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Instituto Brasileiro de Ciências Criminais

§ 2º. Considera-se criminoso habitual quem: otro nombre, separado del concepto de reincidencia. Es una fórmula legal
a) reincide pela segunda vez na prática de crime doloso da mesma natureza, que ya permite ‘ marcar’ a una persona como delincuente. Si la reincidencia
em período de tempo não superior a cinco anos, descontado o que se refere a responde a la idea de una classificación entre disciplinados e indisciplinados,
cumprimento de pena; que a veces pasa por el requisito previo de la reincidencia y, en otras, ni siquiera
se lo requiere, porque su ‘ pésima’ condición se revela con la simple pluralidad
b) embora sem condenação anterior, comete sucessivamente, em período de tempo
delictiva.” (Instituto Interamericano de Derechos Humanos. Sistemas penales
não superior a cinco anos, quatro ou mais crimes da mesma natureza e demonstra,
y derechos humanos en América Latina (informe final). Zaffaroni, Eugenio
pelas suas condições de vida e pelas circunstâncias dos fatos apreciados em
Raul (coord.). Documento final del programa de investigación desarrolado por
conjunto, acentuada inclinação para o crime. el Instituto Interamericano de derechos humanos (1982-1986). Buenos Aires:
§ 3º. Considera-se criminoso por tendência quem, pela sua periculosidade, motivos Depalma, 1986. p. 90).
determinantes e meios ou modo de execução do crime, revela extraordinária (10) Hassemer, Winfried; Muñoz Conde, Francisco. Introducción a la criminologia.
torpeza, perversão ou malvadez. Valencia: Tirant lo blanch libros. 2001.
(6) “Em se tratando de criminoso habitual ou por tendência, a pena a ser imposta (11) Baratta, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal: introdução à
será por tempo indeterminado. O juiz fixará a pena correspondente à nova sociologia do direito penal. Trad. Juarez Cirino dos Santos. Rio de Janeiro: Freitas
infração penal, que constituirá a duração mínima da pena privativa da liberdade, Bastos, 1999.
não podendo ser, em caso algum, inferior a três ano.” (art. 78)
(7) Zaffaroni, Eugenio Raúl. Reincidencia: un concepto de derecho penal autoritario.
In: Derechos Fundamentales y Justicia Penal. San José da Costa Rica: Juricentro,
1992. p. 41.
Leonardo Isaac Yarochewsky
(8) Beccaria, Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução: Lucia Guidicini e Alessandro
Doutor em Ciências Penais pela UFMG.
Berti Contessa. São Paulo: Martins Fontes, 1997. p. 62. Membro do IDDD e do IAB. Advogado.
(9) “Se trata de tentativas de elaborar un concepto de ‘ habitualidade’, con ese o leonardo@yarochewsky.com.br

Organização criminosa sem crime?


Observações críticas sobre a proposta de
reforma pelo Projeto de Lei Anticrime
Beatriz Corrêa Camargo e Renato de Mello Jorge Silveira
1 Proposta de reforma no conceito das organizações criminosas infração concreta.(4) Apesar dessa antecipação da punição ao estágio
(Art. 1°, § 1°, da Lei 12.850/2013) delitivo prévio, as penas atribuídas à participação nas organizações
Em matéria de política legislativa, a pergunta sobre o “porquê” são bastante elevadas.(5) No caso brasileiro, a conduta de integrar
12 costuma orientar as discussões sobre a pertinência das propostas organização criminosa é punida com pena de 3 a 8 anos de prisão.(6)
de mudança. Quanto ao Anteprojeto de Lei apelidado “Pacote Por diversas razões, os chamados “delitos de organização”
Anticrime”, sugerimos uma breve análise que parta, ao invés suscitam dúvidas quanto às exigências de um Direito Penal
disso, da pergunta “para quê?”, a fim de tentar elucidar se haveria democrático. Dado à diversificação do fenômeno do crime
algum ganho, de natureza penal, com a reforma do conceito de organizado, tais delitos representam um desafio ao princípio da
organizações criminosas previsto na Lei 12.850/2013, nos moldes legalidade penal no que se refere à descrição da conduta punível.
que acabam de ser propostos. Por isso é que as definições de organizações criminosas muitas vezes
A Lei 12.850/2013 define a organização criminosa como uma são dotadas de uma certa artificialidade, como se faz, por exemplo,
associação de quatro ou mais pessoas, estruturalmente ordenada, e em relação à fixação de um número mínimo de integrantes.
caracterizada pela divisão de tarefas. De modo semelhante ao crime O Anteprojeto elaborado pelo Ministério da Justiça objetiva
de associação criminosa, o conceito de organização criminosa é ampliar esse conceito, deixando de considerar necessária a finalidade
caracterizado, ainda, pela finalidade delitiva desse agrupamento, de prática de crimes graves ao incluir a hipótese de agrupamentos
considerado ilícito, nos termos da lei, porque atua com objetivo de que, in verbis: “se valham da violência ou da força de intimidação
obter vantagens mediante a prática de infrações penais cujas penas do vínculo associativo para adquirir, de modo direto ou indireto, o
máximas sejam superiores a quatro anos, ou que sejam de caráter controle sobre a atividade criminal ou sobre a atividade econômica,
transnacional.(1) como o Primeiro Comando da Capital, Comando Vermelho, Família
Essa definição corresponde aos parâmetros estabelecidos do Norte, Terceiro Comando Puro, Amigo dos Amigos, Milícias, ou
internacionalmente pela Convenção das Nações Unidas contra o outras associações como localmente denominadas”.
Crime Organizado Transnacional.(2) Sua adoção pelo legislador É com essa proposta de ampliação que iremos nos ocupar nas
brasileiro foi endossada por anos de discussão entre doutrina e próximas linhas. Problema igualmente grave, mas contornável com
jurisprudência em torno da necessidade ou não de uma tipificação a boa vontade do legislador, ou do próprio intérprete, em situação
mais complexa do fenômeno do que aquela oferecida pela redação menos ideal, é a redação do texto que desmembra em diversos
do antigo crime de quadrilha ou bando, do Código Penal.(3) incisos o atual § 1° do art. 1° da Lei 12.850/2013. Isso porque
A lógica por trás dos delitos de organização é punir atos que são referida técnica dissocia o caráter transnacional dos crimes (“cujas
conceitualmente anteriores à preparação ou à participação em uma penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de

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caráter transnacional”), para estabelecer em inciso separado, que a criminosa para fins de investigação processual, apesar de haver um
própria organização seja de caráter transnacional. Com isso, a nova tipo penal próprio para elas no art. 288-A, CP. Entretanto, fazer essa
redação retiraria, também aqui, a necessidade de que a organização indicação por meio da tipificação penal proposta não parece ser a
seja voltada à prática de crimes graves. Segundo o Projeto de Lei, a solução mais adequada, como elucidaremos adiante.
redação final do dispositivo seria a seguinte: Menos óbvias são as consequências de uma abertura do conceito
“Art.1o.......................................................... típico para outras medidas sugeridas pelo Anteprojeto, de natureza
§ 1o Considera-se organização criminosa a associação de 4 processual penal e de execução da pena. Dentre essas medidas,
(quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada encontram-se os impedimentos para a progressão de regime, para
pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, e que: a concessão do livramento condicional ou mesmo para aplicação
de benefícios prisionais para o condenado por organização que
I - tenham objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem
mantiver o vínculo associativo (art. 2°, § 9°, Lei 12.850/2013).
de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas
Ademais, são previstas mudanças no Código Penal para facilitar
penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos;
o perdimento do produto do crime (art. 91-A, § 1°, CP), além das
II - sejam de caráter transnacional; ou medidas para impedir a soltura do preso provisório vinculado a
III - se valham da violência ou da força de intimidação do vínculo organização criminosa (art. 310, § 2°, CPP). Tudo leva a crer que
associativo para adquirir, de modo direto ou indireto, o controle tais institutos encontrem uma aplicação ainda mais ampla caso se
sobre a atividade criminal ou sobre a atividade econômica, como leve adiante um conceito tão obscuro de organização criminosa, no
o Primeiro Comando da Capital, Comando Vermelho, Família do qual a finalidade delitiva deixa de ser um elemento constitutivo do
Norte, Terceiro Comando Puro, Amigo dos Amigos, Milícias, ou crime em questão.
outras associações como localmente denominadas.”
4 Perdas com a reforma: ausência de bem jurídico, punição pelo
2 Algum ganho quanto à tipificação da conduta? simples versar em coisa ilícita, ampliação injustificada da viola-
A nomeação de facções criminosas pelo texto do Anteprojeto, ção da intimidade para fins de investigação
a título de “exemplificação”, é bastante sintomática de problemas Em contrapartida, as propostas de reforma trazidas pelo
de ordem dogmática envolvendo a proposta. De um lado, ela Anteprojeto apresentam resultados bastante negativos, desde
demonstra por si só a dificuldade de transformar em abstração perspectiva de interpretação e aplicação das normas penais
o que se pretende exatamente com essa reforma. De outro, gera existentes. O mais imediato é a criação de um conflito de normas
estranheza não apenas pelo estilo de redação, mas, principalmente, no que se refere ao crime de integrar milícia privada. Nessa
porque sugere que grupos como o PCC ou o Comando Vermelho hipótese, uma criminalização a título de “organização criminosa”
não poderiam ser enquadrados na legislação já existente. Com na Lei 12.850/2013 derrogaria o art. 288-A, CP, punido com pena
efeito, o modo de atuação dos grupos mencionados já corresponde mínima de 4 anos, mais alta que os 3 anos estabelecidos pelo art. 2°
à definição do art. 1°, § 1° da Lei 12.850/2013 atualmente em vigor: caput da Lei 12.850/2013. Logo, mais adequado que uma abertura
são associações estruturalmente ordenadas, com divisão de tarefas, conceitual nesse caso seria um dispositivo na lei esclarecendo
criadas para a obtenção de vantagens (econômicas, manutenção de que as organizações tipificadas no art. 288-A do CP contam como 13
poder, etc.) mediante a prática de crimes. organização criminosa para fins processuais de investigação e
Portanto, para o propósito de punição desses grupos, assim como execução da pena.
das milícias mencionadas, se mostra completamente desnecessária Há outros efeitos deletérios, menos visíveis de imediato,
qualquer mudança legislativa no conceito de organização criminosa. caso venha a ser acolhida uma nova redação para o conceito de
Haveria, então, ganhos de natureza indireta, relacionados a organização criminosa.
outros âmbitos do sistema penal, que não exclusivamente o da Isso porque, se existe absoluto consenso quanto ao caráter
tipificação de condutas? criminoso de organizações como o PCC, por outro lado, a proposta do
Ministério da Justiça modifica o conceito de organização criminosa
3 Outros ganhos possíveis? de tal modo que desfigura qualquer concepção de ilícito material
Na literatura científica, parte do diagnóstico sobre as possivelmente relacionado a essa tipificação. Assim, na medida
transformações operadas pela criminalização dos delitos em que a proposta retira da definição de organização criminosa a
organizativos no Direito Penal consiste em compreender tais delitos exigência de que a estruturação do grupo seja voltada à prática de
como expressão de demandas de caráter repressivo e investigativo. crimes, a norma deixa de ter por objeto uma lesão de direitos alheios
Dessa forma, se, de um lado, o crime de integrar associação ou minimamente reconhecível no contexto dado. Afinal de contas, qual
organização criminosa cumpre muitas vezes a função pouco perigo (abstrato) de lesão estaria exatamente envolvido no fato de
democrática de suprir a dificuldade de constituição de provas na se pertencer a um grupo que se vale da “força de intimidação” do
delimitação individualizada dos crimes praticados,(7) de outro vínculo associativo para adquirir o controle sobre uma atividade
lado, sem desconsiderar os riscos de excessos em investigações econômica? A descrição é tão difusa que dá a impressão de tratar de
desvirtuadas, a categoria dos crimes associativos abre caminhos que um crime contra a ordem econômica. Constitui, nesse sentido, mais
em grande medida se mostram necessários para algumas atividades uma janela para expandir a criminalização da atividade empresarial
de investigação, as quais, de outra maneira, não seriam viáveis no e político-partidária.
âmbito processual penal.(8) Dessa forma, ao excluir do conceito de organização criminosa a
Nesse sentido, não parece de todo mal deixar de modo expresso finalidade associativa voltada à prática de crimes de maior relevo,
na lei que as milícias privadas também contam como organização o Anteprojeto não apenas vai na contramão de tudo aquilo que a

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doutrina sempre ponderou como razões legítimas de criminalização Renato de Mello Jorge. Organização e associação criminosa nos crimes
econômicos: realidade típica ou contradição em termos? In: Oliveira, Willian
em tais casos,(9) como ainda se distancia de toda a rede normativa et al. (org.). Direito penal econômico: estudos em homenagem aos 75 anos
internacional voltada ao combate do crime organizado.(10) do Professor Klaus Tiedemann. São Paulo: Liber Ars, 2013. p. 166-169; com
maior ênfase na discussão jurisprudencial, Estelitta, Heloisa. Criminalidade
Parece-nos que é exatamente essa ausência de um injusto de empresa, quadrilha e organização criminosa. Porto Alegre: Livraria do
reconhecível que oferece o principal problema da proposta de Advogado, 2009. p. 50-59. Cf., ainda, Pitombo, Antônio Sérgio Altieri de
reforma, já que termina por favorecer a punição por qualquer Moraes, Organização criminosa – nova perspectiva do tipo legal. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009. p. 106-108.
espécie de vínculo a esses agrupamentos. Pior do que isso: não
(4) Independentemente de qualquer discussão sobre o bem jurídico protegido,
apenas um vínculo remoto em relação às organizações citadas no o crime de organização criminosa integra o Direito Penal de caráter
Anteprojeto, mas também em relação a quaisquer associações que supraindividual, e neste tocante, está sujeito ao processo de justificação que
simplesmente se situam à margem da legalidade. exigem as intervenções dessa natureza. A esse respeito, SILVEIRA, Renato de
Mello Jorge. Direito penal supraindividual: interesses difusos. São Paulo: RT,
Generalizações dessa natureza devem ser vistas com reservas. 2003. p. 167-173.
(5) Cancio Meliá, Manuel. El injusto de los delitos de organización: peligro y
Como é sabido, o domínio das chamadas “facções criminosas”
significado. RGDP, n. 8, p. 1, 2007.
nos presídios brasileiros (como nas favelas) desempenha forte (6) Art. 2°, Lei 12.850/2013.
papel político na distribuição do poder entre os líderes desses (7) O que se aplica, no Brasil, particularmente para a realidade empresarial.
grupos, nesse microcosmo. Para a grande maioria dos presos, Críticas a esse respeito, em Silveira, Renato de Mello Jorge. Organização e
integrar alguma facção não é uma escolha, é uma imposição e uma associação criminosa nos crimes econômicos: realidade típica ou contradição
em termos? In: Oliveira, Willian et al. (org.). Direito penal econômico: estudos
questão de sobrevivência.(11) Nessas condições específicas, o que se em homenagem aos 75 anos do Professor Klaus Tiedemann. São Paulo: Liber
apresenta é antes uma hipótese de exclusão da culpabilidade que Ars, 2013. p. 171 e s. Anteriormente, negando a configuração da organização
deveria isentar o sujeito de responsabilidade penal em razão da criminosa em qualquer hipótese do contexto empresarial, Estelitta, op. cit., p.
29 e ss.
coação sofrida em um espaço de ausência de liberdade. Ao invés
(8) Cancio Meliá, op. cit., p. 6. Como observa Badaró, Gustavo Henrique Righi
disso, o anteprojeto apresenta uma uniformização de tratamento Ivahy. Hipóteses que autorizam o emprego de meios excepcionais de obtenção
que aproxima a Lei 12.850/2013 de uma responsabilização penal de prova. In: Crime organizado: análise da lei 12.850/2013. Ambos, Kai;
Romero, Eneas. São Paulo: Marcial Pons, 2017. p. 17 e s. a Lei 12.850 de 2013
objetiva, sem considerar o contexto individual de relação do sujeito
não fugiu a esse padrão.
com as organizações em questão. (9) A esse respeito, vide Cancio Meliá, op. cit., p. 9-10; Estellita, Heloisa; Greco,
Em outras palavras: “integrar” uma organização criminosa Luís. Empresa, quadrilha (art. 288 do CP) e organização criminosa. Uma análise
sob a luz do bem jurídico tutelado. Revista Brasileira de Ciências Criminais, v.
requer uma conduta ativa dentro de uma rede estruturada a um fim 19, n. 91, p. 398-400, jul./ago. 2011.
específico, e não apenas uma adesão de caráter político a um grupo (10) Nesse sentido, os documentos internacionais se servem de conceitos e
gerido por outras pessoas.(12) Além disso, a menos que se deseje definições muito mais claros e precisos. Sobre isso, veja-se, além da Convenção
viver em um Estado em que a liberdade de associação não tenha de Palermo, outros exemplos advindos de normativas europeias citados por
Zuñiga Rodríguez, Laura. Criminalidad organizada, derecho penal y sociedad:
maior sentido, não basta a existência de uma associação com um apuntes para el análisis. In: Sanz Mulas, Nieves. El desafío de la criminalidad
nome qualquer para se ter uma organização criminosa em cuja organizada. Granada: Comares, 2006. p. 49-51; Estellita, Heloisa; Greco,
simples participação se mereça uma pena mínima de 3 anos. Luís. Empresa, quadrilha (art. 288 do CP)..., p. 395.
(11) Como esclarece Dias, cada facção tem um sistema de funcionamento próprio,
14 Uma abertura do conceito de organização criminosa para com graus diversos de pertencimento. Nesse sentido, a “adesão” à facção
toda e qualquer forma de agremiação é ainda questionável desde pode possuir significados distintos, não necessariamente implicando ações
e estratégias coordenadas, o que suscita dúvidas sobre até que ponto se trata
a perspectiva das implicações geradas quanto aos mecanismos
realmente de uma organização, ou se haveria simplesmente uma identificação
investigativos previstos na Lei 12.850/2013, já que acaba diminuindo para fins de demarcação da atividade do tráfico de drogas. A respeito, cf.
as exigências legais para o emprego de medidas que são altamente Dias, Camila Caldeira Nunes. PCC – Hegemonia nas prisões e monopólio da
violência. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 324.
invasivas à privacidade e à intimidade dos investigados. Essa
(12) Sobre os requisitos para a conduta típica de “pertencer” a um grupo criminoso
preocupação não se limita ao problema do tráfico de drogas, mas organizado, Cancio Meliá, Manuel. El delito de pertenencia a una organización
se estende igualmente para o âmbito do Direito Penal econômico. terrorista en el código penal español. Revista de Estudios de la Justicia, n. 12, p.
158 e ss., 2010.
Que essa verdadeira “incriminação automática”, pelo mero
(13) Um breve estudo sobre a transformação das instituições brasileiras diante
versar em coisa ilícita, pouco contribui para diminuir a deletéria do propósito de lidar com a criminalidade organizada transnacional pode ser
atuação das organizações criminosas no Brasil é fato que se pode encontrado em Machado, Maíra Rocha. As novas estratégias de intervenção
inferir não apenas da limitação inerente ao sistema punitivo de sobre crimes transnacionais e o sistema de justiça criminal brasileiro. In:
Slakmon, Catherine; Machado, Maíra; Bottini, Pierpaolo (org.). Novas direções
resolver problemas de origem estrutural dentro de uma sociedade. na governança da justiça e da segurança. Brasília: Ministério da Justiça, 2006.
Em realidade, o cerne da discussão científica internacional em torno p. 277 e ss.
do problema da criminalidade organizada se dá não no plano da
tipificação delitiva, mas sim, do aperfeiçoamento do aparato de Beatriz Corrêa Camargo
investigação, bem como da cooperação internacional, para lidar Professora de Direito Penal da Universidade Federal de
com redes transnacionais de crimes que ultrapassam fronteiras e Uberlândia. Pós-doutora e mestra em Direito Penal pela
exigem respostas intersetoriais(13).
Universidade de Bonn. Doutora em Direito Penal pela USP.
beatrizcamargo@ufu.br
Notas
(1) Art. 1°, §1° da Lei 12.850/2013.
(2) Art. 2°, a, da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Renato de Mello Jorge Silveira
Transnacional, incorporada pelo Decreto 5.015, de 12 de março de 2004.
Professor Titular de Direito Penal da USP. Pós-doutor pela
(3) Trata-se do atual art. 288-A do Código Penal. Uma descrição detalhada da
evolução doutrinária e legislativa a respeito do crime de associação criminosa,
Universitat Pompeu Fabra, Barcelona. Advogado.
bem como da tipificação da organização criminosa, encontra-se em Silveira, rmjs@usp.br

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