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Publicado em NOVA ESCOLA 02 de Abril | 2018

Inclusão

7 perguntas e respostas sobre


autismo
Com qual idade é possível diagnosticar se uma criança é autista? Como os
professores podem garantir o acolhimento na sala de aula?
Soraia Yoshida

Foto: Getty Images

O autismo – ou Transtornos do Espectro Autista (TEA) – refere-se a uma série de transtornos que
caracterizados por desafios em habilidades sociais, comportamentos repetitivos, fala e comunicação
não verbal, assim como características únicas e diferentes. Não existe um autismo único autismo e sim
vários tipos, causados por diferentes combinações genéticas.

LEIA MAIS Asperger: como a escola deve acolher o aluno e os pais

Aproximadamente 1 em cada 160 crianças em todo o mundo possui algum transtorno do espectro
autista, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde. Uma criança autista apresenta
dificuldades no desenvolvimento da linguagem, nos processos de comunicação, interação e
comportamento social. Mas estudos já mostraram que programas de treinamento e educação podem
reduzir essas dificuldades.

Não há testes de sangue ou genéticos que possam determinar se uma criança é autista. O diagnóstico
é baseado no comportamento.

LEIA MAIS Desafios na inclusão dos alunos com deficiência na escola pública
O processo de identificar uma criança autista assemelha-se a identificar uma deficiência de
aprendizado. O professor precisa olhar para as habilidades sociais da criança e ver se elas ficam
aquém do seu potencial. Não existe uma maneira simples de conferir se uma criança demonstra
comportamento social apropriado para sua idade, da mesma maneira que as habilidades de leitura e
escrita.

Tal como qualquer pessoa, quem é diagnosticado com TEA tem pleno direito à educação em escolas
regulares, sejam públicas ou particulares. Estar na sala de aula comum permite à pessoa diagnosticada
com TEA socializar e aprender com pessoas diferentes. Por lei, toda criança tem o direito de conviver
em sociedade e aprender em um ambiente heterogêneo - o que é positivo para o desenvolvimento
humano.

Para tentar diminuir os estigmas que ainda pesam sobre o autismo, NOVA ESCOLA levou uma série de
dúvidas básicas, mas que ainda geram dúvida, a Liliane Garcez, gerente de programas do Instituto
Rodrigo Mendes (IRM).

Com qual idade geralmente é possível diagnosticar se a criança possui TEA?No caso de
Asperger, valem as mesmas recomendações?
Não há consenso quanto a isso. Ao contrário, trata-se de uma questão bastante polêmica. Se, por um
lado, há quem defenda o diagnóstico precoce, por outro, uma parte significativa de especialistas afirma
que é preciso considerar que nos anos iniciais estamos em pleno desenvolvimento e um diagnóstico
equivocado pode gerar sérios prejuízos. O diagnóstico de TEA é o que chamamos de diferencial, que é
um método sistemático usado para identificar doenças realizado, essencialmente, por processo de
eliminação. Envolve a somatória de algumas características e a exclusão de outras, ou seja,
características que podem indicar que uma criança tem um transtorno do espectro autista podem não
estar presentes em outra com o mesmo diagnóstico. Após o lançamento do DSM V, o transtorno de
Asperger passou a ser considerado dentro da designação geral, ou seja, ele está contemplado no
transtorno do espectro autista. O importante é compreender que a Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão estabelecem que os processos de Habilitação e
Reabilitação devem começar “no estágio mais precoce possível e sejam baseados em avaliação
multidisciplinar das necessidades e pontos fortes de cada pessoa”. Estabelecem ainda que a atenção
integral à saúde das pessoas com TEA deve “envolver diagnóstico diferencial, estimulação precoce,
habilitação, reabilitação e outros procedimentos definidos pelo projeto terapêutico singular”. Ou seja, a
avaliação deve considerar os aspectos biopsicossociais, assegurando que o direito ao diagnóstico
precoce seja contemplado de maneira mais abrangente.

Na escola, os professores devem ficar atentos a quais comportamentos?


Esforços, por parte da escola, no sentido de buscar o diagnóstico quando há hipótese de TEA são
legítimos, principalmente para assegurar direitos. Entretanto, por vezes o que faz a escola buscar um
laudo é a expectativa ilusória de que ele irá trazer respostas sobre como trabalhar com aquele aluno
em sala de aula. Como cada criança é única, as barreiras que impedem seu acesso pleno ao currículo
também são peculiares. Nesse sentido, ainda que apresentem pareceres diagnósticos semelhantes,
duas pessoas podem reagir às mesmas intervenções de maneiras bem diferentes. Duas pessoas
podem ter características comuns, mas são diferentes uma da outra. Quando o laudo médico é
interpretado como um atestado de incapacidade, a escola pode deixar de apostar nas potencialidades
do estudante, o que se torna uma barreira atitudinal ao processo de escolarização. Buscar um
diagnóstico ou apoiar a família nesse processo é uma ação que faz parte das responsabilidades de
uma escola que protege. Porém, ele não pode ser fator de segregação escolar e sim compor as
características da criança e da turma a serem consideradas no planejamento de estratégias
pedagógicas para todos e cada um dos estudantes.

Toda criança com um interesse específico por um assunto pode ser diagnosticada com TEA?
Não. Trata-se de um mito. Nem todas as crianças com TEA apresentam necessariamente o que se
convenciona chamar de “interesse focal” e nem todas as crianças com um interesse específico têm esse
diagnóstico médico. De fato, crianças costumam demonstrar maior interesse por algo. Identificar tais
interesses é fundamental para engajá-las no processo de aprendizagem que justamente tem como um
de seus objetivos ampliar repertórios e agregar conhecimentos novos. Esse é um dos papéis da
educação.

Como o diretor da escola pode garantir a inclusão de alunos com autismo?


Em primeiro lugar, buscando estabelecer espaços de diálogo que, independentemente do formato,
viabilizem a participação ativa de todos os envolvidos – professores da sala de aula comum,
professores do atendimento educacional especializado, coordenador pedagógico, diretor, auxiliares de
limpeza, merendeiros, ou seja, toda a comunidade escolar. A discussão coletiva das estratégias para
alcançar os objetivos de aprendizagem e a união de esforços neste sentido tem se revelado como um
caminho profícuo na busca pela garantia da inclusão destes e de outros alunos. A formação em
serviço, que é uma das atribuições da gestão escolar, é uma ferramenta muito potente para fortalecer
esse movimento. É importante também que o diretor, juntamente com os demais educadores, garanta
a participação das famílias e dos estudantes.

E o professor em sala de aula?


Não há “receitas prontas”, mas, sim, dicas importantes para que a aprendizagem se torne possível e
muito mais significativa para os estudantes. A primeira é chave para as demais: o ponto de partida é
sempre o próprio aluno. Desenvolver práticas pedagógicas a partir do próprio aluno significa buscar
identificar seus interesses e necessidades a fim de flexibilizar o currículo e diversificar as estratégias. E
não há como o professor fazer isso sozinho. E nesse ponto temos a segunda dica: é preciso
desenvolver uma dinâmica de trabalho colaborativo, que envolva diretamente outros profissionais da
escola, professores do atendimento educacional especializado, coordenador pedagógico, diretor,
auxiliares de limpeza, merendeiros, ou seja, toda a comunidade escolar. Vale ressaltar a potencial
relevância do profissional do atendimento educacional especializado (AEE) nesse processo,
principalmente na identificação das barreiras que atrapalham ou impedem a aprendizagem e dos
meios e modos de acesso ao currículo para apoiar o professor em sala de aula. Novamente, a “aposta”
e altas expectativas no processo de ensino-aprendizagem impulsionam o desenvolvimento de cada um
dos alunos, com ou sem TEA.

Como deve ser a conversa com os pais?


Não há uma periodicidade ou formato padrão neste sentido. Mas é necessário garantir espaços de
escuta e diálogo que viabilizem o estabelecimento de uma parceria efetiva entre a família e a escola,
baseada em uma relação de cooperação e apoio mútuo. Toda escola estabelece regras para esse
diálogo. E elas devem ser o guia para alunos com ou sem TEA.

Quais as recomendações para os pais que enfrentam dificuldade para matricular os filhos?
Nenhuma escola pode recusar a matrícula de qualquer estudante com base em seu diagnóstico
médico. Até mesmo dificultar seu acesso representa crime. O direito de frequentar a escola e participar
plenamente de todos os aspectos da vida escolar é assegurado em todas as leis brasileiras.
Especificamente, a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) determina que o acesso de crianças e adolescentes
com deficiência à educação não pode mais ser negado, sob qualquer argumento, tanto na rede pública
quanto na rede particular. Além disso, a lei proíbe a cobrança de qualquer valor adicional nas
mensalidades e anuidades que tenha como justificativa a deficiência ou o TEA.

Assim, a escola mais indicada para qualquer aluno é a mais próxima de sua residência. No caso da rede
privada, é aquela que a família escolhe como de sua confiança. Quando os pais enfrentam dificuldade
para matricularem seus filhos na escola, é recomendável, em primeiro lugar, estabelecer diálogo. Se,
no entanto, essas tentativas forem esgotadas, uma alternativa é contatar a Secretaria de Educação do
município e, oportunamente, o Ministério Público, exigindo os direitos do estudante. Lembrando que o
direito a uma educação inclusiva não se restringe a matrícula e presença; compreende também o
desenvolvimento de suas potencialidades para a plena participação em igualdade de condições com
seus pares.

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