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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

CAMPUS POÇOS DE CALDAS


Departamento de Psicologia

A INSERÇÃO DE CRIANÇAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISMO NA


REDE PÚBLICA DE ENSINO: observação das habilidades sociais e do
acompanhamento oferecido na sala de aula

Leidy Dayana Novais da Cruz


Mariana Brassi Luccas
Regiane de Souza Quinteiro

Poços de Caldas
2020
1. INTRODUÇÃO

O espectro autista se caracteriza por danos desde os primeiros anos de vida na área de
interação social, comunicação e comportamento (BOSA; CALLIAS, 2000). Os estudos
realizados relacionados às áreas de etiologia, possibilidades terapêuticas e inserção em
escolas regulares não são conclusivos, dado que se evidencia a importância de novas
pesquisas.
O direito à matrícula de alunos com necessidades educacionais especiais em escolas
regulares no Brasil é garantido por lei desde a Constituição de 1988. Porém, a inserção de
crianças com autismo no contexto escolar, especialmente em escolas públicas, tem se tornado
um problema principalmente pelo fato de nosso país não se preocupar em oferecer um
atendimento adequado a crianças e jovens com esse transtorno. A grande questão é que tipo
de atendimento especializado seria importante nas áreas da educação e saúde.
A escola, ao receber uma criança com dificuldades em se relacionar, seguir regras
sociais e de adaptar-se, muitas vezes confunde esses comportamentos com falta de educação e
de limite. E, por falta de conhecimento, muitos profissionais da educação não sabem
reconhecer e identificar as características de um autista. A partir disto, o ambiente escolar
pode tornar-se de difícil convivência, tanto para o autista quanto para o professor que não
possui habilidades para lidar com a realidade do aluno, causando estresse para ambas as
partes e prejudicando principalmente o desenvolvimento da criança. Não se deve pensar no
autismo como algo fora da nossa realidade e condenado ao isolamento em escolas
especializadas. Existe muito a se fazer pelos autistas e a principal ação é conhecer a história
de aprendizagem de cada criança ou jovem com autismo, visto que se pode encontrar
especificidades e capacidades em cada uma delas. É preciso entender a visão de mundo de
uma criança autista, não como algo distante, mas como uma pessoa que passará por fases em
seu desenvolvimento e que precisará de compreensão das pessoas ao redor. Importante
considerar a sua inserção na escola regular, proporcionando além da aprendizagem o convívio
social.
Foram levantadas algumas hipóteses para a realização da presente pesquisa que se
referem à possível falta de orientação ou de execução das orientações por parte dos
educadores em relação ao TEA, sobre como inserir a criança no contexto de ensino regular e a
falta de aplicação/adaptação de metodologias de ensino que possam amenizar os prejuízos
causados pelo transtorno.
Acredita-se que o trabalho a ser realizado tentará esclarecer e apontar sugestões de
mudanças em relação aos métodos e relações estabelecidas entre aluno e professor, para que a
inclusão escolar e social das crianças autistas seja efetiva. A partir do que já foi exposto, é
possível realizar os seguintes questionamentos: (a) será que a lei que protege os direitos de
pessoas com Transtorno do Espectro Autista está sendo posta em prática e tem visibilidade a
todas as pessoas? As escolas regulares do ensino público possuem estrutura adequada para a
inclusão desses alunos? Os educadores e funcionários possuem cursos que os qualifiquem
para o trabalho com os autistas? E quais os danos e estresses causados pela não orientação de
como lidar com o transtorno?
A justificativa para a realização dessa pesquisa se deve ao fato de ainda existirem
poucos trabalhos que relacionem a falta de orientação e qualificação dos profissionais na área
educacional, com a dificuldade demonstrada pelos autistas em adaptarem-se ao novo
ambiente, manter relações sociais estáveis e desenvolverem-se cognitivamente
(AGRIPINO-RAMOS; LEMOS; SALOMÃO, 2014). Também foi levado em consideração
que a partir deste contexto de não experiência por parte da professora e dificuldades de
adaptação da criança com autismo, o ambiente acaba sendo influenciado pelo estresse, o que
muitas vezes leva à desistência de ambas as partes de persistirem na aprendizagem. Com base
nos resultados que serão obtidos, busca-se identificar que procedimentos de ensino são
utilizados para promover a inclusão da criança.
O interesse pelo tema proposto surgiu de contatos pessoais com autistas, através do
estágio de observação da disciplina de Psicologia Social, onde foi possível perceber as
dificuldades que a criança autista possuía no processo de inserção social e as limitações nas
atividades propostas pelos educadores. Observou-se, também, as complicações enfrentadas
pelos professores para a adaptação destes alunos tão peculiares, com dificuldades no
desenvolvimento de diversos tipos de exercícios e falhas na comunicação. Em casos em que o
grau de severidade do transtorno é maior, o autista não consegue compreender o que está
sendo proposto e o professor não consegue passar a mensagem. Outro fator que influenciou
na decisão pelo tema da pesquisa, é o despreparo estrutural das escolas regulares, não
possuindo espaços específicos reservados para essas crianças e funcionários com qualificação
adequada para auxiliar na adaptação.
Esta pesquisa buscou estudar como a instituição de ensino escolhida acompanha o
desenvolvimento das crianças com Transtorno do Espectro Autista, na faixa etária dos 4 aos
12 anos, inseridas no contexto escolar de unidades da rede pública de ensino. Quanto aos
objetivos específicos, ficou definido: (a) Observar o acompanhamento escolar de alunos com
TEA no ensino regular, a partir de sua interação social e dos métodos utilizados pela
professora para aprendizagem dos processos cognitivos; (b) Verificar como ocorre a mediação
das professoras com os alunos com TEA; (c) Identificar as facilidades e dificuldades
observadas e apontadas pelas professoras regentes e professoras de apoio nas relações
estabelecidas com os alunos em sala de aula.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

Serão abordados, nos seguintes parágrafos, tópicos com explicações acerca do que é o
Transtorno do Espectro Autista, uma breve contextualização sobre o histórico da Educação
Especial no Brasil e a importância das habilidades sociais no contexto escolar para crianças
autistas.

2.1 O Transtorno do Espectro Autista a o papel da mediação no processo de


aprendizagem.

O Transtorno do Espectro Autista (TEA), por ser uma síndrome comportamental,


possui entre os sintomas alguns impactos psicossociais como: dificuldade de interação social,
déficit de comunicação – quantitativo e qualitativo, e padrões desajustados de comportamento
que não possuem finalidade social (CAMARGO; BOSA, 2007). Outros autores, em literatura
mais recente, apresentam o TEA como um transtorno do desenvolvimento neurológico,
caracterizado por dificuldades de comunicação e interação social, presença de
comportamentos e/ou interesses restritos ou repetitivos. Tem origem nos primeiros anos de
vida e sua trajetória inicial não é uniforme. A busca por sinais precoces do autismo é uma
área de intensa investigação científica, visto que os primeiros sinais surgem antes dos 3 anos
de idade. Trata-se de um transtorno pervasivo e persistente, não havendo cura e suas
consequências e demandas variam de acordo com a variação notável na expressão de
sintomas e com o grau de acometimento (leve, moderado ou grave). A intervenção precoce
busca alterar o prognóstico e suavizar os sintomas (SOCIEDADE BRASILEIRA DE
PEDIATRIA, 2019). É fundamental que por trás do indivíduo diagnosticado, haja uma rede
de apoio que dê o suporte necessário para as condições que o autismo exige. A adaptação
frente a essa condição crônica é um desafio, e por ser uma situação constante ao longo do
ciclo vital dos que se encontram ao redor do diagnosticado, resulta, muitas vezes, em estresse
emocional.

No contexto escolar a mediação do professor com o estudante autista é de extrema


importância para o seu desenvolvimento escolar e adaptação social. Muitas são as
dificuldades que a criança pode enfrentar estando em uma sala de aula, além de estímulos
intensos e diversos – sons, luz, cheiros, sensações atípicas do seu cotidiano, a resistência à
mudança e, principalmente, a dificuldade de interação social. Todos esses fatores são
considerados barreiras que prejudicam a permanência dessas crianças nos ambientes
escolares. Em seus estudos sobre os “Fundamentos da Defectologia” Vygotsky (1995)
dissertou sobre como o escape ao natural e cultural é o limitador principal do
desenvolvimento de uma criança com deficiência. Ainda, para ele, a esfera cultura é o único
caminho para se compensar a deficiência. O desenvolvimento e implantação de técnicas que
englobem as particularidades de cada caso, se feitas e aplicadas adequadamente, podem
produzir resultados surpreendentes no desenvolvimento biopsicossocial de crianças autistas.
Para isso, o ambiente escolar precisa estar preparado para receber, apoiar e incentivar essas
crianças, tanto com instrumentos educacionais quanto com educadores preparados. Muitas
vezes o não-preparo desses profissionais é a principal causa da privação e isolamento de
crianças deficientes mentais. Vygotsky (1995) colocou que a deficiência provoca a “luxação
social”, um processo de reclusão – perante a visão sociocultural do indivíduo somente pelo
ângulo da deficiência e das dificuldades – e que, portanto, a inclusão é fundamental. Também
em seus estudos, ele afirmava haver benefícios da inserção de crianças com deficiência
mental em grupos de indivíduos com desenvolvimento típico, como uma sala de aula,
podendo os outros alunos atuar como mediadores do processo de aprendizagem do sujeito
autista. Essas trocas remetem ao conceito de mediação, que, para Vygostky, muito acrescentou
para o desenvolvimento cognitivo.

Camargo e Bosa (2009) afirmaram que o repertório restrito de atividades e interesses


de crianças autistas muitas vezes é o que restringe a motivação de profissionais que deveriam
trabalhar para potencializar as suas habilidades, e desenvolver aspectos mais específicos de
sua cognição. Segundo Bosa (2002), a ausência de respostas de uma criança autista não se dá
somente a recusa ou devido ao fato do isolamento social ser muito característico nesse
transtorno mas se deve, muitas vezes, à falta de compreensão do que está sendo exigido dela.
Bosa (2006) ainda destacou que o fornecimento precoce de uma educação formal, a partir dos
dois aos quatro anos, aliada à mediação e integração de todos os profissionais envolvidos, têm
obtidos bons resultados. Ou seja, se uma correta mediação for feita, se métodos adequados
forem usados, e não somente uma inclusão superficial e forçada por lei, o avanço no âmbito
escolar viria a acontecer em esferas públicas, não condenando as crianças somente a escolas
especializadas. Camargo e Bosa, em sua pesquisa sobre competência social, afirmaram:

Proporcionar às crianças com autismo oportunidades de conviver com


outras da mesma faixa etária possibilita o estímulo às suas capacidades
interativas, impedindo o isolamento contínuo. Além disso, subjacente
ao conceito de competência social está a noção de que as habilidades
sociais são passíveis de serem adquiridas pelas trocas que acontecem no
processo de aprendizagem social. (2009, p. 68).

Mead (apud Camargo; Bosa, 2008), em seus estudos sobre interacionismo simbólico,
descrevia a socialização como construção de uma identidade social, dada na e pela interação
com os outros. Para Mead, a ação direta de um indivíduo só faz sentido através do gesto de
outro, e cada gesto precisa ser interpretado de acordo com o significado que cada pessoa
atribui à ação. Em escolas, a convivência e partilha de experiências de crianças típicas com
crianças atípicas (no caso, autistas) muito pode contribuir para a visão de mundo de ambas as
partes. Lidar com as diferenças e compreender os diversos significados que uma criança pode
atribuir a uma ação, é o que possibilitaria um progresso cultural e cognitivo.
A escassez de estudos nessa área prejudica a tentativa de não isolamento e condenação
de crianças com TEA, contribuindo para a manutenção do “tabu” em que é associado o
autismo, e dificultando a integração de medidas que combatam essas limitações. A correta
mediação por parte do ambiente escolar, das crianças e do professor é o que define a
permanência ou não da criança com deficiência e/ou necessidades especiais na escola. As
vivências escolares devem promover um desenvolvimento e aprimoramento de aspectos
falhos da tríade – interação social, comunicação e cognição. Nesse processo, com certeza, as
educadoras, alunos do ensino regular e as crianças com TEA estarão aprendendo juntos em
todos os aspectos.

2.2 Breve histórico sobre a evolução da Educação Inclusiva no Brasil

As primeiras instituições brasileiras com a iniciativa de focalizar o atendimento


educacional a pessoas com deficiência surgiram no século XIX. Primeiramente, em 1854, foi
criado por Dom Pedro II, o Imperial Instituto dos Meninos Cegos via Decreto Imperial nº
1.428/1854. Posteriormente, em 1857, foi criado o Imperial Instituto de Surdos-Mudos, por
meio da Lei nº 839/1857 (TEIXEIRA; OLIVEIRA; SOUSA, 2018). De acordo com
Nascimento e Omodei (2019), apesar da criação dessas instituições, a educação ainda não era
pensada para todos, pois a Educação Especial se caracterizou por ações isoladas e o
atendimento era focado apenas em pessoas com deficiências visuais e auditivas, deixando de
englobar as pessoas com deficiências físicas e metal.
Em 1889, a partir da Proclamação da República, a deficiência mental passa a ser
comentada nas pautas de políticas públicas. Essa demanda surge devido ao fato das
implicações que a deficiência mental provocava no âmbito escolar e no da saúde pública,
visto que a relacionava também com a criminalidade e o fracasso escolar. Com isso na década
de 1920, o número de instituições destinadas ao atendimento da deficiência mental aumentou,
ultrapassando o número de instituições que se dedicavam ao atendimento das demais
deficiências (NASCIMENTO; OMODEI, 2019).
Porém as instituições desta época e todo movimento realizado pelo governo através de
campanhas, constituía-se a partir de um caráter assistencialista e filantrópico. Esse fato
contribuiu para que a deficiência permanecesse no âmbito da caridade pública, impedindo
assim que suas necessidades fossem encaradas como direitos de cidadania, o que também
tirava a responsabilidade do governo de oferecer atendimento educacional às pessoas com
deficiência na rede pública de ensino. Neste cenário, o número atendimento feitos nas redes
privadas era maior do que nas redes públicas.
De acordo com Teixeira, Oliveira e Sousa (2018, p.459), com a nova Constituição de
1946, que reafirma as propostas de redemocratização do país, é assegurado à União a
competência de legislar sobre as Leis de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Com isso,
em 1961, é instituída a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, por meio da Lei nº
4.024/1961, que contempla um tópico específico sobre a “educação de excepcionais´´. Neste
tópico se encontra o art. 88 que afirma que a “educação de excepcionais, deve, no que for
possível, enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade”; e
também o art. 89 que reforça a possibilidade de investimento público nas instituições de
“iniciativa privada consideradas eficientes pelos conselhos estaduais, podendo receber dos
“poderes públicos tratamento especial mediante bolsas de estudo, empréstimos e subvenções”
a fim de garantir atendimento aos alunos “excepcionais”. Nesta mesma época, surgem duas
importantes instituições especializadas em deficiência, a Sociedade Pestalozzi (fundada em
1926) e a Associação de Pais e Amigos de Excepcionais (APAE) (fundada em 1954).
A década de 1970 foi marcada pelo processo de institucionalização da Educação
Especial em termos de planejamento de políticas públicas. Surge então o Centro Nacional de
Educação Especial (CENESP), em 1973. O CENESP tinha como finalidade de integrar os
alunos que apresentavam deficiência leve e moderada, ao ritmo de estudos das escolares
regulares. Os estudantes que apresentavam dificuldades e/ou deficiências mais severas, eram
encaminhados a escolas específicas de educação especial (NASCIMENTO; OMODEI, 2019).
Segundo Teixeira, Oliveira e Sousa (2018), essa década se caracteriza por ser um período de
transição de uma modelo segregacionista, em que havia um isolamento social da pessoa com
deficiência, ao movimento integracionista, visando a institucionalização desta como uma
forma de preparo para a vida. Neste modelo de integração, desde pequena a criança era
encaminhada para instituições especializadas em deficiência para aprenderem a se adaptar a
sociedade, sendo a escola o local ideal para essas conquistas. Nota-se, portanto, que o modelo
clínico, terapêutico e assistencialista da educação no Brasil ainda permanece.
Juntamente com o processo de redemocratização do país e a promulgação da
Constituição de Federal de 1988, o Brasil é influenciado pelo movimento mundial a favor da
integração da pessoa com deficiência e é garantido então a igualdade de acesso e permanência
na escola dessas pessoas, sendo o dever do Estado o oferecimento do Atendimento
Educacional Especializado (AEE), preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208). De
acordo com Nascimento e Omodei (2019), foi somente em 1994, através da Declaração de
Salamanca que o princípio de inclusão foi apontado pela primeira vez no Brasil. O documento
orientador estabelece que “crianças e jovens com necessidades educativas especiais devem ter
acesso às escolas regulares, que elas devem se adequar por meio de uma pedagogia centrada
na criança, capaz de ir ao encontro dessas necessidades” (ONU, 2006 apud NASCIMENTO;
OMODEI, 2019).
Ainda em 1994, foi lançada no Brasil a Política Nacional de Educação Especial,
orientando o processo de “integração instrucional”. O documento orienta que aqueles que
“(...) possuem condições de acompanhar e desenvolver as atividades curriculares programadas
do ensino comum, no mesmo ritmo que os alunos ditos normais” (BRASIL, 1994a, p. 19
apud NASCIMENTO; OMODEI, 2019) devem frequentar as classes comuns da rede regular
de ensino. Para Teixeira, Oliveira e Sousa (2018), essa declaração reafirma os pressupostos
construídos a partir de padrões homogêneos de participação e aprendizagem. Desta forma, a
política não provoca mudanças nas práticas educacionais para que haja uma valorização dos
diferentes potenciais de aprendizagem no ensino comum. Ela ajuda a manter a
responsabilidade da educação desses estudantes exclusivamente do âmbito da educação
especial.
Segundo Nascimento e Omodei (2019), foi em 2008 que o país conquistou o maior
avanço em relação às políticas em Educação Inclusiva. Neste ano foi lançada a Política
Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, orientando sobre o
AEE em salas de recursos e centros especializados de referência. Essa política defende que os
alunos que possuem deficiência tenham o direito a frequentar a sala de aula comum e, quando
necessário, recebam atendimento educacional especializado no período inverso ao da
escolarização. Assim, a Educação Especial passa a ser definida como modalidade de ensino
que perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, realiza o atendimento educacional
especializado, disponibiliza os serviços e recursos próprios desse atendimento e orienta os
alunos e seus professores quanto a sua utilização nas turmas comuns do ensino regular
(BRASIL, 2008 apud NASCIMENTO; OMODEI, 2019).
O decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011, afirma que o Atendimento
Educacional Especializado (AEE) “deve garantir apoio especializado para eliminar as
barreiras que possam prejudicar o processo de escolarização de estudantes com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação”, assegurar a Sala
de Recursos Multifuncionais, formação continuada de professores para o AEE, formação de
gestores, educadores e demais profissionais para atuação na educação especial, adequações no
campo de acessibilidade física e estruturação de núcleos de acessibilidade nas instituições de
ensino superior. O Decreto preconiza que o atendimento educacional especializado deve
“integrar a proposta pedagógica da escola, envolver a participação da família para garantir
pleno acesso e participação dos estudantes, atender às necessidades específicas da educação
especial, e ser realizado em articulação com as demais políticas públicas”. (TEIXEIRA;
OLIVEIRA; SOUSA, 2018, p. 468).
Em 2014, foi aprovada a Lei 13.005, de 25 de junho de 2014 (Lei do PNE), que
estabelece 20 metas a serem efetivadas até 2024, em relação à Educação Especial foi proposta
a disponibilidade e garantia, nas três esferas de governo, o ``investimento de 10% do PIB para
a educação, sem contingenciamento, contemplando rubrica específica para implantar e
implementar programas e projetos na área de educação especial (BRASIL, 2012 apud
NASCIMENTO; OMODEI, 2019) ``. A PNE propõe também universalizar, para a população
de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e
altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao atendimento educacional
especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, com a garantia de sistema
educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços
especializados, públicos ou conveniados (BRASIL, 2014 apud NASCIMENTO; OMODEI,
2019, p.71).
Recentemente, no dia 30 de setembro de 2020 foi promulgado o decreto N° 10.502
que institui a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com
Aprendizado ao Longo da Vida.. Com isso a União, em colaboração com os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, se responsabilizam por implementar no Art. 1º ´´programas
e ações com vistas à garantia dos direitos à educação e ao atendimento educacional
especializado aos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades ou superdotação´´ (BRASIL, 2020). Essa nova política é bastante recente e alerta
os profissionais da Educação Especial acerca do estabelecimento de classes especializadas nas
escolas de ensino regular. Esta proposta parece contrapor-se à política definida em 2008.
Neste momento é de expectativa sobre os efeitos do presente decreto.

2.3 Estimulação de habilidades sociais em contexto escolar

Em estudos acerca da Psicologia do Desenvolvimento, Hartup (1989) aprofunda-se na


temática das interações sociais com pares, influenciado pelos paradigmas da cognição social
(Piaget), aprendizagem social (Bandura) e as teorias sociogenéticas de Baldwin e Vigotsky
(CAMARGO, S.P; BOSA, C.A, 2009). Esse autor sugere que toda criança necessita vivenciar
dois tipos de relacionamentos: vertical e horizontal. O relacionamento vertical se caracteriza
por relacionamentos complementares que envolvem apego, construção de vínculo, a uma
pessoa com maior poder social ou conhecimento, como os pais, a professora ou um irmão
mais velho. Já os relacionamentos horizontais são igualitários, pois envolvem companheiros
da mesma idade, cujo poder social e comportamento mútuo se originam de um mesmo
repertório de experiências, e, portanto, podem caracterizar-se também recíprocos. Esses dois
tipos de relacionamento exercem funções diferentes para a criança e são necessários para o
desenvolvimento de habilidades sociais efetivas. Enquanto a relação vertical proporciona
segurança e proteção, cria modelos internos básicos e desenvolve habilidades sociais
fundamentais, a relação horizontal desenvolve habilidades sociais que só podem ser
experienciadas no relacionamento entre iguais: formas específicas de cooperação, competição
e intimidade (HARTUP, 1989, 1992).

Os conceitos de competência social e habilidades sociais são intimamente


relacionados e, por isso, muitas vezes utilizados como sinônimos. Del Prette e Del Prette
(1996, 1999) fazem a distinção entre ambos. Segundo esses autores, a habilidade social possui
um caráter descritivo, o qual se refere à totalidade dos desempenhos do indivíduo perante as
demandas de uma situação em sentido amplo As habilidades sociais contribuem para o
desenvolvimento das competências sociais, favorecendo um relacionamento saudável e
produtivo com as demais pessoas. A competência social, por sua vez, é a capacidade que a
pessoa possui de articular pensamentos, sentimentos e ações, de acordo com cada situação e
cultura, Esta capacidade pode gerar consequências positivas para a criança (DEL PRETTE e
DEL PRETTE, 2005). Trata-se, portanto, não de um traço global da personalidade, mas um
conjunto de comportamentos aprendidos no decurso das interações sociais, sobretudo, na
interação com pares. (CAMARGO, S.P; BOSA, C.A, 2009). Ainda, nesse sentido, Almeida
(1997) ressalta a importância de se compreender a competência social numa perspectiva
desenvolvimental e contextualizada no seu espaço sociocultural. Percebe-se, com isso, a
importância da interação social como papel influente no desenvolvimento da criança,
enquanto via de formação de relações sociais (DESSEN; ARANHA, 1994). Diversos estudos
identificam a importância da interação com pares para o desenvolvimento da criança
pré-escolar e de sua competência social (ALMEIDA, 1997; HARTUP, 1996). No contexto da
criança com TEA é preciso considerar o que minimamente ela precisa aprender acerca das
interações sociais, considerando sempre a rede de apoio, a fim de buscar formas de estimular
o desenvolvimento de algumas das habilidades sociais, considerando as especificidades da
história de vida da criança e realizando adaptações necessárias a depender do nível de
gravidade.

É de conhecimento que o autismo se caracteriza por um desenvolvimento atípico em


fatores relacionados à interação social, comunicação e um repertório comportamental restrito.
Estas características podem ocasionar um isolamento social da criança e de sua família,
principalmente quando não há o conhecimento necessário acerca do transtorno, ou a
estimulação adequada da criança nas suas condições particulares. Estudos apontam que o
processo de socialização se faz muito importante para proporcionar a essas crianças, que se
encontram no espectro, oportunidades de convivência. A inclusão escolar, por exemplo,
oferece oportunidade para construção de um espaço de aprendizagem mútuo e de
desenvolvimento de competências sociais. Proporcionar às crianças com autismo
oportunidades de conviver com outras da mesma faixa etária possibilita o estímulo às suas
capacidades interativas, impedindo o isolamento contínuo (CAMARGO; BOSA, 2009). Além
disso, subjacente ao conceito de competência social está a noção de que as habilidades sociais
são passíveis de serem adquiridas pelas trocas que acontecem no processo de aprendizagem
social. Entretanto, esse processo requer respeito às singularidades de cada criança. E, segundo
Moura, é nesse contexto de relações sociais que ocorrem também a estimulação da
linguagem, o desenvolvimento cognitivo, o autoconhecimento e o conhecimento do outro.
Além de também de proporcionar conhecimentos sobre o mundo, e auxiliar
consequentemente nos relacionamentos subsequentes – em casa com a família e socialmente
com o mundo.

3 METODOLOGIA

O desenvolvimento da pesquisa consistiu em uma revisão de literatura bibliográfica


sobre o Transtorno do Espectro Autista, para tanto foi utilizada a base de dados SCIELO - a
partir do uso das palavras chaves: autismo; contexto escolar; habilidades sociais; inclusão
escolar, educação especial, e também livros relacionados ao assunto.
Posteriormente, foi realizado um trabalho de campo em uma escola pública e
municipal em uma cidade no interior de Minas Gerais, por meio de observações e registro das
interações entre alunos e professoras durante as aulas.

3.1 Participantes
Participaram da pesquisa uma professora regente e duas professoras de apoio (A1 e
A2), dos 1° e 2° ano, a psicopedagoga da Sala de Recuros Multifuncionais e foram
observados três alunos (B1, B2 e B3), do sexo masculino, com idades entre 9 e 12 anos, sendo
um de cada turma, no período vespertino.

3.2 Materiais
Foi utilizado um modelo de folha de registro para os registros diários das atividades
observadas em sala de aula. O primeiro modelo consistia em um quadro contendo 16 frases
afirmativas - que foram elaboradas a partir das observações dos comportamentos e falas que
mais eram recorrentes na mediação professora-aluno - que remetiam a diferentes formas que a
professora poderia interagir com a criança-alvo (ex.: chamar o aluno e auxiliar a fazer a
atividade; dar bronca). As pesquisadoras observaram e registraram a frequência dos
comportamentos desejáveis para a interação com os alunos e que ocorriam durante o horário
das aulas. A folha de registro também permitia ter um melhor controle da quantidade de
visitas realizadas à escola, a quantidade de tempo da visita e quais turmas já haviam sido
visitadas. No total foram utilizadas cerca de seis folhas de registros por cada pesquisadora.
Um celular foi utilizado para gravação do áudio da entrevista com a psicopedagoga.
Um questionário contendo 15 perguntas foram enviados para as professoras regentes e
de apoio, contendo os seguintes temas: formas de avaliação do aluno com autismo; uso de
atividades adaptadas em sala de aula; forma de preparo de atividades adaptadas; a observação
e acompanhamento das professores acerca do desenvolvimento do aluno com TEA, entre
outros.

3.3 Procedimento de coleta de dados


Para a coleta de dados as pesquisadoras realizaram a observação e registro dos
comportamentos durante as aulas, anotando as observações no final do protocolo de registro
de cada visita. Foram realizadas seis visitas ao todo nas salas de aulas (três visitas no 1° ano
B; uma visita no 2° B; e duas visitas no 2° ano A), a fim de observar as professoras em suas
interações com os alunos com TEA. A entrevista semiestruturada com a Psicopedagoga foi
realizada com agendamento prévio após as observações e análises de dados realizadas e teve
uma duração aproximada de 30 minutos. A psicopedagoga autorizou a gravação da entrevista
por meio do celular de uma das pesquisadoras. Na sequência foi elaborado um questionário
no Google Forms e enviado para o e-mail de cada professora.

3.4 Procedimento de análise de dados


Os dados obtidos a partir das observações foram distribuídos em tabelas para verificar
a frequência dos comportamentos das professores (regentes e de apoio) em suas interações
com os alunos com TEA. A elaboração do questionário ocorreu com base nas frequências
mais baixas observadas de certos comportamentos, abrangendo as principais problemáticas. A
proposta inicial era realizar a entrevista com as professoras regentes e de apoio, porém, após
pedidos das mesmas e em função do período de final de ano letivo as pesquisadoras
optaram-se por elaborar um questionário online.
Tanto os dados transcritos da entrevista quanto os dados do questionário foram
analisados, e, a partir dessa análise de conteúdo, foram realizadas subdivisões de temáticas e
tópicos para o desenvolvimento de quadros informativos (Quadros 1 e 2), que abordam as
respostas das professoras regentes e de apoio em contraste com o que foi observado pelas
estudantes durante a fase de observação em sala de aula.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados encontrados nas observações das crianças em sala de aula, na entrevista
com a psicopedagoga e nas respostas dos questionários devolvidos pelas professoras serão
apresentados na sequência em que foram realizados.
4.1 Acompanhamento escolar de alunos com TEA no ensino regular, a partir de sua
interação social e dos métodos utilizados pela professora para aprendizagem dos processos
cognitivos.
Com a realização da pesquisa e do trabalho de campo, foi possível notar que houve
interação entre as crianças com TEA e os outros alunos da escola pública. Esta interação
variava de aluno para aluno, pois cada caso possuía características individuais que podiam vir
a permitir ou não uma aproximação tanto por parte do aluno com autismo, quanto dos
professores e colegas. Quanto à interação das professoras com os alunos com autismo e com
os demais, percebeu-se pelos registros em sala de aula que o aluno é bem amparado pelas
professoras, tanto regentes quanto de apoio, essas sempre trabalhando a autonomia do aluno,
ajudando-o a se desenvolver da melhor maneira possível – como foi citado em uma das
respostas do questionário. Percebeu-se uma maior interação e auxílio por parte das
professoras de apoio para com os alunos com TEA, talvez por estarem somente com eles,
enquanto a professora regente tinha todo o restante da sala para se preocupar, por isso a
interação era maior entre a de apoio e o aluno.

Um aspecto importante a ser ressaltado é a interação das crianças com autismo com
seus colegas e professores. Essa interação que ocorre de um modo tão singular e único entre
eles, reafirmando a importância da inclusão escolar como um caminho que possibilita a
socialização das crianças com TEA através da convivência com seus pares. Essa inclusão abre
caminhos para a aprendizagem mútua e o desenvolvimento de habilidades e competências
sociais de todos os alunos (BOSA, 2002). Importante também refletir em um processo de
aprendizagem em que todos os envolvidos (professoras, alunos com e sem TEA, gestão
escolar, entre outros) serão influenciados pelas relações sociais estabelecidas. Através dessas
interações é possível observar que pode ocorrer estimulação para aquisição de
desenvolvimento da linguagem, dos aspectos cognitivos, do autoconhecimento e do
conhecimento do outro.

Notou-se também que eram utilizados materiais didáticos adaptados como as PECs
(Picture Exchange Communication System), que consistem em rotinas ilustradas que facilitam
a expressão e comunicação do aluno (SANINI; BOSA, 2017); folhas com letras grandes para
serem contornadas com o lápis de escrever; alfabetos para serem completados com letras que
faltam; caixas de areia onde o aluno escrevia letras que eram ditadas; quebra-cabeças
adaptados como atividades; entre outros. O intuito da adaptação desses materiais era
promover uma melhor compreensão desses alunos com o conteúdo administrado pela
professora. Constatou-se também que os materiais adaptados eram utilizados para o
desenvolvimento e aprendizagem de crianças com outras deficiências, visto que a escola
municipal alvo do estudo vem sendo a referência regional em relação à inclusão escolar de
crianças com diferentes tipos de deficiência. Essas observações demonstram que a escola
segue com êxito as leis que amparam a Educação Especial, principalmente no que se refere a
adaptação do plano pedagógico às necessidades do aluno (SANINI; BOSA, 2017).

De acordo com o que foi observado nas visitas para cada sala de aula, foi realizada
uma tabulação com os principais comportamentos das professoras regentes (PR) e professoras
de apoio (PA) ocorridos no dia a dia em sala de aula.

Tabela 1. Comportamentos apresentados pelas professoras na sala de aula em interação


com as crianças com TEA, em três salas de aulas.

Tipo de interação Frequência

PA PR

Chamar o aluno e auxiliar a fazer a atividade 2 0

Correr atrás do aluno 6 2

Recebe abraço/beijo do aluno 17 10

Observar atividades realizadas em sala de aula pelo aluno 15 8

Pedir para aluno se sentar 7 3

Pedir para aluno falar mais baixo 0 2

Realizar atividade escolar para o aluno 2 0

Entregar material para aluno 33 3


Utilizar de recursos adaptados* 11 1

Auxiliar aluno na atividade escolar 35 1

Chamar atenção do aluno para a atividade 14 3

Dar bronca 1 0

Fazer perguntas referentes à atividade para o aluno 12 5

Pedir para aluno ajudar na atividade 2 1

Redirecionar aluno para sua carteira 7 1

Levar o aluno ao banheiro 6 0

Pode ser observado uma frequência maior de interações sociais emitidas pela
professora de apoio, especialmente quando auxiliava o aluno na atividade escolar, chamar a
atenção do aluno para a atividade, fazer perguntas referentes à atividade, observar as
atividades realizadas na sala de aula, entregar material para o aluno, utilizar recursos
adaptados, receber beijos e abraços do aluno, entre outros. Possivelmente essa frequência
maior se deve à exclusividade do trabalho da professora de apoio com o aluno que exigem
necessidades especiais, mesmo que ela precisasse auxiliar outros dois com deficiência. A
professora regente, por sua vez, emitiu os mesmos comportamentos numa frequência menor,
mas recebia beijos e abraços do aluno, observava as atividades realizadas, fazia perguntas
referentes à atividade. Importante salientar uma atenção dividida por parte desta professora
com os outros alunos da sala de aula.

Os observações sugerem que nesta escola municipal as professoras exercem a


educação inclusiva, proporcionando oportunidades para o aluno desenvolver capacidades para
interagir com demais colegas e professoras. Sobre a aprendizagem de habilidades acadêmicas,
estas devem ser programadas conforme o seu potencial, idade e interesse do aluno. Foi
identificado que os materiais e recursos adaptados eram específicos para cada aluno. Esta
convivência no dia a dia precisa sensibilizar as professoras a propor melhores formas de
comunicação com o aluno com TEA, além de atentar para a potencialidade de cada um e agir
com persistência, pois seu desenvolvimento pode ser lento (AIRES; ARAÚJO;
NASCIMENTO, s/a).

4.2 O papel da sala de recursos multifuncionais como atividade complementar à sala de


aula.
A partir do levantamento das temáticas mais presentes no dia-a-dia das salas
acompanhadas, surgiram questionamentos acerca de como era realizado o trabalho da
psicopedagoga com as crianças com TEA na Sala de Recursos Multifuncionais. Com essa
intenção, foi realizada uma entrevista com a psicopedagoga para compreender como
acontecem as intervenções desta profissional com os alunos.
De acordo com a psicopedagoga, os alunos que apresentam maiores dificuldades na
aprendizagem no desenvolvimento cognitivo, são encaminhados para este serviço
complementar ao ensino regular que acontece em horário contrário aos das aulas. Este
serviço ofertado dentro da própria escola colabora para a integração e inclusão dos alunos.
Diferente das instituições específicas para pessoas com deficiência, que a acabam excluindo
essas pessoas da convivência com outras que não possuem deficiência. Se, a partir da AEE,
uma correta mediação for realizada, se métodos adequados forem usados, e não somente uma
inclusão superficial e forçada por lei, poderia acontecer um avanço significativo no âmbito
escolar, não segregando as crianças com TEA a escolas especializadas. Esse é o avanço
proposto pela Política Nacional de Educação Especial, proposto em 2008.
A psicopedagoga contou que a escola já recebeu vários cursos relacionados ao autismo
e assuntos da mesma temática, inclusive ofertados pela própria entrevistada e pela diretora.
Segundo a percepção da entrevistada, há uma diferença quanto a atenção dada pelos
professores quando o curso é administrado por alguém de fora da instituição.
Pode-se perceber também que é realizado um planejamento prévio de seis meses em
relação a cada caso, com os professores regentes e de apoio, com a direção e supervisão para
discutir as características de cada caso. E após essa discussão, os professores adquirem
autonomia e a procuram quando em situações específicas – como crises, ou questões
referentes à aprendizagem, ou algum comportamento atípico do aluno. Esta informação
retrata a importância da escola pública buscar meios para a capacitação dos profissionais
porque a inclusão pode exigir adaptações curriculares a depender das capacidades de cada
aluno com TEA.
Outro assunto abordado na entrevista foi sobre como certos métodos que funcionam
tão bem para certas crianças, podem ser um fracasso para outras. As condições de cada caso
são singulares, e, por isto, o tratamento é único e diferente para cada aluno. As estratégias
adotadas precisam variar de acordo com os diversos diagnósticos e limitações que cada caso
sustenta. Novas descobertas são realizadas todos os dias com as crianças e assim novas
maneiras de lidar com cada uma vão surgindo. É através de erros e acertos que se percebe a
evolução. E mesmo que às vezes mínima, é o que faz valer a pena o trabalho.

Percebeu-se na entrevista que o trabalho da psicopedagoga é intenso e em busca


constante de encontrar melhores formas de comunicar-se com as crianças com autismo a fim
de oferecer oportunidades para aprenderem o currículo proposto pela escola. Identificou-se
que as trocas realizadas com as professoras regentes e de apoio configuram um trabalho de
equipe em prol da inclusão da criança com autismo no ensino regular. Oliveira (2020) coloca
que o professor deve abrir as portas para as várias formas de aprendizagem de cada criança
com autismo, desenvolvendo metodologias para aluno aprender a se comunicar e se
desenvolver.

4.3 Como se desenvolve a comunicação com as crianças não-verbais.

A partir das informações apresentadas pela psicopedagoga na entrevista, pode-se


analisar que o trabalho realizado com as crianças com autismo é feito através da utilização de
“pranchas de comunicação” com crianças não-verbais, principalmente com as mais velhas.
Geralmente utilizam fatos/situações/objetos do cotidiano da criança, e a partir disso é
montado frases que ajudem a criança a expressar sua vontade. Há também outros meios que
os próprios alunos desenvolveram para conseguirem se comunicar, como o caso de um garoto
que mostrava pelo aplicativo Google o que queria naquele momento. Com as crianças
menores, a entrevistada relatou que a comunicação é mais difícil. Eles não se expressam e
quase não dão pistas do que estão querendo, o que acaba criando comportamentos
indesejados. É necessário ir tentando acertar por tentativa. Os trabalhos realizados com essas
pranchas de comunicação são inseridos no atendimento com as crianças quando pequenas, e o
retorno só é notado quando esses já estão maiores e passam a compreender que aquela
ferramenta é uma forma de comunicação. Alguns terapeutas acreditam que o trabalho com
pacientes com TPL está fadado ao fracasso e há um gasto de energia em vão. Mas existem
diversos estudos que provam ao contrário e que demonstram que a psicoterapia na abordagem
cognitivo-comportamental é eficaz.

De acordo com Smith (2008), crianças autistas não se comunicam com os outros de
maneira comum, sendo que cerca de 50% das crianças com autismo não falam para se
comunicar, pois não são verbais. Já as outras 50% das crianças são verbais, mas muito do que
dizem é uma repetição do que acabaram de ouvir, fenômeno chamado ecolalia. Em geral, elas
não entendem que a comunicação acontece entre as pessoas e não entendem que as pistas
não-verbais e as opiniões pessoais são importantes para o sucesso da comunicação.

4.4 As diferentes formas de interação entre professoras regentes e professoras de apoio


com os alunos com autismo em sala de aula.

A partir dos dados obtidos com os questionários recebidos pelas três professoras do 1°
e 2° ano (uma regente e duas de apoio), realizou-se uma análise de conteúdo sendo com isto
possível elaborar dois quadros que relacionam relatos semelhantes e divergentes das
professoras regentes e professoras de apoio, em relação às experiências vividas em sala de
aula. As professoras de apoio serão diferenciadas no quadro a partir das siglas A1 e A2, já os
alunos serão identificados como B1 e B2, sendo que cada professora responsável por um
aluno em específico (A1-B1 e A2-B2). O aluno (B1) acompanhado pela professora A1 tinha
mais autonomia, usava a comunicação verbal, enquanto que o aluno (B2) que a professora A2
auxiliava era não-verbal. Cada um apresentava habilidades e dificuldades específicas,
portanto a forma de se relacionar com as professoras se diferenciava, assim como a maneira
de ensinar o conteúdo da disciplina também. O número de respondentes deveria ter sido seis,
que caracterizavam todas as professoras observadas durante o estudo, mas apenas três
responderam o questionário. Portanto, os alunos mencionados nas respostas das professoras
de apoio, se referem a apenas dois dos três alunos que foram observados.
O Quadro 1 apresenta alguns relatos da professora regente e das de apoio que se
assemelhavam em relação aos materiais adaptados, sua relação com os alunos e a
comunicação com os mesmos.

Quadro 1. Relatos semelhantes apresentados pelas professoras regentes e professoras de


apoio (A1 e A2) sobre as experiências em sala de aula.

Categoria Professora regente Professoras Auxiliares Observação das


pesquisadoras
Materiais “O conteúdo que será A1: “Sim. Todas. Especialmente “O aluno realiza uma
adaptados trabalhado em sala divisões por cores. ” atividade de recortar
naquele dia é adaptado palavras e colar em uma
para o nível cognitivo e folha que possuía desenhos
motor do aluno.” A2: “A maioria das atividades de quadrados onde deveriam
devem ser adaptadas para que haja ser coladas as palavras
entendimento por parte do aluno recortadas. ”
elevando sua autoestima e sua “Em uma das atividades, o
autonomia.” aluno deve completar um
alfabeto com as letras que
faltam. As letras estavam
recortadas e separadas da
folha que continha o
alfabeto.”

Relação entre “Ele é muito carinhoso A1: “Minha relação é como a “O aluno deita no colo da
professoras e com ambas, o aluno relação com qualquer outra criança. professora de apoio ”
aluno busca sempre, a sua Eles me consideram como um “O aluno fica quieto por um
maneira, interagir e se apoio para o aprendizado deles. ” tempo em sua carteira, em
comunicar conosco.” seguida bate as mãos na
A2: “É muito carinhoso e quando mesa e começa a murmurar
está tranquilo consigo maior (como se fosse chorar). A
resultado com as atividades.” professora regente se
aproxima dele e conversa
um pouco. O garoto deixa de
murmurar e volta a fazer
atividade novamente.”

Comunicação “Utiliza-se a A1: “Verbalmente. Comunico da ”O aluno se levanta para


com o aluno comunicação verbal e mesma forma que com os demais, pegar o quebra-cabeça que
rotinas ilustradas apenas simplificando as estava debaixo de sua
(quando necessário).” explicações nas atividades. ” carteira. A professora de
apoio diz para ele pedir que
A2: “Não há comunicação verbal. ela pega para ele. “
Mas tem muito entendimento se
expressa por sinais.”

A partir da análise do Quadro 1, percebe-se que há correspondência referente ao que é


afirmado pelas professoras e o que foi observado pelas pesquisadoras, no que se diz respeito a
adaptação do material didático para os alunos com autismo. Como afirmou a professora
regente: ”os materiais são adaptados para o nível cognitivo e motor de cada aluno”. Essa
adaptação se torna muito importante “para que haja entendimento por parte do aluno elevando
sua autoestima e sua autonomia.” , afirmou a professora de apoio A2. De acordo com as
observações realizadas, as adaptações do material didático ocorriam, por exemplo, através do
recorte e colagem de palavras, e complementação do alfabeto a partir das letras recortadas.
Na segunda categoria da tabela, sobre a relação das professoras com os alunos,
percebe-se que há muito afeto e carinho entre eles. A professora regente ao se referir a um dos
alunos, informou que ele era muito carinhoso com ambas as professoras e que ele encontrava
diferentes maneiras de se comunicar com elas. A professora de apoio também afirmou que o
aluno era muito carinhoso, e quando estava “tranquilo” as atividades eram realizadas com
maiores resultados. Este carinho descrito pelas professoras se confirmou através das
observações das pesquisadoras. Foi observado que o aluno com autismo demonstrou carinho
quando deitava a cabeça no colo da professora, e também era possível perceber que a
professora de apoio apresentava um bom manejo das situações em que o aluno apresentava
algum tipo de desconforto.
Em relação à comunicação entre professoras e alunos, tanto a professora regente
quanto a professora de apoio A1, afirmaram haver comunicação verbal entre eles
simplificando as explicações nas atividades e usando ``rotinas ilustrativas``(quadrinhos com
desenhos de ações a se fazer) para facilitar o entendimento do aluno. A descrição da
observação feita pelas pesquisadoras no quadro, demonstra que existe o entendimento do
aluno quando a professora pede algo para ele.
Esses resultados sugerem que cada professora buscava desenvolver relacionamento
interpessoal com o aluno com autismo, compreendendo o seu ritmo e humor em cada dia de
aula. Não havia falta de contato entre professoras e aluno, respeitando os seus limites.
Segundo Oliveira (2020), o professor terá que perceber as dificuldades, as limitações e as
potencialidades, gostos e estímulos que mais o auxiliarão a atingir os objetivos com esses
alunos.
A seguir o Quadro 2 apresenta o mesmo formato do quadro supracitado, mas com a
diferença que os relatos se mostraram divergentes nas categorias mensuração da evolução do
aluno, realização de cursos e entrega de material didático.

Quadro 2. Relatos divergentes apresentados pelas professoras regentes e professoras de


apoio (A1 e A2) sobre as experiências em sala de aula.

Categoria Professora regente Professoras Auxiliares Observações das pesquisadoras


Mensuração da Folhas de registro e A1: Folhas de registro e conforme Durante o período de observações
evolução do avaliação somática a dificuldade de cada aluno, afinal realizado não foi possível notar nenhuma
aluno cada autista tem uma forma forma de registro da evolução do aluno
diferente de apresentar em sala de aula.
dificuldades. É necessário
conhecer cada caso para criar
medidas necessárias.”

A2: “Folhas de registro e


relatórios.”

Realização de Não. A1: “Faço um curso anual para Não foi observado.
cursos atendimento com crianças de
diversas deficiências, sendo assim
também tratado sobre o autismo.”

A2: “Fiz cursos através da


ADEFIP (Associação de
Deficientes Físicos), mas não
específico para autistas.”

Entrega do A entrega do material é feita A1 e A2: A entrega do material é A professora regente entrega o material
material diretamente para o aluno. feita diretamente para a professora de atividades diretamente para a
didático de apoio.. professora de apoio. Esta organiza o
material e ajuda o aluno a realizar a
tarefa.

A partir das informações do Quadro 2, percebe-se que há divergências entre os relatos


das professoras e a observação das pesquisadoras no que se refere ao modo de mensuração da
evolução do aluno em sala de aula. A professora regente afirmou existir o preenchimento de
uma folha de registro e uma avaliação somática para acompanhamento do desenvolvimento
cognitivo. As professoras de apoio também afirmaram que preenchiam uma folha de registro,
A1 afirmou que varia conforme a dificuldade de cada aluno, e que é necessário usar diferentes
medidas de acordo com cada caso, e a professora A2 acrescentou que confeccionava um
relatório. Durante as observações não foi possível observar o registro da evolução do aluno
algum tipo de registro. O que pode se supor é que estas anotações poderiam ocorrer em
momentos após o horário de aula.
Durante as observações foi registrado que a entrega do material didático utilizado no
dia para as aulas era feito da professora regente para a professora de apoio e posteriormente
esta entregava-o para o aluno. Em suas respostas, a professora regente afirmou entregar
diretamente para o aluno. Enquanto que as professoras de apoio afirmaram que a entrega era
realizada primeiramente para elas e depois repassado para o aluno. É interessante observar
esta dinâmica da entrega do material, pois apresenta a idéia de o aluno está sempre apoiado
por alguém, que ele não possui autonomia o suficiente para receber seu material de estudo
diretamente da professora regente, como ocorre com as outras crianças da sala. Talvez isso
possa estar relacionado com o grau do autismo e de autonomia destes alunos.
Ao analisar as demais respostas do questionário, a professora de apoio A1 afirmou
que possui ensino superior completo, mas não especificou qual o curso, enquanto a A2
afirmou ter magistério e a professora regente também possui magistério. A1 atua na escola há
2 anos, A2 está há apenas 1 ano e a regente atua por 9 anos na escola.
Na questão em que é perguntado se foi realizado algum curso específico por elas para
atuar com crianças autistas, a professora regente afirmou não ter realizado um curso
específico que a capacitou para os devidos trabalhos a serem realizados com as crianças que
possuem TEA. Já as professora de apoio responderam que fizeram cursos para trabalhar com
crianças com deficiências, mas não especificamente autistas. De acordo com o nº 7.611, de 17
de novembro de 2011, o AEE deve garantir apoio especializado para eliminar as barreiras que
possam prejudicar o processo de escolarização de estudantes com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. Desta maneira a formação
continuada de professores para o AEE, formação de gestores, educadores e demais
profissionais para atuação na educação especial são garantias para que realmente haja a oferta
de um atendimento especializado e de qualidade para esse grupo. Além disso, a
psicopedagoga informou que a escola recebeu vários cursos sobre autismo e nenhuma das
entrevistas fez menção a tal informação. Poderia levantar-se a hipótese de que a oferta dos
cursos pela escola pública ocorreu em período anterior do contrato das professoras, visto que
estão atuando há pouco tempo na escola.
Na questão sobre quais atividades adaptadas eram mais frequentemente usadas com
os alunos com TEA, a professora A1 respondeu que utilizava materiais adaptados diversos
como recicláveis, entre outros. A professora A2 afirmou que a ferramenta que mais utilizava
era o quebra-cabeça adaptado. Quando questionadas se existiam atividades que precisavam
ser adaptadas para o uso dos alunos, a professora regente informou que as atividades
realizadas pelos alunos eram adaptadas de acordo com seu nível de desenvolvimento
cognitivo, bem como para suas dificuldades motoras e exemplificou: “Se a sala fará uma
atividade de nomeação das palavras de plantas, o aluno autista em questão (uma vez que isso
varia de aluno para aluno) faria a mesma atividade, porém colando fichas com os nomes das
partes das plantas em seus respectivos lugares, sempre com auxílio para identificar cada
palavra.” Em outras situações a adaptação consistia em fazer uma divisão de cores, quando
havia dificuldade de fala e escrita, as atividades deveriam ser programadas a fim de facilitar o
entendimento por parte do aluno e eleve sua autonomia e autoestima.
Foi perguntado, somente para as professoras de apoio, se elas preparam algum tipo de
atividade para o aluno, a professora A1 respondeu afirmativamente, informando que
preparava atividades com materiais descartáveis, e a professora A2 respondeu que não
preparava material, pois a professora regente deixava preparado para a criança e ela só
entregava e auxiliava a realização. Sobre os alunos participarem de atividades avaliativas
como as outras crianças da turma, a professora A1 respondeu que a professora regente da sala
elabora atividades avaliativas adaptadas conforme o desenvolvimento do aluno, e a professora
A2 respondeu que o aluno não participava das atividades avaliativas como as outras crianças,
já que este aluno em específico era não-verbal então seu acompanhamento se dava a partir de
outras atividades como, por exemplo, as PEC’s. A professora regente afirmou que os alunos
do 2º ano não eram avaliados através de notas, sendo submetidos somente a avaliações
externas, nestas todos os alunos com diagnóstico, segundo orientação do MEC, realizavam a
mesma prova, porém fora de sala e com o auxílio de leitor.
No que se refere à participação do aluno no dia a dia em sala de aula, principalmente
na apresentação de um conteúdo novo, a resposta da professora A1 foi que o aluno interagia
com o assunto, fazia alguma atividade com o mesmo tema, porém com adaptações para sua
capacidade de realização (que nem sempre era como a dos demais colegas), enquanto que a
professora A2 respondeu que o aluno fazia suas próprias atividades, mas não interagia com os
colegas. A professora regente afirmou que a participação do aluno no dia-a-dia em sala de
aula, especialmente na apresentação de um novo conteúdo, acontecia de maneira própria, os
alunos faziam suas próprias atividades e socializam com os colegas em diversos momentos,
como em tempo livre, momento de jogos e brincadeiras, atividades em grupos, construção de
cartazes, entre outros. Isso pode estar associado ao fato desse aluno ser não verbal e
apresentar maiores dificuldades na aprendizagem e na interação com as outras pessoas,
devido ao fato de seus transtorno apresentar características que prejudicam sua evolução
cognitiva.
Quando as professoras foram questionadas se a entrega do material pela professora
regente era feita para elas ou diretamente para os alunos, a resposta de ambas foi de que a
entrega era feita para elas. Já regente diz que a entrega do material didático é sempre feita
diretamente ao aluno. Foi pedido para que citassem exemplos de atividades realizadas pelo
aluno no dia a dia em sala de aula, a professora A1 respondeu que eram realizadas atividades
de alfabetização, leitura de sílabas, somas simples, entre outras, enquanto a professora A2 deu
um exemplo que consistia em fazer as letras do alfabeto e numerais na areia. Uma das
atividades frequentemente mais realizadas pelos alunos com TEA em sala de aula é
interpretação de texto, afirmou a professora regente, a auxiliar faz a leitura do texto e das
perguntas e o aluno responde colorindo o desenho que representa a resposta correta. Esta
atividade é especialmente adaptada para as crianças com autismo.
As professoras de apoio tinham conhecimento a respeito do desenvolvimento da
criança que acompanhavam, sendo que a professora A1 colocou que o desenvolvimento do
aluno que ela acompanhava era maior do que os alunos que as outras professoras de apoio da
instituição, porém em alguns aspectos ele apresentava uma demora maior no entendimento. O
que fica claro na fala: “Enquanto a sala consegue ler textos, os autistas que acompanho leem
sílabas.” Já a professora A2 respondeu que o aluno que ela acompanhava teve uma adaptação
difícil na escola, mas na medida do possível demonstrava interesse, era inteligente, esperto e
assimilava bem o que lhe era ensinado. A professora regente se mostrou estar por dentro do
histórico de evolução comportamental de seu aluno ao afirmar que no início do ano o aluno
não mostrava interesse em realizar as atividades ou interagir com os colegas, mostrava-se
sempre bem agitado, gritava bastante, raramente expressava alguma vontade verbalmente.
Aos poucos passou a gostar de fazer as atividades, sua coordenação motora fina foi
melhorando e começou a interagir com os colegas da sala, com a professora e com a auxiliar.
Foi ficando mais calmo e seu vocabulário se ampliou. Ao término do ano, o aluno já se
expressava em algumas ocasiões sentimentos, desejos de forma verbal.
Sobre o dia a dia das professoras com os alunos, a professora A1 informou que a
professora regente trazia a atividade, e, quando necessário, ela, a própria professora de apoio,
fazia as adaptações que ajudava no entendimento e na organização da atividade, que era
indispensável para aluno autista. Tais alunos a consideravam como um apoio para o
aprendizado deles. A professora A2 informou que às vezes o aluno chegava na escola agitado,
consequentemente não fazia as atividades propostas, muito menos concentrar-se. No entanto,
ela acrescentou que ele era muito carinhoso e quando estava tranquilo ela conseguia um maior
resultado com as atividades. Segundo informações da professora regente, os alunos são muito
carinhosos tanto com ela quanto com a auxiliar, buscando sempre sua maneira própria de
interagir e se comunicar com ambas.
Sobre a comunicação das professoras com os alunos com TEA, a professora regente
afirma que a criança a qual ela dá aula, possui comunicação restrita, porém se comunicam
verbalmente e quando necessário utilizam-se rotinas ilustradas.A professora A1 respondeu
que se comunicava com eles verbalmente e da mesma forma que com os demais alunos,
apenas simplificando as explicações nas atividades. Já a professora A2 respondeu que seu
aluno não era verbal, mas havia muita comunicação através de sinais. Foi questionado a
professora regente o que ela percebia da relação entre as professoras de apoio e o aluno, ela
afirma que a relação em sala de aula entre eles é ótima, se interagem muito bem e a auxiliar
é essencial para o trabalho com as crianças com autismo durantes as aulas.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da pesquisa realizada foi possível identificar como ocorria a relação entre
professoras e alunos diagnosticados com o Transtorno do Espectro Autista. Em geral,
notou-se que há uma maior interação entre professora de apoio e aluno com TEA, pois o
trabalho era focado nele e, portanto, a atenção oferecida a eles era exclusiva. Em relação à
professora regente, percebeu-se que sua interação com o aluno com TEA ocorria mais em
situações em que se é necessário manter a ordem em sala de aula, como nos casos em que o
aluno se encontrava agitado e não conseguia manter a atenção na atividade que as professoras
estavam administrando. Um outro aspecto a ser relatado é a interação dos outros alunos da
escola com as crianças com autismo. Observou-se que havia comunicação e interação entre
essas crianças, e o acolhimento que ocorre na escola era bastante positivo.
Em estudos futuros seria importante a participação de um número maior de alunos e
professores para se obter uma visão ampliada do processo de inclusão trabalhado na escola.
Pode-se notar que a inclusão das crianças com TEA nesta escola pública encontra-se em um
caminho de construção com a estimulação do afeto, das relações sociais, da aprendizagem
sem deixar de olhar as especificidades de cada uma.

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