e a aquisição dos equipamentos de
customizado para emprego
militar, permite que a tas e €109.817.204,00 se referem a serviços guerra eletrônica. A aquisição das aeronaves KC-390 e de um simulador de voo, e
aeronave possa se utilizar de apoio logístico dos aviões e do simulador respectiva sustentação logística, com as configurações e especificações técnicas,
plenamente de vantagens da de voo, por meio do consórcio constituído operacionais e logísticas definidas pela Força Aérea, permitirá reforçar as atuais ca-
rede de tráfego aéreo civil por Embraer S.A. e a Embraer Netherlands pacidades de transporte aéreo, de busca e salvamento, evacuações sanitárias e
(Foto: Rockwell Collins). B.V, enquanto €44.969.053,00 serão destina- apoio a cidadãos nacionais, nomeadamente entre o Continente e os Arquipélagos,
incluindo-se, também, as capacidades adicionais de reabaste-
cimento em voo e de combate a incêndios florestais, o que
possibilita que Portugal disponha de aeronaves com funções
de duplo uso (civil e militar), que respondem a necessidades per-
manentes do país. As características únicas da aeronave KC-390
estabelecem um novo padrão para o transporte militar estra-
tégico, até aqui apenas possível de assegurar com aeronaves
quadrimotores, de superiores dimensões e capacidades, cons-
tituindo-se assim, nesta classe, como a solução que satisfaz in-
tegralmente os requisitos definidos pelo Estado Português,
bem como os exigidos para participação nas operações mili-
tares que poderão decorrer das alianças de que Portugal faz
parte”.
O contrato de aquisição das cinco aeronaves por Portu-
gal foi assinado pelo Primeiro-Ministro português, António
Costa, e pelo Ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, em
uma solenidade nas instalações da Embraer em Évora, no dia
22 de agosto último.

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presas para conciliar com a empresa americana os interesses do go-


verno brasileiro e da Embraer. A União exigia que a soberania nacio-
nal fosse preservada, e se opunha a qualquer participação da Boeing
na produção de aeronaves militares. À Embraer, por sua vez, interes-
sava ter acesso à rede comercial da companhia americana em todo
o planeta.
O que se comenta é que, excetuando os que já participam do
programa, ao menos outros cinco países já manifestaram interesse
na aquisição do KC-390, que atraiu muito interesse das delegações
estrangeiras durante o Salon International de L’Aéronautique et de
L’Espace (SIAE) 2019, realizado em Le Bourget, Paris, entre 21 e 27 de
junho deste ano. Durante o evento, a aeronave foi demonstrada,
exibindo sua excelente performance, tanto em voo como nos pou-
sos de decolagens.
Obviamente, o maior interesse da Boeing na parceria com Em-
braer no programa do KC-390 é o fato de que a aeronave faz frente
e apresenta muitas vantagens em relação ao seu principal concor-
Acima A concepção artística mostra, atrás rente, o C-130J Hercules, produzido pela sua arquirrival, a Lockheed Martin. A
do assento do 2P, o posto do Operador de O peso da Boeing Boeing produz o C-17 Globemaster III, que é muito maior que o KC-390, mas não
Missões Especiais e seu Painel Embraer e Boeing já vinham de- tem, em seu portfólio, um concorrente para o C-130J, e aí o KC-390 da Embraer se
Multifunção. Esse posto não deve ser senvolvendo sinergias em vários pon- encaixa perfeitamente.
confundido com o do Loadmaster, que ficatos, o que culminou com uma combi- Na edição 132 de “Segurança & Defesa”, de 2018, foi publicado artigo apre-
na cabine de carga (Foto: Embraer). nação de negócios na área da Aviação sentando um Situation Report do programa do KC-390, descrevendo a aeronave
Comercial, onde foi formada uma nova em detalhes e suas características. Por isso, a intenção do presente trabalho é fo-
empresa, a Boeing Brasil Commercial, com sede em São José dos Campos, em São car nos pontos de destaque da aeronave em relação à concorrência, notadamente
Paulo, com 80% de capital da Boeing e 20% de capital da Embraer. Nela, a Boeing o C-130J. Um comparativo das principais características dos dois aviões pode ser
assumiu o controle da área de E-Jets da Embraer, ficando de fora as área de de- visto no quadro que acompanha este texto.
fesa (Embraer Defesa & Segurança), de aviação executiva e de serviços, que fica-
rão estabelecidas na sede de Gavião Peixoto, também no interior de São Paulo. Nascimento de um vencedor
Mas as duas empresas, que já trabalhavam juntas na integração de armas Os primeiros estudos da Embraer relativos a uma nova aeronave de trans-
americanas, como a Small Diameter Bomb (SDB) e a Joint Direct Attack Mu- porte militar tiveram origem em 2005, quando foram iniciadas avaliações do
nition (JDAM) no A-29 Super Tucano, re- mercado desse segmento. A empresa pesquisou junto a diversos países que
solveram criar uma joint venture dedicada operavam aeronaves de transporte com capacidade de 5-20t de carga paga, e
Abaixo O KC-390 vindo para o ao marketing e suporte do KC-390 em chegou à conclusão de que havia um mercado de cerca de 3.000 aeronaves
pouso, com seus flapes
todo o mundo, com o apoio da Boeing, desta categoria, que necessitariam de substituição nos próximos 20-30 anos. Boa
baixados. A deriva vertical e o
leme de grandes dimensões que não terá acesso à parte de engenha- parte deste mercado usava aviões com cerca de 25 anos de idade, e que já es-
permitem excelente ria e produção da aeronave, mas sim aos tavam sendo submetidos a programas do tipo Mid-Life Update (MLU), visando
estabilidade nas operações de dividendos na comercialização, na mesma estender suas vidas úteis. Realisticamente, a Embraer excluiu desta lista os paí-
pouso e decolagem, inclusive razão de 49% da sua participação na divi- ses nos quais o mercado já seria abastecido por produtos próprios, como os Es-
em pistas não preparadas são societária na joint venture. tados Unidos, Rússia e Ucrânia, por exemplo, além de países que já haviam anun-
(Foto: Adrien Daste/Embraer). Essa foi a forma encontrada pelas em- ciado que substituiriam suas aeronaves por modelos como o C-17, o A-400M ou
o C-130J. Mesmo assim, ainda restava um mercado de cerca de 700
aeronaves que poderia ser disputado por um novo avião na cate-
goria de até 20t de payload.
A Embraer iniciou o que ela designou, na época, como Projeto E
CXX, usando recursos próprios e, num primeiro momento, usando
partes comuns à bem-sucedida linha de jatos comerciais E190, in-
cluindo asas (que, entretanto, passaram a ter diedro negativo, ou
anedro), empenagem vertical, sistema fly-by-wire e glass cockpit. A
fuselagem seria totalmente nova, com rampa traseira e trem de
pouso principal deslocado para as laterais, em sponsons, em confi-
guração similar à do C-130. Os motores seriam os mesmos da sé-
rie General Electric CF34-10E usados na linha E175/E190, mas pos-
síveis alternativas seriam os Pratt & Whitney PW6000 e os
Rolls-Royce BR715.
Em abril de 2007, durante a LAAD daquele ano, a Embraer
apresentou publicamente, pela primeira vez, seu novo produto, já
rebatizado como C-390. Em geral, a recepção do público ao novo
projeto foi boa, mas a concorrência não o levou muito a sério. Na
ocasião, comentava-se que o desenvolvimento custaria à Embraer

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2-4 DE
DEEZEMBRO
EM CORFERIAS
BOGOTÁ-COLÔMBIA

BOGOTÁ, CENTRO DE
INOVAÇÃO NO SETOR
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SEGURANÇA E DEFESAA

PARTICIPE DA FEIRA QUE EXIBE AS


A MAIS RECENTES TECNOLOGIAS DE SE
EGURANÇA
E DEFESA PARA MARINHA, FORÇA AÉREA
A E EXÉRCITO NA AMÉRICA LATINA E NO CARIBE

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Apoio Associa Organizaçã
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anos, o primeiro protótipo do KC-390, que re-


cebeu a matrícula experimental PT-ZNF, teve
sua construção iniciada e foi apresentado
(roll-out) em 21 de outubro de 2014, voando
pela primeira vez em 3 de fevereiro de 2015;
até fevereiro do ano seguinte, foram acu-
muladas mais de cem horas de voo. A mon-
tagem do segundo protótipo (PT-ZNJ) foi
concluída em março de 2016, e seu primeiro
voou aconteceu em 28 de abril de 2016. Em
21 de junho daquele ano, a FAB e a Embraer
realizaram com sucesso o primeiro lança-
mento de paraquedistas.
No entanto, dois incidentes com o pri-
meiro protótipo (PT-ZNF) afetaram o crono-
grama de desenvolvimento do KC-390. O
primeiro aconteceu durante um ensaio em
voo em 12 de outubro de 2017, quando o
PT-ZNF teve inesperada e substancial perda
de altitude, superada após a realização de
procedimentos de recuperação pelos pilo-
Acima O primeiro protótipo por volta de US$500 milhões. Entretanto, tos. Segundo relatos, durante ensaio para situação de estol, teria ocorrido uma
do KC-390, visto durante um fato importante alterou fortemente os perda de sustentação, provocada por uma alteração repentina do centro de gra-
testes de operação de rumos do projeto, transformando-o, sem vidade, pouco antes da aeronave atingir o nível máximo de estol. Com isso, o
abertura da rampa de carga dúvida, em um futuro vencedor. Este fato foi avião teria perdido altitude rapidamente, com a tripulação só tendo conseguido
em voo (Foto: Embraer). a apresentação do C-390 à FAB, ainda em retomar o controle pleno a 1.000 pés (300 metros) de altitude. Após o ocorrido,
2007. A Força Aérea, naquela ocasião, esta- o PT-ZNF foi totalmente examinado pela Embraer e, exceto por danos de pouca
belecia os Requisitos Técnicos, Logísticos e Industriais (RTLI) para seu Programa monta, a empresa concluiu que a aeronave era recuperável e, pouco tempo de-
KC-X, visando a obtenção de uma nova aeronave de transporte para substituir pois, o avião retornou aos voos de testes, junto com o segundo protótipo.
seus K/C-130H Hercules. Esses RTLI levaram a Embraer a concluir que uma aero- Em 5 de maio de 2018, porém, o PT-ZNF se envolveu em novo incidente, no-
nave de transporte derivada do E190, por melhor que fosse, não atenderia vamente sem vítimas, quando saiu da pista em Gavião Peixoto durante a reali-
idealmente nem à FAB e nem ao mercado. zação de testes em solo, desta vez sofrendo severos danos no trem de pouso e
Assim, a empresa voltou às pranchetas (ou aos computadores) e resolveu na parte estrutural da fuselagem. A Embraer concluiu que os danos eram por de-
recomeçar do zero, alterando radicalmente o desenho do avião, tendo como mais extensos, e contabilizou US$127 milhões pela perda do protótipo, tendo
Norte os inputs da FAB estabelecidos no RTLI do KC-X. As sugestões vindas do sido obrigada a adiar a entrega da primeira aeronave à FAB (prevista para o fi-
Exército Brasileiro também foram levadas em consideração no novo projeto e, nal de 2018), para o final de 2019, quando o programa de desenvolvimento es-
em 2008, a FAB formalizou o pedido de desenvolvimento e industrialização da taria concluído em 97%. Por conta disso, a FAB realizou a cessão da primeira aero-
aeronave, tornando-se assim parceira do projeto (já então rebatizado como nave de série (FAB 2852) à empresa, para que se unisse ao segundo protótipo
KC-390, evidenciando suas características multifuncionais de Avião Tanque e Car- para a conclusão dos ensaios. Foi essa aeronave, com a matrícula da FAB oculta
gueiro) e dividindo com a Embraer a propriedade intelectual do programa. Na e usando o prefixo PT-ZNX, que se apresentou na 53ª edição do SIAE 2019,
LAAD 2009, o KC-390 foi oficialmente lançado, com grande repercussão. quando a Embraer comemorava seus 50 anos e o programa do KC-390 atingia
Em outubro de 2009, o Congresso aprovou a destinação à Embraer, por meio as 2.200 horas de voos de testes.
de pedido do Poder Executivo, de uma verba no montante de R$305 milhões
para o desenvolvimento da aeronave, por meio do Orçamento da FAB. En- Diferenciais
quanto a Embraer procurava novos parceiros, a FAB preparou um pedido para O KC-390 tem como principal pretensão ser um novo padrão de aeronave
a aquisição de trinta exemplares do KC-390, incluindo dois protótipos. dentro dos requisitos da categoria. Além do simples transporte de cargas, tro-
Em novembro de 2012, graças ao novo programa, foi criada a Embraer De- pas e paraquedistas, pode cumprir uma diversidade de outras missões, entre elas:
fesa & Segurança (EDS) sediada na cidade de Gavião Peixoto, no interior do Es- reabastecimento aéreo (REVO), apoio a missões humanitárias, combate a in-
tado de São Paulo, gerando mais de mil novos postos de trabalho. Em março do cêndios, busca e salvamento e evacuação aeromédica (MedEvac). A própria de-
ano seguinte, a FAB e a EDS concluíram a Revisão Crítica de Projeto (Critical De- signação da aeronave, com a inclusão da letra “K”, já demonstra um diferencial
sign Review, ou CDR), “congelando” a configuração do KC-390 e iniciando a em relação aos concorrentes, incorporando a função de reabastecedor ab ini-
Fase de Projeto Detalhado e Certificação (Detailed Design And Certification tio. Equipado com dois Wing Aerial Refuelling Pod (WARP) Cobham Model 912,
Phase, ou DDCP). específicos para o avião brasileiro (um em cada asa), o KC-390 é capaz de trans-
O governo brasileiro assinou o primeiro contrato com a Embraer para a pro- ferir até 450 galões americanos/min.
dução em série do cargueiro em 20 de maio de 2014, em um negócio estimado O WARP da Cobham é capaz de gerar autonomamente a energia que con-
em R$7,2 bilhões, que incluía suporte logístico, peças sobressalentes e manu- some, por meio de uma RAT (Ram Air Turbine), acionada por uma hélice no na-
tenção. O desenvolvimento do KC-390 contou com R$ 4,5 bilhões do Programa riz do pod. A RAT converte energia mecânica em energia elétrica, gerando o su-
de Aceleração do Crescimento (PAC). Apesar de atrasos na liberação das verbas ficiente para as operações de extensão e recolhimento da mangueira de 33m,
previstas, em função dos problemas econômicos surgidos na administração da longa o suficiente para ficar longe e abaixo da turbulência gerada pelas asas e
presidente Dilma Roussef, o que atrasou o desenvolvimento em pelo menos dois motores do KC-390. O pod pesa cerca de 500kg e pode ser operado nas faixas

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Acima Presente e futuro na mesma de velocidade de 180-300 nós para caças REVO inclui dois tanques extras paletizados, que podem ser transportados no
foto. O primeiro protótipo do KC-390 e de 120-140 nós para helicópteros. Pode interior da fuselagem. Fabricados por uma empresa do Grupo Cobham, a Sear-
(PT-ZNF) visto no Campo dos ser rapidamente instalado no KC-390, e gent Fletcher, os dois Auxiliary Fuselage Fuel Tanks podem transportar 2.350 ga-
Afonsos, com um C-130H ao fundo existem dois modelos diferentes de ces- lões americanos e, além de ampliar a capacidade do KC-390 de transferir com-
(Foto: Sgt Batista/Força Aérea tas: para caças ou helicópteros. bustível em voo, podem ser usados em missões em que seja necessário ampliar
Brasileira). Além dos dois pods, o sistema para a autonomia da aeronave, como translado (ferry) e Busca e Salvamento (SAR). Aos

C-130J X KC-390
COMPARATIVO DAS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DAS AERONAVES
Especificações C-130J KC-390
Tripulação (mínimo de piloto, co-piloto e loadmaster) 3 3
Capacidade de transporte 92 militares (128 no C-130J-30) 80 militares
64 paraquedistas (92 no C-130J-30) 66 paraquedistas
74 macas e 5 atendentes médicos (92 macas 74 macas e 8 atendentes
no C-130J-30)
6 pallets (8 no C-130J-30) 7 pallets
2–3 Humvee, ou 1 x LAV III (com a torre removida) 1 x Boxer 8x8
ou uma VBTP M113 1 x Stryker com blindagem extra
2-3 x Humvee, ou 1 x BMP-3, 1 x Patria AMV, 2 x M113,
1 x VBTP-MR Guarani ou 1 x helicóptero Black Hawk
Capacidade de carga (payload) C-130J: 19.050kg 26.000kg (concentrados)
C-130J-30: 19.958kg 23.000kg (distribuídos)
Dimensões e volume do compartimento de carga 16,50m (18,05m no C-130J-30) 18,50m (incluindo a rampa) x 2,95m x 3,45m (C x A x L);
x 3,10m x 2,6m (C x A x L); 126,3m3 169m3
Envergadura 40,41m 35,05m
Altura 11,84m 11,84m
Comprimento 29,79m (34,36m no C-130J-30) 35,20m
Área alar 162,10m² 140,56m2
Peso vazio 34.274kg 23.600kg
Peso máximo de decolagem 70.305kg (74.393kg para o C-130J-30) 81.000kg (máximo)
74.400kg (normal)
67.000kg (tático)
Motores 4 × turboélices Rolls-Royce AE 2100D3, 4.637shp 2 x turbofans IAE V2500-E5, 139,4 kN (31.330 lbf)
(3.458kW) cada, com hélices Dowty hexapás R391 de empuxo cada
Velocidade máxima 671km/h (362 nós) 988km/h, Mach 0.8
Velocidade de cruzeiro 643km/h (348 nós) 870km/h (470 nós)
Teto operacional 8.615m (28.000ft) 11.000m (36.000ft)
Alcance 3.334km (1.800mn) com 15.400lb (34.000lb) de carga 2.815km (1.520 mn) com 23,000kg (50.700 lb) de carga
com tanques extras; 5.078km (2.850mn) para o 4.908km (2.650mn) de alcance de translado,
C-130J-30 6.130km (3.310mn) de alcance de translado, com
tanques extras; 8.500km (4.600mn) com os tanques
internos de fuselagem
Distância de decolagem 1.433m (ISA, Nível do Mar), com 19.050kg de carga; 1.524m (ISA, Nível do Mar), com 23.000kg de carga
549m em decolagem de máxima performance 1.165m (ISA, Nível do Mar), com 16.000kg de carga;
Distância de pouso 777m com peso total de 58.967kg 1.000m (ISA, Nível do Mar) com carga de 26.000kg

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2020

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APOIO ASSOCIAÇÃO PUBLICAÇÃO


à OFICIAL ASSOCIADA À ORGANIZAÇÃO
Ã
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Acima Os primeiros testes de 23.600kg de combustível transportados pode estender as mangueiras, liberar e monitorar a quantidade combustível
operações de reabastecimento em nas asas do KC-390, os tanques auxiliares transferida, controlar o fluxo de combustível transferido, dar zoom no vídeo, etc.
voo com o KC-390 envolveram da fuselagem somam outros 14.000kg, O mesmo painel extra para o tripulante adicional, situado atrás do 2P, per-
apenas contatos“secos”(sem um acréscimo de 60% na quantidade mite o emprego em outras missões, como Busca e Salvamento (SAR) e Tática, e
transferência real de combustível), normal de combustível do avião. Outra de lá também podem ser operados os sistemas de autoproteção do KC-390, con-
com caças F-5EM da Força Aérea vantagem é a possibilidade de serem trolado o FLIR, etc. Essa posição não deve ser confundida com a do loadmaster
Brasileira (FAB). Para conclusão dos
transportados um ou os dois tanques, (mestre de carga), que fica no compartimento de carga, e de onde este pode ge-
testes, serão feitas transferências
reais de combustível com caças- que podem ser rapidamente embarca- renciar os lançamentos de carga,
bombardeiros A-1 (AMX) e dos e desembarcados, permitindo inclu- reduzindo o trabalho dos dois tri-
helicópteros H-36 Caracal, também sive o abastecimento de outras aerona- pulantes no cockpit. Abaixo Por medida de economia e
da FAB, ainda em 2019 (Foto: ves no solo, em aeródromos remotos. Segundo as informações da para favorecer a logística e
Embraer). Assim, o KC-390 dispõe da flexibilidade Embraer, em condições ideais de manutenção, a frota restante de
K/C-130 da FAB foi concentrada
para operar em configuração mista, le- operação um KC-390 pode trans-
inicialmente na Base Aérea do Galeão
vando carga ou pessoal, além de um tan- ferir até 24.500kg de combustível, e, depois, deslocada para a Ala 2, em
que. Por último, mas não menos importante, cada KC-390 sai de fábrica já equi- operando a 460km (250mn) de sua Anápolis - GO. A FAB pretende manter
pado com um probe sobre a fuselagem, projetando-se à frente, o que permite base. A 1.852km (1.000mn), a quan- em operação 10 aeronaves do tipo até
que, além de abastecer outras aeronaves, o KC-390 possa ser reabastecido em tidade que pode ser transferida é 2023, quando espera possuir igual
voo, aumentando ainda mais sua flexibilidade. reduzida para pouco menos de quantidade de KC-390 (Foto: Sgt
O REVO é uma das características de destaque do avião, que pode realizar 14.000kg, É preciso não esquecer Johnson/Força Aérea Brasileira).
até duas operações de reabastecimento
em voo simultaneamente, garantindo
maior operacionalidade aves dentro de
um pacote de missão. O que se previu
para o KC-390, na missão de reabastece-
dor, é a possibilidade de empregar dois
observadores nas janelas, colocadas nas
portas traseiras do compartimento de
carga, que poderão passar as informa-
ções ao comandante do REVO, sentado
no cockpit, na posição atrás do 2P, frente
a um painel multifunção. A partir dessa
posição, ele pode conduzir a operação de
modo autônomo, sem os observadores,
usando as câmeras de vídeo externas do
KC-390, que mostram toda a operação,
de dia ou de noite. O painel apresenta to-
das as informações necessárias e, a par-
tir do seu posto, o comandante do REVO

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Acima A capacidade que, além de reabastecer, o KC-390 pode dores) posicionados em cadeiras especiais e usando janelas em formato de bo-
multifuncional do KC-390 é ser reabastecido em voo, inclusive por ou- lha, o KC-390 pode ser usado em operações de Busca e Salvamento (SAR) por
explicitada nas imagens acima, tro KC-390, ampliando sua autonomia. muitas horas, ampliando a autonomia com um ou dois dos tanques auxiliares de
mostrando, da esquerda para a Tendo sido iniciada em 2016, ape- fuselagem, transportados internamente, deixando ainda espaço interno para o
direita, o lançamento de nas com contatos secos (sem transfe- transporte de suprimentos, fardos e botes, que podem ser lançados pela rampa
paraquedistas, operação de rência real de combustível), a campanha ou portas laterais. Já em missões de evacuação aeromédica, a aeronave pode ser
combate a incêndios florestais com
de ensaios em voo de REVO será com- equipada com até 74 macas, padrão Stanag 2040, oito atendentes médicos e todo
emprego do MAFFS (Modular pletada com transferências reais entre o equipamento necessário para suporte à vida, para receber feridos ou sobrevi-
Airborne Fire Fighting System) e
KC-390 e caça-bombardeiros A-1 (AMX) ventes de desastres naturais.
operação de Busca e Salvamento
(SAR), inclusive com emprego de e helicópteros H-36 Caracal, dos quais 8 A capacidade FLIR (Forward Looking Infrared), proporcionada pela possibi-
pod com FLIR (Fotos: Embraer). dos 18 adquiridos pela FAB são equipa- lidade de levar um pod Rafael Litening II, será extremamente útil em missões tá-
dos com o “pau de selfie”, como o pessoal ticas e de Busca e Salvamento (SAR). Mas não há dúvidas de que o principal sen-
da Força se refere ao probe desses heli- sor do avião será o já citado radar Leonardo Gabbiano T20. O equipamento não
cópteros. Além dos F-39E/F Gripen, os futuros “clientes” do KC-390 poderão é um simples radar meteorológico, como o dos concorrentes, mas um radar de
possivelmente incluir até seis outros helicópteros Black Hawk, da variante emprego tático (inclusive com modos ar-ar) e de vigilância, operando na Banda
HH-60 Pave Hawk ou similar, dedicados a missões C-SAR (Combat SAR) e cuja X, capaz de detectar um alvo marítimo a até 220mn (407km) e de acompanhar
aquisição é pretendida pela FAB para equipar o 2º/10ºGAv (Esquadrão Peli- 200 alvos simultaneamente.
cano), permitindo que sejam retornados ao 7º/8ºGAv (Esquadrão Harpia) e O uso do radar Gabbiano e do pod Litening, associado à blindagem em pon-
ao 5º/8ºGAv (Esquadrão Pantera), respectivamente sediados na Ala 8 (Ma- tos-chave da aeronave, com capacidade de resistir a impactos de munição de
naus – AM) e na Ala 4 (Santa Maria RS), os 7,62mm e de 12,7mm, juntamente ao uso de uma suíte de autodefesa que inclui
quatro H-60 Black Hawk cedidos por es- Radar Warning Receiver (RWR), Laser Warning System (LWS), Missile Approaching
Abaixo A foto mostra em
detalhe o radome, antenas do sas unidades ao Pelicano, em substitui- Warning System (MAWS), dispensadores de chaff e flares e Directional Infrared
MAWS (próximas aos faróis de ção aos últimos H-1H operados pela uni- Counter Measures (DIRCM), ampliam em muito a capacidade de sobrevivência
pouso) e a posição da sonda dade, sediada na Ala 5 (Campo do KC-390 em ambientes hostis. Isso sem contar com a capacidade de manobra
para REVO, acima e à esquerda Grande-MS). proporcionada pelos controles fly-by-wire e pela própria célula, dimensionada
da cabine de pilotagem do KC- Com o emprego de um pod Rafael Li- para suportar continuamente até 3g.
390 (Foto: Sgt Batista/Força tening, e guarnecidas as posições na fuse- O KC-390 pode também cumprir missões de combate a incêndios, embar-
Aérea Brasileira). lagem para até quatro spotters (observa- cando sistemas como o Modular Airborne Fire Fighting System (MAFFS), já
usado nos C-130 da FAB. O MAFFS II, montado em um trolley tipo RO/RO (Roll-
On/Roll-Off) pode ser instalado em menos de uma hora, sendo capaz de “bom-
bardear” com até 11.300 litros (3.000 galões americanos) de retardante químico
ou água uma área desejada, em menos de dez segundos, por meio de ar com-
primido. O fato de usar um sistema fly-by-wire e de possuir grande controle a bai-
xas velocidades (no SIAE 2019 essa capacidade foi demonstrada, com o KC-390
voando a 108 nós, apenas 4 nós acima da velocidade de estol) permite à aero-
nave grande precisão nos lançamentos, com imediata compensação da mudança
do centro de gravidade.
Desde o início, o projeto do KC-390 contou com parceiros comprometidos
com a inovação, que seria marca registrada da aeronave. O glass cockpit é dotado
da suíte Pro Line Fusion, da Rockwell Collins, sendo o painel dominado por cinco
Multi-Function Displays (MFD) de 15,1 polegadas (seis, se for incluído o painel do
operador especial, atrás da posição do 2P); os pilotos dispõem de Head-Up-Dis-
plays (HUD), e o painel e a iluminação são compatíveis com o uso de óculos de
visão noturna (NVG-Night Vision Goggles). A escolha do sistema Pro Line Fusion,

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típico da Aviação Comercial, permite colocar o KC-390 em vantagem em relação foi usado para tornar o KC-390 uma aeronave ainda melhor do que poderia ser.
à competição, pois marca um ponto importante no suporte pós-venda, uma vez As parcerias firmadas com empresas da Argentina, Portugal e República
que a rede de apoio da Collins está presente em inúmeros países. Tcheca, além da joint venture com a Boeing, para o marketing e apoio pós-venda
Isso não significa que o Pro Line Fusion imponha alguma limitação ao KC-390, em nível mundial darão, com certeza, o acesso àquele mercado projetado, anos
por ser uma aeronave militar. Ao contrário, sua arquitetura aberta permite que atrás, pela Embraer, de 700 aeronaves. Nesse mercado, o KC-390 certamente po-
sejam apresentadas, no HUD ou em um dos MFD, informações como Computed derá atingir uma market share de 200 a 300 exemplares, o que seria um sucesso
Air Release Procedures (CARP) ou High Altitude Release Point (HARP), geradas no comercial digno do esforço dispendido para desenvolvê-lo.
computador de missão com o fim de proporcionar lançamentos precisos. Isso é A entrega dos dois primeiros KC-390 de série à FAB, no último trimestre deste
algo reservado, hoje, apenas a aeronaves como o C-17. O sistema da Rockwell Col- ano,dará início à segunda etapa de certificações,ao menos pelos dois próximos anos,
lins permite que a tripulação do KC-390 possa ter ao seu alcance a informação dentro do Grupo Kilo, validando a operacionalidade da aeronave, com certificações
que desejar, de acordo com a missão, e ainda permite a essa mesma tripulação complementares de reabastecimento em voo (REVO), operação de sistemas de
voar em ambiente de tráfego aéreo civil, com total integração, inclusive com em- guerra eletrônica e lançamento de cargas pesadas. Com isso, o KC-390 vai atingir a
prego do Traffic Alert and Collision Avoidance System (TCAS). A Rockwell Collins, Capacidade Final de Operação (Final Operational Capability, FOC), e o caminho es-
diga-se de passagem, é responsável pelo desenvolvimento do sistema de manejo tará então totalmente aberto para atender as mais diversas exigências de operadores
de cargas do KC-390, denominado Cargo Handling and Air Delivery System civis e militares de todo o mundo. n
(CHADCS).
Mesmo dentro da própria Embraer, a inovação foi o principal pano de fundo NOTA
no desenvolvimento do KC-390, começando pelo fato de a empresa ter aban- (1)
É esse o prazo do contrato assinado Abaixo O presidente da
donado a configuração inicial, derivada do E190, e recomeçado o projeto do zero. em 10 de dezembro de 2018 com a IAS, em- Embraer Defesa & Segurança,
Essa postura se espalha também por suas subsidiárias, como a Eleb, que desen- presa brasileira especializada em manuten- Jackson Medeiros de Farias
volveu o trem de pouso principal do tipo bogie do avião, com inovador sistema ção aeronáutica, sediada em São José da Schneider, entrega ao Primeiro-
de distribuição de pesos, patenteado nos Estados Unidos. Lapa (MG). Pelo contrato, a IAS deverá reali- Ministro de Portugal, António
Costa, uma maquete do KC-390
Outro parceiro importante foi a empresa americana DRS Defense Solutions, zar a manutenção de 52 motores Rolls
nas cores da Força Aérea
que projetou os sistemas de movimentação de carga e lançamento aéreo do Royce T-56A-15 até o dia 9 de dezembro de Portuguesa, durante a
KC-390, o Cargo Handling System/Aerial Delivery System (CHS/ADS). Além de 2023. A expectativa da FAB seria manter dez solenidade de assinatura do
permitir o lançamento e extração de cargas durante o voo pelo KC-390, seja por C-130, sendo dois KC-130, até 2023, quando contrato de aquisição de cinco
gravidade ou por meio de extrações por paraquedas (Low Altitude Parachute um número semelhante de aeronaves unidades da aeronave, em Évora
Extraction System – LAPES), o CHS/ADS utiliza travas eletromecânicas com con- KC-390 já estaria operacional. (Foto: Embraer).
trole por software, trilhos-guias retráteis, roletes reversíveis, anéis de ancoragem
de fixação direta e painéis de piso com estrutura de grande capacidade de
carga. Isso permite que o compartimento de carga do KC-390 possa ser re-
configurado para diversas missões, em um tempo que vai de poucos minutos
a um par de horas, bastando embutir, deslocar, girar ou reposicionar seus ele-
mentos. Com isso, o KC-390 pode, por exemplo, transportar simultaneamente
dois tipos de pallets, algo não disponível para seu concorrente mais próximo.

Conclusão
Está bem claro que o KC-390 é muito mais do que um substituto para o C-
130, na FAB. Ele não apenas poderá cumprir com melhor desempenho as missões
hoje desenvolvidas pelo veterano Hercules, mas também muitas outras, graças
à sua versatilidade e adequados equipamentos de missão. A aeronave foi testada
no frio glacial e no calor do deserto, tendo realizado todos os ensaios do pro-
grama de desenvolvimento. Durante o programa de testes, foi levada a extremos
que provocaram dois incidentes graves com o primeiro protótipo, mas até isso

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