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AULA 4

TRANSTORNO DO ESPECTRO
AUTISTA

Profª Rossana Ghilardi


TEMA 1 – O ALUNO COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

Nesta aula, pretendemos levantar questões relacionadas à atuação de


professores e escolas de educação básica no atendimento ao aluno com
Transtorno do Espectro Autista (TEA). É desejável a trajetória na qual a criança
tenha o diagnóstico de TEA o mais cedo possível, para que receba atendimento
terapêutico especializado e oportunize à escola participar em conjunto com
especialistas na implantação do tratamento, principalmente em sua
especificidade, que é a aprendizagem acadêmica. No entanto, sabemos que
essa não é a realidade na maioria dos casos.
O esperado não acontece primeiramente porque o diagnóstico costuma
acontecer de forma tardia. É muito comum professores e equipe escolar
participarem inclusive do levantamento diagnóstico e do encaminhamento para
profissional da área da saúde, porque às vezes os familiares percebem os
comportamentos da criança como relacionados à personalidade, criando
estratégias para lidar com inconveniências, ou lhes falta conhecimento e
informação para entender os sintomas apresentados.
Também é preciso considerar que o processo diagnóstico pode ser
demorado e a escola pode receber a criança sem tratamento definido, sem
orientação quanto às dificuldades e potencialidades. É preciso lembrar que um
grande entrave para diagnóstico e intervenção no caso do TEA é justamente o
espectro, com uma gama muito ampla e variada de dificuldades e
comportamentos, com graus de comprometimento diverso, comorbidades e
sintomas secundários variados.
A finalidade da educação, definida no art. 2o da LDB 9.394/96, é o pleno
desenvolvimento do educando, envolvendo acesso ao conhecimento
sistematizado e definido pela sociedade como necessário para exercer a plena
cidadania e qualificação para o trabalho. Como atingir esses objetivos
considerando que a pessoa com TEA tem prejuízo persistente na comunicação,
interação social e outros tão fundamentais a educação formal? Lembramos que
algumas crianças não falam na idade esperada, outros apesar de desenvolver a
linguagem, não evoluíram para fala funcional, e as práticas educacionais
brasileiras a interação verbal está muito presente.
Outro critério definidor de TEA são os padrões restritos e repetitivos de
comportamento, interesses ou atividades, mas as classes convencionais em

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nosso país continuam com cadeiras enfileiradas na espera de alunos com
poucos movimentos, atentos ao professor de forma padronizada, sentados por
várias horas. Sem contar que há crianças autistas com alto nível de ansiedade,
comportamento agressivo, crises de birra prolongadas, dentre outras
consequências que podem dificultar ainda mais a aprendizagem escolar.
Preocupa, mas não imobiliza. Ao contrário, impulsiona a busca de
soluções. É importante ressaltar que há tratamento para TEA, portanto, há
evolução e desenvolvimento quando a intervenção acontece. Em alguns casos
extremos, o convívio escolar será adiado, geralmente quando a criança não
controla comportamentos agressivos ou as condições cognitivas são precárias,
mas muitos alunos estarão na escola convencional, com ou sem a presença de
acompanhante.

TEMA 2 – A ESCOLA E O ALUNO COM TEA

Cunha (2017) inicia o capítulo de seu livro destinado a orientações aos


professores resgatando a perspectiva de Maria Montessori (1870-1952) sobre a
mente absorvente da criança: “Uma criança típica aprende, por meio de
brincadeiras, com os pais, os colegas e os professores na escola. Faz amizades
e adquire habilidades motoras e cognitivas. Simplesmente vivendo ela aprende”
(Cunha, 2017). O autista não é assim, não entende objetos pela função cultural
deles, tem movimentos estereotipados que prejudica o desenvolvimento motor,
precisa aprender até mesmo atividades mais elementares; muitas vezes não
fala, não se comunica como esperado.
Com certeza essa perspectiva pode assustar alguns docentes,
principalmente se considerarmos os déficits na formação deles para atender a
alunos de inclusão. Vieira (2020) realizou levantamento de pesquisas e artigos
sobre a percepção dos docentes a respeito de sua própria formação e confirma
que eles se consideram despreparados, tanto na formação inicial quanto na
continuada; entendem que a formação deficitária é uma das principais
dificuldades para atender alunos com TEA. Apesar de a legislação educacional
destacar a inclusão de todos os alunos e indicar ações de formação específica
aos docentes, na prática parece haver ainda muita defasagem.

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2.1 Dicas iniciais

Há muito para fazer a respeito da formação dos professores. Coloque-se


no lugar de qualquer docente recebendo no início do ano letivo um grupo de
alunos, sendo que um deles é apresentado com suspeita de TEA. Algumas
recomendações básicas podem auxiliar nesse primeiro momento, começando
com o mais simples e básico, como as dicas do Instituto NeuroSaber (2016):

• Estabelecer e manter contato contínuo com familiares e outros


profissionais que acompanham a criança com TEA buscando o máximo
de informação possível.
• No contato com o aluno, tentar identificar o que lhe provoca interesse
para utilizar como fator motivacional durante as atividades escolares.
• Estabelecer práticas no dia a dia acadêmico para facilitar o acesso da
criança às atividades escolares, principalmente sequenciar atividades de
forma clara, desmembrar orientações e ordens de um exercício; procurar
graduar conteúdos, dos mais simples aos mais complexos, para promover
maior compreensão. Um exemplo de questão em exercício escolar é que
gastamos muita energia para atividades diárias e precisamos nos
alimentar para reposição. Cite as refeições consideradas principais do dia
e depois indique o que você costuma comer em cada uma delas. A
interação poder ser sequenciada dessa maneira: quais são as principais
refeições do dia? O que você costuma comer no café da manhã? O que
gosta de comer no almoço? O que prefere comer no jantar?
• Para estimular a atenção visual, é interessante utilizar objetos e
acessórios de interesse da criança, também por isso a segunda
recomendação aqui foi para identificar esses interesses.
• Demonstrar paciência. O tempo da criança autista costuma ser diferente
da criança com desenvolvimento típico, além disso costuma demorar mais
para se recuperar de uma crise de birra, que pode ser frequente.
• Sinalizar e indicar previamente alterações na rotina. A pessoa com TEA
tem dificuldade em adaptar-se às mudanças, por isso é importante
comunicar, apresentar com antecedência quando uma rotina diária for
modificada. Muitos utilizam agendas ou quadros visuais com as rotinas,
que podem ser montados e remontados com o autista diariamente, assim
as alterações podem ser indicadas antes que ocorram.

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Naturalmente, as dicas são apenas um ponto de partida para situar o
profissional na escola em seu primeiro contato com estudante TEA. É
importantíssimo ressaltar a impossibilidade de improvisar no atendimento
escolar para esses alunos. Parte de nossa motivação para estudar o TEA no
contexto escolar está no contato com alunos estagiários de Pedagogia, alguns
dos quais buscavam desesperadamente atividades para desenvolver com
crianças autistas, pois na escola em que atuavam lhes coube a tarefa de atender
a alunos com TEA em determinados momentos da aula. Mais do que improviso,
tratava-se de uma ação inaceitável.

TEMA 3 – CARACTERÍSTICAS DO ALUNO COM TEA E O PLANO DE ENSINO


INDIVIDUAL

Uma ferramenta disponível é o plano de ensino individual elaborado por


analistas de comportamento nas intervenções com autistas, com metas e
atividades envolvendo desde áreas de linguagem, habilidades motoras e sociais
até habilidades acadêmicas. Nesses casos, os professores participam da
implantação e execução de algumas destas estratégias, no entanto essa não é a
única opção e, muitas vezes, o aluno não tem acompanhamento especializado.
Assim, nos últimos anos observamos vários documentos das secretarias de
educação oferecendo orientação aos docentes para desenvolver planos de aula
para esses alunos, alguns sugerindo o Método TEACCH.
Considera-se também a legislação educacional brasileira, que, além de
garantir a autonomia na gestão escolar, estabelece a responsabilidade da escola
no atendimento inclusivo de todos os alunos no mesmo espaço escolar. Assim,
cada escola e cada docente se responsabilizam pelo ensino e aprendizagem de
todos os seus alunos, tenham ou não autismo, e elaboram seu próprio plano
educacional individual. No entanto, a legislação também prevê assistência aos
professores para essas ações, garantindo apoio da equipe pedagógica da
escola, atendimento educacional especializado (AEE), sala de recursos e
formação continuada.

3.1 Habilidades desenvolvimentais

A primeira questão a se considerar na elaboração de planos de ensino


para alunos autistas é que a maioria das crianças com TEA tem falhas nas

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habilidades desenvolvimentais, aquelas que em crianças típicas aparecem
naturalmente com avanço da idade cronológica. Exemplo de habilidade
desenvolvimental é o contato intencional e controlado com objetos, tocá-los,
arremessá-los, recebê-los para deduzir como se comporta (atividade motora).
Ou as funções executivas como “atenção seletiva, flexibilidade cognitiva,
controle inibitório, planejamento, monitoramento e memória de trabalho, dentre
outros, cuja função é regular e controlar comportamentos orientados a metas”
(Dias, 2009, p. vii), que estão por trás da aquisição da linguagem e de outros
aspectos cognitivos.
A imitação, essencial para aprendizagem, também é uma função básica
comprometida nos autistas; o contato visual não acontece, a interação é
reduzida e a imitação comprometida. No entanto, segundo Moreira (2020, p. 37),
a escola pode ser essencial para a criança TEA, “a interação social é
fundamental para o desenvolvimento infantil e algumas habilidades cognitivas e
adaptativas são desenvolvidas mediante a interação e compartilhamento de
experiências com outros alunos.”
Os fatores desenvolvimentais normalmente estão fora do currículo
convencional de escola formal, e as propostas de trabalho para TEA exigem
currículo diferenciado, fato complicado no atual sistema de educação nacional. O
mesmo acontece com a avaliação escolar. Em decorrência das implicações
comunicacionais do TEA, os formatos de verificação usualmente aplicados
podem não traduzir a aprendizagem da criança autista.

3.2 Habilidades sociocomunicativas

Para a pessoa com TEA, será necessária uma atenção especial aos
aspectos que caracterizam o transtorno, como as habilidades
sociocomunicativas. Nas escolas brasileiras, o mais comum é empregar a
psicologia histórico-cultural de Lev Vygotsky (1896-1934) para embasar as
práticas pedagógicas e a análise das habilidades sociocomunicativas; é mais
raro observar emprego de conceitos comportamentais de Skinner, amplamente
utilizados nas intervenções para TEA. Então, na área da educação encontramos
com mais frequência referências para aplicar princípios da psicologia histórico-
cultural na educação de autistas.
Vygotsky estudou a linguagem buscando desvendar sua relação com o
pensamento, a consciência. Entende que há uma base biológica, mas que o

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desenvolvimento das funções psicológicas superiores se estabelece na relação
dialética entre o sujeito e seu meio cultural e material. O pensamento se
estrutura e se molda na mesma medida em que a criança incorpora a linguagem,
aprende lendo, decifrando o mundo, na interação com os outros e demais
mediadores como os artefatos.
Para Vygostsky, o espaço para aprendizagem é a Zona de Desenvolvimento
Proximal (ZDP), distância entre o que o sujeito já domina e aquilo que ainda não
domina, mas pode vir a conhecer. Nas palavras do autor, ZDP é

a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma


determinar através da solução independente de problemas, e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através da solução de
problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com
companheiros mais capazes (Vygotsky, 1998, p. 97).

A psicologia histórico-cultural já preconiza atendimento individual e


diferenciado para cada criança, pois o potencial de aprendizagem é específico
para cada ser. Assim, está em plena consonância com a demanda da pessoa
com TEA. Todos os alunos têm limitações e potenciais para aprender, conseguir
enxergá-los em sua individualidade e levá-los a se desenvolver mais
plenamente, o que chamam de mediação, na perspectiva histórico-cultural. Para
a criança com TEA o percurso de desenvolvimento da linguagem é diferenciado,
a comunicação não verbal, por exemplo, é pouco significativa, assim, costuma
considerar apenas o que se fala, sem as demais referências contextualizadoras.
As inabilidades mais comuns de linguagem são

ausência de espontaneidade na fala; fala pouco comunicativa com


tendência a monólogos; utilização do pronome pessoal de terceira
pessoa; frases gramaticalmente incorretas; expressões bizarras,
neologismos; dificuldade de compreensão de informações e
significados abstratos, além da ecolalia. (Benini; Castanha, 2016, p. 7)

Autistas desenvolvem ecolalia com frequência, que é um comportamento


de eco. A criança repete frases ouvidas na televisão ou de outras pessoas,
usando a mesma entonação e ritmo da original, muitas vezes para criar uma
rotina tranquilizadora, mas quase sempre sem considerar o significado e
aplicação funcional da informação repetida. Outra característica da linguagem
nos autistas está em serem mais literais na comunicação verbal, sem entender
metáforas, por exemplo, e muito do que envolve conceitos abstratos.
Para muitos professores, o mais impactante no atendimento à criança
com TEA é justamente a ausência ou limitação da linguagem verbal. Os

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processos educativos convencionais, sobretudo para crianças menores, estão
fundados nas trocas vocais, entre professor-aluno e entre os alunos. Muitas
pessoas com TEA precisam da comunicação alternativa, para aqueles que não
usam a vocalização, se tornando mais um fator de impacto para o professor.

3.3 Interesses, atividades e comportamentos repetitivos e/ou estereotipados

Outros aspectos que caracterizam o TEA e que o plano de ensino


individual necessariamente contemplará são interesses, atividades e
comportamentos repetitivos e/ou estereotipados. “As manifestações de
comportamentos repetitivos e estereotipados incluem se fixar em rotinas que
trazem segurança e aprender de forma singular. Ocorre uma relação diferente
entre o cérebro e os sentidos, de modo que as informações nem sempre geram
conhecimento” (Moreira, 2020, p. 39).
Alguns apresentam hiper ou hipossensibilidade nas reações, costumam
sentir-se atraídos e “perder” muito tempo com objetos que apresentam
movimento contínuo ou repetitivo; podem ser muito seletivos quanto aos
alimentos. Ao mesmo tempo em que esses objetos ou respostas
comportamentais acalmam ou demonstram a insatisfação da criança, também
impedem a evolução da aprendizagem e será necessário trabalhar com isso na
escola. Pode ser necessário intervir para diminuir os comportamentos
excessivos que atrapalham o aprendizado.

TEMA 4 – MATERIAIS E RECURSOS PEDAGÓGICOS

Nos temas anteriores, levantamos características, limitações e pontos de


vista sobre a educação escolar para pessoas com TEA. Passamos agora a
indicar soluções, isto é, opções didático-pedagógicas para concretizar propostas
de aprendizado. Entendendo que “o processo de mediação pedagógica só será
efetivo se o aluno com TEA for visto como alguém que, apesar das limitações
impostas pelo transtorno, pode se desenvolver e se apropriar dos diversos
aspectos da cultural humana” (Moreira, 2020, p. 55).
Começamos pelos materiais didáticos. É consenso que o material precisa
ser pensado para estimular a criança e promover a vinculação dela com os
professores, colegas e com o conteúdo a ser aprendido. Para oportunizar
aprendizagem para pessoas com TEA nem sempre serão necessários recursos

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de alta tecnologia, muitas vezes soluções de baixo custo são suficientes, como é
o caso dos cartões de comunicação alternativa. Materiais concretos, comumente
empregados na escola para alunos pequenos, são alternativas para facilitar o
aprendizado de criança com deficiência, transtorno ou dificuldade. Jogos em
geral também são opções bem interessantes,

dentre eles os de caráter lúdico cooperativo são importantes à medida


que promovem o desenvolvimento cognitivo, emocional e social do
autista. São considerados relevantes, pois estimulam aspectos
afetivos, proporcionando ganhos em habilidades sociais. Sendo assim,
um instrumento significativo no processo de inclusão escolar. (Benini;
Castanha, 2016, p. 15)

Recursos e materiais serão efetivos quando associados a uma proposta


de trabalho, ao plano educacional. Lembre-se de que a interação com objetos
não é fácil para pessoa com TEA; excesso de estímulos não é um caminho para
estimular aprendizado para autistas. Deixar a criança cercada de materiais e
jogos pode mais atrapalhar que ajudar. Outros materiais e recursos são muito
bem-vindos para organização temporal e espacial, como agendas, calendários,
listas, roteiros de estudos e tabelas. (Benini; Castanha, 2016)
Nas últimas décadas, temos uma grande possibilidade de contribuição
para pessoas com TEA por meio de recursos de alta tecnologia. Como uma das
maiores dificuldades dos autistas está na comunicação, com certeza há
potencial nas Tecnologias Digitais de Informação e da Comunicação (TDIC).
Alguns aplicativos educacionais também são apresentados como alternativa
para aprendizagem de pessoas com TEA.

TEMA 5 – PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

Em muitos momentos da aula e dependendo da atividade, o atendimento


individualizado será necessário para o estudante com TEA, acompanhado pelo
mediador ou pelo professor regente. Nos níveis de gravidade moderado e grave
também precisará do Atendimento Educacional Especializado (AEE), cujo
profissional responsável, segundo o PNEE (2008) será um norteador para o
planejamento do professor da sala de aula convencional, além promover as
adaptações dos materiais e para cada criança, incluindo o material de
comunicação alternativa quando for o caso. Vamos relembrar os níveis de
gravidade do TEA, classificados de acordo com a necessidade de apoio: nível I –
bom rendimento com apoio; nível II – precisa de apoio substancial e mesmo

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assim há prejuízos sociais; nível III – precisa de muito apoio, no entanto, os
prejuízos em seu funcionamento ainda são significativos.
Não podemos esquecer que condições comuns em escolas são
estressantes para muitos autistas, como barulho intenso, ou mesmo moderado,
de vozes e objetos. As mudanças de rotina são muito impactantes para eles, por
isso já alertamos da necessidade de prepará-los para qualquer alteração. Nem
sempre seguir regras é algo fácil para as crianças TEA. Tendo em vista as
diversas características e condições citadas, você consegue indicar o que pode
ser ajustado ou incluído na escola para torná-la atrativa a criança com TEA?
Considera-se também a frequente associação do TEA a comorbidades,
como o alto índice de deficiência intelectual, transtorno de ansiedade e
depressão, TDAH, distúrbios do sono e outros. Análises e investimento didático-
pedagógico nessas áreas também devem ser considerados para elaboração do
plano educacional. Assim como qualquer outra dificuldade, deficiência e
transtorno, há aspectos que chamam a atenção positivamente para o TEA.
Alguns sujeitos se destacam da população típica,

podem também apresentar habilidades incomuns que permitem em


muitos casos superar outras áreas de déficits, por exemplo: forte
destreza visual, facilidade de entender e reter alguns conceitos, regras,
e sequências; excelente memória para detalhes ou fatos mecânicos;
memória de longo prazo; capacidade em informática, habilidades
tecnológicas ou interesse musical; intensa concentração ou focalização
especialmente em áreas de atividade preferidas; habilidades artísticas,
matemáticas e a honestidade. (Benini; Castanha, 2016, p. 8)

Quando essas habilidades se manifestam é importante tirar proveito para


motivar a criança, valorizar suas conquistas e provocá-la a ir além.
Seguindo por esse caminho, temos Cunha (2017) com várias orientações
práticas para os professores. Uma delas é tirar proveito dos objetos de interesse
da criança. Nem sempre esses objetos são empregados pelo autista em sua
funcionalidade social, então levá-lo a entender que blocos de montar servem
para outras coisas além de enfileirar repetitivamente, que podem ser encaixados
e mudar a forma, pode ser uma boa evolução. Considere que “assim como as
ações da criança são percebidas como movimento e manipulação sem sentido,
a mãe e as pessoas próximas vão deixando de significá-las. Como resultado,
persiste um brincar limitado e empobrecido, já que possíveis transformações não
são incentivadas” (Martins, 2013, p. 26). Isso não pode acontecer também na
escola.

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Um fator importante da escola para com a pessoa com TEA está na sala
de aula como local privilegiado para socialização. Tentar tirar proveito, na
medida do possível, da relação e interação com o grupo de alunos tornando-as
aos poucos familiares ao autista, será uma excelente oportunidade de
aprendizado. Nas palavras de Cunha (2017), “incluir é aprender junto”. Sempre
valorizar os momentos nos quais a criança se concentra na atividade, essa é
outra orientação de Cunha (2017). Com muita paciência e persistência, estimular
sempre à participação tendo em vista que um dos principais propósitos das
ações na escola é levar a pessoa com TEA a conquistar maior autonomia.
Cunha (2017) também destaca a sala de recursos que precisa ser
preparada para aluno com TEA. O excesso de objetos e estímulos não é
proveitoso; a ideia é oferecer um espaço simples, com materiais organizados e
sinalizados para aumentar a concentração e específicos para a atividade a ser
desenvolvida a cada momento. Lembrando da necessidade de preparar as
mudanças, quando houver, que devem acontecer paulatinamente.
O professor terá que se preparar para atender momentos de birra, medo e
raiva, muito comuns em autistas. Cada qual terá sua estratégia e apoiar-se nos
interesses da criança é uma boa opção. Como exemplo, para alguns TEA a
música pode ser uma forma de acalmar; alguns inclusive têm muito interesse por
músicas (Cunha, 2017). O autor relembra que o autista muitas vezes não
direciona o olhar, portanto o professor precisa se habituar a colocar-se no campo
de visão dele, dessa forma atraí-lo para a atividade ou orientação proposta.
As ações cotidianas na escola podem promover desenvolvimento da
concentração e memória, um exemplo está na simples organização do material
de aula. Atender à orientação do professor na execução das atividades pode
auxiliar na organização do pensamento e linguagem, assim como atividades em
grupo levam ao desenvolvimento da socialização e afetividade (Cunha, 2017).
Para planejar as práticas pedagógicas com objetivo de inclusão de alunos com
TEA pode-se incluir

• atividades para comunicação, cognição e linguagem: livros, jogos


coletivos, pareamento de concreto com símbolos, música, desenho,
pintura, jogos e atividades que utilizem novas tecnologias digitais e
estimulem o raciocínio;
• atividades para desenvolvimento matemático: blocos lógicos, pareamento
do concreto com o simbólico; encaixes geométricos, jogos e atividades

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que utilizem novas tecnologias digitais, atividades com temas do cotidiano
e que estimulem o raciocínio lógico-matemático;
• atividades para o desenvolvimento motor: exercícios que trabalhem as
funções motoras e sensoriais, encaixes diversos, colagem, recorte,
atividades físicas, atividades com música e de vida prática;
• atividades para socialização: atividades esportivas individuais e coletivas;
atividades pedagógicas em que o aluno possa compartilhar com a turma o
seu saber; atividades que possam ser realizadas por todos os alunos;
• atividades para o desenvolvimento do foco de atenção: atividades e
pesquisas áreas distintas do conhecimento sobre temas que o educando
tem interesse; atividades com novas tecnologias digitais, recortes
diversos com tesoura, música, arte, desenho, pintura e vida prática
(Cunha, 2016, p. 95).

Também trazemos aqui o resultado da pesquisa de Moreira (2020), que


implementou junto a professores da Educação Básica atividades no Plano de
Desenvolvimento Educacional Individualizado (PDEI) para alunos autistas. O
ponto de partida para desenvolver o PDEI foi a avaliação dos limiares das ZDP
de cada um. As atividades são específicas para cada aluno, de acordo com suas
necessidades, desenvolvimento real e potencial. Aqui vamos enumerá-las como
exemplos um pouco mais concretos do que nossos docentes têm desenvolvido
com seus alunos autistas. Vamos à lista de atividades por habilidade:

1) Habilidades comunicativas: conversas dirigidas; utilização de gestos;


escutar histórias curtas; jogos simbólicos, atividades com músicas;
nomeação de objetos; contação de histórias; jogos simbólicos e de
imitação.
2) Habilidades de leitura/escrita: atividades com música; alfabeto móvel;
para identificar vogais e outras atividades; massinha de modelar para
desenhar sobre elas; textos pequenos com temas de interesse para
identificar sílabas simples; escrita do nome; sílabas móveis; jogos com
letras e sílabas.
3) Habilidades de raciocínio lógico-matemático: jogos com sólidos
geométricos para aprender nomes e características; jogos com números
para reconhecer número e quantidade; com blocos lógicos; com ábaco e
material dourado para quantidade e adição.

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4) Habilidades sensoriais: atividades com materiais diversos para caixa de
sensações; sucata para construir objetos, como rolo interno do papel
higiênico para simular alto-falante; imitar sons de animais; cantar e emitir
sons de vogais; cantar músicas infantis com gestos; massinha de
modelar; atividades com balões; música alta e baixa; atividade com
espelho (contato visual).
5) Habilidades motoras: arrumar e guardar material escolar; alinhavo para
coordenação motora fina; treino com lápis (segurar); recorte e colagem;
tapete de lateralidade; recursos concretos.
6) Habilidades sociais: brincadeiras afetivas (cantar com gestos e
expressões faciais); cartões de sentimentos; em frente ao espelho para
ver expressões; com música, para relaxar.
7) Habilidades adaptativas: escovar os dentes, pentear os cabelos, comer
sozinho.

Perceba que a lista não está contextualizada, de maneira nenhuma seria


um cardápio de sugestões. Apenas tem a intenção de revelar que as atividades
para alunos autistas nem sempre são tão diferenciadas daquelas que o
professor já conhece e utiliza com alunos de desenvolvimento neurotípico, o
importante é adequá-la à necessidade de cada criança e inseri-la no plano de
ensino com objetivos claros, bem delineados. Moreira (2020) e os professores
que participaram da pesquisa realizaram o levantamento prévio das habilidades
deficitárias em cada aluno. Após aplicação das atividades previstas, um novo
levantamento foi realizado para identificar alterações no desempenho deles.
Rodrigues et al. (2020) tomando Cunha como referência, evidenciam que
a prática pedagógica do professor no atendimento do aluno com TEA pode se
pautar em três aspectos básicos: observação; avaliação; mediação. Observar
para conhecer e entender a criança, suas habilidades e interesses; avaliar para
verificar a efetividade das práticas, instrumentos e recursos empregados para
ajustes e preparação para os próximos passos; e mediar, que se concretiza nas
intervenções para conectar aluno, docente e escola.
É necessário lembrar que, para alunos da educação especial, é muito
frequente também desenvolver na escola atividades de higiene pessoal, mesmo
em idade na qual crianças típicas já as desenvolveram. Apesar de básicas
mesmo em ações como escovação, uso do banheiro, lavação de mãos podem
apresentar oportunidades de aprendizado mesmo de conteúdos acadêmicos.

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Toda oportunidade de aprender precisa ser explorada. O mesmo no que se
refere à rotina, iniciar o dia escolar trazendo o aluno TEA a participar construindo
o cronograma serve tanto para tranquiliza-lo quanto à rotina, quanto ao
aprendizado e desenvolvimento de habilidades diversas (Miranda, 2015).
Para finalizar, precisamos ressaltar novamente que a responsabilidade
sobre os alunos de educação especial é de toda a equipe escolar, além do
professor regente. Temos a figura do acompanhante em sala de aula, o
profissional da AEE, a equipe pedagógica e sempre que possível a participação
de profissionais especializados como fonoaudiólogo, psicólogo, fisioterapeuta e
outros. Assim, Benini e Castanha (2016) sugerem ações como:

a) realização de reuniões regulares entre os envolvidos no atendimento


dos estudantes com autismo; b) a comunicação entre professores e
família com o uso de instrumentos como agendas, cadernos e outros,
sob a orientação dos multiprofissionais que já atendem estes alunos
junto aos professores e equipes pedagógicas das instituições; c) a
criação de espaço para formações e grupos de estudos sobre a
temática buscando estratégias viáveis e efetivas de atendimento aos
alunos com TEA; d) um olhar dos pedagogos para o currículo aplicado
nas escolas regulares que possuem alunos com deficiências, como o
autismo, e) a proposição de mudança nas metodologias, utilizando e
oferecendo materiais de apoio, readaptando espaços se for o caso.

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REFERÊNCIAS

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