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Complementação Pedagógica
Coordenação Pedagógica – IBRA

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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO DO CURSO

UNIDADE I

DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM

 Que é aprendizagem

 Problema de avaliação

 Distúrbios de aprendizagem – uma definição

 Fases da aprendizagem

 Atenção e aprendizagem

 Aspectos diferentes da atenção

 Atenção seletiva

 Dificuldades de atenção e aprendizagem

 Medidas de atenção

 Distúrbios de aprendizagem considerados como atraso no desenvolvimento da


Atenção seletiva

UNIDADE II

PRINCIPAIS CAUSAS DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E DE


AJUSTAMENTO ESCOLAR

 Distúrbios neurológicos e outras causas responsáveis por problemas de

leitura e escrita e aprendizagem geral

 O processo de aquisição de linguagem

 Distúrbios essencialmente neurológicos de aprendizagem

 Retardamento mental

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 Lesão cerebral

 Ausências ou disritmias

 Disfunção cerebral mínima, genética ou congênita

 Características da criança com disfunção cerebral mínima

 Outras dificuldades associadas à DCM

 Deficiências de aprendizagem apresentadas por crianças com DCM

 Dislexia

 Distúrbios da motricidade

 Transtornos na psicomotricidade

 Atraso de maturação

 Hiperatividade

 Esquema corporal . percepção

 Coordenação visomotora

 Percepção figura-fundo

 Percepção da constância

 Percepção da posição no espaço

 Percepção das relações espaciais

 Orientação e estruturação do espaço e tempo

 Organização temporal

 Outras causas das dificuldades de linguagem

UNIDADE III – Página 83 a120

TRANSTORNOS DE LINGUAGEM

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 Transtornos da Linguagem oral e escrita

 Diagnósticos

 Estratégias de Intervenção

UNIDADE IV

DISTÚRBIOS EMOCIONAIS COMO PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM

 Comportamentos perturbados

 Autismo infantil precoce

 Fracasso escolar

 Dificuldades de aprendizagem

 Distúrbios de aprendizagem

 Subnormalidade mental

 Distúrbios psicofisiológicos ou psicossomáticos

 Os transtornos do aparelho digestivo

 A obesidade

 A recusa do alimento

 Enurese e encoprese

 Os tiques

 Masturbação em público

 Os comportamentos excessivos (para mais ou para menos)

 Os comportamentos agressivos

 Os comportamentos retraídos

 Ansiedade

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 Comportamentos perturbados (medos e fobias)

 Comportamentos psicóticos

 Causas intelectuais dos principais problemas de aprendizagem e

 Ajustamento escolar

 A inteligência

 Origens dos problemas mentais dos subdotados.

- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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APRESENTAÇÃO

O Curso “Distúrbios de aprendizagem” foi elaborado com a

intenção de alertar professores para os múltiplos fatores que


interferem no processo de ensino-aprendizagem, prejudicando-o
gravemente.

Geralmente apenas os problemas de leitura, escrita e


matemática são considerados distúrbios de aprendizagem. Entretanto,
como veremos, há muitos outros a considerar.

Os educadores têm consciência de que às vezes há crianças em


quase todas as salas de aula que, embora consideradas normais sob
outros aspectos, apresentam desempenho em nível inferior ao seu
potencial presumível.

Para algumas dessas crianças a dificuldade limita-se a uma


determinada matéria, como seja a leitura e/ou matemática; para
outras, é mais extensa, impedindo-lhes o desempenho em muitas
áreas.

Os distúrbios de aprendizagem constituem um sério problema


para as crianças, educadores e para seus pais que esperam
resultados positivos no desempenho de seus alunos/filhos na escola.

UNIDADE I
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DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM

“Distúrbios de aprendizagem” é um termo que desperta a


atenção para a existência de crianças que frequentam escolas e
apresentam dificuldades de aprendizagem, embora não aparentem
defeito físico, sensorial, intelectual ou emocional. Por longos anos, tais
crianças têm sido ignoradas, mal diagnosticadas ou maltratadas e a
dificuldade que demonstram tem recebido várias designações, como
“hiperatividade”, “síndrome hipercinética”, “síndrome de criança
hiperativa”, “lesão cerebral mínima”, “disfunção cerebral mínima”,
“dificuldade na aprendizagem”.

Com a introdução do termo “distúrbios de aprendizagem” (Kirk &


Bateman, 1962) e sua ampla aceitação tanto no meio profissional
como no meio leigo, introduziu-se uma certa ordem nesse campo. Isto
somente pode beneficiar as crianças objeto do presente estudo. Ao
mesmo tempo, não devemos deixar de considerar que este termo
abrange uma variedade de crianças com problemas de diferentes
espécies e que apenas têm em comum a dificuldade de aprendizagem
nas condições normais de sala de aula, sem que se evidencie a razão
identificável dessa dificuldade.

Deve ser lembrado, também, que os Distúrbios de


Aprendizagem podem ser genéricos, e, assim, abranger muitas áreas
teóricas da matéria, ou específica, quando uma criança possa não
apresentar dificuldades de aprendizagem, exceto em determinada
matéria, como leitura, dicção ou matemática. Distúrbios de
Aprendizagem compreendem, pois, uma variedade de crianças, e

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nenhum método de ensino ou de tratamento pode ensejar solução ao
problema que apresentam.

Entre as crianças sob essa denominação, muitas em meio à


massa de estímulos sensoriais que as influenciam, parecem ter
dificuldade de selecionar o estímulo que é relevante para a tarefa
proposta. Outras podem aperceber-se de estímulos de uma forma
atípica, e outras ainda parecem codificar informações de uma forma
inaproveitável ou ineficiente.

Algumas dessas crianças parecem impulsivas, outras


hiperativas, outras sujeitas à distração, e outras pouco motivadas.
Existem as que são portadoras de anormalidades que podem ser
detectadas nas funções cerebrais e outras que, subsequentemente,
adquiriram baixo grau de auto-estima, perspectivas de insucesso, alto
grau de ansiedade ao se defrontarem com tarefas de aprendizagem,
ou problemas de comportamento, como agressividade, ou de
retraimento. São necessárias muitas pesquisas para se determinar
como a categoria dos Distúrbios de Aprendizagem deve subdividir-se
a fim de se atingir maior homogeneidade.

Ante uma categoria que abrange tão grande variedade de


crianças, alguns são levados a concluir que o termo “Distúrbio de
Aprendizagem” é inexpressivo e deve ser posto de lado, pois não há
duas crianças iguais, de forma que a única abordagem possível é a de
tratar cada criança como um caso único.

Essa radicalização afigurar-se-ia contraproducente do ponto de vista


de ajuda à criança em particular, assim como se constituiria na
abordagem oposta, segundo a qual todas as crianças com distúrbio de
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aprendizagem devem ser tratadas de forma semelhante. A fim de se
decidir se distúrbios de aprendizagem é um conceito válido, é
interessante estabelecer-se a diferença entre Distúrbios de
Aprendizagem, como uma categoria para crianças com problemas
similares, e “Distúrbios de Aprendizagem” como indicação para uma
criança específica.

Para se designar uma categoria, “distúrbios de aprendizagem” é


termo válido. Alerta para a existência de um problema e, ao facilitar a
comunicação entre os que se preocupam com esse problema e se
interessam em sua solução, pode contribuir para uma eventual
solução. Ao contrário dos termos anteriores como “disfunção cerebral
mínima” “distúrbios de aprendizagem” é puramente descritivo e não
traz implicação de causa que, a esta altura, não foi definida. Além
disso, ao enfatizar que essas crianças têm dificuldade de
aprendizagem, o termo atribui a responsabilidade de auxílio a tais
crianças diretamente ao âmbito da educação, e não ao da medicina,
como o fazem as referências às funções cerebrais.

Como designação de uma criança, individualmente, o termo


“distúrbios de aprendizagem” é mais vago. Como todos os outros em
uso no campo das desordens psicológicas, é apenas descrição e não
explicação do problema que se observou. Se uma criança apresenta
dificuldade de aprendizagem e alguém a designa (ele ou ela) como
portadora de distúrbio de aprendizagem, há sempre o perigo de,
havendo-se encontrado uma designação imprecisa para a criança,
cessarem os esforços no sentido de ajudá-la, porque a designação é
considerada como uma explicação do problema. A afirmação: “Ele é
portador de distúrbios de aprendizagem, razão por que, certamente,
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não se pode esperar que aprenda” sempre serve como desculpa a fim
de se desistir dos esforços para ensinar tal criança. Quando
empregado dessa maneira, o termo “distúrbios de aprendizagem” é
evidentemente contestável.

Por outro lado, se a criança está num sistema educacional em


que os esforços de ensino especializado são empreendidos
objetivando crianças que se classificam na categoria de “portadoras de
distúrbios de aprendizado”, a designação, quando aplicada
corretamente, pode oferecer oportunidades de aprendizagem, o que,
na hipótese contrária, resultaria ineficaz. Entretanto, a designação por
si mesma não levará à experiência de aprendizagem especializada
que se requer para cada criança em particular. Isto em razão de a
categoria ainda ter uma abrangência muito ampla. Cada criança
precisa ser avaliada em separado, de forma que o plano educacional
possa ser pertinente às forças e às fraquezas que ele ou ela
apresentarem.

Eventualmente, como salienta Senf (1972), devemos estar aptos


a identificar subcategorias na área dos Distúrbios de Aprendizagem. A
essa altura capacitar-nos-íamos a fazer um levantamento geral das
abordagens educacionais que melhor se apliquem a crianças de um
determinado grupo. Até então, a designação “distúrbios de
aprendizagem”, em se tratando de uma criança em particular, pode ser
considerada válida apenas se serve como chave administrativa que
enseja à criança acesso a recursos disponíveis. No entanto, como
veremos, mesmo a adoção de um termo genérico como “distúrbios de
aprendizagem” é contaminada de problemas conceituais, semânticos
e metodológicos, que tornam seu uso nada fácil.
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O QUE É APRENDIZAGEM?

Antes que se possa definir “distúrbios de aprendizagem”, isto é,


antes que se possa falar da condição em que não se realize
aprendizagem, é preciso decidir como se pode falar da ocorrência de
aprendizagem. Em outras palavras, para definir “distúrbios de
aprendizagem”, é necessário definir “aprendizagem”.

Até agora, “aprendizagem” é um conceito singular. A palavra é um


termo familiar da linguagem do dia-a-dia e todos, presumivelmente,
sabem o que significa, mas, se nos detivermos por um momento em
seu sentido, veremos que escapa a uma pronta definição. O fato de
dizermos que aprendizagem é a aquisição de conhecimento ou de
especialização, não nos ajuda muito para chegarmos ao significado de
“aprendizagem”.

A base para este dilema reside em que aprendizagem é uma


abstração, um conceito, uma síntese mental. Não é um objeto que se
possa apontar, nem uma atividade que possa ser definida em termos
de comportamento observável, como por exemplo, comer. Podemos
dizer que comer é o processo de se colocar comida na própria boca e
degluti-la. Pode-se apontar uma pessoa que esteja engajada nessa
atividade e todos os que a estiveram observando concordarão em que
essa pessoa está comendo. Aplique-se à aprendizagem o exemplo
acima.

Constituirá aprendizagem o fato de uma criança olhar a página


impressa de um livro?

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A que recorreríamos para demonstrar a alguém o que
entendemos por aprendizagem?

A aprendizagem é presumivelmente alguma coisa que se


introduz na mente de uma pessoa, não sendo, pois, nada que se
possa apontar. É um processo oculto, e não uma ação ostensiva. É
preciso que se observe determinado comportamento que requeira
especialização ou conhecimento e, em seguida, registrar uma
alteração positiva nesse comportamento. Sob certas circunstâncias,
pode-se dizer, depois, que a alteração decorreu da aprendizagem. Em
outras palavras, a aprendizagem não pode ser observada enquanto se
processa, mas somente depois que se realiza.

A aprendizagem não é um comportamento, mas uma alteração


de comportamento. Também não é um evento singular, mas um
sistema de fases inter-relacionadas. Estas, impõem por sua vez um
processo complexo. Quando o sistema inteiro se classifica sob a
designação de “aprendizagem”, estamos lidando com uma abstração
conhecida em ciência como síntese mental hipotética. As sínteses
mentais hipotéticas são invenções válidas, porque auxiliam na
ordenação de muitas observações e facilitam o debate. As pesquisas
que visam à descoberta da relação das muitas variáveis envolvidas na
síntese mental, servem frequentemente para promover o
conhecimento.

Ainda que válidas, as sínteses mentais hipotéticas apresentam


também desvantagens. Entre estas destaca-se o uso descuidado que
pode levar à visão da síntese mental como sendo uma explicação.
Tomemos por exemplo a observação que se faça de um menino que,

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ontem, incapaz de multiplicar 7 por 7, dá hoje resposta certa à mesma
questão. Poder-se-ia perguntar por que hoje pode ele fazer aquilo de
que ontem não foi capaz, e se chegar à resposta de que “assim
procedeu em razão de ter aprendido a resolver a questão”.
Evidentemente, nada foi explicado, uma vez que “aprendizagem” nada
mais é que a designação que adotamos quando observamos aumento
de especialização ou de conhecimento.

PROBLEMA DE AVALIAÇÃO

Como foi dito, a aprendizagem somente pode ser demonstrada


observando-se uma alteração no comportamento em consequência de
progresso em especialização ou conhecimento “sob certas
circunstâncias”.

Quais são essas circunstâncias?

Uma é a em que, realmente, ocorreu um aumento da capacidade


para solução de um determinado problema ou para lidar com uma
determinada tarefa. A pessoa precisa ter passado do
desconhecimento ao conhecimento, da incapacidade à capacidade.
Para demonstrar tal transformação, é preciso que se conheçam os
padrões de comportamento da pessoa em dois momentos: um
primeiro registro do estado de incapacidade e, depois, o do estado de
capacidade. Um teste prévio e um teste posterior. Como todos os
padrões, este precisa ser seguro e válido.

A segunda circunstância, que precisa ser considerada caso se


tenha de atribuir à aprendizagem a alteração em comportamentos,

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consiste em que certos eventos aos quais se possa atribuir o aumento
de conhecimento precisariam ter ocorrido entre os dois momentos de
observação. Esses eventos são oportunidades para que a criança
adquira o conhecimento em questão. Comumente, isto se manifesta
sob a forma da preocupação que alguém tem com comportamento, a
qual definimos como ensino, embora, particularmente no campo da
habilidade motora, as oportunidades de engajamento em métodos de
ensaios e erros possam também preencher esse requisito.

Não é preciso que aqui nos preocupemos com o resultado


muitas vezes falso de pesquisa que investigasse se a alteração na
habilidade é devida à maturação ou à experiência. Um certo nível de
maturação precisaria ter sido atingido se a experiência devesse
resultar em aprendizado e, para nada além do que as respostas
motoras mais simples, a maturação e a experiência influiriam na
realização de desenvolvimentos do conjunto de atitudes e reações de
uma criança. Esta precisa atingir não somente um certo nível de
maturação se quiser beneficiar-se do esforço que se empreendesse
para lhe ensinar-lhe alguma coisa, como também o ensino deve ser
compatível com seu nível atual de habilitação a que chegou por
aprendizagem anterior e com suas condições físicas.

A fim de nos capacitarmos a dizer se a aprendizagem realizou-


se, ou não, é necessário, portanto, que tenhamos uma medida válida
da ignorância, uma oportunidade de adquirir conhecimento específico
e, novamente, uma medida válida do conhecimento adquirido. Uma
vez que as alterações na realização podem deixar de ser genuínas,
como as alterações aparentes devidas a medidas falíveis, e desde que
possam resultar de eventos outros que não a aprendizagem, tais como
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as alterações na motivação, qualquer afirmação de que uma pessoa
tenha aprendido alguma coisa é uma conclusão imprecisa.

E o mais importante é que a realização que observamos para


apurar se ocorreu aprendizagem, precisa ser relevante para a
habilitação e conhecimento em que estamos interessados.

No caso de habilitação motora, isto não representa muito de um


problema. Se quisermos que uma criança aprenda a fazer o laço de
seus sapatos, o critério de seu aprendizado resume-se em que ela
possa realizar o ato de amarrar o cordão dos sapatos.

Mas se quisermos que uma criança aprenda a ler, qual será o


critério?

É bastante que a criança possa olhar uma sentença e pronunciar


as palavras corretamente? Isto é leitura?

Evidentemente, é possível proceder dessa forma até um certo limite,


mediante a simples memorização dos sons apropriados enquanto se
ouvissem as palavras lidas por alguém. Ler, afinal, envolve a
capacidade de extrair o significado da palavra escrita; dizer palavras
em voz alta não é ler.

Mas como se pode saber se uma pessoa é capaz de deduzir


significado daquilo que lê?

Agora, torna-se necessário introduzir a compreensão da síntese


mental e descobrir meios de tornar perceptível a compreensão através
de algum processo. Nós o fazemos formulando questões que somente
podem ser respondidas por uma pessoa que tenha entendido o

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significado dos símbolos escritos que ela tiver decifrado. Assim,
tentamos chegar a um teste válido de compreensão, com todos os
problemas de semântica, significado duplo, ambiguidade e
irrelevâncias que o procedimento envolve.

DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM – UMA DEFINIÇÃO

Um Distúrbio de Aprendizagem apresenta-se quando a criança


não manifesta subnormalidade mental geral, não é portadora de
deficiência das funções visuais ou auditivas, não está impedida de
desempenhar tarefas educativas em razão de distúrbios psicológicos
desconexos e é dotada das vantagens proporcionadas por educação e
cultura adequadas, mas que, não obstante, manifesta deficiente
desempenho teórico.

À parte aquelas condições que especificam o que não seja um


distúrbio de aprendizagem, esta definição configura um círculo vicioso,
pois estabelece, em essência, que um distúrbio de aprendizagem é
uma incapacidade de aprender. Do conhecimento rudimentar que se
tem desse campo, é de se ponderar que cada definição em uso
focaliza o que não seja condição de incapacidade, não considerando o
que é indeterminado e, portanto, ambíguo.

Quando definido dessa maneira, o “distúrbio de aprendizagem”


classifica-se numa categoria heterogênea. Pesquisas sugerem que
muitas crianças portadoras de distúrbios de aprendizagem têm em
comum um desenvolvimento retardado da aptidão de manter atenção
seletiva. Podemos afirmar que o ritmo relativamente lento em que

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essas crianças desenvolvem tal aptidão cria-lhes obstáculos no início
de sua aprendizagem na escola, de forma que uma base educacional
fraca dá origem a dificuldades teóricas futuras.

Além do mais, outras características muitas vezes atribuídas a


crianças com dificuldades de aprendizagem, tais como hiperatividade,
perseveração, distração e impulsividade, derivam do problema de
manutenção de atenção seletiva. O problema de manter atenção
seletiva representa desenvolvimento retardado e é possível que seja a
causa de um grande número de dificuldades de aprendizagem.

FASES DA APRENDIZAGEM

O fenômeno a que damos o nome de aprendizagem, e ao qual


atribuímos as alterações perceptíveis de comportamento, não é um
evento singular, mas uma série de eventos, cada qual devendo ocorrer
antes que se possa inferir a realização de aprendizagem. Se uma
criança tem dificuldade em qualquer ponto nessa série de eventos,
essa dificuldade manifestar-se-á como um problema de aprendizado.

Portanto se quisermos ajudar uma criança nessas condições,


precisamos não somente apurar o ponto na série de eventos em que a
dificuldade ocorre, como também nos certificar de que a ajuda que
oferecemos é relevante para a dificuldade apresentada pela criança.

Gagné (1970), sugere que cada ato de aprendizagem deve ser


decomposto em fases distintas.

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As fases e os processos concomitantes são:

 Motivação.

Os behavioristas sustentam que a aprendizagem se realiza


quando a uma resposta se segue uma recompensa. Mas, afirmam
ainda, desde que um indivíduo (homem ou mulher) tenha passado por
uma contingência dessa ordem, esperará, provavelmente, que à
resposta que emitir, seguir-se-á algum evento desejável. Essa
expectativa servirá então como incentivo que motivará o aprendiz a
tomar conhecimento da tarefa de aprendizagem e a se deter nela.

Para a maioria das crianças em idade escolar, essa motivação é


um tanto sutil e difícil de se identificar. Provavelmente, trabalham
porque descobriram que a aprendizagem resulta em maior
competência, o que, por sua vez, permite o domínio de novas tarefas.

Na leitura, por exemplo, o incentivo pode muito emergir do


reconhecimento de que saber ler permite a descoberta de coisas
interessantes a respeito do mundo. Dessa maneira, a criança engajar-
se-á eventualmente na leitura “para seu próprio bem”, com a alegria
da recompensa que a leitura lhe proporcionará.

Outras motivações podem influenciar outras crianças. O elogio


feito por um adulto que exerça ascendência sobre a criança, a alegria
pelo êxito obtido, a vitória em competição ou o contentamento que
advém da realização contam-se entre as muitas e complexas
motivações humanas.

Algumas crianças, e especialmente as que registram reiterados


insucessos em tarefas relacionadas com a escola, não mais esperam

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que seus esforços as conduzam à recompensa. É para essas crianças
que alguém empenhado em ajudá-las precisa primeiro estabelecer a
motivação, insinuando-lhes uma expectativa de recompensa. Isto pode
tomar a forma da oferta de reforços muito concretos, até que se tenha
realizado uma aprendizagem mínima, após a qual se possa acenar,
com reforços mais abstratos (tais como a satisfação de um trabalho
bem feito).

 Apreensão.

Desde que a criança (menino ou menina) tenha sido motivada a


fazer o trabalho envolvido em aprendizagem, a fase seguinte e a mais
crucial é aquela em que a criança atende ao estímulo relevante de
aprendizagem. Tendo aberto o livro, a criança precisa prestar atenção,
seletivamente, à letra ou à palavra que desejamos ensinar-lhe.

Há razões ponderáveis para acreditar-se que as crianças com


distúrbios de aprendizagem têm dificuldades em manter a necessária
atenção seletiva para aprendizagem adequada. O professor pode
ajudar essa criança, variando a nitidez dos estímulos, mediante
informações cuidadosas sobre aquilo a que a criança deve prestar
atenção; desenvolvendo a atenção seletiva como uma estratégia de
reação; e mediante a extensão gradual do período durante o qual se
exija de uma criança que mantenha atenção seletiva. O que é
contraproducente são as exortações de ordem geral como “Prestem
atenção”, ou “Observem o que vocês estão fazendo”.

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 Aquisição.

Aqui chegamos ao âmago do processo de aprendizagem, em que a


matéria apresentada ao aprendiz (menino ou menina) precisa penetrar
em seu sistema cognitivo para “armazenamento” como memória, de
forma que possa mais tarde ser evocada e posta em uso. Nesta fase,
os eventos são internos e somente podemos tirar inferências a
respeito quando os eventos subsequentes perceptíveis ocorrerem.

O professor pode auxiliar uma criança nessa fase, sugerindo-lhe


estratégias para codificação, mas é difícil apurar se a criança está
tendo ou não dificuldade nessa fase. Em parte, isto ocorre porque é
quase impossível distinguir os problemas no nível de aquisição dos
que se verificam nas duas fases seguintes.

 Retenção e evocação.

Desde que o aprendiz tenha adquirido uma parcela de informação,


precisa ser capaz de retê-la e de evocá-la na ocasião apropriada. Esta
é a área da memória, tema que durante muitos anos vem sendo objeto
de vastos estudos, mas a respeito do qual sabemos relativamente
pouco. Embora a criança que apresente um problema de
aprendizagem sempre demonstre não ser capaz de evocar alguma
coisa que tenha presumivelmente aprendido, é provável que seu
problema resida mais nas primeiras fases, como seja motivação,
atenção seletiva ou codificação, do que em defeitos reais de
armazenamento ou de recuperação de memória. Esta informação
fundamenta-se na observação de que as crianças portadoras de
distúrbios de aprendizagem não demonstram deficiência de memória
para outras matérias que não as relacionadas com a escola, e que,
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mediante ajuda nas primeiras fases, não têm dificuldade para a
evocação posterior.

Há certos recursos para retenção e evocação. A insistência na


aprendizagem, muitas repetições da tarefa aprendida além do ponto
em que se deseja a evocação imediata, podem ser indicados para
facilitar a evocação posterior.

 Generalização.

Uma vez adquirida determinada parcela de informação, o aprendiz


precisa ser capaz de usá-la em várias circunstâncias e situações
diferentes. Tendo aprendido a ler uma palavra no contexto de uma
sentença, a criança precisa ser capaz de ler essa palavra quando for
encontrada numa sentença diferente ou em lugares diferentes.

Este processo de transferência deve ser o objetivo principal de todo


o ensino, pois não é suficiente que uma criança aprenda a evocar
certos fatos na sala de aula; ela precisa ser capaz, também, de evocá-
los fora da escola ou em classes diferentes e em contextos diferentes.

A transferência é decisiva não somente em termos da matéria a ser


aprendida, mas também em termos do próprio processo de
aprendizagem. Vale dizer que processos como expectativa, atenção
seletiva e codificação, que por si mesmos são comportamentos
aprendidos, precisam ser acessíveis à criança não somente na
situação de aprendizagem estruturada, mas também sob outras
condições em que alguma coisa tiver de ser aprendida.

A transferência pode ser enfatizada fazendo-se com que a criança


use determinada parcela de informação ou habilidade sob uma

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variedade de condições diferentes durante o processo inicial de
ensino. Assim, uma palavra deve ser mostrada em contextos
diferentes e escrita em dimensões diferentes e em diferentes
superfícies, mas o professor deve ter sempre presente o fato de que o
objetivo precípuo do esforço empreendido é ensejar à criança a leitura
daquela palavra com o máximo de transferência.

Vellutino, Steger,Moyer, Harding e Niles (1974) reportam-se a


esse resultado quando salientam que a ajuda terapêutica à criança
com distúrbios de aprendizagem deve visar ao máximo de
transferência, sugerindo que o treinamento em habilidades não
relacionadas com o objetivo precípuo do que está sendo ensinado,
como dar treinamento com moldes geométricos distintos a uma
criança que tem dificuldade de reconhecer letras ou palavras, pouco
ou nada contribui para um programa terapêutico.

Do mesmo modo, se uma criança tem de aprender a manter


atenção seletiva, é melhor ensinar-lhe isto no contexto da leitura do
que engajá-la em exercícios que envolvem atenção a partes de
imagens ou a peças de quebra-cabeças. As estratégias educacionais
devem relacionar-se diretamente com a habilidade a ser aprendida, e
não com alguma suposta deficiência subjacente.

 Desempenho.

O desempenho é, sem dúvida, a única prova de que se realizou


aprendizagem, porque, então, o processo ressurge das operações
internas do aprendiz e se torna perceptível. Conforme indicado no
início do debate, a realização, ou não, de um determinado ato não nos
revelará, necessariamente, se se efetuou aprendizagem.
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Os resultados da motivação, a relevância da questão e a
compreensão do que se requeira, tudo exige ponderação. Algumas
crianças podem ter aprendido e ainda estarem incapazes de executar,
mas isto comumente se relaciona com problemas de medo ou
insucesso, ansiedade ante a perspectiva de avaliação ou o desejo de
magoar um professor, o pai ou a mãe. Este não é um aspecto de
distúrbio de aprendizagem no sentido em que este termo é aqui
empregado.

 Retroação.

Esta é a outra fase importante, frequentemente negligenciada pelos


que pretendem ensinar. Depois que a resposta for dada, o aprendiz
precisa receber não somente informações sobre a adequação
(exatidão) da resposta, de forma a orientar as respostas futuras, mas
também, confirmação da expectativa que fora estabelecida no início
do ciclo de aprendizagem. Se essa expectativa não for confirmada, o
aprendiz não somente desconhecerá se a resposta era aceitável, mas
também falhará no desenvolvimento de expectativa de recompensa
em futuros julgamentos de aprendizagem, com prejuízo para a
aprendizagem subsequente. É muito provável que o reforço que segue
uma resposta não se constitua somente em função motivadora, mas
supra também importante retroação informativa. De fato, a retroação
informativa pode bem ser a mais importante das duas funções de um
reforçador.

Conjecturas a respeito dos processos de aprendizagem de


crianças com distúrbios de aprendizagem nunca de devem basear em
observações de abordagens usadas por pessoa que se tornou perita

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em determinada tarefa. Por exemplo, um leitor consumado decifra
rapidamente todas as palavras e séries de palavras, sem o recurso a
incentivos extrínsecos ou à retroação, para ser exato. A leitura para
essa pessoa é um reforço em benefício próprio, mas este não é o caso
da criança que está começando a adquirir essa habilidade, nem do
jovem que não conseguiu aprender o uso adequado da habilidade.

O próprio fato de que a criança (menino ou menina) requer


auxílio terapêutico indica-nos que para ela a abordagem usual de
ensino e as hipóteses de praxe não foram válidas e que devemos
recorrer a métodos de ensino bem diferentes daqueles adotados para
crianças que não têm problemas de leitura. Somente uma análise
cuidadosa, individualizada, do processo de aprendizagem de uma
criança com dificuldade de aprendizagem permitirá a seleção de um
programa terapêutico apropriado. A generalização de conclusões de
processos de aquisição normal, ou de processos do executor
consumado, induz comumente a erro.

Nas páginas seguintes, devemos rever algumas pesquisas


recentes sobre a aprendizagem humana e procurar relacioná-las com
a questão da dificuldade de aprendizagem.

Atenção e Aprendizagem

O que é atenção?

Palavras que são empregadas na linguagem comum tendem a


causar confusão quando são também usadas num sentido técnico por
psicólogos. “Atenção” é uma dessas palavras. Atenção é um evento

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oculto que não pode ser controlado diretamente. Dessa maneira, é
muito parecido com o processo oculto de aprendizagem, que também
não apresenta referência direta e só pode ser mensurado pela
observação das alterações no desempenho.

Se ambos são mensurados por uma alteração no desempenho,


é possível apurar se a falta de alteração no desempenho é devida à
atenção imperfeita, à aprendizagem imperfeita ou a ambas O que
chamamos de atenção tem uma variedade de aspectos e, assim, pode
significar coisas diferentes para diferentes pessoas.

Berlyne apresentou importante contribuição para esse campo,


auxiliando na diferenciação dos múltiplos significados de “atenção” e
sugerindo que o uso técnico da palavra seja limitado a apenas um
aspecto, o da atenção seletiva.

Aspectos diferentes de Atenção

O ambiente de uma pessoa está repleto de estímulos potenciais,


e da profusão de outros que surgem do interior de seu corpo. São
estímulos potenciais, porque esses eventos não se transformam em
estímulos funcionais até que constituam motivo para resposta.

Se um determinado evento se constitui em motivo para resposta,


depende do estado da pessoa, acordada ou adormecida, alerta ou
indiferente, vigilante ou absorta. Em outras palavras, depende de seu
estado de atenção. Qual a intensidade de atenção que uma pessoa
está dando ao campo de estímulo como um todo é o que Berlyne
(1970) identificou como os aspectos intensivos da atenção. Desses

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pode-se diferenciar entre animação, atenção e grau de
concentração.

A animação geralmente associa-se a uma dimensão


psicológica, que pode ser interpretada como além da continuidade do
sono até o despertar. Foi demonstrada uma variedade de alterações
psicológicas correlacionadas com animação e coincidentes com
respostas a estímulos. Entre essas alterações fisiológicas, contam-se
as do ritmo cardíaco e as da atividade elétrica do cérebro. Embora
intimamente relacionada com a animação, a atenção identifica a
disposição momentânea da pessoa para receber e processar
estímulos. Berlyne sustenta que atenção e animação não são a
mesma coisa, uma vez que nos estados extremos de animação (como
no auge do excitamento) a atenção de uma pessoa a variações
mínimas nos estímulos exteriores é frequentemente muito baixa. O
grau de concentração, o terceiro dos aspectos intensivos da atenção,
determina se a pessoa atende a uma série ampla ou restrita de
estímulos sobrevindos.

Por aspectos intensivos, Berlyne quer significar a identificação


do quanto de atenção uma pessoa está dando ao campo de estímulos
em geral. Como é distribuída entre os vários elementos do campo de
estímulo, a intensidade de atenção seria determinada pelo estudo dos
aspectos seletivos da atenção. Berlyne distingue, então, três
processos: comportamento exploratório, abstração e atenção seletiva.

“Comportamento exploratório” é o termo que Berlyne atribui


aos atos físicos que induzem um órgão dos sentidos a entrar em
contato com uma fonte de estimulação. Mover os olhos na direção de

27
um evento visual, de forma que esse evento possa ser percebido
como estímulo, é um exemplo de comportamento exploratório. Que
esse ato não é o mesmo que atenção, é o que se verifica apreciando a
diferença entre olhar e ver ou entre ouvir e escutar. O professor que
supõe que a criança, por se achar olhando para o quadro-giz, está
prestando atenção na lição, pode estar errado!

A abstração é outra forma de seleção do campo de estímulos, e


é conveniente que se identifique separadamente.

Este é o processo pelo qual a pessoa percebe (atende a) uma


dimensão do objeto de estímulo, ao mesmo tempo que ignora outras
dimensões do mesmo objeto. Ao diferenciar entre uma ficha azul e
uma branca, estamos ignorando a forma, o volume, o peso e a textura,
características que nesses objetos são as mesmas, e respondendo
apenas à propriedade de cor. Separamos a cor de outras tantas
propriedades igualmente disponíveis dos estímulos, mas irrelevantes.

Atenção Seletiva

Todos os processos até aqui mencionados têm sido debatidos uma


vez ou outra sob o título de “atenção”, termo que Berlyne insiste em
que seja reservado para o processo que ele intitula atenção seletiva.
A qualquer momento, uma pessoa recebe estímulos de grande
número de fontes e através de cada receptor dos sentidos. As fibras
nervosas visuais, auditivas, táteis, cinestésicas e proprioceptivas estão
levando constantemente impulsos que muitas vezes requerem
respostas conflitantes, mutuamente incompatíveis. Ocorreria o caos de
comportamento, caso a pessoa não apresentasse capacidade para
selecionar entre esses impulsos e atender, em consequência, a
28
responder, a um impulso ou a um limitado número deles a um só
tempo. A atenção seletiva é, assim, a capacidade altamente
adaptável, e um defeito na utilização dessa capacidade pode ser
prontamente considerado como uma séria desvantagem. Mesmo
dentro do conceito de atenção seletiva, Berlyne sugere que se
considerem três outros processos. Dentro do conhecimento das
dificuldades de aprendizagem, esses processos assumem
considerável importância. São eles:

 Atenção na aprendizagem;

 Atenção na rememoração;

 Atenção no desempenho;

Esses três aspectos da atenção seletiva operam em pontos


separados temporariamente.

A atenção na aprendizagem reporta-se ao problema de seleção


de estímulo no ponto em que se estabelece uma associação resposta-
estímulo. Mesmo na mais simples situação de aprendizagem, uma
pessoa está recebendo vários estímulos simultaneamente, mas a
resposta é aprendida para um só estímulo ou para um número limitado
de estímulos. Tomemos por exemplo uma criança a quem se pretenda
ensinar a dizer o som “bê” ante a apresentação visual da letra “b”
escrita num quadro-giz. Entre os estímulos recebidos por essa criança
no momento, incluem-se não só a forma da letra, mas, também, o
dedo indicador do professor, a voz do professor modulando o som,
barulhos estranhos na sala, outras coisas escritas no quadro-giz, a cor
deste, a cor e o tamanho da letra, um sapato apertado, um “estômago

29
roncando”, as pressões do local, e assim por diante. Entre tudo isso, a
criança precisa selecionar a forma da letra e a voz do professor, a fim
de aprender a resposta apropriada. Esta façanha requer atenção
seletiva. Se a atenção seletiva não estiver funcionando
adequadamente, a criança terá dificuldade de aprender a lição.

Com certeza essa dificuldade pode assumir muitas formas. Se a


criança de forma extremamente seletiva atentar somente para a voz
do professor, excluindo de sua atenção a letra escrita, o professor
ouviria a criança dizer “bê” e suporia que a criança aprendera. O erro
dessa suposição surgirá apenas mais tarde quando, na ausência do
estímulo auditivo, o estímulo visual falhar no comando da resposta
adequada. É também concebível que uma criança atente para o dedo
indicador do professor e para o som de sua voz, prendendo então a
vocalizar “b” ante o estímulo do dedo indicador do professor.
Novamente, então, se a criança (menino ou menina) tiver de atentar
de forma extremamente seletiva para a porção circular da letra “b”, ela
emitiria, num teste posterior, a resposta “bê” quando lhe fosse
apresentada a letra “d”, manifestando, assim, a inversão em que
frequentemente incidem os leitores principiantes ou os retardados.

Berlyne sintetiza a noção do que seja atenção na aprendizagem


colocando a questão:

Quando uma criança está recebendo um número de estímulos


sob condições conducentes à aprendizagem, que estímulos se
tornarão mais fortemente associados à resposta?

A atenção na rememoração está intimamente relacionada a essa


questão, motivo pelo qual Berlyne expressa este problema na questão:
30
“Quando um ser humano está recebendo uma quantidade de
estímulos, quais estímulos ele estará apto a rememorar em
ocasiões futuras?

Exceto pelo fato de o que chamamos de aprendizagem usualmente


ocorrer sob condições estruturadas explicitamente (ao passo que as
coisas de que podemos lembrar-nos mais tarde são às vezes
encontradas incidentalmente e não necessariamente sob condições
conducentes à aprendizagem), parece haver muito pouca diferença
entre atenção na aprendizagem e atenção na rememoração, para
justificar mais do que uma menção rápida desta última.

O terceiro processo, que envolve a atenção seletiva, representa,


contudo, uma questão nitidamente diferente, com implicações para o
estudo dos distúrbios de aprendizagem. Somente se pode verificar
que uma criança aprendeu alguma coisa que lhe tentamos ensinar, se
observarmos o desempenho ulterior desta criança.

Se o desempenho ulterior for aquém de nossas expectativas, isto


não significará necessariamente que não tenha ocorrido
aprendizagem. A definição de Berlyne para atenção no desempenho
diz respeito a um aspecto desse problema. Uma menina terá
aprendido muitas respostas a muitos estímulos quando a colocamos
na situação em que lhe exija desempenho específico. Nessa situação,
muitos estímulos estarão presentes e competindo pelo comando de
seu comportamento.

Berlyne usou o termo “conflito” para indicar a situação em que


respostas mutuamente incompatíveis estão sendo induzidas ao
mesmo tempo, e a atenção no desempenho é um dos meios pelo qual
31
o indivíduo enfrenta esse conflito. Ela dirige sua atenção direta
seletivamente a um estímulo ou a um limitado número de estímulos e
emite a resposta que aprendeu.

A criança que aprendeu a associar o som correto à letra “b”,


supõe-se que a aprendizagem se realizou e que a criança “conhece” o
som que esta letra simboliza. A letra é então apresentada com a
questão: “Que som isto tem?”

Esses são os estímulos aos quais se espera que a criança


atenda. Mas, e se ela, ao contrário, atender a qualquer dos doze
outros estímulos, que também estão presentes no momento, e disser:
“É a sirene de um carro de bombeiros”, ou “Meu estômago está
roncando”, ou “Meu tio tem um novo filhote de cachorro”, ou “Meu
sapato está apertado”, ou “Amanhã é sexta-feira”? Cada uma dessas
respostas é apropriada aos estímulos presentes, alguns externos,
outros internos, mas a criança não atendeu ao estímulo que o
professor considerou apropriado.

Essa falha de atenção no desempenho bem pode levar alguém a


dizer que essa criança é distraída. Os estímulos irrelevantes, do ponto
de vista do professor, distraíram-na do estímulo que ele esperava
fosse o enfoque de sua atenção. Se a criança deve também responder
a vários estímulos emanados do interior de seu corpo, o sapato
apertado, o estômago roncando, a pressão na base de suas costas, as
respostas motoras observadas bem poderiam levar alguém a dizer
que essa criança é hiperativa.

A distração e a hiperatividade de crianças, quando registradas


frequentemente, aliadas às dificuldades de aprendizagem, podem,
32
portanto, não ser mais que outro aspecto de seu problema com a
atenção seletiva, problema esse que, do ponto de vista presente, pode
bem ser a fonte da dificuldade de aprendizagem.

Para Berlyne, há certas condições sob as quais a apresentação


de um estímulo resultará em aumento de atenção. Essas condições,
Berlyne as designa “variáveis colativas”, são novidade,
complexidade, incerteza, surpresa, conflito e alteração. Pode ser
demonstrado, por exemplo, que a dimensão de complexidade
relaciona-se com atenção de maneira previsível.

Com base na duração do tempo em que um paciente mantém


seu olhar na direção de um estímulo visual como sua medida de
atenção, Day demonstrou que um estímulo de baixa complexidade,
definido pelo número de ângulos de uma forma geométrica feita ao
acaso, manterá a atenção por menos tempo do que o faria um
estímulo similar de alta complexidade, contanto que a complexidade
não aumentasse além de um nível delimitável.

Em outras palavras, o paciente mostrará preferência por um


moderado nível de complexidade. Os estímulos que são muito
complexos e os que são muito simples parece que atraem atenção
reduzida. Professores experientes de crianças pequenas sabem há
muito que seus alunos podem manter-se interessados (atentos) por
tempo maior se a tarefa lhes é apresentada com aspectos incomuns,
acenando-lhes com surpresas, e em formas variadas. Os
responsáveis pelo ensino de crianças com dificuldades de
aprendizagem podem bem adotar uma abordagem semelhante.

33
As palavras a serem lidas ou os problemas de matemática a
serem resolvidos podem ser apresentados sob a forma de jogos, a
título de novidade. O que lhes poderia causar surpresa seria esconder
as palavras em diferentes partes da sala de aula, ou cobri-las com
papel pardo de embrulho, e mandar as crianças numa caça às feras.
Só a imaginação do professor limita as alterações que podem ser
introduzidas na apresentação de tarefas e matérias.

Dificuldades de Atenção e Aprendizagem

A atenção é condição necessária, mas não suficiente para a


aprendizagem. Vale dizer que a aprendizagem não ocorre senão
quando o indivíduo esteja prestando atenção à matéria a ser
aprendida, mas, quando a aprendizagem se realiza, outros processos
que não a atenção, precisam estar bem envolvidos.

Assim, se a criança é exposta a uma situação que se presume


possa conduzi-la à aprendizagem e se, em seguida, ela realiza
algumas coisas de que não era capaz antes, podemos dizer com
bastante certeza que essa criança não consegue adquirir uma nova
aptidão sob essas circunstâncias, é impossível dizer se essa falha no
aprendizado foi devida à falta de atenção.

Esse dilema torna impossível estudar a atenção no contexto de


um experimento de aprendizagem, visto que em tal experimento a
atenção é confundida com outras variáveis como aptidão, memória e
evocação.

34
Medidas da Atenção

Uma forma de resolver o problema é aplicar uma tarefa que não


requeira a aquisição de uma nova habilidade, porque já se encontra no
repertório de respostas da pessoa. Essa tarefa pode ser uma simples
resposta motora, como seja pressionar um botão assim que aparecer
um estímulo prontamente perceptível. Desde que uma pessoa tenha
sido esclarecida de como realizar a tarefa, a falha na emissão da
resposta quando da aparição do estímulo pode ser considerada com
bastante segurança como devida a uma falta de atenção.

A associação estímulo-resposta permite uma variedade de


modificações destinadas ao estudo da atenção sob condições
diferentes. Assim, pode-se solicitar resposta a um estímulo (“pressione
o botão à esquerda quando se ascender a luz vermelha”) e resposta
diferente a outro estímulo (“pressione o botão à direita quando a sineta
tocar”). Mediante a apresentação simultânea de muitos estímulos,
cada qual comandando uma resposta diferente e mutuamente
exclusiva, é possível verificar a que estímulo uma pessoa está
atendendo seletivamente.

O uso de simples respostas motoras, para cuja emissão não se


requer nenhuma habilidade, ou a apresentação de estímulos em
formas com as quais a criança não tenha tido nenhuma experiência
prévia, permitem que se estudem os processos de atenção
relativamente inconfundíveis com a aprendizagem.

35
Distúrbios de Aprendizagem considerados como atraso no
desenvolvimento da Atenção Seletiva

Se a capacidade de atenção seletiva se desenvolve com a idade,


como nos sugerem os estudos, não se justifica a suposição de que
todas as crianças desenvolvam essa capacidade ao mesmo tempo.
De fato, há plena razão para se supor que existem diferenças
individuais no desenvolvimento dessa capacidade e que algumas
crianças a desenvolverão mais lentamente que outras. Quando essas
crianças forem então colocadas numa situação de aquisição de leitura
na sala de aula, onde a capacidade de usar e manter a atenção
seletiva é requisito para o êxito, é de se esperar que essas crianças
não sejam bem-sucedidas.

Os princípios a que se subordina o desenvolvimento, sugerem


que as crianças que adquirem uma determinada habilidade mais
lentamente que as outras acabarão por recuperar-se do atraso, desde
que se dê tempo a que os processos de desenvolvimento tenham
curso. Conforme sugere a obra de Rourke e Czudner (1972), as
crianças que falharam inicialmente numa determinada tarefa, assim
que se tornam mais crescidas, desenvolvem também a capacidade de
atenção. Se forem então examinadas, seu desempenho não diverge
do de outras crianças de sua idade. Entretanto, isto é válido apenas
nas tarefas reação-tempo de laboratório, e não no caso de
desempenho na escola, onde as crianças com distúrbios de
aprendizagem continuam a desempenhar em nível abaixo do da
classe.

36
Por que ocorreria isso, se o atraso anterior na atenção seletiva
não constitui mais um problema?

A resposta, por certo, está na frase “que se dê tempo para que


os processos de desenvolvimento tenham seu curso”. À medida
que o tempo passa, toda a sorte de eventos ocorre. Não somente tem
curso o amadurecimento de uma criança, como a criança é exposta a
múltiplas experiências, algumas das quais aumentarão seu
desenvolvimento, outras o impedirão.

O tempo de reação em simples tarefas de percepção em


laboratório pode ser relativamente natural segundo essas
experiências, de forma que possa refletir haver-se a criança
recuperada do atraso no desenvolvimento da atenção seletiva. O
desempenho teórico é outra questão. Neste ponto, persiste o
problema da criança, não porque continuassem as dificuldades com
atenção seletiva, mas porque o desempenho com êxito, pressupõe
aprendizagem nos graus anteriores, o que uma criança nessas
condições não adquiriu.

Muitos insucessos nos primeiros anos marcarão a criança em


termos de percepção que ela tem de si mesma, de sua resposta à
situação escolar, de sua autoconfiança e das expectativas dos outros
com vistas a seu potencial. O fato de que a aprendizagem continuará
a ser um problema para uma criança nessas condições não
surpreende, e este raciocínio indica que ela precisará de muito auxílio
para superar os efeitos acumulados do atraso de desenvolvimento.

37
Exercícios sobre o texto:

1) Como você define uma criança portadora de “distúrbio de


aprendizagem”?

2) Como podemos mensurar a atenção, e como você define


atenção seletiva?

3) De que forma se desenvolve a capacidade de atenção seletiva?

UNIDADE II

Principais causas das dificuldades de Aprendizagem e de


Ajustamento Escolar

Inúmeros estudos estão sendo feitos no campo da Psicologia e


da Psiquiatria, buscando a melhor forma de classificar os distúrbios
que prejudicam a aprendizagem, bem como determinar suas causas.
Trata-se de um assunto complexo, que envolve muitos conhecimentos
que o pedagogo não aprofunda em seu curso de formação
profissional, como por exemplo: defeitos genéticos, distúrbios de
personalidade, da conduta, defeitos congênitos, disfunções cerebrais e
outros.

A seguir agruparemos de acordo os distúrbios e com as suas


causas principais; muitos deles têm mais de uma causa e em todos
há interferência de mais de um fator, seja ele somático ou psíquico.
Isso porque o ser humano é constituído por um todo organizado de
sistemas com profunda vinculação entre si.
38
Causas físicas - São aquelas representadas pelas perturbações
somáticas transitórias ou permanentes. São provenientes de qualquer
perturbação do estado físico geral da criança, como por exemplo:
febre, dor de cabeça, dor de ouvido, cólicas intestinais, anemia, asma,
verminoses e todos os males que atinjam o físico de uma pessoa,
levando-a a um estado anormal de saúde.

Causas sensoriais - São todos os distúrbios que atingem os


órgãos dos sentidos, que são os responsáveis pela percepção que o
indivíduo tem do meio exterior. Qualquer problema que afete os
órgãos responsáveis pela visão, audição, gustação, olfato, tato,
equilíbrio, reflexo postural, ou os respectivos sistemas de condução
entre esses órgãos e o sistema nervoso, causará problemas no modo
de a pessoa captar as mensagens do mundo exterior e, portanto,
dificuldade para ela compreender o que se passa ao seu redor.

Causas neurológicas - São as perturbações do sistema


nervoso, tanto do cérebro, como do cerebelo, da medula e dos nervos.
O sistema nervoso comanda todas as ações físicas e mentais do ser
humano. Qualquer distúrbio em uma dessas partes se constituirá em
um problema de maior ou menor grau, de acordo com a área lesada.

Causas emocionais - são distúrbios psicológicos, ligados às


emoções e aos sentimentos dos indivíduos e à sua personalidade.
Esses problemas geralmente não aparecem sozinhos, eles estão
associados a problemas de outras áreas, como por exemplo da área
motora, sensorial etc.

Causas intelectuais ou cognitivas - São aquelas que dizem


respeito à inteligência do indivíduo, isto é, à sua capacidade de
39
conhecer e compreender o mundo em que vive, de raciocinar sobre os
seres animados ou inanimados que o cercam e de estabelecer
relações entre eles.

O sistema nervoso tem também um papel importante nesses


distúrbios. O modo pelo qual o indivíduo conhece o mundo, sua maior
ou menor capacidade de estabelecer relações, de criar coisas novas,
de inventar, de construir e de buscar soluções diferentes para um
mesmo problema vão depender muito de suas estruturas mentais e de
sua capacidade intelectual.

Causas educacionais - o tipo de educação que a pessoa


recebe na infância irá condicionar distúrbios de origem educacional,
que a prejudicarão na adolescência e na idade adulta, tanto no estudo,
quanto no trabalho. Portanto, as falhas de seu processo educativo
terão repercussões futuras.

Causas sócio-econômicas - Não são distúrbios que se revelam


no aluno. São problemas que se originam no meio social e econômico
do indivíduo. Assim como para os animais, o habitat natural pode ser
propício ou hostil a eles, condicionando seu desenvolvimento, sua
maior ou menor capacidade de adaptação e sua melhor ou pior
condição de saúde; também o habitat dos seres humanos, o meio
físico e social em que vivem, exerce sobre eles a mesma influência,
podendo ser favorável à sua subsistência e também às suas
aprendizagens.

Todas essas causas originam distúrbios, que irão se constituir


nos diferentes problemas de aprendizagem.

40
Distúrbios neurológicos e outras causas responsáveis por
problemas de leitura e escrita e de aprendizagem geral

Muitos distúrbios neurológicos podem atingir tanto crianças


quanto adultos, causando problemas de fala, de locomoção, de
memória, do próprio funcionamento do cérebro (raciocínio) etc. Esses
distúrbios prejudicam qualquer tipo de aprendizagem.

Trataremos apenas dos distúrbios que afetam diretamente a


aprendizagem escolar, ou seja, aqueles que mais frequentemente se
transformam em problemas de aprendizagem de leitura, escrita e
cálculo, de conhecimentos gerais, de fala e de motricidade.

Segundo estudos realizados por Lester e Muriel Tarnopol,


existem crianças inteligentes que, no entanto, têm grande dificuldade
para aprender a ler ou a escrever, em situação de escolarização
normal.

Em pesquisa mundial, psicólogos, educadores e médicos


concordam que as principais causas desses distúrbios podem ser
classificadas como neurológicas, algumas vezes genéticas,
possivelmente intensificadas por distúrbios emocionais secundários.
Alguns especialistas referiram-se ainda à privação cultural, devido ao
status sócio-econômico inferior, como causa desses problemas de
aprendizagem.

Em geral as dificuldades de leitura e de escrita conduzem a


outras dificuldades de aprendizagem. As crianças que não conseguem
aprender a ler e a escrever acabam por fracassar nas outras
disciplinas escolares que implicam no conhecimento da linguagem. Na

41
vida prática não conseguem se orientar sozinhas, pois não lêem
sinais, avisos e advertências. Não se mantêm atualizadas, pois não
são capazes de ler jornais, revistas, livros. Portanto não se
desenvolvem intelectualmente, como poderiam, se lessem e
escrevessem, além de não terem uma realização social e emocional
plena.

O processo de aquisição de Linguagem

A leitura faz parte de um complexo processo linguístico de


desenvolvimento da linguagem. Este processo tem etapas bem
definidas, que vão avançando gradativamente. A leitura e a escrita
representam as etapas superiores. Os primeiros estímulos da
linguagem que a criança recebe são auditivos, visuais, táteis, olfativos
e gustativos, portanto, estímulos sensoriais. Estes estímulos se
associam e formam a linguagem interna do indivíduo.

Pela audição a criança recebe símbolos sonoros, emitidos pelos


objetos de seu ambiente. Assim ela percebe o que acontece ao seu
redor, que passa a significar alguma coisa para ela (linguagem
receptiva ou auditiva).

Assimilando essas mensagens do ambiente e utilizando sua


capacidade de imitação, a criança passa a usar os símbolos verbais
que ouve dos adultos e agora já compreende, entrando então no
período da linguagem expressiva (verbal). É por esse motivo que a
criança precisa de pessoas falando corretamente ao seu redor, para
que ela tenha modelos para imitar e assim consiga aprender a falar
(aprendizagem por imitação).

42
Quando a criança chega à idade escolar, entre 6 e 7 anos, ela
aprende a ler através de símbolos verbais visuais, que vão se juntar à
sua linguagem auditiva. A palavra escrita é a representação gráfica
dos símbolos auditivos, que por sua vez representam experiências
vivenciadas. Por último, a criança é capaz de se expressar através dos
símbolos gráficos (escrita). No processo de alfabetização, tanto a
leitura como a escrita vão acontecendo simultaneamente. Algumas
crianças aprendem primeiramente a escrever e depois a ler, enquanto
com outras dá-se o contrário.

A aquisição da leitura tem a seguinte sequência:

1) Aquisição do significado;

2) Compreensão da palavra falada;

3) Expressão da palavra falada;

4) Compreensão da palavra impressa (leitura);

5) Expressão da palavra impressa (escrita).

As dificuldades de leitura e escrita podem resultar de dificuldades


nos Processos Cognitivos Básicos. São dificuldades de
desenvolvimento do indivíduo. Quando a criança tem um retardamento
mental e por isso é atrasada na leitura, considera-se um caso de
atraso geral da leitura. Quando ela é inteligente, boa aluna em outras
disciplinas, porém atrasada na leitura, seu caso é considerado um
atraso específico de leitura, que muitos preferem chamar de dislexia e
outros de distúrbios específicos de aprendizagem.

43
Por esse motivo é que podemos dizer que as aprendizagens da
leitura e da escrita não são atividades isoladas, fazem parte de um
processo de desenvolvimento da linguagem, e suas dificuldades se
devem a uma deficiência qualquer na estruturação e na organização
da linguagem como um todo.

Distúrbios essencialmente neurológicos de Aprendizagem

Retardamento Mental

É um problema de maturação cerebral, de desenvolvimento


cerebral retardado, o que prejudica ou mesmo impede a aprendizagem
da linguagem.

Lesão cerebral

Dependendo da lesão ou do dano sofrido pelo cérebro, será


maior ou menor a gravidade do problema. Essa lesão poderá ser por
acidente e atingir um dos centros nervosos vitais da aprendizagem:
centros nervosos da fala, dos movimentos, da memória e da própria
aprendizagem, além dos centros sensoriais (audição, visão, olfato,
gustação, tato e equilíbrio).

Ausências ou disritmias (focos)

São distúrbios neurológicos de várias origens, tanto hereditárias


como adquiridas. Trata-se geralmente de uma modalidade de
epilepsia, que se apresenta sob múltiplas formas e vários graus de
intensidade: desde os mais leves até as crises de convulsão e
ataques.

44
As ausências são bastante comuns na primeira infância e em
escolares do e Ensino Fundamental. Consistem em alterações da
consciência em grau variado e de duração muito breve (2 a 15
segundos), que começam e terminam de modo brusco. Além da perda
da consciência, cessam todas as atividades motoras e cognitivas. São
geralmente conhecidas como focos, porque o exame
eletoencefalográfico acusa a presença de uma ou mais regiões
inativas do cérebro. Podem aparecer também no exame regiões de
grande excitabilidade.

Muitos autores, entre eles H.Wallen, consideram a irritabilidade


como a principal característica dos indivíduos epiléticos. Eles também
apresentam uma variabilidade de humor que oscila entre a cólera e a
amabilidade. Muitas vezes são hiperativos. Costumam também ter
distúrbios de atenção, instabilidade psicomotora e certa impulsividade.
Além disso, têm falta de iniciativa, lentidão intelectual e motora,
incapacidade de afastar-se das situações concretas (ver, pegar, contar
etc.) para compreender as explicações do professor. Quanto à
afetividade, os epiléticos são do tipo pegajoso, que se agarram às
pessoas e aos objetos que os rodeiam, por outro lado são explosivos e
costumam ser socialmente agressivos e violentos.

Disfunção cerebral mínima, genética ou congênita

Isto significa dizer um mau funcionamento do cérebro, devido a


fatores hereditários ou a malformações do embrião durante a vida
intra-uterina (problemas pré-natais), a traumas sofridos pelo feto na
hora do parto (problemas perinatais) ou ainda a problemas adquiridos
pelo indivíduo logo ao nascer (problemas pós-parto).

45
Segundo pesquisadores, os problemas de aprendizagem de
leitura e escrita poderão ser causados por um ou vários desses
fatores.

Se partirmos da premissa como Alan O. Ross, de que para toda


aprendizagem há envolvimento do cérebro, poderemos dizer que a
aprendizagem é uma função cerebral, de modo que, quando
encontramos algo errado nessa aprendizagem, o erro deverá ser
atribuído a algum tipo de mal funcionamento do cérebro, isto é, a uma
disfunção cerebral.

Função significa a ação normal, especializada, de um órgão ou


de um membro de uma pessoa viva. O termo disfunção foi utilizado
em lugar de lesão, porque a maioria dos distúrbios de aprendizagem
não se deve a uma causa traumática, irreversível, ou seja, a uma
lesão cerebral. São devidos a pequenos prejuízos da estrutura
cerebral. Por esse motivo, os defensores dessa hipótese, para explicar
as deficiências de aprendizagem, completam o termo com a palavra
mínima, para significar pequena, leve, diminuta. Daí a expressão
Disfunção Cerebral Mínima (DCM) para designar a causa desses
distúrbios.

“A Disfunção Cerebral Mínima é uma síndrome que aparece em


crianças com inteligência média ou superior à média, com problemas
de aprendizagem e/ou certos distúrbios de comportamento de grau
leve a severo, associados a discreto desvio do funcionamento do
sistema nervoso central

Os sintomas são combinações variáveis de déficits (deficiências)


de percepção, conceituação, linguagem, memória, controle da
46
atenção, dos impulsos ou da função motora. A DCM pode ou não ser
acompanhada de outros problemas neurológicos como: cegueira ou
surdez, paralisia cerebral, epilepsia ou retardo mental. Suas causas
são: variações genéticas, irregularidades bioquímicas, sofrimento do
feto na hora do parto, moléstias sofridas durante os anos de
maturação e desenvolvimento, ou causas desconhecidas”.

O que nos importa como educadores é que esta disfunção pode


se manifestar durante os anos escolares, principalmente na Educação
Infantil e no Ensino Fundamental, com uma variedade de dificuldades
especiais de aprendizagem.

Características da criança com Disfunção Cerebral Mínima

A criança com disfunção cerebral mínima pode apresentar o


seguinte quadro:

Distúrbios Neurológicos – A criança não possui coordenação motora


voluntária, isto é, não domina bem os movimentos. Tem dificuldade de
discriminação direita e esquerda (lateralidade). É geralmente uma
criança desajeitada, desastrada, cai muito, tem gestos bruscos e mal
medidos. Costuma quebrar lápis, arrancar botões, quebrar os
brinquedos, as aparelhos de TV, porque usa muita força ao manipulá-
los.

A hiperatividade ou hipercinesia é uma outra característica


marcante. A criança com DCM “não tem parada”. Quando sentada, faz
movimentos desnecessários com os membros superiores e inferiores
ou com os dedos: move o tronco, a cabeça, pisca os olhos, faz
caretas, tamborila na mesa etc. Esta hiperatividade é acompanhada

47
de murmuração constante ou canto monótono. Não consegue fixar as
idéias, não concentra a atenção e sua produção intelectual, por esse
motivo, é muito baixa.

Em exercícios de ginástica ou jogos, que exigem intensa


atividade motora, não se distingue bem o hiperativo. Sua
movimentação excessiva, entretanto, não é produtiva, pois significa
incapacidade de fixar a atenção na execução de um determinado
objetivo. Essa hiperatividade é também chamada síndrome
hipercinética. A criança com DCM apresenta também distúrbios da fala
e retardo na sua aprendizagem.

Distúrbios da Inteligência – Essas crianças fogem um pouco da faixa


normal de inteligência. Algumas podem apresentar problemas de
inteligência maiores do que realmente têm. Isso devido à dificuldade
de fixar sua atenção a distúrbios cognitivos e a um conjunto de
dificuldades escolares decorrentes deles.

Problemas de Comportamento – O convívio com essas crianças é


difícil. Seus familiares, professores e sobretudo as mães acabam por
apresentar comportamento emocionalmente alterado. Alguns pais são
muito tolerantes; outros muito rigorosos; outros ainda são displicentes.

A maioria dos pais tem para com a criança um comportamento


que varia de acordo com o comportamento que a criança revela
naquele momento. Apresentam, portanto, um comportamento
flutuante, que causa insegurança na criança e agrava seriamente seu
estado.

48
Os irmãos “normais” também colaboram para esse clima. A
criança é considerada o irmão desastrado, inábil nos esportes,
quebrador e destruidor de brinquedos, além de mau aluno. Como
reação, pode tornar-se submissa. Nesse caso ela se torna
dependente, triste e distraída. Ou então pode apresentar um
comportamento oposto, tornando-se indisciplinada, agressiva,
exibicionista, barulhenta, procurando enfim chamar a atenção. A
criança com DCM em geral recusa submeter-se às regras de boa
educação. Ela pode também tornar-se negativista e ausente para
livrar-se do controle dos adultos.

As manifestações da DCM costumam desaparecer com a idade.


Porém, muitas vezes não desaparecem, apenas atenuam. Quando
adultas, essas crianças tornam-se indivíduos irrequietos, brincalhões,
barulhentos e animados em demasia. Alguns conseguem superar
esses problemas; chegam até a universidade. Outros, entretanto,
interrompem os estudos e se isolam, chegando mesmo a ter um
comportamento anti-social.

Problemas escolares – A criança com DCM tem dificuldade de


concentração. Ela não consegue prestar atenção nas aulas e, embora
seja inteligente, não aprende.

Outras dificuldades associadas à DCM

Associadas à DCM, é comum encontrarmos a disgrafia, a


disortografia e a discalculia.

Disgrafia – É a dificuldade na utilização dos símbolos gráficos para


exprimir idéias. Caracteriza-se pelo traçado irregular das letras e pela

49
má distribuição das palavras no papel. A criança consegue copiar um
texto, porém quando esse mesmo texto é ditado, ou então quando
esse texto é uma dissertação, surgem sérios problemas de escrita.
Disgrafia é uma deficiência na qualidade do traçado gráfico. Fala-se
portanto, de crianças de inteligência média ou acima da média, que
por vários motivos apresentam uma escrita ilegível ou
demasiadamente lenta, o que impede um desenvolvimento normal da
escolaridade (Ajuriaguerra, 1977).

A disgrafia, também chamada de “letra feia”, não está


necessariamente associada a disortografia. No entanto, a criança que
tem dificuldades para escrever corretamente a linguagem falada,
apresenta geralmente uma disgrafia. Na maioria destes casos, a “letra
feia” é consequência das dificuldades para recordar a grafia correta
para representar um determinado som ouvido ou elaborado
mentalmente. Neste sentido, a criança escreve devagar, retocando
cada letra, realizando de forma inadequada as uniões entre as letras
ou, amontoando-as com o objetivo de esconder os erros ortográficos.
É possível, porém, encontrar crianças disgráficas que não apresentam
qualquer tipo de disortografia.

Principais características encontradas em crianças disgráficas:

a) Má organização da página: este aspecto está intimamente


ligado à orientação espacial. As crianças com dificuldade em
organizar adequadamente sua escrita numa folha de papel,
apresenta um distúrbio de orientação espacial. Sua escrita
caracteriza-se pela apresentação desordenada do texto com

50
margens mal feitas ou inexistentes, espaços entre palavras e
entre linhas irregulares e, escrita ascendente ou descendente.

b) Má organização das letras: a característica principal deste


aspecto é a incapacidade da criança em submeter-se às regras
caligrafas. O traçado apresenta-se de má qualidade, as hastes
das letras são deformadas, os anéis empelotados, letras são
retocadas, irregulares em sua dimensão (demasiado pequena ou
demasiado grande), desorganização das formas e, escrita
alongada ou comprida.

Disotorgrafia – É a incapacidade de apresentar uma escrita correta,


com o uso adequado dos símbolos gráficos. A criança não respeita a
individualidade das palavras. Junta palavras, troca sílabas e omite
sílabas ou palavras. A disortografia é a dificuldade do aprendizado e
do desenvolvimento da escrita expressiva. Esta dificuldade pode
ocorrer associada ou não a dificuldade de leitura, isto é, a dislexia.
Consideramos que 90% das disortografias têm como causa um atraso
de linguagem. Os 10% têm causa neuro-fisiológica.

Características das disortografias:

a) Troca de grafemas: geralmente as trocas de grafemas


representam fonemas homorgânicos, acontecem por problemas
de discriminação auditiva. Quando a criança troca fonemas na
fala, a tendência é que ela escreva apresentando as mesmas
trocas, mesmo que os fonemas não sejam auditivamente
semelhantes;

51
b) Falta de vontade para escrever;

c) Dificuldade em perceber as sinalizações gráficas


(parágrafos, travessão, pontuação e acentuação);

d) Dificuldade no uso de coordenação/subordinação das


orações;

e) Textos muito reduzidos;

f) Aglutinação ou separação indevida das palavras.

Discalculia – É o termo usado para indicar dificuldade em


Matemática. O aluno pode automatizar os aspectos operatórios (as
quatro operações, contas, tabuada), mas encontra dificuldade em
aplicá-los em problemas. Às vezes não consegue entender o
enunciado do problema, porque tem dificuldade de fazer a leitura do
mesmo. Para os disléxicos graves e para as crianças com DCM, até
as operações tornam-se difíceis, porque eles invertem os números ou
então sua sequência.

O portador de discalculia comete erros diversos na solução de


problemas verbais, nas habilidades de contagem, nas habilidades
computacionais, na compreensão dos números.

A matemática para algumas crianças ainda é um bicho de sete


cabeças. Muitos não compreendem os problemas que o professor
passa no quadro e ficam muito tempo tentando entender se é para
somar, diminuir ou multiplicar, não sabem nem o que o problema está
pedindo. Alguns, em particular, não entendem os sinais, muito menos
as expressões. Contas? Só nos dedos e olhe lá. Em muitos casos o

52
problema não está na criança, mas no professor que elabora
problemas com enunciados inadequados para a idade cognitiva da
criança. Em outros casos a dificuldade pode ser da criança e trata-se
de um distúrbio e não de preguiça como pensam muitos pais e
professores desinformados.

Subtipos de discalculia

A discalculia impede a criança de compreender os processos


matemáticos. Kocs (1998), classificou a discalculia em seis subtipos,
podendo ocorrer em combinações diferentes e com outros transtornos:

1) Discalculia Verbal – dificuldade para nomear as quantidades


matemáticas, os números, os termos, os símbolos e as relações.

2) Discalculia Practognóstica – dificuldade de enumerar,


comparar e manipular objetos reais ou em imagens
matematicamente.

3) Discalculia Léxica – Dificuldade na leitura de símbolos


matemáticos.

4) Discalculia Gráfica – Dificuldade na escrita de símbolos


matemáticos.

5) Discalculia Ideognóstica – Dificuldade em fazer operações


mentais e na compreensão de conceitos matemáticos.

6) Discalculia Operacional – dificuldade na execução de


operações e cálculos numéricos.

O psicopedagogo pode ajudar a criança com discalculia a elevar


sua auto-estima valorizando suas atividades, e descobrirá qual o
53
seu processo de aprendizagem, utilizando instrumentos que
ajudarão em seu entendimento.

Os jogos irão ajudar na seriação, classificação, habilidades


psicomotoras, habilidades espaciais contagem.

A criança com DCM luta na escola contra a intolerância dos


colegas e professores e em casa contra a impaciência dos
familiares. Quando seu nível mental é bom, ela consegue superar
essas perturbações, mas poderão persistir alguns sintomas como:
hiperatividade, desajeitamento, desorientação espacial, dislexia,
disgrafia e discalcalculia.

O professor deve ter muito cuidado ao fazer um “diagnóstico”


com base nestes sintomas, pois corre o risco de rotular a criança
injustamente. Às vezes a falha está na escola e não na criança.
Pode ser uma falha no método de ensino, na falta de motivação das
aulas, na falta de motivação/animação do professor ou no seu
despreparo para alfabetizar. Quando uma criança apresentar os
sintomas descritos, convém encaminhá-la a uma equipe
psicopedagógica para avaliação.

Deficiências de aprendizagem apresentadas por crianças com


DCM

Segundo Lefèvre e colaboradores, os problemas escolares


devidos à Disfunção Cerebral Mínima são problemas de evolução e
não podem ser confundidos com problemas de aprendizagem
devidos a retardo mental, distúrbios emocionais ou desajustamento
ambiental. Por esse motivo muitos autores, ao se referirem aos

54
distúrbios causados por DCM, utilizam a expressão “Deficiências
Específicas de Aprendizagem”.

As crianças com DCM têm os seguintes comportamentos de


verbalização:

 Geralmente falam muito alto;

 Conversam ininterruptamente;

 Reclamam dos colegas;

 Respondem ao professor sem serem chamadas;

 Dão palpite em tudo, mesmo não sendo solicitadas;

 Choram, gritam, cantam, assobiam e riem muito sem motivo;

 Xingam os colegas sem serem provocadas;

 Dizem palavrões;

 Ameaçam bater nos colegas e mesmo no professor;

Segundo relato de professores, essas crianças apresentam


os seguintes comportamentos motores:

 - Levantam da cadeira sem motivo;

 - Ficam de pé durante a aula;

 - Correm na sala ou saltitam no mesmo lugar;

 - Perambulam pela classe;

55
 - Algumas crianças destroem o seu material escolar, o dos
colegas e o da escola;

 - Dão pontapés, empurrão, beliscam, puxam os cabelos dos


colegas, mordem os colegas e até mesmo o professor.

Deficiências em linguagem

Falhas encontradas quanto ao reconhecimento das palavras:

 Troca de letras: d/b, m/n etc.;

 Omissão de sílabas: arvi por árvore;

 Repetição de letras ou sílabas: mesmimo por mesmo;

 Fragmentação das palavras: sa pa to por sapato;

 Contaminação: bonina menita em vez de bonita menina;

 Inversão de letras ou sílabas: cerébro por cérebro, camaco por


macaco.

Falhas na fluência da leitura:

 Omissões e repetições de palavras;

 Leitura repetida de linhas;

 Não utilização da pontuação correta e consequentemente


entonação inadequada.

Falhas na leitura silenciosa, em que a criança deve ler um texto


sentada, quieta, usando apenas os olhos, sem mover os lábios ou
apontar as linhas com o dedo:

56
 Leitura cochichada;

 Movimentação dos lábios;

 Leitura apontando as linhas com os dedos, lápis ou régua;

 Olhar dirigido para todos os lados durante a leitura;

 Brincadeiras com os colegas e muita distração durante a leitura;

 Interrupção da leitura, porque a criança levanta-se muitas vezes


do lugar.

Falhas na leitura compreensiva, em que a criança deve efetuar


tarefas demonstrando entendimento do que leu em silêncio:

 Em alguns casos, a criança demonstra total inabilidade para


reproduzir o que leu, tanto oralmente como por escrito;

 Em outros, demonstra inabilidade parcial para reprodução,


necessitando de apoio do professor para lembrar a sequência;

 Todas as crianças demonstram inabilidade para reproduzir


detalhes.

Na interpretação de texto lido, constata-se dificuldade para


determinar a idéia principal. Não conseguem estabelecer relações
de espaço e de tempo, nem a sequência cronológica da história ou
as relações de causalidade da mesma.

57
Falhas nos movimentos e na forma das letras escritas em
cópia e ditado:

 Postura corporal: inclinação excessiva da cabeça e do tronco


para a frente e deslocamento dessas partes do corpo para o
lado.

 Modo de segurar o lápis; com pouca força; com muita força;


muito perto da ponta do lápis ou muito longe desta, com os
dedos crispados;

 Colocação do papel na mesa: muito inclinado em relação ao


corpo;

 Ritmo de trabalho; muito rápido e por isso malfeito; ou


excessivamente lento pela dificuldade de traçar letras;

 Traçado das letras; falhas quanto ao tamanho das letras, à


pressão do lápis e à precisão do traçado; letras muito
irregulares;

 Forma das letras: distorções, substituição da forma por outras


semelhantes, omissão de detalhes (cedilha, pingo ou i etc);

 Colocação das letras: muito separadas ou muito juntas, sem


ligações dentro da palavra;

 Colocação da escrita na folha: não respeitam margem nem


parágrafos. O espaçamento entre as palavras é irregular, umas
unidas, outras bem distantes.

58
Essas falhas são atribuídas à falta de controle postural, de
coordenação motora fina, de integração visomotora, de
representação mental do movimento, de percepção e organização
visual do espaço. No nível da aprendizagem, elas são decorrentes
da realização imperfeita dos movimentos necessários para a
escrita.

Dislexia

“Entende-se por dislexia específica ou dislexia de evolução um


conjunto de sintomas reveladores de uma disfunção parietal (o lobo do
cérebro onde fica o centro nervoso da escrita), geralmente hereditária,
ou às vezes adquirida, que afeta a aprendizagem da leitura num
contínuo que se estende do leve sintoma ao sintoma grave. A dislexia
é frequentemente acompanhada de transtornos na aprendizagem
escrita. As crianças são incapazes de ler com a mesma facilidade que
seus colegas da mesma idade, embora possuam inteligência normal,
saúde e órgãos sensoriais perfeitos, estejam em estado emocional
considerado normal, tenham motivação normal e instrução adequada.

Ao que parece, por trás desses problemas específicos de


aprendizagem, existe sempre um fator biológico, hereditário, isto é, há
uma tendência de a mesma dificuldade ocorrer em outros membros da
família. Nos experimentos feitos em 1976, por Finucci e
colaboradores, com 16 crianças de um grupo de 20 disléxicos,
chegou-se ao seguinte resultado: 3 crianças tinham ambos os pais
com retardo na leitura; 10 tinham um dos pais com retardo de leitura e
3 não tinham nenhum dos pais retardado em leitura.
59
O termo dislexia, que não está isento de ambiguidade, de
utilização exagerada e, às vezes, de uma carga adicional nas
famílias que têm membros com esse transtorno, agrupa o que de
maneira mais ampla, mas talvez mais precisa, entendemos por
problemas lectoescritores ou problemas na aprendizagem e
desenvolvimento da habilidade lectoescritora.

Os sintomas ou condutas mais frequuentes que caracterizam


a dislexia são estes: omissões (de letras, sílabas ou palavras),
uniões ou separações incorretas (de letras, sílabas ou palavras),
confusões (espaciais e auditivas), adulterações, dissociações,
inversão espacial de letras, acréscimos, ritmo acelerado ao ler,
compreensão leitora deficiente, grafia incorreta e/ ou desordenada.

Conceitualmente, mesmo reconhecendo que como dislexia


denominamos fenômenos diversos, poderia ser definida como a
dificuldade na aprendizagem da leitura e escrita em sujeitos não
afetados por déficits sensoriais ou mentais e com idade suficiente para
a conquista dessas aprendizagens. Então, são sujeitos com idade
mental normal, sem problemas adicionais e bem escolarizados.

A etiologia da dislexia é inespecífica. Uma criança disléxica


se caracteriza, precisamente, por não saber ler/escrever corre-
tamente apesar de não ter deficiência perceptiva, motora ou
intelectual. Uma série de hipóteses foi levantada para explicar a
dislexia, mas nenhuma delas se confirmou empiricamente de
maneira objetiva e determinante. Entre essas hipóteses estão as
seguintes:

 Disfunção em áreas de associação parietoccipital em


60
termos de sistema nervoso central.

 Imaturidade por atraso na mielinização.

 Causas genéticas (fundamento: existem muito mais


meninos disléxicos do que meninas, assim como
frequência de irmãos com esses problemas).

 Desorientação espaço-temporal. Lateralização falha e


má organização perceptivo-espacial.

 Desequilíbrio funcional hemisférico. A criança disléxica


prestaria atenção na imagem hemisférica contrária.

 Modo de processar a informação em alguns sujeitos.


Os disléxicos a processariam de maneira mais lenta e
menos precisa.

Outras hipóteses apelam para a origem escolar: exigências


excessivas, mudanças de escola e/ou professor, métodos de
ensino da lectoescrita, problemas de bilinguismo, etc. Alguns
problemas afetivos são apresentados como geradores de certas
dislexias.

Talvez seja conveniente falar, a partir do estado atual da


questão, de várias dislexias (de acordo com sua origem,
sintomas e evolução), e não de dislexia como conceito unívoco, de
maneira que aquelas hipóteses poderiam não ser contrárias, mas
complementares entre si.

61
As características gerais (todas ou algumas) que
acompanham a criança disléxica costumam ser:

 Lateralização incorreta.

 Esquema corporal deficiente.

 Transtornos na percepção.

 Desorientação espaço-temporal.

 Problemas na percepção e execução de fonemas.

 Dificuldade no ritmo de leitura e escrita.

 Atenção dispersa e irregular.

 Dificuldade para associar e globalizar as aprendizagens.

 Dificuldade para a expressão correta do pensamento.

 Execução pobre de desenhos, rígida e carente de


perspectiva.

 Problemas afetivo-emocionais associados.

Outras hipóteses apelam para a origem escolar: exigências


excessivas, mudanças de escola e/ou professor, métodos de
ensino da lectoescrita, problemas de bilinguismo, etc. Alguns
problemas afetivos são apresentados como geradores de certas
dislexias.

• Talvez seja conveniente falar, a partir do estado atual da


questão, de várias dislexias (de acordo com sua origem, sintomas
e evolução), e não de dislexia como conceito unívoco, de maneira
62
que aquelas hipóteses poderiam não ser contrárias, mas comple-
mentares entre si.

Principais dificuldades de leitura. Estas podem ser de três tipos:

1) Atraso geral de leitura, ocasionado por baixa inteligência.


Caracteriza-se pela dificuldade de leitura de palavras isoladas
e pela dificuldade de compreensão de textos. Essa criança
tem também atraso em todas as outras aprendizagens.

2) Atraso específico de leitura, que compreende dificuldades na


leitura de palavras isoladas e na compreensão do texto. Não
significa que a criança não seja inteligente para outras
aprendizagens. Seu atraso é apenas em leitura e escrita.

3) Dificuldades de compreensão, que apenas se referem a


dificuldade de entender o texto, embora ela consiga ler textos
ou palavras isoladas.

Quanto às dificuldades de ortografia, elas podem ser de dois


tipos:

1) Atraso de leitura e ortografia, que consiste na dificuldade de


ler e escrever palavras isoladas;

2) Atraso de ortografia, que se refere apenas ao atraso na


escrita.

Na dislexia em geral, a dificuldade de leitura persiste até a idade


adulta. A dificuldade de ortografia geralmente acompanha a de leitura,
o que é compreensível por serem habilidades relacionadas. Muitas
pessoas aparentemente normais, ou mesmo com grande capacidade

63
de leitura, podem apresentar dificuldade de ortografia. Até mesmo
professores podem apresentar esse problema.A dificuldade de leitura
pode aparecer em qualquer idade, porém quase todas as pesquisas
existentes foram feitas em crianças.

A incapacidade de ler está intimamente ligada aos seguintes


fatores:

 Capacidade intelectual (inteligência);

 Percepção visual e auditiva (boa visão e boa audição);

 Noção de esquema corporal (conhecimento das partes do


corpo);

 Orientação no tempo e no espaço (sucessão de acontecimentos


ou eventos);

 Linguagem e conhecimento do código linguístico (conhecimento


das letras, dos sinais);

 Fatores emocionais que acompanham todos os outros.

O disléxico tem geralmente a seguinte história de vida:

1) Algum parente próximo com a mesma deficiência de linguagem.

2) Nasceu provavelmente de um parto difícil, em que pode ter


ocorrido algum destes problemas:

 Anoxia, ou seja, asfixia relativa;

 Prematuridade do feto ou peso abaixo do normal;

64
 Hipermaturidade, ou seja, o nascimento passou da data prevista
para o parto.

3) Adquiriu, quando criança, alguma doença infectocontagiosa, que


tenha produzido convulsões ou perda de consciência.

4) Atraso na aquisição da linguagem ou perturbações na


articulação da mesma.

5) Atraso para andar.

6) Problemas de dominância lateral (uso retardado da mão


esquerda ou direita).

Para Sammuel Orton, a dislexia seria explicada por uma


inadequada instalação da dominância lateral (lateralidade). Orton
inspirou-se nos trabalhos de Broca (o mesmo que descreveu o centro
da articulação da palavra em 1985). Em sua tese, Broca admite que o
predomínio funcional de um lado do corpo se deve não à educação,
mas sim à supremacia de um hemisfério cerebral sobre o outro.

A escrita em espelho, o retardo da linguagem e a gagueira são


também explicáveis por esse conflito de dominância dos hemisférios
cerebrais .

Alguns erros de leitura e escrita encontrados na dislexia

 Confusão de letras, sílabas ou palavras com pequenas


diferenças de grafia: a/o, e/f etc.

 Confusão de letras, sílabas ou palavras com grafia semelhante,


porém com orientação espacial diferente; b/d, p/b, b/q etc.

65
 Confusão de letras que possuem sons parecidos: b/d, p/q, d/t,
m/b etc.

 Inversão parcial ou total de sílabas ou palavras: me em vez de


em, sol em vez de los, som em vez de mos etc.

 Substituição de palavras por outras estruturas mais ou menos


semelhantes: salvou no lugar de saltou, sentiu no lugar de
mentiu.

 Contaminação de sons: lalito em vez de palito.

 Adição ou omissão de sons, sílabas ou palavras: casa em vez de


casaco, neca em vez de boneca etc.

 Repetição de sílabas, palavras ou frases: mamacaco, paipai.

 Salto de linha, volta à linha anterior e perda da linha durante a


leitura.

 Acompanhamento com o dedo da linha que está sendo lida.

 Leitura do texto palavra por palavra.

 Problemas de compreensão do texto.

 Escrita em espelho (em sentido inverso ao normal).

 Letra ilegível.

 Leitura analítica e decifratória. Quando lê silenciosamente, a


criança não consegue deixar de murmurar ou mover os lábios,
pois precisa pronunciar as palavras para entender o seu
significado.

66
Através de técnicas terapêuticas, a maioria dos disléxicos pode
chegar a ler e até a estudar. Para isso porém, deverá se esforçar
muito. Grande parte dos disléxicos não tem gosto pela leitura, nem é
capaz de dominar a leitura e a ortografia de uma segunda língua
(língua estrangeira).

Se o disléxico não for submetido a uma instrução especializada,


pode permanecer analfabeto ou semi-alfabetizado. Geralmente os
disléxicos ficam excluídos das profissões e vocações que exigem uma
preparação acadêmica.

Distúrbios da motricidade

Segundo Dalila Costsllst, psicomotricidade é a ciência da


educação que focaliza a unidade indivisível do homem: soma (corpo) e
psique (espírito), educando o movimento e ao mesmo tempo pondo
em jogo as funções intelectuais (pensamento).

Temos então na psicomotricidade a ligação do movimento com o


pensamento. Aliás, o primeiro estágio de desenvolvimento humano é o
sensoriomotor, no qual as crianças se orientam pelos sentidos e pelo
movimento. Portanto, as primeiras evidências do desenvolvimento
mental são manifestações motoras. “A criança conhece o mundo
através de suas ações, de seus movimentos”. (Piaget)

Depois que a criança completa 3 anos, a inteligência, que era


função imediata do sistema neuromuscular, passa a se separar da
motricidade. Só nos casos de quociente intelectual baixo é que iremos
encontrar rendimento motor também baixo (mantendo-se o
paralelismo psicomotor).

67
Os transtornos psicomotores compreendem as funções
psíquicas e neurológicas, além de um atraso na maturação do sistema
nervoso central. Sua principal característica é a falta de coordenação
entre o que o indivíduo pretende fazer e a ação propriamente dita, o
que dificulta a capacidade de expressar-se através do corpo. Isso
provoca distúrbios afetivos e também problemas de aprendizagem.

Transtornos na psicomotricidade:

 Atraso de maturação;

 Hiperatividade esquema corporal;

 Percepção visual;

 Orientação e estruturação do espaço e do tempo;

 Organização temporal.

Atraso de maturação

Para H.Bucher, os atrasos do processo de maturação fazem parte


do processo evolutivo global do indivíduo, compreendendo seu
desenvolvimento motor, psicoafetivo, suas motivações e suas
experiências já vivenciadas. A criança apresenta dificuldades de
movimentação das mãos e dos dedos, é emocionalmente instável,
além de apresentar desinteresse e indiferença pelos assuntos
escolares.

Hiperatividade

É um dos distúrbios mais frequentes em crianças com transtornos


motores. A hiperattividade é uma perturbação psicomotora. Esse

68
comportamento não aparece apenas pelo excesso de atividade, de
“falta de parada” da criança, mas também nos seus movimentos em
direção aos objetos e do seu próprio corpo.

As crianças hiperativas têm descontrole motor acentuado, o que faz


com que elas tenham movimentos bruscos e inadequados, expressão
facial descontrolada, fala e respiração entrecortadas, mudanças
frequentes de humor e instabilidade afetiva. Elas passam, por
exemplo, de uma crise de raiva para demonstrações de carinho, do
choro ao riso, e vice-versa.

Esquema corporal

É a capacidade que o indivíduo tem de conhecer seu corpo, as


partes desse corpo e a utilização dessas partes. Nosso corpo é o
nosso principal ponto de referência no espaço. Se não tivermos a
noção das partes do nosso corpo e da posição dessas partes, não
poderemos perceber os objetos nem identificar sua posição no
espaço.

O esquema corporal depende de estímulos cinestésicos (dos


músculos), dos estímulos que recebemos do exterior e que agem
sobre o nosso organismo (sensação tátil, térmica e dolorosa) e de
estímulos sensoriais (principalmente visão e audição). Ainda
recebemos estímulos do interior do nosso corpo (das vísceras).

Tanto o equilíbrio resultante da coordenação dos nossos


movimentos, quanto a discriminação das sensações dependem do
esquema corporal, que também é chamado imagem do corpo. Para
avaliar a imagem que uma criança faz de si mesma, de seu corpo,

69
utiliza-se o teste da figura humana, de Goodenough. O desenho da
criança pode revelar, em termos, a idéia que ela faz de seu corpo,
suas experiências corporais e também seus conflitos.

No esquema corporal devemos considerar ainda a noção de


lateralidade (noção de direita e esquerda). Nos destros a dominância é
da mão direita, enquanto nos sinistros (canhotos) o domínio é da mão
esquerda. A escrita dos destros vai da esquerda para a direita. A dos
canhotos, ao contrário, vai da direita para a esquerda.

Como a tendência natural é escrever no plano horizontal, da


direita para a esquerda, os canhotos podem apresentar o que se
chama de escrita espelhada (escrita como se fosse vista ao espelho).
A criança canhota, que é obrigada a escrever com a mão direita, pode
ter problemas de eficiência motora, de orientação corporal e de
estruturação espacial. Alguns autores consideram esse fato
responsável pela gagueira e aconselham que a criança volte a usar a
mão dominante, que no caso é a esquerda.

Percepção

As percepções são os instrumentos que o ser humano tem para


comunicar-se com o mundo exterior. São portanto, necessárias e
imprescindíveis. Dentre elas a visão é a que tem o papel mais
destacado. O maior progresso da criança em termos de visão é entre
3 anos e meio e 7 anos e meio de idade. Às vezes os órgãos da visão
são anatomicamente normais, porém a criança apresenta retardo no
desenvolvimento da percepção visual. Outras vezes são perturbações
visuais causadas por doenças dos olhos.

70
O atraso do desenvolvimento visual da criança com dislexia ou
com deficiência cerebral mínima poderá estar relacionado com a sua
reduzida capacidade de atenção. Porém, um outro componente
importante é a memória, porque nas percepções o desenvolvimento se
dá com base nas experiências anteriores do indivíduo, que devem ser
guardadas no centro nervoso da memória. Se a criança não tem a
capacidade de fixar a atenção, nem de reter na memória essas
experiências, ela acabará por prejudicar o desenvolvimento geral de
sua capacidade visual.

De acordo com Marianne Frosting, a criança que tem desordens


na percepção visual pode ter cinco tipos de distúrbios que atuam de
maneira isolada ou combinada e que se constituem em problemas de
aprendizagem. Ela poderá apresentar distúrbios de :

 Coordenação visomotora;
 Percepção figura-fundo;
 Percepção da constância;
 Percepção da posição no espaço;
 Percepçãp das relações espaciais.

Coordenação visomotora

É a coordenação dos movimentos das mãos e do corpo em


conjunto com os olhos. Quando traçamos uma linha, os olhos seguem
a ação da mão até atingir o alvo. Isso implica em atenção. Os alunos
que têm problemas de coordenação motora não conseguem traçar
linhas com trajetória predeterminada, nem que se esforcem. Não

71
conseguem também, seguir um objeto com os olhos, quando ele se
desloca na sua frente. Como na aprendizagem da leitura e da escrita
esses movimentos são indispensáveis, a criança que não conseguir
fazê-los terá problemas na aprendizagem da linguagem. A destreza
manual depende dessa coordenação olho-mão.

Percepção figura-fundo

É a capacidade de destacar de um conjunto e de elementos uma


figura, sem deixar que os outros elementos interfiram. A figura,
portanto, ganha destaque dentro de um fundo. Essa percepção
também depende das experiências anteriores, dos objetos que a
criança já conhece e que por isso destaca com mais facilidade. Por
exemplo, descobrir em uma gravura animais escondidos entre
folhagem de uma árvore.

Percepção da constância

É a capacidade de identificar um mesmo objeto em situações


diferentes, ou seja, independentemente de suas características de
forma, cor e tamanho. Apesar de as condições de percepção serem
diferentes, os objetos permanecem os mesmos. As crianças que têm
problemas de percepção da constância têm dificuldade em reconhecer
as letras quando elas mudam de forma, tamanho ou cor. Também em
relação às formas geométricas, sofrem esse mesmo problema.

Percepção da posição no espaço

É a capacidade que o indivíduo tem de relacionar-se com os


objetos que o cercam. Para isso precisa perceber as características
dos objetos (tamanho, forma, cor etc.) e a relação do seu próprio

72
corpo com os objetos. Aqui interferem a capacidade cinestésica (dos
músculos) e do equilíbrio. Os objetos podem se localizar na frente,
atrás, em cima, em baixo, à esquerda e à direita de um ponto de
referência.

A posição dos objetos no espaço requer o conhecimento do


esquema corporal, pois nosso corpo é o nosso ponto de referência. Se
a criança não tiver essa noção, além de não perceber as posições dos
objetos no espaço, ela não conseguirá perceber as posições das letras
na sala de aula. Isso porque ela não tem capacidade de orientação
espacial. Ela confunde b com d, p com q, ou então inverte as sílabas
ou pode até mesmo escrever em espelho. Essa criança terá, portanto,
problemas na aprendizagem da leitura e da escrita.

Percepção das relações espaciais

É a capacidade de perceber a posição de dois ou mais objetos


no espaço e a relação existente entre eles, ou com o próprio corpo. A
exploração total do espaço depende dos movimentos dos olhos, da
cabeça e do corpo, além de requerer boa memória visual. Para
compor um quebra-cabeça, por exemplo, precisamos da memória e da
percepção visual. Estas são indispensáveis para sabermos a posição
das peças em relação às outras partes da figura e em relação a nós
mesmos. As crianças que têm dificuldade de percepção espacial nas
relações espaciais não percebem a sequência das letras ou dos
números. Além disso, têm problemas para copiar, para fazer contas
etc.

73
Orientação e estruturação do espaço e do tempo

Por orientação e estruturação do espaço e do tempo, podemos


entender as noções que a criança tem de direita, esquerda, frente,
trás, alto, e baixo (espaço), antes, depois, ontem, hoje e amanhã
(tempo). Aqui a motricidade é um fator importante, além da visão e do
tato. Ao manipular os objetos, as crianças estão exercitando suas
percepções e adquirindo a representação mental desses mesmos
objetos.

Quando a criança não tem esse desenvolvimento em ritmo


considerado normal, ela apresenta distúrbios que se revelam através
dos desenhos, recortes, encaixes, quebra-cabeças e atividades que
impliquem em sentido de direção. Seus desenhos e pinturas são mal
estruturados. Tem muita dificuldade em recortar com a tesoura. Acha
os encaixes e os quebra-cabeças muito difíceis e não consegue fazê-
los. Não tem sentido de direção.

Todas essas dificuldades vão se refletir na aprendizagem da


leitura e da escrita: a criança não consegue executar corretamente o
traçado das letras, inverte-as e escreve torto no papel, sem saber
utilizá-lo. Ela tem muita dificuldade nas atividades que exigem cálculo,
pois não consegue dispor os números uns debaixo dos outros, em
uma soma, por exemplo. Não tem noção de direita e esquerda.

Tais deficiências refletem na vida prática: essas crianças não


conseguem se orientar sozinhas, perdendo-se com frequência. Como
não conseguem fazer nada corretamente, acabam por perder o
interesse nos estudos e principalmente no que exige iniciativa ou
criatividade.
74
Organização temporal

São as noções de tempo, duração, sucessão, periodicidade. Os


distúrbios de organização temporal são também chamados distúrbios
de ritmo.

Segundo Lefèvre, o ritmo da pessoa pode ser considerado em


três níveis:

1) Tempo ou ritmo biológico – quando falamos em sucessão de


estágios de desenvolvimento, cada pessoa tem seu ritmo próprio,
rápido ou mais lento.

2) Tempo externo ou cronológico – este é universal e impessoal. É


o tempo a que todos nós estamos sujeitos, medido pelos relógios e
calendários.

3)Tempo interno ou psicológico – é o sentimento que temos em


relação ao tempo vivido. É uma noção afetiva e subjetiva. Cada um
tem o seu tempo interno. Não se trata de uma noção real de tempo.
Sua duração vai depender da nossa expectativa em relação a um
determinado acontecimento. Ele passará depressa ou mais devagar,
conforme nosso desejo de que alguma coisa aconteça ou não
depressa.

Os ritmos interno e externo podem entrar em conflito e ocasionar


dificuldade de relacionamento com outras pessoas. É o caso de uma
criança que não consegue seguir o ritmo imposto na sala de aula. Ela
estará sempre atrasada em relação aos colegas. Isso a tornará tímida
ou revoltada. Ela passará a apresentar um mau rendimento nos
estudos e perturbações na leitura, escrita e articulação das palavras.

75
A linguagem é inseparável do ritmo. As palavras constituem uma
sequência sonora tempoespacial; as frases são uma sucessão de
palavras, portanto também obedecem a uma ordem temporal. A
linguagem colabora com a capacidade que temos de expressar
nossas lembranças, de exercitar nossa memória. Ela é inseparável da
memorização e esta é imprescindível na formação da linguagem
infantil. A criança precisa recordar as suas experiências anteriores
para estabelecer semelhanças entre os objetos e conseguir nomeá-
los.

Se a criança não tiver desenvolvido a organização temporal, ela


terá dificuldade na aprendizagem da fala e na capacidade de falar de
um modo geral. O pensamento lógico, que é grandemente auxiliado
pela linguagem, permite que a criança desenvolva a organização do
tempo. Ela poderá ficar esquecida, a ponto de não conseguir
estabelecer a sequência temporal de um recado, por exemplo.

A dificuldade no ritmo faz com que a criança encontre dificuldade


na leitura e na escrita: ela não conseguirá discriminar os sons
semelhantes das letras, não terá ritmo certo na leitura, nem entonação
de voz correta na pontuação.

Outras causas das dificuldades de linguagem e de aprendizagem


geral

Existem outras causas das dificuldades de linguagem, que não são


ocasionadas por distúrbios neurológicos. As principais são:

 Incapacidade geral de aprender (falta de inteligência);

 Imaturidade do sistema nervoso (maturação);

76
 Alterações sensoriais ou físicas (órgãos dos sentidos e
membros);

 Distúrbios da fala;

 Distúrbios emocionais;

 Carência cultural;

 Métodos e técnicas de ensino deficientes;

 Falta de motivação ambiental;

 Falta de motivação dos alunos;

 Fatores ambientais gerais.

Incapacidade geral de aprender

Esta é a causa mais grave, pois está relacionada com a


inteligência do indivíduo. Seu quociente de inteligência (QI) é muito
baixo. Por isso ele não consegue aprender a ler, a escrever, nem
desenvolve outras habilidades que impliquem em atividade intelectual.

Imaturidade geral para aprender, ligada à imaturidade do sistema


nervoso

Muitas vezes a criança apresenta-se imatura para iniciar a


aprendizagem da linguagem. Por esse motivo não se aconselha a
alfabetização em idade pré-escolar (até 6 anos completos). Além
disso, é muito importante matricular as crianças na 1ª série do Ensino
Fundamental, baseando-se em sua idade mental (6 anos e meio) e
não em sua idade cronológica. Há crianças que com 6 anos e meio

77
ainda pensam como uma criança de 5 anos, sendo portanto imaturas
para a alfabetização.

Alterações sensoriais ou físicas

Essas alterações influem muito no sucesso da aprendizagem. É


preciso, portanto, observar o estado geral da criança, levando em
conta suas deficiências ou perturbações de saúde física, sobretudo os
distúrbios dos órgãos dos sentidos, como perdas graves da visão e da
audição e doenças como a desnutrição crônica. Só a partir dessas
observações é que a criança poderá ser considerada apta ou não para
a aprendizagem da linguagem.

Distúrbios da fala

Esses distúrbios prejudicam muito a aprendizagem,


principalmente da leitura. Segundo a fonoaudióloga Lígia Zernik
Ometto Pavan, os distúrbios da fala e da audição devem ser
detectados o mais cedo possível para que não interfiram na
aprendizagem da criança. A fase de aquisição da linguagem da
criança vai de mais ou menos 10 meses até mais ou menos 5 anos de
idade, quando ela terá adquirido todos os fonemas da fala.

A criança começará adquirindo os sons do p, m, t, b, d etc. em


palavras como: papai, mamãe, tatu, bola e outras. Por último, ela
adquire os sons do r, lh, l etc. em palavras como; barata, palhaço, lata
e outras.

Espera-se que uma criança por volta de 5 anos já saiba usar


corretamente todos os fonemas da língua. Isso não ocorrendo significa
que ela poderá ter um distúrbio ou um retardo de linguagem. Esses

78
distúrbios são causados por falta de estimulação, má discriminação
auditiva ou inabilidade motora da criança.

É muito comum encontrarmos trocas ou omissões de fonemas


que devem ser detectados e trabalhados o mais cedo possível para
que não atrapalhem a alfabetização. Uma criança que está sendo
alfabetizada, apresentando um distúrbio qualquer na fala, poderá
transferi-lo para a escrita. Por isso é muito importante que o professor
observe a fala da criança durante a educação infantil. Assim ele estará
evitando futuros problemas na época da alfabetização.

Não só a fala, mas também a postura das crianças deve ser


observada. Se elas se mantiverem sempre de boca fechada, quando
estão fazendo um desenho ou uma pintura, ou mesmo comendo, isso
garantirá um tônus adequado dos órgãos fonoarticulatórios. Lábios,
língua e bochecha são formados por músculos. Se a criança ficar de
boca aberta o tempo todo, estes músculos vão ficar hipotônicos, ou
seja, a criança vai ficar com a língua para fora da boca, além de não
controlar a baba, de apresentar distorções na fala e deformações na
arcada dentária. Isso porque a língua vai empurrando os dentes para a
frente. Mantendo a boca fechada, o tônus destes músculos
automaticamente é mantido, evitando-se assim tais problemas.

A gagueira – um dos mais comuns transtornos da fala

Dentre os distúrbios da fala, a gagueira sempre foi muito


discutida. É importante saber que uma criança por volta de 4 anos
pode ou não apresentar o que chamamos de disfluência fisiológica, o
que é normal na sua idade.

79
Esta disfluência deve ser encarada com muita naturalidade pelos pais
e professores, que devem dar tempo à criança, permitindo que ela fale
como quiser, mesmo que para isso tenham que lhe dedicar alguns
minutos a mais.

Dados estatísticos revelam que a incidência da gagueira é maior


em meninos do que em meninas, na proporção de dois meninos para
uma menina, portadores desse distúrbio.

Até hoje não se sabe realmente qual a causa da gagueira. Há


várias teorias sobre o assunto, tanto bioquímicas como fisiológicas. Há
ainda a teoria de Kopp, que é neurológica e que atribui a gagueira a
retardos e deficiências motoras mais ou menos graves.

Não há provas de que a gagueira seja transmissível por herança


genética, embora as estatísticas demonstrem que há maior número de
gagos entre famílias de crianças com esse distúrbio. Mas isso parece
ser devido à ansiedade dos pais gagos, que manifestam exagerada
preocupação ao menor distúrbio da fala apresentado pelos filhos, com
receio de que eles também apresentem o mesmo problema. Essa
atitude apenas provoca ansiedade na criança, o que pode acabar
determinando a instalação de uma gagueira permanente, não de
origem hereditária, mas desencadeada pelo comportamento
emocional dos próprios pais.

A gagueira pode ser um sinal da rivalidade existente entre os


dois hemisférios cerebrais, que lutam pela dominância da lateralidade.
Esta luta pela dominância pode ser congênita, ou adquirida, nas
crianças canhotas forçadas a usar a mão direita.

80
A hipótese mais aceita, entretanto, parece ser a que atribui a
gagueira a uma predisposição do indivíduo. Nesse caso ela costuma
manifestar-se em crianças sensíveis e emotivas que, quando
submetidas a pressões, desestabilizam-se emocionalmente. Seus
conflitos interiores podem então expressar-se sob forma de tiques
nervosos ou de gagueira.

A família tem um papel muito importante no componente


emocional da criança, podendo ser a responsável pela criação de um
clima inadequado à formação de sua personalidade. Um problema de
gagueira apresentado por uma criança pré-escolar pode ser resolvido
com uma boa orientação feita por um profissional aos pais e
familiares. Isso geralmente é suficiente para restabelecer a segurança
emocional da criança e fazer com que ela readquira a fala normal. Nos
casos mais graves, a criança deverá ser submetida a um tratamento
fonoaudiológico.

Outros transtornos da fala

Transtornos da articulação – Estes podem ser causados por


problemas:

 anatômicos – malformação dos órgãos da boca e defeitos na


laringe, por exemplo;

 sensoriais – comprometimento dos órgãos dos sentidos, como


por exemplo da audição;

 motores – deficiência no movimento dos maxilares, o que


impede a articulação correta das palavras;

81
 funcionais – qualquer distúrbio do funcionamento dos órgãos
envolvidos na fala.

Consistem na dificuldade em pronunciar os fonemas, que podem


ser trocados ou suprimidos. A criança que tem algum transtorno da
audição pode encontrar dificuldade na discriminação dos sons, o que
consequentemente dificultará sua articulação.

Transtornos da linguagem por deficiência de audição

A criança que tem uma grave deficiência de audição também


não fala (mutismo). Quando essa deficiência auditiva é parcial, a
criança pode falar, porém sua fala é mal articulada.

Transtornos da fala por lesões cerebrais evidentes

Quando o indivíduo tem uma lesão cerebral grave, como o


idiotismo, ele não fala. A imbecilidade e a debilidade mental também
causam pobreza de vocabulário, além de defeitos sintáticos. Ambos
são devidos a lesões cerebrais.

Atraso da fala

Há crianças que adquirem muito tarde a capacidade de falar (aos


3 ou 4 anos). E quando falam, ainda conservam por muito tempo as
características da linguagem infantil.

Disfasia

A criança possui inteligência e audição normal, porém sua fala


não evolui. Isto se deve a um transtorno na recepção e na análise do
material audioverbal.

82
Mutismo nas crianças

Mutismo total, adquirido e geralmente de origem histérica, emocional.


Aparece após um forte choque emocional ou é proveniente da auto-
sugestão de que uma infecção do aparelho fonador (laringe) é uma
doença muito grave e devido a ela a pessoa não pode falar.

 Mutismo por opção, que aparece em crianças muito


sensíveis e impressionáveis. Crianças a partir de 3 anos
podem adquiri-lo como forma de protesto às desatenções dos
pais. É mais comum ocorrer em crianças de 6 anos, na época
em que começam a frequentar a escola de ensino fundamental.
É também de origem emocional.

Há também o mutismo total causado por deficiência dos órgãos da


fonação ou por lesão de nervos ou do próprio centro da fala; centro
nervoso da articulação da palavra.

Distúrbios emocionais

A angústia e a depressão podem aparecer desde a infância. É


principalmente a sensação de insegurança que mais perturba as
crianças. Estes sentimentos podem ser causados pela própria família
ou pela escola. Os pais muito severos, exigentes ou ansiosos podem
originar na criança medo do professor, fobia da escola ou insegurança.
A escola por sua vez, por seu ambiente de disciplina, de estudo
obrigatório, de regras e ordens, pode ter uma influência negativa na
criança, como por exemplo excessivo absenteísmo, ou seja, falta de
atenção, alheamento, distração.

83
Carência cultural

Carência cultural é o que se convencionou chamar de falta de


um currículo oculto, ou seja, de uma bagagem de conhecimentos que
são considerados pré-requisitos para a alfabetização. Se a família da
criança tiver um vocabulário pobre (código linguístico restrito0, com
muitas palavras incorretamente pronunciadas, essa criança terá como
modelo esse tipo de fala e seu vocabulário ficará também muito pobre.
Se ela não conseguir reunir uma boa soma de estímulos visuais e
sonoros (livros, revistas, discos, TV) que lhe proporcionem
experiências estimuladoras para a audição e para a visão, não terá a
necessária bagagem para formar conceitos, emiti-los e fazer-se
entender pelos outros (código linguístico elaborado). Estas carências
irão ter influência na época de sua alfabetização, quando ela
encontrará mais dificuldade em escrever corretamente, uma vez que
não fala corretamente.

Falta de motivação ambiental

A estimulação do ambiente é um fator preponderante no


processo geral de ensino-aprendizagem. Para motivar a
aprendizagem, são necessários estímulos visuais e auditivos, de
material concreto e de atividades variadas com esse material. Além
disso, é importante um ambiente agradável, bem arejado e bem
iluminado, com mobiliário adequado e confortável, que ofereça
momentos de prazer à criança que inicia sua aprendizagem.

84
Falta de motivação dos alunos

Esta falta de motivação geralmente é devida a fatores


emocionais e ambientais. As crianças ficam muito perturbadas e não
conseguem aprender, quando têm qualquer distúrbio emocional e
quando o ambiente é pouco criativo, com rotinas pouco atraentes para
a criança, que é por natureza lúdica.

Fatores sociais e econômicos gerais

Os fatores sócio-econômicos muito baixos tendem a se


relacionar com os níveis mais baixos de aquisição da linguagem. Isto
se observa principalmente nas escolas de ensino fundamental da
periferia das cidades. O fator cultural tem influência na questão das
oportunidades educacionais e da aprendizagem em geral.

A estrutura da linguagem, quanto à relação entre linguagem


falada e escrita, parece ter também influência na dificuldade que as
crianças têm para aprender a ler.

Geralmente as crianças com distúrbios de aprendizagem têm


mais dificuldade para escrever do que para ler, principalmente devido
à falta de coordenação dos movimentos que quase sempre
acompanha os distúrbios neurológicos da aprendizagem. Mesmo as
crianças disléxicas, depois de aprenderem a ler bem, em geral
continuam com graves problemas de escrita.

Os problemas de aprendizagem podem trazer consigo


problemas emocionais secundários que se traduzem em frustração
profissional, complexo de inferioridade pelo status social e desencanto
com a educação formal. Isso porque, como a alfabetização é uma

85
capacidade muito valorizada socialmente, a criança que não consegue
se enquadrar nos padrões sociais estabelecidos pode desenvolver
comportamentos anti-sociais na escola, que vão desde a rebeldia até
mesmo à delinquência. Indiretamente, tanto pais como professores
acham-se também envolvidos, uma vez que poderão ficar
desapontados com a incapacidade da criança, ou mesmo sentir-se
culpados dessa deficiência.

UNIDADE III

TRASNSTORNOS DA LINGUAGEM

Os transtornos da linguagem, independentemente de suas


causas, expressão e estrutura, deveriam ser considerados, em um
contexto mais amplo, como alguns transtornos específicos dentro
daqueles que afetam a comunicação humana. A pessoa é
basicamente um ser comunicativo, e a comunicação é uma
dimensão essencial do ser humano. Este a expressa, desenvolve
e exercita de diversas maneiras, com diversas linguagens, entre
elas as verbais, aquelas que são efetivadas por meio das
palavras, sejam orais, sejam escritas.

Vamos nos referir aos transtornos da linguagem verbal.


Falamos de pessoas que sofrem de dificuldades para se comu-
nicar verbalmente, de forma oral ou escrita. Estamos de novo
diante de um tema em íntima conexão com o pensamento e que
também está enfocada interdisciplinarmente. É precisamente essa
confluência de aspectos (e de disciplinas correspondentes) na

86
linguagem, além dos diferentes enfoques de escolas e
paradigmas, que introduziu confusões nesse tema, as quais não
foram poucas.

Por tudo isso, para maior clareza sistemática e em


conformidade com as finalidades inerentes a um manual, fazemos
a seguinte opção:

 Abordar os transtornos da linguagem verbal.

 Abordar a linguagem oral e a escrita. Priorizar a criança e


suas aprendizagens.

 Trazer uma visão de conjunto desses transtornos, com


seus aspectos principais, mesmo sabendo que nem tudo
pode ser abordado aqui.

 Centrar-nos em três grupos mais significativos de


problemas e transtornos.

 Abordar problemas de linguagem não-atribuíveis


diretamente a outros déficits, como os da visão da mente,
do autismo, etc.

Classificação

Transtornos da fala

São alterações e/ou dificuldades que o sujeito apresenta na


hora de emitir sons articulados com um conteúdo significativo, cuja
etiologia é geralmente variada, pois as causas podem ser
orgânicas, psíquicas, funcionais, etc. Distinguimos os seguintes

87
transtornos:

• Disartria. Transtorno na articulação de determinados fonemas


ao falar, com dificuldades adicionadas para mover os órgãos bucais
em geral, embora não se refiram à fala. Embora sua etiologia seja
complexa, as causas desse transtorno costumam estar relacionadas
com o sistema nervoso, com algum tipo de lesão que afeta a fala.

• Disfonia. Transtorno na emissão (som) da voz. Falamos de


disfonias orgânicas quando se devem a causas orgânicas, isto é,
quando há alguma alteração em algum órgão relacionado com a
fonação (por exemplo, lesões na laringe, deficiências neurológicas,
estrutura anômala do véu palatino, lesões bucais, etc.). Falamos de
disfonias funcionais quando alguma função foi afetada e não algum ór-
gão, como no caso anterior. A aparência dos transtornos pode ser
idêntica, mas não suas causas.

• Dislalia. Transtorno na articulação, mas não por causa de


lesões ou alterações do sistema nervoso (e nisso se distingue da
disartria, embora os sintomas de uma e da outra possam ser
idênticos). Costuma apresentar-se sob estas formas:

Funcional. Sem causa orgânica de base. Exemplos: substituir um


fonema por outro ("faca" por "vaca"), omissões de uma letra ou
sílaba ("baço" por "braço", "petite" por “apetite"), etc. Esses erros
costumam ser denominados em função da letra e/ ou fonema
afetados. Assim, rotacismo (problemas com o r), lambdacismo
(defeitos com o l), gamacismo (defeitos com c, g, k, q), deltacismo
(defeitos com d e t), etc.

88
Orgânica. Aqui há como base uma causa orgânica, embora não
no sistema nervoso. Se a causa orgânica está em uma audição
incorreta, ocorre uma dislalia audiógena. Se a causa orgânica
consiste em alterações dos órgãos da fala, sem origem
neurológica, temos a disglosia.

• Disfemia. Transtorno na elocução linguística, na sequência


ou fluxo da fala. As expressões com as quais esse transtorno se
manifesta são repetição de sílabas ou palavras e interrupções
espasmódicas. Segundo estudos realizados, é um transtorno mais
comum em homens do que em mulheres e na maioria dos casos
se apresenta antes dos 7 anos. É a gagueira, (sucintamente já
mencionada). Trata-se de um transtorno que se instala da menor
para a maior intensidade e frequência, desde uma disfemia leve
(gaguejar em cerca de 2% das palavras, pouca tensão e poucos
bloqueios), até uma disfemia grave (gaguejar em cerca de 25%
das palavras, com grandes tensões e muitos e prolongados
bloqueios). Segundo pesquisas clássicas e recentes, as causas
atribuíveis são de caráter fisiológico, psicossocial e/ou psi-
colinguístico. Podemos distinguir duas categorias de disfemia:

Tônica. A interrupção da fala ocorre ao iniciar o discurso ou partes


deste.

Clônica. Caracterizada por repetições de sílabas ou palavras.

Há uma conduta e transtorno, diferente da disfemia, embora,


às vezes, possa ser confundida com ela. É o farfalhejo: fala
excessivamente rápida, com articulação desordenada e sem que o
sujeito (ao contrário do que acontece com o disfêmico) tome
89
consciência do problema.

Transtornos da linguagem oral

• Afasia. Sob essa denominação, ou também com o nome de


disfasia, diversos transtornos são conceituados. Em prol da
clareza e da simplicidade, faremos referência a três variantes:

1ª Afasia expressiva do desenvolvimento. Transtorno no


desenvolvimento da linguagem, que afeta principalmente a ex-
pressividade e menos a compreensão e a percepção. A criança
afetada por esse problema esquece palavras já aprendidas
enquanto aprende outras novas, bem como manifesta alterações
na organização morfossintática das frases, na fonação e
articulação da linguagem. E um atraso da linguagem que não pode
ser atribuído a deficiências intelectuais ou ao meio sociocultural.

2a Afasia receptiva do desenvolvimento. Transtorno muito


menos frequente que o anterior. É uma deficiência grave e
persistente que afeta principalmente a compreensão. Dizemos
afasia receptiva do desenvolvimento quando não chega a adquirir
nenhuma linguagem. A afasia receptiva ocorre sem que haja como
base uma lesão adquirida demonstrável, deficiência mental,
perturbação da personalidade ou alteração do ambiente social e
familiar.

3a Afasia infantil adquirida. Transtorno que consiste na


perda total ou parcial da linguagem (compreensão + expres-
sividade) quando esta já havia sido adquirida, em virtude de uma
lesão cerebral.

90
• Atrasos da linguagem. Referem-se ao não-aparecimento
desta em uma idade e/ ou etapa evolutiva em que normalmente já
se estabeleceu. Dentro dos atrasos, distinguimos:

 Atraso simples da linguagem. As primeiras palavras


aparecem próximo dos 2 anos, o vocabulário é muito pobre,
as frases são de palavras justapostas, e o sujeito fala de si
mesmo na terceira pessoa. Como causas possíveis
costumam ser assinaladas as do tipo hereditário, as
neurológicas, fatores socioculturais do meio linguístico da
criança e aspectos afetivos e de relação interpessoal.

 Audiomudez. O sujeito ouve bem, mas parece mudo, de


maneira que aos 5 anos ainda não adquiriu nenhuma
linguagem ou apenas algumas poucas palavras.

DIAGNÓSTICOS

Dos transtornos da fala

• Ainda que tenha de ser adaptado a cada caso singular,


existe, no entanto, toda uma série de passos a serem dados no
diagnóstico, entre os quais sempre se destaca a observação direta
pelo especialista da produção linguística pelo sujeito em questão.

• A avaliação propriamente dita compreende:

 Anamnese, que inclui:

a) Dados pessoais.

91
b) Histórico do sujeito, seus desenvolvimentos, sua
personalidade, doenças, trajetória escolar, etc.

c) Antecedentes familiares e atitudes dos pais diante do


problema.

 Avaliação sistemática da articulação e da fala em geral.

 Observação e avaliação da motricidade bucofacial e da


conduta respiratória.

 Exame da percepção temporal e do ritmo.

 Exame da percepção e discriminação de sons, fonemas


e palavras.

 Exame de memória verbal imediata. Testes


complementares, se necessário, de caráter auditivo,
neurológico, etc., e, claro, de capacidade intelectual.

• A avaliação sistemática da fala é feita com estes exercícios:

 Contagem.

 Mostras de fala.

 Mostras de leitura.

 Repetição de sons, sílabas, palavras, frases que são


propostas ao sujeito.

 Conversação a partir de gravuras.

 Conversação espontânea com o sujeito.

92
 Repetição de dígitos e de ritmos.

 Exercícios de discriminação de fonemas ou palavras


parecidas.

Dos transtornos da linguagem oral

Inclui os seguintes aspectos:

• A anamnese, principalmente por meio de entrevista com a


família, observando os mesmos itens assinalados para os
transtornos da fala.

• Exame médico, neurológico e auditivo, principalmente para


descartar causas e patologias ligadas à personalidade e a outros
aspectos de acordo com o descrito ao nos referirmos a esses
transtornos.

• Exame da linguagem mediante:

 Observação e registro da linguagem da criança.

 Testes padronizados para determinar o nível linguístico.

• Exame de:

 Inteligência geral do sujeito.

 Conduta geral do sujeito.

 Processos de produção da fala.

 Atenção, percepção, psicomotricidade, lateralidade,


esquema corporal.

93
Dos transtornos da linguagem lectoescritora

Inclui os seguintes aspectos:

 Anamnese, no sentido antes indicado, sempre com


entrevista com os pais.

 Opinião do professor sobre o rendimento do aluno.

 Descarte de qualquer tipo de alteração perceptivo-motora


ou neurofisiológicas, se for necessário, fazer os exames
pertinentes. Considera-se se a criança tem um nível de
amadurecimento suficiente e necessário (nunca antes dos
6 anos).

 Aplicação de testes psicométricos para descartar qualquer


tipo de deficiência intelectual.

 Exercícios de leitura oral e de leitura silenciosa, avaliando


a compreensão, os erros, o ritmo, etc.

 Exercícios de escrita: ditado, cópia, composição livre, para


análise dos erros cometidos.

 Testes específicos de organização espacial (esquema


corporal, lateralidade, etc.).

ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO

Nos transtornos da fala

Não é possível fazer uma exposição minuciosa das


diferentes estratégias de intervenção, mas indicamos uma série de
exercícios e atitudes sem esquecer que, além disso, cada
94
transtorno exige uma estratégia diferencial ou ao menos exercícios
e atividades adequados ao caso.

A. Estratégias indiretas:

 Exercícios respiratórios.

 Exercícios de sopro.

 Exercícios de relaxamento.

 Exercícios bucofaciais (lábios, bochecha, língua,


mandíbula, palatos).

 Exercícios de deglutição. Exercícios de discriminação


auditiva.

B. Estratégias diretas:

 Exercícios de implantação e/ou correção fonética em


geral.

 Exercícios de recuperação e correção de fonemas em


que o sujeito tem dificuldade.

 Exercícios com sílabas e palavras seguindo uma


sequência do simpIes para o complexo.

 Exercícios de articulação.

 Exercícios de ritmo.

 Exercícios de expressividade tonal.

 Exercícios de leitura, recitação, etc.

95
C. As atitudes adequadas no ambiente da criança,
principalmente dos pais, é uma exigência inevitável na
implantação de estratégias. Resumimos as principais:

 Ter tolerância.

 Nem proteger nem laissez-faire.

 Motivar mediante reforço.

 Não forçar nunca.

 Falar devagar com a criança, mostrando-se tranquilos


diante dela.

 Exercícios respiratórios e de relaxamento.

 Colaborar com o professor, o logopedista e o psicólogo


que atendem a criança.

De uma maneira mais específica, apresentamos outras para


os transtornos da linguagem, sem esquecer a incidência concreta
em cada caso:

A. Estratégias indiretas:

 Exercícios de discriminação auditiva.

 Exercícios de discriminação auditiva com coordenação


gestual.

 Exercícios buco-orofaciais.

96
B. Estratégias diretas:

 Exercícios para organizar a função sintática e o campo


semântico, servindo-se de gravuras, imagens e
vinhetas.

 Exercícios facilitadores da comunicação, mediante


representações pictográficas e utilização de gestos.

 Exercícios de compreensão linguística a partir de


objetos, jogos, repetição de sons e palavras, conversa-
ções espontâneas, etc.

 Exercícios para facilitar o aspecto expressivo da


linguagem oral.

 Exercícios morfossintáticos, desde palavras e frases


simples até outras mais complexas.

Nos transtornos da linguagem lectoescritora

A.Exigências prévias. Tudo aquilo que dissemos antes em


relação às atitudes dos pais e colaboração entre a família e os
reeducadores, assim como sobre sua adaptação à dislexia
concreta que o sujeito apresenta, aqui é particularmente exigível.
Essa mesma adaptação deve respeitar a idade e o nível de
desenvolvimento da criança.

B.Estratégias diretas. Devem compreender sempre:

 Exercícios psicomotores, sobre o esquema corporal, de


ritmo, de automatização de noções espaciais, de

97
reprodução de formas no espaço, de orientação em
gravuras e ilustrações, pintura e desenho livre com
comentário posterior, etc.

 Exercícios de atenção discriminativa. Exemplo: rasura


de sílabas e/ ou palavras em um parágrafo.

 Exercícios mentais, como identificação e definição de


objetos, cálculo com números, semelhanças e
diferenças, ordenamento de histórias desordenadas,
descrição e interpretação de cenas gráficas ou
naturais.

 Exercícios de grafia, como copiar, reproduzir letras,


sinais de pré-escrita, letras sobre padrões, preencher
lacunas em palavras.

 Exercícios de escrita, como copiar letras, palavras e


parágrafos, separar corretamente as palavras de um
parágrafo em que todas aparecem unidas, formar
palavras a partir de letras soltas e de frases a partir de
palavras, ditados, etc.

 Exercícios de leitura, com palavras nas quais falta uma


letra. Leitura em voz alta e silenciosa. Explicação oral
de um parágrafo lido. Soletramento de palavras em voz
alta, primeiro lendo e depois memorizando. Manejo do
dicionário.

 Correção específica dos erros mais frequentes


associados às dislexias: omissões, inversões, rotações,

98
acréscimos, separações, etc.

RESUMO

 Pensamento e linguagem são realidades interdependentes,


aspectos de uma atividade cognoscitiva superior
intimamente ligados, dificilmente entendidos se forem
separados. O estudo dos transtornos do pensamento e dos
transtornos da linguagem é uma prova a mais e uma
expressão dessa interdependência.

 Os transtornos do pensamento se referem a processos do


pensar (formação de conceitos, abstração e solução de
problemas), não a capacidades mentais. Estão ligados a
condutas cognitivas, embora não só a elas, e constituem um
campo aberto para a busca de hipóteses explicativas e para
a determinação de sua etiologia.

 A classificação dos transtornos do pensamento aparece em


três grandes grupos: transtornos da vivência, no conteúdo e
com correlatos verbais. Junto com esse enfoque clássico é
preciso considerar outros transtornos atípicos, mas
importantes. É o caso das crianças em desvantagem ou
carentes socioculturalmente, cuja problemática supõe todo
um desafio educacional para a escola e seus métodos. Na
raiz das desvantagens se encontram fatores biológicos,
familiares, econômicos e socioculturais.

 O diagnóstico dos transtornos do pensamento não tem, por


um lado, a finalidade de apenas classificar / descrever as

99
alterações de maneira fixa, mas sim de considerar o sujeito
em sua problemática concreta e diferencial voltada para
suas possibilidades e vias de reabilitação. Por outro lado,
deve buscar os fatores etiológicos que possam explicar as
alterações. O diagnóstico inclui a entrevista psicológica (com
anamnese, observação da conduta do sujeito, testes ad hoc,
coleta de dados) e um conjunto de testes específicos.

 As estratégias de intervenção em transtornos do


pensamento devem ser iniciadas com a prevenção, es-
pecialmente indicada em ambientes capazes de gerar
crianças carentes socioculturalmente. Algo semelhante cabe
dizer da educação compensatória, por mais que no sentido
profundo que toda educação devesse sê-lo. As diversas
estratégias cognitivas e de modificação de conduta são, na
prática, as mais seguidas e as mais recomendáveis para os
problemas aqui estudados, sem que isso signifique fechar a
porta para outras, como a humanista, para a qual damos um
valor especial no sentido de reforçadora das melhores
atitudes nos terapeutas e educadores, e eficaz para a
interação professor-aluno.

 Os transtornos da linguagem podem ser considerados, em


um contexto mais amplo, como transtornos da comunicação
humana, e esse enfoque, que ainda não foi desenvolvido de
forma satisfatória, pode dar resultados interessantes.
Abordamos os transtornos da linguagem verbal e
classificamos as alterações em três grupos: transtornos da

100
fala, transtornos da linguagem oral e transtornos da
linguagem lectoescritora.

 O diagnóstico dos transtornos da fala, da linguagem oral e


da linguagem lectoescritora deve ser adaptado a cada caso
concreto, mas para realizá-lo não pode faltar nunca a
observação direta do especialista, a anamnese, os dados
fornecidos por aqueles que mais diretamente conhecem o
sujeito (família, professores) e toda uma série de testes e
exercícios ad hoc. Sem esquecer que esse diagnóstico deve
ter, além disso, um caráter global, avaliando aspectos como
a inteligência e a personalidade da criança.

 As estratégias de intervenção nos problemas de linguagem


são de dois tipos. Algumas procuram fornecer recursos de
base para o sujeito, como, por exemplo, no reforço dos
processos cognitivos (pensamento, atenção) ou em
aspectos ligados a esses problemas (psicomotricidade,
orientação espacial, etc.), e outras estão diretamente
dirigidas para a correção das alterações e a implantação das
condutas e habilidades desejadas. Em muitos casos as
estratégias fazem um caminho para trás e quase sempre
começam do zero, estabelecendo algumas bases sólidas.
Assim, por exemplo, muitos dos exercícios realizados na
correção dos problemas lectoescritores são idênticos aos
que precisam ser feitos em uma correta introdução para a
aprendizagem da leitura e escrita.

101
 Tanto no caso do tratamento dos problemas de pensamento
como de linguagem são fundamentais as atitudes do
ambiente da criança, principalmente pais e professores. Esta
deve se sentir apoiada, compreendida, estimulada e
reforçada em suas aprendizagens e conquistas durante o
tratamento, a fim de se livrar de angústias e de bloqueios
que tornam qualquer intervenção ineficaz.

UNIDADE IV

Distúrbios emocionais como problemas de aprendizagem

As pessoas são diferentes umas das outras e por isso reagem


diferentemente a um mesmo estímulo ambiental. Os vários tipos de
reações, portanto, se devem às diferentes personalidades, ou seja,
aos diferentes padrões usuais de reação e de interação do indivíduo
com o meio físico e social. Esses padrões são relativamente estáveis
e são eles que fazem com que cada indivíduo se diferencie dos outros.
No entanto é preciso lembrar que o indivíduo, ao nascer, já encontra
uma sociedade estabelecida, com padrões de comportamento social
definidos e nos quais deve se enquadrar. Quando ele não consegue
se ajustar a esses padrões, é considerado “anormal” e é marginalizado
pela sociedade.

O desenvolvimento da personalidade se deve tanto ao


comportamento genético do indivíduo, que é hereditário, quanto às
aprendizagens que ele vai coletando em sua interação com o meio
físico e social, como à influência da cultura e da sociedade em que

102
vive. A cultura deve ser entendida como o conjunto de ideais,
costumes, crenças, tradições e conhecimentos dessa sociedade, que
são transmitidos ao indivíduo através da educação.

A personalidade da criança vai se formando à medida que ela


interage com o meio físico e social em que vive, desenvolve-se com o
seu crescimento físico, vai se modificando com as sucessivas
interações e se expressa através dos diferentes comportamentos, nos
relacionamentos sociais e nas ligações afetivas

Os modos mais comuns do indivíduo externar suas emoções é


através do comportamento. O que é comportamento? Segundo Robert
Laplane, “comportamento é o conjunto de atitudes e de condutas
psicológicas, uma maneira de ser e, mais ainda, um dinamismo ativo”.

Existem as chamadas “crianças difíceis” ou “crianças-problema”,


cujos comportamentos são marcados por irregularidades. São os
chamados desenvolvimentos atípicos ou que apresentam desvios de
conduta.

Comportamentos perturbados

Os comportamentos perturbados podem ser classificados em


comportamentos deficientes e comportamentos excessivos.

Comportamentos deficientes

Os comportamentos deficientes caracterizam-se pela


inadequação às exigências sociais e do meio ambiente. Dentre os
comportamentos deficientes destacam-se:

 O autismo infantil precoce;

103
 O fracasso escolar;

 As dificuldades de aprendizagem;

 Os distúrbios de aprendizagem;

 A subnormalidade mental;

 A delinquência juvenil;

 Os distúrbios psicofisiológicos ou psicossomáticos.

Autismo Infantil Precoce

Descrito pela primeira vez por Kanner. Consiste em uma perda


do contato da criança com a realidade que a cerca, ocasionando-lhe
uma impossibilidade ou uma grande dificuldade em comunicar-se com
os outros. Esse distúrbio tem início na primeira infância.

A criança autista não interage com nenhuma pessoa. Não sorri,


não reconhece os membros da família, nem desenvolve a linguagem,
emitindo apenas sons distorcidos e ininteligíveis. Apesar destes
desvios de comportamento, ela não apresenta distúrbios neurológicos
graves, sendo que o seu desenvolvimento físico continua
normalmente. É um distúrbio raro. É mais frequente em meninos do
que em meninas. A criança autista tem uma grande deficiência de
afetividade.

Fracasso Escolar

Outro fator psicológico que envolve a aprendizagem é o


chamado fracasso escolar. Esse distúrbio costuma ser encontrado nos
primeiros anos escolares e, depois, a partir de 9 a 10 anos, até a idade

104
adulta, abrangendo várias etapas da vida de uma pessoa. Nas
primeiras séries do ensino fundamental, o fracasso escolar diz respeito
à leitura, escrita e cálculo. Esse fracasso pode ser causado mais
comumente pela disfunção cerebral mínima (DCM) e pela dislexia.

Quando a criança atinge os 9 ou 10 anos, esse fracasso pode


ser devido à deficiência intelectual. O fato de fracassar poderá
produzir no aluno várias reações diferentes, dependendo de sua
personalidade e de seu temperamento.

As várias reações diante do Fracasso Escolar

O fracasso escolar pode desencadear as reações mais diversas:

 Alguns alunos tornam-se apáticos, desinteressados;

 Outros tornam-se indisciplinados;

 Há aqueles que se tornam negativistas, sempre se opondo aos


pais e ao professor;

 Aqueles que passam a apresentar uma grande instabilidade


emocional, sendo ora estudiosos, ora totalmente relapsos.

Qualquer uma dessas reações pode levar o caso a agravar-se e, na


medida em que o aluno vai ficando mais velho, o fracasso inicial vai se
acentuando. Tanto os professores como a própria família muitas vezes
colaboram inconscientemente para esse agravamento. Os primeiros
exigindo e fazendo críticas ao aluno, além de atribuir-lhe notas cada
vez mais baixas. A família, fazendo comparações com os outros
colegas ou irmãos e castigando-o pelo insucesso. Isso é o que se
chama de negativa escolar.

105
Posteriormente, essa negativa que o aluno recebe da família,
principalmente na fase da adolescência, se traduz por uma reação
contra a figura paterna. Isso porque ele, sentindo-se incapaz de
superar o pai, revolta-se e acaba abandonando o lar. Quando sua
revolta é passiva, ele apresenta desinteresse por tudo o que se refere
à aprendizagem, negando-se a estudar ou a aprender qualquer coisa
e tornando-se relaxado consigo mesmo.

Quando o jovem, ao tentar trabalhar, receberá outra negativa.


Como não está preparado, só conseguirá resultados decepcionantes,
que o levarão a considerar-se um incapaz. Isso vai desencadear um
estado de tensão emocional muito grande; angústia, fadiga, dores de
cabeça, insônia. Esse estado poderá agravar-se, dependendo do
temperamento e da personalidade do indivíduo. Com o passar dos
anos, o problema poderá transformar-se em uma obsessão, em
histeria, em algum tipo de fobia ou até mesmo em psicose, que
acabará por afeta-lo profunda e irrecuperavelmente. Ele passará a
viver em constante estado de depressão.

Como educadores devemos tentar compreender esses alunos e


fazer o possível para não prejudica-los. Devemos principalmente trata-
los com paciência e não esquecê-los no fundo da classe.

Dificuldades de Aprendizagem

Existem dificuldades de aprendizagem, também causadas por


distúrbios psicológicos, que no entanto são mais leves e com o tempo
são superadas.

106
Entre elas podemos citar a ansiedade de separação de casa,
principalmente da mãe, de quem a criança é muito dependente e por
quem é superprotegida. Os temores que a criança sente são devidos à
insegurança e não devem ser confundidos com fobia escolar. Ela
sente-se tão nervosa e desamparada que não consegue aprender, até
que tudo se normalize e ela se adapte à escola.

Recusa em ir à Escola

Existe um outro grupo de crianças que têm problemas de


aprendizagem porque se recusam a ir á escola, como forma de
chamar a atenção dos pais, de faze-los preocuparem-se com elas,
mesmo que seja demonstrando aborrecimento, zanga ou até impondo-
lhes um castigo mais violento. A solução é; levar a criança à escola,
despedir-se normalmente, insistindo, até que ela se habitue.

Distúrbios de Aprendizagem

É um termo reservado por alguns autores para designar aqueles


problemas de aprendizagem apresentados por crianças que, apesar
de serem normais física e mentalmente e até serem dotadas de
inteligência um pouco acima da média, têm dificuldade de aprender a
ler e a escrever.

Subnormalidade Mental

Os distúrbios psicológicos são todos acompanhados de


distúrbios emocionais que os agravam. Geralmente são reunidos sob
os rótulos de retardamento mental, deficiência mental, demência ou
debilidade mental.

107
Esses distúrbios são encontrados em crianças que apresentam
um desempenho muito aquém do esperado para a sua faixa etária.
Isso pode ser causado por retardamento de origem hereditária, por
retardamento do desenvolvimento orgânico ou por lesão cerebral.

Quando submetidas a testes de inteligência, as crianças com


subnormalidade mental revelam resultados bem mais baixos do que é
considerado normal. O seu QI é em geral 75 para menos.

Geralmente essas crianças são educadas em classes de


educação especial, até que consigam superar a defasagem que
apresentam. Quando conseguem superar, são integradas em classes
comuns. Mesmo assim sempre terão um atraso de dois ou três anos
em relação à sua faixa etária.

Distúrbios Psicofisiológicos ou Psicossomáticos

São distúrbios de origem emocional, associada ao


funcionamento deficiente do organismo.

A asma

A asma é uma alteração da função respiratória. Modifica-se o


ritmo respiratório e surgem espasmos dos brônquios, com secreção de
muco e muita tosse. É considerada um transtorno do tipo alérgico, que
responde bem a tratamento imunológico. Porém, admite-se que o
desencadeamento das crises se deve a fatores psicógenos.

Muitos casos dessa enfermidade aparecem após um forte


trauma emocional, como a perda de um dos pais, a separação dos
pais, as brigas em família etc. A criança asmática, por faltar

108
periodicamente à escola, sofre atrasos de aprendizagem, que a
tornam ainda mais ansiosa.

Os transtornos do Aparelho Digestivo

Outros distúrbios comuns de origem psicossomática são os


transtornos do aparelho digestivo.

As perturbações digestivas – cólicas, dores abdominais, vômitos.


Podem ser ocasionadas por tensão emocional, ansiedade,
nervosismo. É comum vermos alunos queixarem-se de diarréia
durante a época de provas, ou de dor de barriga na hora da prova.

A obesidade

A obesidade é um distúrbio emocional comum. Consiste em um


excesso de peso por ingestão de alimentos. Pode ser causada por um
distúrbio do metabolismo do organismo (hormonal), ou pode ser
devida ao tipo constitucional do indivíduo, herdado geneticamente dos
pais, ou ainda por uma sensação de conforto, de estar bem
alimentado, bem protegido (lembrança da proteção materna). A
criança obesa torna-se preguiçosa e mais lenta na escola. Isto se
reflete em preguiça de estudar e diminuição de seu rendimento.

A recusa de Alimento

A recusa de alimento é o oposto do excesso de comer e é


chamada de anorexia nervosa. É a perda de apetite, que faz a criança
emagrecer um pouco, até a inapetência completa, que é a recusa a
alimentar-se. Esse é um distúrbio emocional grave que pode chegar a

109
prejudicar seriamente a pessoa e até leva-la à morte. É um dos
poucos distúrbios mais frequente em meninas do que em meninos.

A criança que não se alimenta bem começa a ter problemas de


aprendizagem, mais ou menos semelhantes aos de uma criança
subnutrida: desânimo, sonolência, indisposição geral e fracasso
escolar.

Enurese e Encoprese

São perturbações do desenvolvimento, ocasionadas por retardo


de maturação biológica e agravadas pelo componente emocional. Nos
dois casos a criança ainda não mantém um perfeito controle dos
esfíncteres, da bexiga e do intestino.

A enurese é uma perturbação comumente encontrada em


crianças de até mais ou menos 3 anos. Consiste em molhar a cama
durante a noite. Essa perturbação pode durar até os 5 anos ou mesmo
prolongar-se até 10-12 anos. Nesse caso há maior interferência do
componente emocional: a criança tem vergonha dessa sua falha e
muito medo de que estranhos a descubram, o que pode atrapalhar sua
concentração nos estudos. Há várias teorias explicativas do fato,
sendo que uma delas é emocional, atribuindo-o a ciúme dos irmãos
menores ou à carência afetiva. É mais comum entre meninos.

A encoprese é também relativamente comum e bastante


conhecida dos professores de educação infantil e do ensino
fundamental. Consiste em evacuar nas calças. Também incide mais
em meninos. Em geral desaparece com tratamento, quando então se
estabelece um horário certo para a defecação. Entretanto, se esse

110
distúrbio prosseguir até 7 ou 8 anos, ou mesmo até a puberdade,
ocasionará sérios problemas emocionais, que seguramente irão
prejudicar os estudos.

Os Tiques

São perturbações fisiológicas da coordenação motora, ou seja,


movimentos musculares involuntários com os olhos, com a cabeça,
com as mãos, com os pés, com os ombros. São também conhecidos
como cacoetes. Seus sintomas manifestam-se através de movimentos
repetitivos e imperiosos, com intervalos irregulares; aumentam quando
a pessoa fica emocionalmente perturbada e desaparecem enquanto
ela dorme.

São movimentos bruscos, aparentemente grotescos e cômicos.


Há pessoas que piscam muito; outras repuxam a boca; outras ainda
se coçam ou fazem movimentos com os ombros, com os pés e com as
mãos. Em situações de grande tensão, como por exemplo em uma
prova, o aluno fica quase que impossibilitado de faze-la devido a seus
tiques.

Masturbação em Público

A masturbação é um ato fisiológico. Ela depende de um auto-


controle adquirido pelo indivíduo na sua fase de socialização. Do
mesmo modo que se aprende que não devemos andar nus, que não
devemos comer com as mãos e sim com os talheres, que não
podemos fazer nossas necessidades em público, aprendemos
também que a masturbação não é um ato público.

111
Apesar de os psicanalistas freudianos atribuírem à masturbação
infantil um significado sexual profundo, há uma outra tendência para
explicar esse fato: a curiosidade própria da criança em relação aos
seus órgãos genitais. Outra explicação é o fato de serem muito
comuns as inflamações e as micoses na área genital das crianças que
brincam sentadas na areia ou na terra, vestidas apenas com um
calção. Essas afecções da pele em geral produzem coceira. A criança
coça a região genital naturalmente, como se coçasse o braço ou o pá.

O oxiúro, um verme que se instala no ânus, também provoca


coceira. Ao coçar-se, a criança sente prazer e repete o ato várias
vezes, o que não pode ser interpretado como uma verdadeira
masturbação, do tipo auto-excitação manual, pois não há orgasmo.

Há crianças que têm modelos de masturbação e de relações


sexuais entre adultos em casa. Nesse caso a imitação é a responsável
por ela procurar reproduzir esses atos na escola e mesmo na classe.

Esses casos devem ser observados, anotados e encaminhados


ao orientador educacional ou a um psicólogo, para que seja feita uma
reeducação dos hábitos da criança.

Os Comportamentos excessivos (para mais e para menos)

São comportamentos de má adaptação à vida social. Podem ser


excessivos para mais, como os comportamentos agressivos
(agressões), ou excessivos para menos, como os comportamentos
retraídos, que abrangem: ansiedade, comportamentos perturbados
(medos e fobias) e comportamentos psicóticas.

112
Os Comportamentos agressivos

Segundo B. L. Welsh, a agressividade é um retardo permanente


ou uma predisposição constitucional para a agressão.

Os comportamentos agressivos revelam uma personalidade


agressiva, em que os fatores hereditários estão presentes. Significam
sobretudo uma resposta a algum estímulo externo que perturbou
emocionalmente a pessoa, seja a sua situação econômica, social ou
mesmo emocional do momento. Podem ser originados ainda por um
distúrbio hormonal.

O indivíduo responde por diversos modos: violência física,


agressão à pessoa ou objeto que o perturbou, dano à propriedade etc.

Os comportamentos agressivos são considerados em função de


sua intensidade. Por exemplo, os tapinhas dados no bumbum de uma
criança, para repreende-la por qualquer traquinagem, não têm a
mesma intensidade de um bom tapa, dado no rosto de quem nos
ofendeu.

A agressividade parece ser um comportamento inato. Algumas


crianças apresentam comportamentos agressivos desde muito
pequenas. São crianças de temperamento impulsivo, irado ou raivoso,
demonstrado através de atitudes violentas em relação a seus
brinquedos ou a pessoas com quem convivem. Rasgam ou quebram
brinquedos; dão beliscões, puxões de cabelo e arranham ou mordem
as outras crianças, inclusive os adultos; têm crises de raiva.

113
As condições que favorecem a agressividade parecem ser as
frustrações, isto é, o estado em que fica um indivíduo quando é
impedido ou quando se vê impossibilitado de realizar algo.

Outra causa para explicar a agressão é que geralmente ela é


fortalecida pelo reforço, isto é, se o indivíduo agride, geralmente
recebe uma punição por essa agressão, o que o faz revidar
novamente, aumentando a agressividade, Por exemplo, se um filho é
punido fisicamente pelo pai, com uma surra, com o intuito de controlar
seu temperamento agressivo, esse comportamento está sendo
reforçado pelo pai, com o castigo físico, que também é muito violento.
A criança tende a crescer altamente agressiva, pois ela toma como
modelo a agressividade do pai.

Nas crianças pequenas a agressividade pode ser passageira,


pois faz parte da evolução de sua personalidade; se não reforçada,
esta agressividade acabará naturalmente.

Quando a agressividade persiste na idade escolar sob a forma


de cólera violenta (raiva), de oposição veemente ao professor e aos
colegas, de brutalidade, de destruição de objetos ou mesmo de
vandalismo, é preciso observar mais detidamente o comportamento do
aluno, antes de encaminhá-lo a um especialista. O professor deverá
ter o cuidado de não “rotular” um aluno, sem perfeito conhecimento de
causa.

Quando esses comportamentos violentos e frequentes


transformam-se em casos patológicos, eles passam a causar
problemas de aprendizagem, de adaptação à escola e de interação

114
social. Constituem uma das causas da evasão escolar, devendo ser
tratados por psicólogos ou psiquiatras.

Os Comportamentos retraídos

Retrair-se significa encolher-se, afastar-se. No que se refere a


comportamento social, significa afastar-se de qualquer interação com
outra pessoa. Pessoas que apresentam comportamento retraído
respondem ao meio exterior e às outras e às outras pessoas com
comportamento de fuga.

Ansiedade

A ansiedade é um sentimento de fuga no sentido de a pessoa


evitar qualquer estímulo que lhe seja desagradável, como por exemplo
a dor, o medo, a insegurança, a indiferença ou a violência. O
comportamento ansioso provavelmente tem um componente genético
inato, assim como o da agressividade.

As personalidades ansiosas apresentam mudanças fisiológicas bem


características, quando estão no período de maior ansiedade:

 Mudança no ritmo cardíaco;

 Transpiração abundante;

 Respiração alterada, arfante;

 Modificação no comportamento motor, revelando tremores;

 Hiperatividade;

 Movimentação desordenada;

115
 Apreensão, preocupação, medo pela ameaça de algo que a
própria pessoa não sabe determinar;

 Gagueira nervosa.

É muito comum as crianças em idade escolar apresentarem


ansiedade, acompanhada de transpiração intensa, principalmente nas
mãos. Esta ansiedade é uma resposta ao medo de não ser bem-
sucedido nos estudos, à incerteza de uma situação nova, como por
exemplo, a dos primeiros dias de aula. De um modo geral, reflete a
insegurança e a falta de confiança da criança em suas próprias
capacidades. A ansiedade é uma condição duradoura, porém instável,
isto é, às vezes é mais intensa, outras vezes menos.

A influência da ansiedade nos estudos é muito grande e prejudicial.


Alguns alunos podem revelar-se extremamente ansiosos, o que irá
prejudicar diretamente o seu desempenho nas provas, podendo até
causar sua reprovação, embora eles dominem perfeitamente a
matéria. Outros, embora um pouco ansiosos pela expectativa das
questões, conseguem controlar-se e sair-se muito bem, embora
possam até ser alunos com menor rendimento durante o ano em
comparação com aqueles muito ansiosos. O professor, sabendo
desses fatos, deverá levá-los em conta por ocasião da avaliação dos
alunos.

É preferível usar o termo perturbação emocional para designar a


ansiedade e os medos generalizados. Isso porque é a emoção que
está perturbando o comportamento da pessoa, o que não quer dizer
que ela seja ou esteja perturbada.

116
As crianças com perturbação emocional tendem a fugir do convívio
com outras crianças. São os chamados alunos “isolados” na escola.
São crianças retraídas, têm poucos amigos e também poucos
interesses. São sujeitas a frequentes crises de choro, muito sensíveis
a críticas e muito preocupadas, desanimando com facilidade diante do
fracasso. Têm pouco entusiasmo e interesse pelas coisas, são
normalmente tristes e muito aflitas quando devem efetuar uma tarefa.

Essas crianças são chamadas deprimidas. Se a depressão for


muito grave, deverá ser tratada com especialistas. Se for leve, o
professor e os próprios colegas podem tentar animar a criança
deprimida, fazendo-a participar dos acontecimentos escolares,
atribuindo-lhe tarefas importantes, juntamente com outros colegas que
lhe dêem apoio e estima.

Comportamentos perturbados (medos e fobias)

São perturbações de origem emocional que impedem a criança e


aprender, embora ela tenha as capacidades necessárias para receber
uma instrução escolar normal: atenção, percepção e coordenação.
Porém, o uso dessas capacidades fica prejudicado pelo distúrbio
psicológico que ela já tinha muito tempo antes de ter ido para a escola
e que passou despercebido.

O comportamento das crianças com essas perturbações é


marcado por irregularidades: não são bem adaptadas, são retraídas e
intensamente negativistas. Essas irregularidades começam
geralmente quando são ainda bebês, manifestando-se na área do
sono, da alimentação e da eliminação das excretas.

117
Essas crianças têm tendência a se retraírem e a chorar muito:
choram para tomar banho; estranham pessoas desconhecidas,
manifestando-se através do choro; choram como protesto ao saírem
de casa; choram para ir à escola e lá permanecem chorando alto por
muito tempo. Nesse estado elas não conseguem adaptar-se à escola
nem prestar atenção às aulas.

Com essas dificuldades iniciais, a criança poderá iniciar um


processo de aversão ao estudo ou à própria escola. Se continuar indo
à escola, será sempre sob protesto. Assim ela irá acumulando
dificuldades de aprendizagem, sejam elas na leitura e na escrita ou
em outra aprendizagem qualquer. Por esse atraso será punida pelo
professor com repreensões, castigos e notas baixas. Em casa
receberá também manifestações de desagrado dos pais e até mesmo
castigos. Ela passará então a identificar estudo, escola e professor
com punição e castigo. Ficará cada vez mais ansiosa e poderá
generalizar essa emoção para todas as atividades escolares e até
mesmo para a escola. Esse comportamento é conhecido como fobia
escolar. A criança recusa-se a ir à escola e é dominada por uma
repulsa irrealística, tendo horror à escola.

Como defesa a essa aversão, ela poderá apresentar sintomas


físicos de náuseas, dor de estômago, diarréia, dor de cabeça ou
qualquer outra dor. Todos os dias aparece um sintoma diferente, que
serve de pretexto para ela ficar em casa. Na verdade o que ela teme é
deixar a segurança do lar e a proteção da mãe.

Essa fobia escolar é mais comumente encontrada em crianças


pequenas da educação infantil ou das primeiras séries do ensino

118
fundamental. É uma perturbação que atinge igualmente meninos e
meninas.

Outra causa da fobia escolar pode ser também uma ausência


prolongada da escola, por doença ou viagem, após o que a criança
sente-se estranha ao grupo, fica atrasada e não consegue mais se
integrar à classe.

Comportamentos Psicóticos

O comportamento retraído, quando em situações muito


profundas e graves, pode-se apresentar de forma muito perturbada e
distorcida. Usa-se a expressão psicose infantil para se referir a esse
tipo de comportamento. Porém, como não se conhecem precisamente
quais os comportamentos que se enquadrariam nessa denominação,
parece melhor designa-los como comportamentos psicóticos.

Há outras expressões também usadas para designar esse


comportamento; esquizofrenia infantil, crianças atípicas, psicose
autista, mas ele não ser confundido com o autismo.

Causas intelectuais dos principais problemas de aprendizagem e


de ajustamento escolar

A inteligência

A inteligência é um dos componentes indispensáveis para


qualquer aprendizagem que implique em raciocínio. Em termos de
escolarização, quase todas as aprendizagens exigem que o indivíduo
seja dotado de inteligência, não necessariamente brilhante, mas pelo
menos de nível médio.

119
Algumas conceituações de inteligência

De acordo com Stern, “inteligência é a capacidade geral de


adaptação do indivíduo aos problemas novos e às condições mutáveis
de vida”, ou também “a capacidade de adaptar-se a novas situações
mediante o emprego consciente dos meios ideativos”.

Para Claparède, inteligência “é a capacidade de aprender e aproveitar-


se da experiência”.

Para Catell, “inteligência é a capacidade de desenvolver


comportamentos sociais adequados e adquirir cultura geral”.

Terman, acredita que o indivíduo revela sua inteligência quando é


capaz de pensar abstratamente.

Sempre se pensou que o homem era o único ser vivo dotado de


inteligência superior e que, portanto, se diferenciava dos outros
animais, tornando-se o único a poder dirigir e modificar sua condição
de vida. Muitos pesquisadores fizeram experimentos e conseguiram
provar que os animais inferiores têm um comportamento instintivo
muito rico, mas independente de aprendizagem. Vários animais
superiores, como os chimpanzés, macacos de várias espécies,
raposas, cães e outros, conseguem aprender, revelando
manifestações de inteligência.

A inteligência humana é a mais completa e implica não apenas


em armazenar conhecimento, mas também em poder abstrair,
sintetizar e generalizar, além de aplicar esses conhecimentos e
experiências adquiridas em outras situações futuras, semelhantes
(transferências de aprendizagem). O tipo mais evoluído é o que

120
envolve raciocínio, dispensando as tentativas do ensaio e erro, a
experimentação ou a memorização de conceitos.

Origens dos problemas mentais dos subdotados

Há várias causas externas (exógenas) e internas (endógenas)


responsáveis pela oligofrenia, que é o distúrbio do sistema nervoso
causador dos problemas mentais dos subdotados.

Fatores endógenos – São aqueles do próprio organismo e que


produzem agressões ao sistema nervoso da criança. Qualquer
interferência nos primeiros três meses de vida do feto poderá ser
muito prejudicial ao seu sistema nervoso que está em formação. Os
danos futuros serão de maior ou menor gravidade, de acordo com a
extensão da lesão.

Os fatores endógenos podem ocasionar as seguintes deficiências:

 Microencefalia – cérebro pequeno;

 Hidrocefalia (“cabeça de água”) - o cérebro é comprimido


devido a um grande volume de líquido cefalorraquidiano;

 Síndrome de Down – é uma alteração cromossômica que


ocorre de forma acidental e mecânica durante a divisão celular.
Sua aprendizagem tem um ritmo menor que as crianças não
Down.

Fatores exógenos – São fatores externos ao organismo, que


podem causar graves lesões no feto ou na criança.

121
 Doenças como sífilis e diabete materna podem lesar o feto. A
rubéola da mãe nos três primeiros meses de gestação é outra
causa de lesões graves na criança, sendo uma das situações em
que o aborto é recomendado.

 Os raios X recebidos pela mãe podem prejudicar a criança.

 O fator RH negativo da mãe é responsável por lesões e


problemas cerebrais no filho.

 Os traumatismos do parto: parto muito rápido ou muito lento, ou


ainda um fórceps mal aplicado, causam problemas cerebrais na
criança.

 As drogas usadas pela mãe ocasionam perturbações cerebrais


no feto e o alcoolismo também pode causar lesões cerebrais.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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