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PREFEITURA DE IGUABA GRANDE

PROCURADORIA GERAL DO MUNICÍPIO

EXMO. SR. DR. JUIZ DO TRABALHO DA 2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO


GONÇALO – TRT1.

Reclamação Rito Ordinário nº: 0101449-46.2017.5.01.0262

MUNICÍPIO DE IGUABA GRANDE, inscrito no C.N.P.J. sob o nº


01.615.882./0001-62, com sede na Prefeitura Municipal, sito a Av. Paulino Rodrigues
de Souza, nº 3.200, Centro, por um de seus procuradores in fine assinado, nos autos
da RECLAMAÇÃO TRABALHISTA em epígrafe, movida por ANDERSON DA
CONCEIÇÃO FONSECA, vem, à digna presença desse r. Juízo oferecer
CONTESTAÇÃO, consubstanciado nos fatos e fundamentos a seguir aduzidos:

1) DAS PRELIMINARES

1.1) DA ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO MUNICÍPIO

Com efeito, cumpre argüir neste momento a flagrante ilegitimidade


passiva ad causam do Município de Iguaba Grande para figurar no polo passivo da
presente Reclamatória, eis que, em momento algum manteve "relação jurídica
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trabalhista" - conforme conceituada pela CLT - com o Reclamante, como


indicado na exordial.

Nota-se, da documentação carreada aos autos, que o Reclamante


não foi contratado pelo Município e sim pela EMPRESA COMPILLAR
ENTRETENIMENTO PRESTADORA DE SERVIÇO EIRELI/EPP, vencedora de
licitação, que tinha por objetivo a prestação de serviços nos diversos setores da
Administração Municipal.

Trata-se de Pessoa Jurídica totalmente distinta do Município, possuindo


personalidade jurídica própria, não podendo, em momento algum, ser
confundida com este ente público, consoante vem reconhecendo esse Juízo
especializado nas irretocáveis sentenças proferidas em casos semelhantes.

A referida empresa selecionava e encaminhava seus empregados para a


prestação de serviço profissional mediante as necessidades administrativas da
Administração Pública, sendo de sua inteira autonomia e responsabilidade a
prestação das orientações necessárias à consecução dos serviços, bem como, a
remuneração dos seus empregados, ou seja, os profissionais selecionados pela
reclamada COMPILLAR, recebiam orientações desta empresa e não da tomadora de
serviços, vez que inexistia a relação de subordinação.

De modo cristalino se manifesta incidência da Lei Federal nº 8666, de 21 de


junho de 1993, em seu art. 71, caput e § 1º, dirimindo todas as dúvidas acerca da
questão da ausência de responsabilidade subsidiária do Município em caso de
contratos de prestação de serviços via licitação, onde o contratado recruta, in casu,
empregados por sua conta, esta é dicção do comando legal, in verbis:

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“Art. 71 - O contratado é responsável pelos encargos


trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais
resultantes da execução do contrato.
§1º - A inadimplência do contratado com referência aos
encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à
Administração Pública a responsabilidade por seu
pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou
restringir a regularização e o uso das obras e edificações,
inclusive perante o registro de imóveis.” (grifo nosso).

Em igual sentido, pontifica o renomado doutrinador Profº Valentin


Carrion, em sua obra Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, 25ª edição,
2000, Saraiva, pág. 455, in verbis:

“Os órgãos da Administração Pública que contratam obras


ou serviços com terceiros não possuem responsabilidade
pelos encargos trabalhistas... (L.8666/93, arts.1º, 6º e 71).
(original sem o grifo)

Conseqüentemente, não pode o Município responder pelo pagamento


de quaisquer verbas rescisórias trabalhistas pelas quais não possui responsabilidade
legal, pois consoante as leis que regem a matéria, a sociedade empresária
COMPILLAR foi contratada através do devido procedimento licitatório, estando
excluída, portanto, por expressa previsão legal, a responsabilidade do
Município pelo pagamento das verbas requeridas nestes autos pelo
Reclamante, eis que o mesmo era, indubitavelmente, empregado da indigitada
EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS.

Pelo acima exposto, preliminarmente, requer o Município Reclamado


seja decretada a sua ilegitimidade para figurar no pólo passivo da presente

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demanda, ante a inexistência de relação jurídica com o Reclamante, muito


menos relação de cunho trabalhista.

1.2) – DA INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA EM RAZÃO DE EVENTUAL CONTRATO


TEMPORÁRIO COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Adite-se, POR CAUTELA, que o Município não tem em seus quadros


de pessoal qualquer empregado público regido pelo regime trabalhista.

Isso implica dizer que o Reclamante não pertence ao quadro funcional


do Município.

Eventual contrato diretamente feito pelo Município com o Reclamante


estaria regido pela disciplina administrativa do Regime Especial previsto pelo inciso
IX do art 37 da Constituição da República, cujas regras remetem à competência
de jurisdição da Justiça Comum Estadual.

Caso contrário, segundo a jurisprudência dominante, estaríamos diante


de um “contrato” nulo de pleno direito à vista do princípio insculpido no inciso II do
artigo 37 da CRFB/88, que nega incidência de qualquer direito resilitório trabalhista
ou estatutário àquele que se beneficiou dos recursos de pessoal da Administração
Pública em fraude a Lei.

2) - MÉRITO
2.1) DA CONTRATAÇÃO DO RÉU COM A 1ª RECLAMADA (COMPILLAR) –
FUNDAMENTOS

Extrai-se o seguinte dispositivo Constitucional:

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Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do


trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a
todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
observados os seguintes princípios:
(...)
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno
porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua
sede e administração no País

Em seguida, outra normativa da Constituição Federal:

Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os


Municípios dispensarão às microempresas e às empresas
de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento
jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela
simplificação de suas obrigações administrativas,
tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou
redução destas por meio de lei”.

Nota-se, portanto, que o procedimento licitatório para contratar


empresa de pequeno porte – EPP - pela Administração Pública é válida e estimulada
pela própria Constituição.

Ademais, vale ressaltar que a lei mencionada pelo art. 179 da Carta
Maior é a Lei Complementar nº 123/06, com suas modificações posteriores.

Assim, a Constituição Federal de 1988, em seus artigos 170 e 179, indica


a necessidade de uma política pública que assegure benefícios às pequenas
empresas, objetivando reduzir a desigualdade existente entre elas e as demais
empresas.

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As inovações contidas na legislação trouxeram mudanças


procedimentais de grande relevância, vindo a alterar o resultado final dos certames
licitatórios. Com o advento da Lei Complementar nº 123/06 foi seguida a
determinação constitucional, possibilitando, desta forma, facilidade no acesso aos
mercados das micro e pequenas empresas, no tocante às participações que as
mesmas poderão ter nos procedimentos licitatórios instaurados pela Administração
Pública.
Como se percebe, a Constituição Federal autorizou o tratamento
diferenciado para estimular as contratações das pequenas empresas com o poder
público e, neste sentido, diante da LC nº 123/06, vários procedimentos foram
alterados, referente aos trâmites licitatórios, para que tal estímulo pudesse, na
prática, se concretizar.

Neste sentido, a Lei 8.666/93, que regula as licitações públicas, sofreu


alterações necessárias, em especial, os artigos 3º, § 14; 5º-A; 33, inc. III.

O Município de Iguaba Grande, por esta via, não viola a via de


contratação com a empresa reclamada, quando esta passou por procedimento
licitatório, em cumprimento à determinação Constitucional e demais obrigações
legais.

Não se espera do Poder Público que lhe seja atribuído a total e


completa responsabilidade, como um garantidor universal, para toda e
qualquer contratação realizada com particulares, sejam pessoas físicas ou
jurídicas, após regular licitação.

O Ente Público Municipal não pode ser prejudicado, quando a própria


Constituição e leis que a regem atribuem estímulos à contratação com pequenas
sociedades empresárias. É contraditório a lei estimular a contratação de ME e

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EPP, e ao final, caso estas sociedades apresente irregularidades, que suporte


o ente federativo o ônus que não é de sua responsabilidade.

A falta de pagamentos trabalhistas, tributários, previdenciários e


de qualquer outra natureza e de responsabilidade da sociedade particular e
empresária não poderia ser transferida ao ente público municipal, por não ser
de sua gerência. Interferir em tais elementos é transformar o ente público em
gestor de negócios privados.

Portanto, a relação entre o Poder Público Executivo Municipal com


a 1ª Reclamada se encerra na licitação e cumprimento do objeto de
contratação. Demais elementos que não são objetos da prestação de serviço são
únicos e exclusivos da pequena empresa, como a falta de pagamento de seus
empregados.

2.2) DA NÃO VINCULAÇÃO ENTRE O MUNICÍPIO-RECLAMADO E O


RECLAMANTE

Como acima já afirmado, as pessoas físicas que possuem relação de direitos


e deveres com o Município devem estar enquadradas, em regra, como servidores
efetivos. Ou seja, aqueles submetidos à aprovação e nomeação após concurso
público.

Assim reza a Constituição Federal:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer


dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e,
também, ao seguinte:

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(…)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de
aprovação prévia em concurso público de provas ou de
provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade
do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas
as nomeações para cargo em comissão declarado em lei
de livre nomeação e exoneração;
(…)
V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por
servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em
comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira
nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei,
destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e
assessoramento;
(...)
IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo
determinado para atender a necessidade temporária de
excepcional interesse público;

Por óbvio, há possibilidade de nomeação para cargo em comissão.


Mas este, somente para servidor de carreira e, para funções de direção, chefia e
assessoramento. Como se percebe, não era a atividade do reclamante.

Da mesma maneira, não pode estar enquadrado o reclamante, na


hipótese de contratação para atender necessidade temporária de excepcional
interesse público, haja vista que a contratação do Município foi com a empresa 1ª
Reclamada mediante licitação. Não há, na hipótese, necessidade temporária, nem
excepcional interesse que afaste dos serviços corriqueiros necessários à
Administração.

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Repisa-se: o Reclamante não possui qualquer vínculo com o


Município-réu. A forma da prestação de serviço, os dias de trabalho, o valor do
salário e todas as demais formas de tratativas para execução da prestação do
serviço com o Ente Público eram realizados conforme os ditames da empresa
COMPILLAR, tendo esta a autonomia, o poder de hierarquia e disciplinar sobre
os seus empregados.

Ademais, cabe alertar que o próprio Reclamante esclarece que,


somente prestou serviços à COMPILLAR no contrato desta com o Município-réu,
entre 20 de maio a 08 de agosto de 2016.

Ora, se a rescisão contratual ocorreu em 07/11/2016, conforme


assevera o demandante, então já não existia qualquer vínculo possível entre o
Município de Iguaba Grande e o reclamante.

Se o Reclamante ainda labutava no mês de dezembro, quando


ocorreu a sua suposta dispensa, ou como requeira ao juízo, em novembro,
seja qual for o verdadeiro mês de rescisão, já não prestava serviço em
benefício do Município-réu.

Por fim, mas não menos importante, mesmo afirmando ter labutado em
Iguaba Grande entre 20 de maio a 08 agosto de 2016, não há prova nos autos que
em tais dias correspondentes aos meses alegados houve a efetiva prestação
de serviço.

Nota-se evidente, que o Município de Iguaba Grande não pode ser


condenado à qualquer valor a título indenizatório pleiteado pelo Reclamante.

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2.3) – DA INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA


ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.

Questão que sempre despertou polêmica refere-se à responsabilização


subsidiária das obrigações trabalhistas imputadas à Administração Pública nos
contratos de prestação de serviços. Parte da doutrina e jurisprudência firmaram o
entendimento de que, caso a empresa contratada não arcasse com as suas
obrigações, o ente público poderia ser responsabilizado subsidiariamente, desde que
figurasse no título executivo judicial. Aplicar-se-ia, portanto, o item IV do Enunciado
331 do TST, que dizia:

“IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte


do empregador, implica na responsabilidade subsidiária do
tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que
este tenha participado da relação processual e conste também
do título executivo judicial.”

A dúvida se fundava na aplicabilidade ou não deste item do Enunciado


aos entes da Administração Pública, em razão, especialmente, do disposto no artigo
71 da Lei nº 8.666/93. Todavia, a matéria ficou pacificada no Tribunal Superior do
Trabalho, por força da alteração promovida desde a Res. 96/2000, publicada no D.J.
de 18.09.2000. Confira-se:

“IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte


do empregador, implica na responsabilidade subsidiária do
tomador de serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive
quanto aos órgãos da administração direta, das
autarquias, das fundações públicas, das empresas
públicas e das sociedades de economia mista, desde que
hajam participado da relação processual e constem também do
título executivo.”

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Em que pese o notório saber jurídico dos integrantes daquela Egrégia


Corte, fato é que o entendimento firmado não parece se coadunar com o
ordenamento jurídico pátrio. Senão vejamos.

É preciso verificar, de início, a sistemática adotada pela Lei nº 8.666/93.


Confira-se o artigo 71, parágrafo primeiro, da Lei nº 8.666/93:

“Art. 71 – O contratado é responsável pelos encargos


trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais
resultantes da execução do contrato.

Parágrafo 1º - A inadimplência do contratado com


referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais
não transfere à Administração Pública a responsabilidade
por seu pagamento , nem poderá onerar o objeto do
contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e
edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.”

Trata-se de norma cujo comando é claro, não pairando sobre ela


qualquer polêmica a ensejar dúvida quanto à sua correta interpretação. O legislador
excluiu, de modo expresso, qualquer responsabilidade da Administração Pública no
que concerne à inadimplência do contratado com os seus encargos trabalhistas,
fiscais e comerciais, ainda que originados por força da execução do contrato
administrativo.

O que interessa ao ente público, quando celebra um contrato


administrativo, é a sua correta execução, ou seja, a prestação adequada de um
serviço, a entrega de um bem, ou a realização de uma obra. As obrigações e
encargos dos contratados são de sua única e exclusiva responsabilidade.

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Aliás, se assim não fosse, os entes públicos funcionariam como verdadeiros


seguradores de todo e qualquer encargo das empresas contratadas, o que
seria um evidente absurdo.

A doutrina é unânime sobre a matéria. Transcreva-se a posição de


MARÇAL JUSTEN FILHO, in Comentários à Lei de Licitações e Contratos
Administrativos, 5º ed. São Paulo: Dialética, 1998, p. 530 :

“Também fica expressamente ressalvada a inexistência de


responsabilidade da Administração Pública por encargos e
dívidas pessoais do contratante. A Administração Pública
não se transforma em devedora solidária ou subsidiária
perante os credores do contratante. Mesmo quando as
dívidas se originarem de operação necessária à execução
do contrato, o contratado permanecerá como único
devedor perante terceiros.

Qualquer litígio entre particular e terceiros resolve-se no


estrito âmbito entre eles, sem acarretar sacrifício da posse
da Administração Pública.” (grifo nosso)

Este, também, é o entendimento de JESSÉ TORRES PEREIRA


JÚNIOR, em sua obra Comentários à Lei das Licitações e Contratações da
Administração Pública. Rio de Janeiro: Renovar, 1994, p. 434:

“Em todas essas relações de direito público ou privado, a


contratada é a única e exclusiva titular dos correspectivos
encargos, que não se comunicam á Administração
contratante, antes, durante, ou depois da execução do
contrato.”

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Lembre-se, por oportuno, que quando o legislador objetivou


estabelecer de modo diverso, o fez expressamente, como por exemplo na hipótese
dos encargos previdenciários em que há uma responsabilidade solidária entre a
Administração Pública e o contratado, consoante dispõe o próprio art. 71, parágrafo
segundo, da Lei nº 8.666/93.

Portanto, o primeiro obstáculo a impedir a responsabilização


subsidiária dos entes públicos nas terceirizações encontra-se na regra prevista no
art. 71 do Estatuto das Licitações, cuja constitucionalidade é presumida, já que até o
presente momento se desconhece qualquer declaração do Poder Judiciário
inquinando a norma de inconstitucional.

O segundo obstáculo registrável é o princípio constitucional insculpido


no artigo 37, inciso II da CFRB/88, que não admite qualquer vínculo legal ou
empregatício com a Administração Pública sem a prévia aprovação em concurso
público1, negando aos infratores na regra maior direitos resilitórios concernentes de
situações fáticas irregulares.

Por conseguinte, não havendo vínculo legal ou contratual sustentável,


não há que se falar em responsabilidade subsidiária do Ente Público sobre verbas
que não está obrigado por lei a suportar.

Um argumento bastante utilizado para atribuir responsabilidade aos


entes públicos nestas hipóteses é o da sua eventual culpa “in eligendo” e “in
vigilando”. Ambas, não procedem.

A culpa “in eligendo” é facilmente afastada quando a contratação é


precedida de licitação, procedimento administrativo que visa selecionar a proposta

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Exceções na Própria Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

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mais vantajosa para a Administração Pública, observados os princípios da


competitividade e da impessoalidade. Ora, como imaginar que exista culpa na
escolha do contratado se, justamente, o que se pretende em um certame licitatório é
evitar contratações balizadas por critérios subjetivos e pessoais ?

Com efeito, se a licitação é séria – não se podendo partir de premissa


que não seja esta – a autoridade administrativa está jungida à contratação com o
primeiro colocado, sendo-lhe vedado celebrar contrato com preterição da ordem de
classificação (art. 50 da Lei 8.666/93).

A licitação é, em verdade, mera decorrência do princípio da


indisponibilidade do interesse público, cuja essência se traduz na impossibilidade
dos administradores disporem do interesse público a seu bel-prazer, não se podendo
cogitar de uma liberdade de atuação na escolha do contratado; daí o total
descabimento de eventual culpa “in eligendo” quando a contratação é precedida de
prévio procedimento licitatório.

A culpa “in vigilando”, ou seja, a atribuição de responsabilidade ao ente


público por não ter fiscalizado adequadamente as relações da contratada com os
seus empregados, mostra-se igualmente descabida.

Como se sabe, compete privativamente à União legislar sobre Direito


do Trabalho, na forma do disposto no art. 22, inciso I da Constituição Federal e
organizar, manter, executar a inspeção do trabalho, consoante dispõe o artigo 21,
inciso XXIV, da Carta Maior. E é através do Ministério do Trabalho e Emprego que
este ente político exercita o poder de polícia em matéria de fiscalização do
cumprimento das normas de proteção ao trabalho. Não podem, pois, Estados e
Municípios exercer poder de polícia em competências que não são as suas. Veja-se,

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a respeito, a lição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, em sua obra Curso


de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 11ª edição, p. 575:

“Como critério fundamental, procede o dizer-se que é


competente para dada medida de polícia administrativa
quem for competente para legislar sobre a matéria. Assim,
a União exercerá em caráter exclusivo polícia
administrativa sobre o que estiver arrolado no art. 22 da
Constituição e concorrentemente com Estados e Distrito
Federal sobre o que consta do art. 24.”

É, portanto, inconcebível obrigar órgãos e entidades públicas estaduais


e municipais a arcarem com um a atribuição que refoge aos limites de sua
competência, em evidente violação ao princípio da legalidade previsto no art. 37,
caput da Constituição Federal, já que, ao exercerem poder de polícia que não se
insere no seu campo de atuação, estarão agindo sem qualquer respaldo legal.

Como se não bastasse o acima dito, forçoso lembrar que o contratado


tem a obrigação de manter durante toda a execução o contrato as condições de
habilitação e qualificação exigidas na licitação (artigo 55, XIII, da Lei nº 8666/93) o
que cria um correlato dever para os entes públicos em fiscalizar a manutenção
destas condições ao longo da execuções do contrato. E, dentre os requisitos de
habilitação, não consta qualquer exigência relativa a comprovação de adimplemento
das obrigações trabalhistas, salvo a prova de regularidade com o Fundo de Garantia
por Tempo de Serviço (FGTS) e a prova de cumprimento do art. 7º, inciso XXXIII da
CF, que trata da “proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de
dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de
aprendiz, a partir de quatorze anos.”

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Ora, se para participar de uma licitação e estar apto a contratar com


um ente público não há qualquer exigência em relação aos encargos trabalhistas
(salvo os mencionados), como exigir que durante a execução do contrato a
Administração Pública fiscalize estes encargos para se eximir de uma
responsabilidade, ainda que subsidiária? A obrigação de fiscalizar a manutenção
dos requisitos de habilitação não alcança os encargos trabalhistas, já que eles
sequer são exigidos como condição para participação nos certames, o que
impede qualquer atribuição de culpa “in vigilando”.

Portanto, o dever da Administração Pública de fiscalizar os encargos


trabalhistas do contrato não decorre de nenhuma norma constitucional ou legal e
muito menos de obrigação oriunda do contrato; daí o descabimento de atribuição de
culpa “in vigilando”.

Ademais, esta responsabilização subsidiária dos entes públicos viola,


também, o princípio da razoabilidade, pois obriga o tomador de serviços a assumir
o comportamento do verdadeiro empregador, com os encargos conseqüentes, o que
a terceirização visa, justamente, evitar.

A terceirização é conceituada como a transferência de certas atividades


para terceiros visando reduzir custos, possibilitando que as empresas direcionem
seus esforços para sua atividade fim. Ora, ao se exigir que o ente público atue como
se empregador fosse, organizando pessoal e estrutura própria para fiscalizar os
encargos trabalhistas dos empregados do contratado, cria-se para o tomador de
serviço uma excessiva onerosidade, o que, além de desnaturar a essência da
terceirização, pode simplesmente inviabilizá-la.

Não se pode perder de vista que a essência da terceirização é a


atividade, o serviço a ser prestado e não a pessoa física; tanto por isto que ela se

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formaliza, via de regra, através de contrato administrativo precedido de licitação e


não de preenchimento de cargo precedido de concurso público.

Um outro aspecto do tema foi enfocado pelo ilustre Procurador do


Estado do Rio de Janeiro Dr. Victor Farjalla, em recente palestra proferida na
Procuradoria-Geral do Estado do Rio de Janeiro, manifestando-se igualmente
contrário ao posicionamento firmado pelo Tribunal Superior do Trabalho. Aduziu, com
habitual clareza, que, quando o contratado oferece o seu preço no certame, já
estão embutidos todos os encargos trabalhistas dos empregados envolvidos
na execução do contrato, de sorte que, se o ente contratante for condenado
subsidiariamente, será obrigado a pagar duas vezes, em evidente afronta à
noção mais elementar de justiça. Entende, ainda, que o Direito do Trabalho não
pode ser interpretado de modo tão dissonante do restante do ordenamento jurídico,
desconsiderando simplesmente a existência de outras normas jurídicas, como é o
caso do artigo 71 da Lei nº 8666/93.

Por outro lado, de toda sorte, ainda que haja eventual desvirtuamento
culposo ou intencional do contrato, acarretando prejuízo nos interesses e na
aplicação dos direitos daqueles envolvidos na prestação do serviço com a empresa
contratada, descabe a punição indiscriminada da Fazenda Pública contratante,
restando a responsabilização e punição pessoal daqueles que deram causa ao
ilícito, através dos remédios próprios da legislação vigente.

Noutro giro, importante alertar que, na análise da Súmula 331 do TST,


necessário que haja a prova da “culpa in eligendo” e/ou “in vigilando” durante a
execução do contrato, para que haja a responsabilidade subsidiária da
Administração Pública.

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O mero inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do


empregador não gera responsabilidade subsidiária automática do integrante
da Administração Pública, tomador dos serviços

Assim se extrai o próprio entendimento do Tribunal Superior do


Trabalho – TST. Como exemplo, ementa do julgado prolatado em recurso de
revista, Acórdão da 6ª Turma, min. Relatora Kátia Magalhães Arruda, publicado
08/03/2013:

“RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE


SUBSIDIÁRIA. DECISÃO RECORRIDA NA QUAL A MATÉRIA
FOI EXAMINADA EM TESE, SEM O REGISTRO DAS
PREMISSAS FÁTICO-PROBATÓRIAS CONCERNENTES ÀS
CULPAS IN ELIGENDO E IN VIGILANDO. 1 – O Pleno do
STF, ao declarar a constitucionalidade do art. 71 da Lei nº
8.666/93, somente vedou a transferência consequente e
automática, fundada no mero inadimplemento, da
responsabilidade da empresa prestadora de serviços para o
ente público tomador de serviços, ressalvando que "isso não
impedirá que a Justiça do Trabalho recorra a outros princípios
constitucionais e, invocando fatos da causa, reconheça a
responsabilidade da Administração, não pela mera
inadimplência, mas por outros fatos".
2 - Em consonância com a jurisprudência do STF, o Pleno do
TST deu nova redação à Súmula nº 331 do TST: "IV - O
inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do
empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador
dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja
participado da relação processual e conste também do título
executivo judicial.

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V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e


indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas
condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta
culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666,
de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento
das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço
como empregadora. A aludida responsabilidade não
decorre de mero inadimplemento das obrigações
trabalhistas assumidas pela empresa regularmente
contratada".
3 – No caso dos autos, o TRT de origem examinou a matéria
em tese, sem, contudo, registrar no acórdão recorrido se
houve ou não a culpa in eligendo e/ou a culpa in vigilando,
premissas fático-probatórias indispensáveis para decidir a
controvérsia nesta Corte Superior. Nesse contexto,
ressalvando entendimento pessoal, curvo-me à conclusão
da Sexta Turma, determinando o retorno dos autos à Corte
de origem para que prossiga no exame da matéria com
base no conjunto fático-probatório relativo à culpa in
eligendo e/ou à culpa in vigilando. 4 – Recurso de revista a
que se dá provimento parcial para determinar o retorno dos
autos ao TRT de origem.”

Como se percebe, somente haveria de cogitar responsabilidade


subsidiária deste Município-réu, caso constatasse, no conjunto fático-
probatório, que houve alguma irregularidade na licitação, com consequente
culpa in vigilando e/ou in eligendo.

Não se trata pois, o caso. O Reclamante percorre o judiciário apenas


para receber as devidas verbas rescisórias, tratando-se, portanto, de mero

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inadimplemento das obrigações trabalhistas, o que deve ser afastado o


entendimento da responsabilidade subsidiária, assim como determina o TST.

Não há linha sequer na ação reclamatória, sobre irregularidades do


certame licitatório e/ou situações outras que correspondam à má gerência ou
inexecução do contrato, objeto da licitação. Assim, conforme o TST, sob a análise da
súmula 331, a responsabilidade do ente público deve ser afastada, pois se trata, o
caso em comento, de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte da
empresa contratada pelo Município.

3 - DO ÔNUS DA PROVA

Dispõe o art. 818 da CLT que a prova das alegações incumbe à parte
que as fizer. Nesse sentido, as alegações por ora apresentadas pela Reclamante
estão despidas de qualquer conjunto probatório.

Por tais razões, mais uma vez, devem ser indeferidas as pretensões da
Reclamante.

Urge salientar que a Administração Municipal não dispõe de


documentação inerente à prestação de serviço do Reclamante, Sr.ANDERSON DA
CONCEIÇÃO FONSECA, tendo em vista que todo o controle era realizado pela
prestadora de serviços, a empresa COMPILLAR ENTRETENIMENTO.

4 – DO PRECEDENTE FAVORÁVEL AO MUNICÍPIO-RECLAMADO

Nos termos de julgamento pretérito e da lavra do Exmo. Juiz do


trabalho da 1º Vara do Trabalho de São Gonçalo, a Sentença refutou as alegações
do reclamante e que figurava como partes a COMPILLAR ENTRETENIMENTO

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PRESTADORA DE SERVIÇOS EIRELI-EPP; o MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO e;


o MUNICÍPIO DE IGUABA GRANDE, em conformidade com as exposições acima
aduzidas.

Em elogiáveis linhas, assim decidiu aquele magistrado, nos autos da


Reclamação Trabalhista – Rito Ordinário nº 0100863-12.2017.5.01.0262:

“(...) DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIARIA DOS 2º E 3º


RÉUS

Os reclamados negaram o pedido de responsabilidade


subsidiária, amparados na inexistência de culpa com relação à
contratação da 1ª reclamada para a realização dos serviços de
iluminação púbica dos Municípios. Invocaram o art. 71 da Lei
8.666/93 e a decisão proferida pelo STF nos autos da ADC
16, no sentido que não basta o mero inadimplemento da
contratada para a configuração da responsabilidade
subsidiária do ente público, sendo necessária também a
constatação de culpa deste na fiscalização do contrato.

Recentemente o Plenário do STF, em sede de Repercussão


Geral nos autos do RE 760.931, com o voto do ministro
Alexandre de Moraes, confirmou o entendimento adotado na
ADC 16, que veda a responsabilização automática da
administração pública, só cabendo sua condenação se
houver prova inequívoca de sua conduta omissiva ou
comissiva na fiscalização dos contratos.

No caso dos autos, além de não haver prova inequívoca


quanto à inexistência de fiscalização do contrato por parte
dos Municípios, a parte autora sequer alegou tal hipótese
em sua narrativa, atendo-se a requer a responsabilização
apenas com amparo na Súm. 331, C.TST.

Assim, inexistindo prova inequívoca quanto a ausência de


fiscalização do contrato pelos 2º e 3º reclamados, entendo
por improcedente o pedido de responsabilidade
subsidiária destes.

Rejeito o pedido.” (destaque nosso)

E assim, arremata:

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“(...) Ante o exposto, na reclamação trabalhista ajuizada por


DIEGO DA SILVA NUNES MATOS em face de COMPILLAR
ENTRETENIMENTO PRESTADORA DE SERVICO EIRELI -
EPP, MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO e MUNICÍPIO DE
IGUABA GRANDE, cuja fundamentação acima compõe o
presente dispositivo, decido:

Rejeitar as preliminares de incompetência absoluta e


ilegitimidade passiva dos 2º e 3º reclamados;

No mérito, declarar a confissão ficta da 1ª ré, e julgar


improcedente os pedidos em face dos 2º e 3º reclamados, e
parcialmente procedentes, em face da 1ª ré, (...)” (destaque
nosso).

4 – DA CONCLUSÃO

Por todo o exposto, além da impugnação específica aos pedidos


autorais acima discriminados, requer a V. Exa.:

a) a extinção do processo, sem resolução do mérito, em relação ao Reclamado


Município de Iguaba Grande, em razão de sua flagrante ilegitimidade passiva ad
causam;
b) na hipótese de eventual contrato temporário do Reclamante com o Município de
Iguaba Grande, seja reconhecida a incompetência absoluta desse MM. Juízo para
o julgamento da presente contenda;
c) No mérito, sejam julgados IMPROCEDENTES todos os pedidos formulados pelo
Reclamante, por tratar-se de medida de lídima Justiça.

Protesta pela produção de prova documental, testemunhal, bem como


depoimento pessoal da Reclamante, sob pena de confissão.

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Termos em que
Pede deferimento.
São Gonçalo, 19 de janeiro de 2018.

Anderson Luís da Costa Nascimento


Procurador do Município

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