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Espero que esta obra de carácter didáctico se ajuste às exigências dos meus colegas
juristas formados e em formação e que com ela lhes facilite situar-se e dominar os principais
problemas das Finanças Públicas que apesar de sua interdisciplinaridade, que abre coutadas,
não pretende ver nas Faculdades de Direito formados economistas.
Sofremos forte influência dos Professores Doutores António Sousa Franco e Eduardo
Paz Ferreira que leccionam esta Disciplina na Universidade de Lisboa sem que amiúde nos
socorramos de outros autores e ajustemos forte condimento do nosso contributo pessoal.
Não estamos nem satisfeitos, nem resignados, mas dispostos a não desistir e a insistir.
Agradecimentos
a) Produção,
b) Distribuição,
c) Troca; e
d) Consumo.
Por exemplo, o sal, foi largamente e durante vários anos usado como meio padrão de
troca.
2. Finanças e Estado
Sabe-se que o Estado, para realizar a sua actividade, carece de dinheiro para pagamento
de despesas nas áreas entre outras, de Saúde, Educação, Segurança, Justiça.
3. Evolução da expressão
A palavra latina finis1 é apontada como sendo a raiz etimológica do termo finanças
através duma evolução pela qual, nos séculos XII e XIV, surgiram as expressões finatio e
financia que exprimiam as ideias de débito e de prestação.
Entende-se também que da França, onde designava, no século XV, o conjunto dos
meios económicos postos à disposição de uma organização política para a realização dos seus
fins próprios, terá vindo a generalização do vocábulo2.
O objecto das Finanças Públicas foi alargando sucessivamente o seu âmbito à medida
que o sector público se envolvia num conjunto cada vez mais amplo de actividades,
1
Com o significado de fim, termo, prazo e vencimento de dívida.
2
SOARES MARTINEZ, Introdução ao Estudo das Finanças, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Lisboa, 1967,
pp. 19 e ss.
3
SOUSA FRANCO, António, Finanças Públicas e Direito Financeiro, 4.a Edição, Coimbra Editora, 1997, p. 46.
3
ultrapassando a estrita intervenção nos domínios reconduzíveis às necessidades de segurança,
cultura e bem-estar4.
a) Sentido Orgânico
Neste sentido orgânico, Finanças Públicas designa Órgãos do Estado ou de outro ente
público competentes para gerir os recursos económicos com vista à satisfação de certas
necessidades sociais (ex.: Ministério do Plano e Finanças, Conselho Municipal).
a) Sentido objectivo
b) Sentido subjectivo
Capitulo II
Actividade financeira do Estado
1. Generalidades
2. Definição
4
Considerados por FREITAS DO AMARAL, Diogo, Curso de Direito Administrativo, Vol. 1, Almedina, 1992, p.
32, como as três espécies fundamentais de necessidades colectivas.
4
A actividade financeira do Estado é aquela que visa satisfazer as necessidades
colectivas ou alcançar outro tipo de objectivos económicos, políticos e sociais e se concretiza
na arrecadação de receitas e na realização de despesas.
3. Principais objectivos
Não é excessivo salientar que a obtenção de crescentes níveis de eficiência (em termos
globais), deve ser a principal e a mais constante característica da actividade financeira do
Estado, sendo o seu objectivo último alcançar níveis crescentes de bem-estar social.
(i) Admita-se que uma parcela das receitas públicas aplicada num programa
nacional de reabilitação de estradas rurais. A manutenção da utilidade deste património serve
um conjunto vasto de agentes económicos: o “consumo” deste serviço pelo utente “A” não
reduz nem inviabiliza o “consumo” do utente “B”. Por outro lado, tanto a construção de
estradas como a sua manutenção, foi e é paga com fundos estatais, podendo, eventualmente, ser
construída e reabilitada por uma empresa privada estatal ou pública.
5
(ii) Agora, o caso da instalação de uma unidade industrial produtora de embalagens
de cartão. O Estado pode decidir afectar parte das suas receitas, à realização do fundo de
constituição desta empresa, sendo os bens produzidos adquiridos pelos mais variados sectores
de actividade económica (tanto públicos como privados). Contudo, o consumo de embalagens
pelo cliente “A” impede que o cliente “B” adquira as mesmas embalagens.
(iii) Considere-se ainda uma hipotética produção de material escolar por uma
empresa. Esta empresa pratica um determinado nível de preços, traduzindo as condições de
produção e os custos dos diferentes factores de produção. O Estado, verificando que, aos preços
praticados, 90% dos alunos - correspondendo a famílias de baixos rendimentos – não tem
acesso àquele material escolar, e face ao interesse de que se reveste a utilização daquele
produto para os seus objectivos na área da educação, o Estado decide adquirir o material
escolar à empresa e proceder à sua posterior venda aos alunos a preços diferenciados, quiçá
bonificados, consoante o rendimento do respectivo agregado familiar. O Estado afectou,
assim, parte das suas receitas à subvenção de material escolar que colocou à disposição de um
grupo – alvo pré-estabelecido.
(iv) Um último exemplo: face ao interesse que representa a cultura de algodão para
exportação e as dificuldades financeiras dos agricultores, o sistema bancário está disposto a
lançar uma linha de crédito específica para a respectiva campanha agrícola com uma taxa de
juro mais baixa que a praticada correntemente. Neste caso o instrumento que incentivará a
produção é a taxa de juro (política de crédito) mas a sua utilização só é possível porque o
Estado irá afectar parte dos seus fundos à bonificação da taxa de juro do sistema bancário para
alcançar um objectivo específico.
Dos exemplos supra, sem ser necessariamente pela ordem da sua apresentação,
podemos concluir que a eficiência na afectação de recursos deve considerar:
Como se vê, para uma eficiente afectação de recursos o Estado não deve subtrair-se à
rede de critérios de avaliação económica e financeira, para o que torna-se necessário medir os
efeitos directos e indirectos da sua intervenção nas principais grandezas macroeconómicas,
6
garantindo que (1,o) os objectivos são alcançáveis e (2.o) os efeitos colaterais não actuam em
sentido contrário aos objectivos definidos.
A aplicação das receitas obtidas pelo Estado organiza fluxos para as famílias e para as
empresas, determinando a redistribuição do Rendimento Nacional.
Para esta escola a função distributiva das Finanças Públicas deveria cingir-se
apenas à obtenção de receitas necessárias ao funcionamento do aparelho administrativo.
5
Entende-se por distribuição primária do Rendimento Nacional a participação dos diferentes grupos homogéneos
de agentes económicos (camponeses, pequenos proprietários rurais, operários, funcionários públicos, sector
empresarial privado, sector público produtivo, etc.) na formação do Rendimento Nacional, participação esta que
decorre das condições estruturais prevalecentes numa determinada formação social, num “momento” anterior à
intervenção do Estado.
7
▪ A chamada escola da economia do bem-estar apontava a necessidade de
intervenção do Estado de forma a corrigir os desequilíbrios inerentes ao funcionamento do
mercado, salvaguardando, contudo, a aplicação de rigorosos critérios de eficiência económica.
Assiste-se actualmente à alteração destas duas correntes mas não estão encerradas as
polémicas em torno dos princípios de tributação e de programação das despesas públicas, seu
impacto na actividade económica global, em consequência das diferentes interpretações do
qualificativo adequado.
6
Numa sociedade estruturalmente distorcida, como a nossa, por exemplo, deve entender-se como sendo de
elevados níveis de desemprego e subemprego, atraso técnico e tecnológico, desequilíbrios sectoriais regionais,
profunda desigualdade na distribuição dos rendimentos, e de alta dependência do comportamento dos mercados
internacionais relativamente às suas receitas de exportação e de importação de bens de equipamento.
8
3.4. Crescimento e desenvolvimento económico
4. Necessidades Públicas
São estas características de certos bens de consumo passivo que levam o Estado a
produzir esses determinados bens que podem ser públicos8, ou puramente públicos ou públicos
por natureza9.
A produção destes bens implica despesas cuja cobertura exige financiamento através de
receitas que podem decorrer de preços10, de contraimento de empréstimos ou de impostos,
seguramente o principal, o mais definitivo meio de financiamento e a receita coactiva por
excelência.
7
Para maior desenvolvimento, veja-se o nosso Introdução ao Direito Fiscal, W&W – Editora, Maputo, 2002, pp. 9
e ss.
8
Bens que só satisfazem necessidades colectivas.
9
SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 26.
10
Pela venda de bens que produz. de seu património, ou de serviços cujos rendimentos líquidos destina à cobertura
das despesas públicas para a satisfação de necessidades colectivas.
9
A referência a estas receitas não teve objectivos enunciativos, mas tem apenas um
carácter exemplificativo.
Mas não é apenas a afectação dos bens que interessa mas a sua distribuição eficiente14.
Para esta distribuição eficiente ou óptima15 nem sempre o mercado se mostra apto. A primeira
causa seria a incapacidade de criar a optimização em certas áreas, optando-se ou por delas
prescindir, o que tornaria impossível em sociedade, ou pela sua produção alternativa, uma
solução racional.
11
SOUSA FRANCO, António, ob. cit. , p. 26.
12
Ob. cit., p. 19.
13
Não qualquer sistema livre em que o Estado apenas garante a ordem social.
14
Aquela permite um bem-estar melhor sem afectar a situação dos restantes cidadãos , o mesmo que dizer,
(segundo SOUSA FRANCO, António, ob, cit., p. 23), “quando não for possível nenhuma melhoria na situação de
qualquer dos membros sem prejudicar os restantes”.
15
SOUSA FRANCO, António, ob. cit., p. 25.
16
SOUSA FRANCO, António, ob. cit., pp. 26 e 27.
10
Quando os preços de produção baixam, por efeito do monopólio, a renda monopolista
situa-se acima do preço normal causando prejuízos aos consumidores.
Como se vê, o Estado aparece a actuar para criar níveis aceitáveis de bem-estar, para
introduzir correcções de funcionamento do mercado e supletivamente às actuações dos sujeitos
económicos não dominados pela lógica do mercado.
O Estado cria as condições sem as quais a colectividade pereceria; o Estado tem que
gerar e gerir os bens de custos uniformemente decrescentes, tem que socializar exterioridades e
assumir os que ninguém quer correr; porque só ele pode defender o interesse geral, tem uma
perspectiva ilimitada do tempo, dispõe de autoridade para impor regras de utilização de bens
sem outro tipo de financiamento.
Não que o Estado não possa recorrer a este tipo de financiamento mas é certo
que esta receita não é significativa. As mais significativas receitas não provêem de um
exercício que implique contraprestação do Estado ao cidadão, decorrendo do exercício do seu
imperium.
17
SOUSA FRANCO, António, ob. cit., p. 28.
18
SOUSA FRANCO, António, ob. cit., p. 28.
11
A outra, que deve ser entendida habilmente19, reside no facto de os privados
determinarem as despesas em função das suas receitas efectivas enquanto que o Estado através
de vários meios, o mais poderoso dos quais é o imposto, não subordina estritamente as suas
despesas às receitas.
Por fim, enquanto o fim último das finanças privadas é produzir o lucro,
conseguido pela produção de bens ou serviços com despesas mínimas e sua venda pela receita
máxima, o Estado não tem como fim contabilizar receitas superiores às despesas,
preordenando-se à satisfação de necessidades colectivas, de que atrás falámos.
6. O fenómeno financeiro
Famílias, indivíduos ou mesmo organizações têm como base nas suas relações
económicas o contrato. A Economia Privada, em regra, é contratual.
19
Não queremos que se vá concluir que a capacidade do Estado gastar é infinitamente elástica. Cada vez mais o
Estado vai ou deve ir moderando o exercício do seu poder de lançar impostos, dada a crescente capacidade dos
cidadãos resistirem vitoriosos ao seu agravamento. Acresce ainda o facto de o Estado estar mais atento ao efeito
dos desequilíbrios, em particular dos défices orçamentais, sobre a economia.
20
BRAZ TEIXEIRA, A., Finanças Públicas e Direito Financeiro, AAFDL, 1990, p. 8.
21
Não tem ainda consagração generalizada o uso distinto dos vocábulos financial para qualificar as finanças
privadas e financeiro para as finanças públicas que o Professor Sousa Franco (ob. cit., p. 3) emprega.
12
b) Na Economia Comunitária temos a solidariedade do grupo. Combina-se a
propriedade privada e a propriedade social ou comunitária;
c) Na Economia Pública temos uma solidariedade organizada e dotada de poder
político.
Como fenómeno social, pode ser encarado sob três perspectivas: política,
económica e jurídica.
Por isso, em nenhum caso o fenómeno financeiro pode assumir uma posição de
completa neutralidade política23 e deixar de reflectir as concepções políticas dominantes no
meio social em que se verifica.
O fenómeno financeiro não é uma criação da vontade política nos pressupostos a ela
ajustáveis.
Não se conclua, porém, ser absoluto que a actividade financeira só é possível num
quadro estadual.
22
SOUSA FRANCO, ob. Cit., p. 5.
23
SOARES MARTINEZ, ob. cit., p. 35.
13
Em relação às comunidades religiosas, as necessidades colectivas são financiadas
através de doações espontâneas, do pagamento de taxas para certos serviços, mexendo-se num
domínio de actividade própria, não recorrendo à coacção pública.
Não esgota o Estado a satisfação das necessidades públicas. Há entidades que exercem
uma verdadeira actividade financeira. Tal é o caso dos Fundos (FUTUR, FUNDAC – Fundo
para o Desenvolvimento Artístico e Cultural), Empresas Públicas, Serviços e Autarquias locais.
São entidades com autonomia financeira pela qual têm o direito de organizarem
orçamento privativo, de possuírem receitas próprias e de não carecerem, por isso, de
autorização para a realização das suas despesas.
É neste segundo plano, em que reside a preocupação de dar garantias aos particulares,
aspecto essencial para a defesa dos seus direitos e interesses contra eventuais abusos do Estado.
7. O poder e a economia
Por poder deve entender-se o poder político, que é a forma de organização do Estado
ou, melhor, a capacidade de influenciar comportamentos. Ligado a este aspecto temos a
actividade económica, entanto que processo orgânico de satisfação de necessidades humanas
mediante afectação de bens materiais raros a fins alternativos individuais ou sociais, privados,
comunitários ou públicos.
Daqui resultam relações, como atrás se disse, de três tipos que se seguem:
Teremos, neste caso, a política financeira de redistribuição pela qual se transfere parte
dos rendimentos dos que se encontram acima da nédia para os que se encontram abaixo da
linha dos rendimentos médios, isto é, dá-se dos ricos aos pobres.
Já se vê que por mais liberal que seja a filosofia económica e social de um Estado, daqui
resulta a necessidade de se definir a doutrina ou a política económica e social que deverá ser
por ele seguida, por exemplo, se de inspiração abstencionista, se liberal, se socialista ou se
intervencionista.
24
SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 8.
15
Com a sua intervenção na economia o Estado modifica o comportamento dos restantes
agentes económicos.
O Estado pode actuar como agente económico. A extensão dessa actividade é, porém,
variável.
Há serviços que pode entender-se que só o Estado poderá garantir aos cidadãos tais
como o de abastecimento de água, energia, saúde, administração de justiça, defesa e segurança.
Na actividade económica directa do Estado, o Estado, ele próprio, actua como agente ou sujeito
económico, formulando escolhas ou opções económicas no interesse da comunidade.
As decisões tomadas no âmbito do poder político levantam sempre dúvidas quanto à sua
validade ou eficiência, na prossecução dos objectivos do Estado.
No âmbito das finanças idênticas dúvidas sobre a eficiência das opções do Estado seja
qual for a sua concepção26 ou a sua forma doutrinária27.
25
SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 11.
26
Estado soberano, Estado República, Estado de Classe, Estado conglomerado – ver SOUSA FRANCO, ob. cit.,
p. 75.
27
Sem querermos ser exaustivos, podemos ter o Estado patrimonial, Estado-polícia, Estado guarda nocturno,
Estado de serviços, Estado providência, Estado de bem-estar, Estado de desenvolvimento, Estado de Direito
Democrático ou autocrático, Estado social, Estado Tecnológico, Estado de cultura, Estado autoritário e Estado
totalitário.
16
A decisão financeira é tomada em função de interesses dos governantes que buscam
simpatias e suporte político e, como decisão económica, que também é, não está isenta das
disputas do poder por pessoas ou grupos destas.
O cidadão deposita o voto para maximizar o seu interesse individual ou dos partidos que
apoiam.
O Estado, na sua missão de prosseguir o bem-estar social, tem tomado decisões cujo
objectivo é fortalecer o seu poder político independentemente do resultado de tal decisão.
Noutros momentos, as decisões que o Estado toma no âmbito das finanças têm a ver
com a análise dos processos e objectivos na actividade financeira.
No primeiro caso, a decisão política é tomada por consenso mínimo social30, livre31,
implícito ou explícito, no exercício da democracia.
Ora, antes interessa, falar do conceito de sistema económico que cobre realidades
diversas.
Quanto ao sistema financeiro temos que ele exerce funções que podem constituir fins
possíveis da sua gestão, configurando grandes tipos e efeitos objectivos resultantes do
respectivo financiamento, com destaque para as funções sociais do Estado.
32
SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 17.
33
Para aprofundamento, veja-se SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 48 e PEREIRA DE SOUSA, Domingos,
Finanças Públicas, Universidade Técnica, ISCSP, Lisboa, 1992, p. 59.
18
É o sistema mais antigo e emerge da revolução industrial e caracteriza-se por34:
a) A propriedade privada;
b) Iniciativa privada da qual destaca-se
. liberdade de contratar,
. liberdade de trabalho,
. liberdade de empresa.
2.4. Regimes
A. Liberalismo; e
B. Intervencionismo35.
2.4.1. O liberalismo
34
SOUSA FRANCO, A., ob. Cit., p. 48.
35
Sobre estes dois regimes, para maiores desenvolvimentos, veja-se SOUSA FRANCO, ob. cit., pp. 50 a 66.
36
Teixeira Ribeiro, ob. Cit., p. 40.
19
a) Quanto ao seu lugar e função: dominam os princípios de privatização da economia,
sector público reduzido, mínimo quantitativo e qualitativo e simplicidade da actividade
económica;
b) Quanto às suas relações com a economia privada: dominam as ideias de separação
entre finanças e economia, elasticidade dos fenómenos e abstracção económica do Estado;
c) Quanto à estrutura jurídica das finanças: os aspectos principais resumem-se na
importância da participação democrática parlamentar na actividade financeira, arbitragem entre
o poder público e o direito privado, em ordem a garantir os direitos do homem cidadão-
proprietário e o princípio da legalidade;
d) Quanto à configuração dos instrumentos financeiros: a importância primordial do
imposto e do equilíbrio orçamental.
2.4.2. O intervencionismo
a) Quanto ao seu lugar e função: autonomia do sector público (que passa a ter, para
além da supletiva satisfação das necessidades colectivas, realiza objectivos de política
económica e social), equilíbrio entre economias pública e privada, regra do óptimo (melhor
satisfação das necessidades públicas e o óptimo social), crescente dimensão, pluralidade e
complexidade do sector público;
b) Quanto às relações entre actividade financeira e economia privada: o princípio é o
da integração entre economia e finanças, finanças funcionais (que visam realizar fins
financeiros e extra-financeiros) e finanças activas e o Estado a abandonar a sua passividade e
atitude abstencionista;
c) Quanto à evolução das instituições jurídico-políticas: os aspectos de garantia
individual e predomínio parlamentar alteram com o declínio da instituição parlamentar
(tecnoburocratização das decisões) e formas de participação diversificada da sociedade (civil),
afirmação predominante dos direitos económicos e sociais e limitações ao princípio de
legalidade;
d) Em relação às instituições financeiras assiste-se ao ressurgimento do património
(mobiliário e imobiliário), à saturação fiscal (com o imposto a ter uma utilização extra-fiscal e
subida contínua da carga fiscal real e psicológica), limitações ao princípio do equilíbrio
orçamental com recurso a receitas não efectivas.
2.7.1. Generalidades
Caracterizam os sistemas colectivos três traços tais como a apropriação pública dos
meios de produção, o papel central do plano como super-lei e o interesse estatal, a
solidariedade e o bem-estar colectivo como motivações dominantes.
40
Ob. Cit., p. 62.
41
Ob. Cit., p. 58.
42
SOARES MARTINEZ, apud Domingos Pereira de Sousa, ob. cit., p. 74.
21
O caso paradigmático é o da URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas43,
onde por o Estado ser o principal produtor pergunta-se ser correcto falar da fronteira entre
actividade financeira e economia privada. A resposta afirmativa decorre de se reconhecer que
se justifica a distinção entre o sector público administrativo e o sector público produtivo, entre
o orçamento e a actividade empresarial do Estado44.
Capitulo IV
Conceito, natureza, autonomia e relações do Direito Financeiro
1. Aspectos introdutórios
43
Anterior à prossecução dos princípios de glos nost (transferência) e perestroika (reestruturação) de Mikhail
Gorbatchov.
44
SOUSA FRANCO, A., ob. cit. p. 69
22
No primeiro caso temos englobadas as normas de Direito Constitucional e Direito
Administrativo onde se incluem matérias inerentes à competência quanto à aprovação do
orçamento e a sua autorização política; a fiscalização financeira e a execução orçamental; o
património e o tesouro do Estado.
No segundo caso, temos normas relativas ao direito das receitas e financiamento das
necessidades públicas e que regulamentam os aspectos atinentes ao imposto e outros tributos,
ao crédito público, entre outras fontes de receitas do Estado.
É certo, pelo que temos vindo a estudar, que este ramo – o Direito Financeiro –
prossegue a realização de interesses colectivos, com um dos sujeitos – o Estado – investido de
garantias e poderes próprios.
O Direito Financeiro, tal como qualquer ramo de Direito, caracteriza-se por ter uma
função própria de que decorrem conteúdos e normativos próprios e regimes específicos48,
autónomos, coerentes, axiológica e normativamente unidos, e por ter instituições e vida
próprias.
48
Sobre a evolução histórica do Direito Financeiro: ARMINDO MONTEIRO, Introdução ao Estado de Direito
Fiscal na “Revista da Faculdade de Direito de Lisboa”, Vol. 6, 1949, pp. e 36 ss; SOARES MARTINEZ, Da
personalidade tributária, Lisboa, 1953, pp. 51 e ss; Elementos para um Curso de Direito Fiscal em “Ciência e
Técnica Fiscal”, n.o 138 (Junho de 1970), pp. 14-25.
49
Não pode falar-se, em bom rigor, de autonomia absoluta, pois o Direito é uno e incindível.
24
Apesar disso a autonomia de Direito Financeiro é uma questão assente; uma vez
igualmente assente a autonomização de certos tipos de normas em virtude de sua conexão com
uma função delimitada.
No Direito das Receitas, por sua vez, podem distinguir-se o Direito Tributário que
regula a aquisição de todas as receitas coactivas e o Direito Fiscal que regula, em especial, os
impostos e o seu processo administrativo.
O Direito Financeiro tem mais afinidades com os seguintes ramos, de que recebe
importantes contributos:
a) Direito Constitucional
b) Direito Administrativo
c) Direito Penal
É ao Direito Penal que o Direito Financeiro vai buscar os contributos sobre normas
punitivas relativas à violação dos seus preceitos.
d) Direito Processual
d) Direito Privado
A relação entre o Direito Financeiro e o Direito Privado, para além deste ser o Direito
Comum, há aspectos da actividade do Estado que são regulados pelo Direito Privado, tal é o
caso, por exemplo, da dos empréstimos públicos.
25
e) Direito Internacional
Capitulo V
Fontes, Interpretação e Aplicação da Lei em Direito Financeiro
1. Sobre as Fontes
Mas para não embarcar num recursum ad infinitum, recorrendo à doutrina tradicional,
diremos que entende-se por fontes do Direito os modos de formação ou de revelação do direito,
isto é, aqueles factos normativos a que se atribui predicados de factos produtores (fontes
materiais) de comandos vinculantes (fontes formais).
1.2.1. Enunciação
Entendido, como quisermos, que a expressão fonte não tem significado unívoco, que é
plurisignificativa, podemos enumerar as seguintes fontes de maior consenso51 52 53:
- Lei,
- Costume,
- Jurisprudência,
- Doutrina.
1.2.2. O Costume
1.2.3. Jurisprudência
50
BAPTISTA MACHADO, J., Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1997, p. 153.
51
BAPTISTA MACHADO, ob. cit., pp. 157 e ss.
52
CASTRO MENDES, J., Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa, 1984, p. 90.
53
BRAZ TEIXEIRA, António, Finanças Públicas e Direito Financeiro, AAFDL, 1991, p. 25.
26
Se considerarmos que o Tribunal Administrativo pode produzir assentos que dirimem
conflitos de aplicação contraditória de normas existentes e que eles só cedem perante nova lei,
há que considerar os assentos, com carácter jurisprudencial, fonte de Direito54.
1.2.4. Doutrina
Das tradicionais fontes de Direito apenas a lei é que pode ser apontada como a
fonte intencional imediata56 por excelência, justificando-se o estudo das suas diversas
manifestações:
1.3.1. Constituição
1.3.3. Lei
1.2.5. Decretos
54
Não se afasta, porém, a questão da sua possível inconstitucionalidade já que estaria envolvido o exercício do
poder legislativo por um órgão jurisdicional.
55
BAPTISTA MACHADO, J., ob. cit., p. 163.
56
Para mais desenvolvimentos, ver nosso Introdução ao Direito Fiscal, pp. 45 a 72, W&W Editora, 2000.
27
1.2.6. Regulamentos
PARTE II
Instituições Financeiras
Capítulo I
Aspectos gerais
1. Introdução
57
Para mais desenvolvimentos, ver nosso Introdução ao Direito Fiscal, ob. cit., pp. 86 a 90.
58
SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 107.
59
BRAZ TEIXEIRA, ob. cit., p. 44.
28
O Estado tem a sua actividade centrada no sector público, não apresentando a
homogeneidade que lhe é característica no liberalismo.
2. Descentralização60
64
MACHADO, João Baptista, Participação e descentralização, desenvolvimento e neutralidade na Constituição
de 1976, Coimbra, 1982, p. 55.
65
Ibidem.
66
SOUSA FRANCO, A., Colóquios ..., ob. cit., p. 13.
67
MIRANDA, Jorge, Colóquio – Que lições se podem tirar de uma experiência de 18 anos, ob. cit., p. 48.
68
Richard Bird et François Vaillancount, Descentralization financière et pays en dévéllopement: concepts, mesure
et evaluation – Revue d‘ánalyse économique, Vol. 74, nº 3, Septembre 1998, pp. 343-362.
69
A descentralização permite acelerar as tomadas de decisões e de meios, tendo em conta as preferências locais.
A delegação consiste no estabelecimento de agentes locais que exercem funções governamentais em nome do
Estado, reduzindo o número de funcionários. A devolução é mais próxima do sentido da descentralização.. Esta
pode ser no seio de um Estado constitucionalmente unitário ou federal. Num Estado unitário a descentralização
não é senão um meio de partilha de poderes e responsabilidades entre o governo central – principal, e o governo
local – agente, numa perspectiva de cima para baixo.
No federalismo, uma perspectiva de baixo para cima, são os governos locais que criam um Estado.
No domínio das relações financeiras, pode falar-se do federalismo financeiro ou de finanças federais. No primeiro
o Estado define as regras operacionais e financeiras e supervisa. No segundo existe autonomia influenciada pela
diversidade etnolinguística e económica.
70
Sendo comparável com a regionalização, esta entendida como autonomia constitucionalmente conferida a entes
públicos territoriais em ordem à prossecução de interesses próprios das respectivas populações, com dimensão de
antagonismo de base electiva, isto é, governo próprio e com funções políticas e legislativas.
30
A descentralização será administrativa se às entidades autónomas forem
atribuídas apenas competências para tomar decisões definitivas em matéria administrativa.
A descentralização, com as suas variantes, cria problemas de natureza vária, tais como
saber
71
Em Moçambique, a Constituição veda este terceiro tipo de descentralização, na medida em que, para além de
expressamente declarar o Estado moçambicano um Estado unitário (artº 1), é taxativa na entrega dos poderes
legislativos aos órgãos de soberania, maxime a Assembleia da República.
72
Preferimos falar de políticas económicas na medida em que existirão mais do que uma em virtude dos níveis de
decisão que serão, também, mais do que um.
73
Uma “socialização” que não traz consigo a rica cadeia de articulações sociais.
31
I. Por descentralização financeira entende-se a repartição de serviços públicos e a
organização de rendimentos74 financeiros entre o Estado e as colectividades locais75.
82
Estes conceitos nem sempre exprimem as mesmas realidades. Sobre isso, diz o Professor Paz Ferreira, ob. cit.,
pp. 21 e 22: “... sendo evidente que quando a Comunidade Económica Europeia utiliza a palavra regionalização
para designar uma unidade administrativa distinta, levanta problemas económicos específicos, está longe do
sentido dado à expressão em Itália, onde se contempla com a mesma palavra certas pessoas colectivas públicas de
base territorial e dotadas de um certo grau de autonomia política (...) não são, portanto, pequenas as dificuldades
terminológicas com que se depara o investigador destas matérias ...”.
83
Nos termos do mesmo Regulamento, Artigo 16, eis as características da autonomia administrativa:
a) atribuição de competências aos dirigentes para, nos termos da lei, autorizar a realização de despesas
de gestão corrente ou relativas a planos e projectos aprovados, bem como o seu pagamento;
b) A desagregação das dotações orçamentais na tabela da despesa;
c) Pagamento das despesas efectuadas pela Tesouraria do Estado mediante a utilização das formas de
pagamento do Tesouro, depois de autorizada a libertação de meios;
d) Obrigatoriedade de publicação, no Boletim da República, até trinta dias após a aprovação, de todas as
alterações orçamentais;
e) Obrigatoriedade de prestação de contas pelos responsáveis pela direcção e gestão orçamental, ao
Ministro de tutela e às entidades competentes do SCP.
84
A autonomia administrativa e financeira, nos termos do Artigo 6 da Lei do SISTAFE é a capacidade reconhecida
por lei a uma entidade pública, dotando-a com poderes para praticar actos administrativos definitivos e executórios,
no âmbito da respectiva gestão administrativa e financeira corrente. Nos termos do Artigo 22 do Regulamento do
SISTAFE e para efeitos de gestão financeira, a autonomia administrativa e financeira tem as seguintes
características:
a) atribuição de competências aos dirigentes para, nos termos da lei, autorizar a realização de despesas e
efectuar a cobrança das receitas;
b) dotações orçamentais constituídas por valores globais no Orçamento do Estado;
c) utilização das receitas próprias, obedecendo ao mecanismo de contas de ordem, nos termos do presente
Regulamento;
d) orçamentos privativos, com tabelas de receitas e tabelas de despesas devidamente discriminadas e
publicitadas;
e) pagamento directo das suas despesas;
f) obrigatoriedade de publicação no Boletim da República, até trinta dias após a aprovação do seu orçamento
privativo, devidamente discriminado e de todas as alterações orçamentais;
g) obrigatoriedade de prestação de contas dos responsáveis pela direcção e gestão orçamental, ao Ministro da
tutela, às entidades competentes do SCP e ao Tribunal Administrativo;
h) dever de, no pagamento das suas despesas, utilizar, primeiro, as receitas próprias e, só depois, as
provenientes do Orçamento do Estado ou outro ente público.
85
O sector público deve ser entendido como um conjunto de actividades económicas exercidas por entidades
públicas ou administrativas.
33
A dimensão do sector público deriva duma opção bipolar entre o recurso à actividade
pública ou actividade privada.
2.4.2. A autonomia
Estas carências, antes cobertas pela piedade, caridade e solidariedade familiar, grupal,
profissional, classista ou religiosa hoje passaram a ser cobertas por mútuos de seguros e por
montepios (associações de confrarias) e mais recentemente, numa concepção universalista92
assistencialista93 e laborista94.
86
Em contraposição com o sector administrativo (que não coincide com a Administração Pública) no qual assiste-
se a uma actuação económica do Estado segundo critérios não empresariais) fora do mercado ou através do
condicionamento (inter alia, estímulo, apoio, cooperação, imposição, proibição ou punição)
87
Os órgãos do ente autónomo estão dotados dos poderes necessários para administrar o património de que dispõe
a pessoa descentralizada.
88
A competência do ente autónomo circunscreve-se à gestão do património alheio.
89
A autonomia orçamental é uma desorçamentação que pode ter a forma de independência orçamental. Para mais
desenvolvimentos, ver SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 155.
90
Capacidade de gerir autonomamente os recursos monetários próprios.
91
Capacidade de assumir dívidas.
92
Pela qual se reconhece a todos os cidadãos o direito a um mínimo vital e social.
93
Inspirada pelo regime de esquema mínimo de protecção social, quando solicitada e discricionariamente
reconhecida a necessidade.
94
Defendendo a continuidade de rendimentos anteriormente percebidos na fase activa do trabalhador.
34
depende do governo e da administração central95 do Estado e que tem como unidade básica a
empresa pública96 que podem ser perfeitas97 ou imperfeitas98.
CAPÍTULO II
As instituições financeiras
1. Conceito
- a Constituição financeira,
- os órgãos de decisão financeira (decisores financeiros),
- o aparelho financeiro (administração e gestão),
- os planos financeiros (Orçamento e Plano Económico),
- o património público (o acervo estatal),
- o tesouro público (instituição de gestão dos meios monetários do Estado),
- o crédito público.
95
Não inclui, por isso, o sector empresarial autárquico (alínea j) do n.o 3 da Lei n.o 1/97, de 18 de Fevereiro; e
artigo 35 da Lei n.o 11/97, de 31 de Maio)
96
Lei n.o 17/91, de 3 de Agosto. A empresa pública tem uma determinada relação com o Estado tendo este
controlo, gestão ou maioria de capital social aspecto que, ao ser o mais claro vínculo de dependência orgânico-
funcional no sector público torna inequívoca a publicitação EP(características jurídicas e sócio-políticas de
entidade).
97
São perfeitas quando dotadas de personalidade jurídica, ampla autonomia (administrativa, patrimonial e
financeiro) e aptas a prosseguir objectivos sócio-económicos do estado.
98
Podem ser apontadas como imperfeitas os serviços municipalizados e o Serviço Nacional de Totobola e Lotarias
de Moçambique.
99
Segundo os ensinamentos do Prof. SOUSA FRANCO (ob. cit.,, p. 241) são instituições de enquadramento
aquelas que, diferentemente das instrumentais (meios e instrumentos financeiros) determinam como se forma e
exercita no domínio financeiro, a vontade política do Estado, no respeito pela sua estrutura interna, pelo tipo de
relações que tem com a sociedade e pelos direitos dos cidadãos.
100
OLIVEIRA MARTINS, Guilherme, Constituição Económica, 1o. volume. AAFDL, 1983, p. 5.
101
ANDRÉ e HAURIOU e JEAN GICQUEL, Droit constitutionnel et institutions politiques, 7a. Ed. Montchestien,
1980, pp. 78 e ss.
35
constituição programática ou de constituições político-sociais onde se incluem as constituições
económica, social e cultural.
102
OLIVEIRA MARTINS, ob. cit., p . 10.
103
SOUSA FRANCO, A., Noções de Direito da Economia, AAFDL, 1982, p. 91.
104
SOUSA FRANCO, A. L., Finanças Públicas e Direito Financeiro, Vol. I, 4.a Edição, 1993, p. 244, “Sistema
financeiro e constituição financeira no texto constitucional de 1976 em Estudos sobre a Constituição, Vol. III,
1979; idem, “A revisão da constituição económica”, separata da Revista da Ordem dos Advogados, 1982 pp. 21-3;
e “Sobre a constituição financeira de 1976-82, Estudos ed. Do Centro de Estudos Fiscais, 1983 (separata). Também
o Prof. TEIXEIRA RIBEIRO tem escrito sobre a matéria no Boletim de Ciências Económicas, de Coimbra: “As
opções fiscais da Constituição”, 1978; “O sistema fiscal na Constituição revista” 1982; “O imposto de rendimento
pessoal e a discriminação dos rendimentos”1985; “As alterações à Constituição no domínio das Finanças
Públicas”, 1983; “Os poderes orçamentais da Assembleia Nacional”1971; “Os poderes orçamentais da Assembleia
da república”1987.
105
G. D’OLIVEIRA MARTINS, Lições sobre a constituição económica portuguesa. II – A constituição
financeira, AAFDL, 1984-1985.
106
GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa anotada, I Vol., 2.a ed.,
1984, maxime, pp. 459-473.
107
JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, Vol. I, Tomo II, 1981, pp. 339 ss. (reeds.).
108
OLIVEIRA MARTINS, Constiuiçao Financeira, 2o. Volume, p. 5.
109
A constituição política e social baseia-se nos seguintes princípios:
a) Independência E SOBERANIA (Art. 7 da CRM);
b) Dignidade da pessoa humana (Art.s 70 e 71 da CRM);
c) Democracia política representativa, electiva e pluralista (Art.os 30, 31, 33 e 34, 68, 73, 76 e 77 da CRM);
d) O princípio teleológico da construção de uma sociedade livre, justa e solidária (em geral o At. 6 da CRM);
e) Princípio da descentralização financeira (Título IV e em particular os Art. 181 e 183 da CRM).
36
A constituição financeira formal é aquela que resulta do texto constitucional,
isto é, o conjunto de normas constantes do texto da Constituição ou que sejam dotadas dos seus
requisitos formais.
É um princípio que, apesar de apenas implícito, está dotado dos requisitos formais como
se de texto constitucional formal fizesse parte.
a) No plano do Estado
O Governo, no exercício do seu poder subordinado e delegado tem também uma acção
conformadora.
b) No plano da Administração
110
É por essa razão que OLIVEIRA MARTINS (ob.cit, p. 12) fala da “constituição material como um espaço de
jogo” autónomo e pluralista, como sistema fundamental de mediação jurídica (normativa, jurisprudencial e
consuetudinária) entre valores étnico-jurídicos e os factos económicos e sociais” .
111
OLIVEIRA MARTINS, ob. Cit., p. 12.
112
Orientação geral corresponde à fixação de objectivos e suas prioridades, estratégia e princípios gerais de
actuação.
113
De acordo com o Artigo 133 da CRM, a Assembleia da \República é o mais alto órgão legislativo da República
de Moçambique e a ele compete determinar as normas que regem o funcionamento do Estado através de leis e
deliberações de carácter genérico
114
Entende-se que onde há poder de decisão administrativa tende a haver poder de decisão financeira que é
exercido com tanto mais eficiência quanto maior ele estiver descentralizado.
38
Constituem ainda instituições de enquadramento, responsáveis pela
administração e gestão financeira os vários serviços de coordenação e controlo (por exemplo a
Inspecção-Geral de Finanças, Direcção Nacional de Impostos e Auditoria, a Direcção Nacional
do Património e o Departamento de Dívida Pública), os serviços de gestão orçamental
(Direcção Nacional do Orçamento, a Direcção Nacional de Contabilidade Pública, a Direcção
Nacional das Alfândegas) e, ainda, os serviços de apoio à tutela do Ministério do Plano e
Finanças como sejam o Banco de Moçambique (tutela a bancos), a Inspecção Geral de Seguros
e a Inspecção Geral de Jogos)..
3.4. Tribunais
a) em primeira instância
. Tribunais aduaneiros,
. Tribunais fiscais;
b) em segunda instância
. Tribunal Administrativo.
4. Instrumentos Financeiros
4.1. Explicação
- o Património,
- o Crédito Público,
- o Orçamento,
- a Conta do Estado.
39
- da introdução de um sistema de classificação orçamental moderno, abrangente e
consistente;
- da unificação dos orçamentos corrente e de investimento.
PARTE III
A TEORIA DO ORÇAMENTO
Capitulo I
Origem, conceito e caracterização do Orçamento
1. Origem
Embora não com a configuração de hoje já no século XVI aos monarcas era
imposta uma audição às Cortes.
2. Conceito
Há, pois, que fazer o cálculo antecipado das despesas e das receitas.
Esta é a noção do orçamento, que deve ser entendido como ”um documento no
qual estão previstas as receitas a arrecadar e fixadas as despesas a efectuar, num determinado
ano económico, visando a prossecução da política financeira do Estado.
115
Posição diferente será a dos particulares que iniciarão o processo de planificação financeira com a determinação
das receitas aptas a cobrir as despesas que não terão necessariamente que cobrir as necessidades.
40
A natureza do orçamento a extrair do conceito atrás ensaiado não é a mesma,
consoante se trate de receita ou despesa.
Será uma previsão, em princípio, fixada pelo mínimo desejável, em relação às receitas;
e é um verdadeiro limite (tecto máximo) e condição, quando se trate de despesas.
Aqui chegados, vê-se que em bom rigor o orçamento do Estado é e deve ser
mais do que a definição atrás exposta esclarece. Vale a pena, pois, avançar por uma que
julgamos mais completa:
3. Tipos de orçamento
Será de gerência aquele orçamento que inscreve aqueles dois instrumentos financeiros –
receitas e despesas, no momento em que devem ser cumpridas as obrigações ou exercidos os
direitos correspectivos. Mais facilmente, no orçamento de gerência uma despesa trianual de 9
000 contos terá inscrito em cada um dos três exercícios de sua execução 3 000 contos. Num
orçamento de exercício os 9 000 contos seriam inscritos no primeiro exercício da execução da
despesa.
116
Esta definição inspirada na do Professor Sousa Franco (ob. cit., p. 336) e Pereira de Sousa (ob. cit., p. 86)
parece-nos mais compacta e mais completa.
117
Cfr. TEIXEIRA RIBEIRO, ob. Cit., p. 53.
41
O orçamento de tesouraria é o que permite programar os pagamentos e recebimentos e
pode estar presente quer num orçamento de gerência, quer no de exercício.
O orçamento de exercício é de mais difícil execução mas para efeitos de função política
é o mais recomendável, facilitando a responsabilização dos governos pelos orçamentos que lhes
são imputáveis.
4. Funções do Orçamento
a) Função económica
b) Função política
O orçamento é uma verdadeira exposição do plano financeiro e por ele se faz a garantia
de direitos fundamentais e de equilíbrio dos poderes de decisão financeira.
c) Função jurídica
118
A seu tempo discutiremos mais conclusivamente sobre a matéria.
42
O Direito Orçamentário é mais forte do que o Direito Administrativo.
Deve já deixar-se uma nota leve sobre a diferença sobre Lei Orgânica do
Orçamento contida no SISTAFE119 e na Lei n° 15/97, de 10 de Julho, e a Lei do Orçamento do
Estado que é anual e elaborada em estrita obediência à Lei Orgânica do Orçamento.
Como pode ver-se, estas funções são independentes. A autorização parlamentar é feita
no suposto de alcançarem-se certos e determinados objectivos, através de uma eficiente e
racional gestão dos dinheiros (função económica) se for garantida uma adequada fiscalização
(função jurídica).
5. Realidades semelhantes
Há realidades que importa distinguir de orçamento por, dada a proximidade, com ele
poderem confundir-se , tais como a Conta do Estado, o orçamento das pessoas privadas, o
plano económico e os orçamentos administrativos.
a) Conta do Estado
b) Balanço do Estado
d) Plano Económico
e) Orçamentos Administrativos
119
Lei n° 9/2003, de 19 de Fevereiro.
43
Por orçamentos administrativos designam-se partes do Orçamento que constituem
previsões e autorizações administrativas internas respeitantes a sectores ou estruturas da
Administração.
6.1 As doutrinas
A natureza do orçamento é controvertida, havendo aqueles que admitem poder ter uma
natureza uniforme e aqueles que defendem que a sua qualificação jurídica pressupõe uma
fragmentação.
Seria uma lei em sentido material pois considera-se uma norma inovadora120.
Os que não concordam com a sua qualificação como lei em sentido material sustentam
que não passa de uma autorização ao Governo para realizar despesas e cobrar receitas. Não se
entende que seja uma verdadeira lei pois não fixa regras gerais e permanentes.
c) Acto Administrativo
d) Acto-condição
120
Introduz alterações na ordem jurídica pré-existente.
121
Para mais desenvolvimentos, ver BRAZ TEIXEIRA, ob. cit., pp. 95 a 117.
44
O segundo pressuposto é que o orçamento contém autorizações legislativas e a
competência orçamental da Assembleia da República é exercida sob a forma de lei, por
imposição legal
Está igualmente claro que o orçamento não é um simples acto político, que é uma lei em
sentido formal sendo que do seu desrespeito há penalidades previstas em lei enquadradora.
Capitulo II
Princípios e Regras da Organização Orçamental
1. Aspectos gerais
Classificaremos de regras:
- a anualidade; e
- o equilíbrio,
2. Principio da anualidade
Pela regra da anualidade124 125, o orçamento tem uma vigência anual, refere-se ao ano
financeiro, o qual pode ou não coincidir com o ano civil.
122
Os princípios representam normas substanciais ou essenciais, de validade permanente, resistentes às
contingências e são fonte da disciplina orçamental (BRAZ TEIXEIRA, ob. cit., p. 149).
123
As regras orçamentais, consequência lógica natural dos princípios,, admitem excepções, de conteúdo
pragmático e são adaptáveis às necessidades e às conveniências do momento (ibidem).
124
Não confundir com a anuidade utilizada em sede de Direito Fiscal para significar prestações anuais dum
determinado imposto.
45
Em Moçambique, à semelhança do que sucede na maioria dos países, as receitas e as
despesas são orçamentadas para o período compreendido entre 1 de Janeiro e 31 de Dezembro,
o qual coincide com o ano civil.
Aliás, a nossa lei, como já atrás se disse, não dá guarida a esta concepção.
125
Note-se que tem-se preferido falar do “Princípio de Autorização Anual de cobrança”. É uma transposição do
“Princípio do Consentimento”ou da “Regra da aprovação orçamental”, princípios com larga consagração no
Direito Fiscal e que, na essência, representam a aceitação dos governados à cobrança do imposto pelo poder
instituído. É uma garantia institucionalizada e com dignidade constitucional, constando do Artigo 135, n.o 2,
alínea h) da Constituição da República de Moçambique, que prevê: “2. Compete, nomeadamente, à Assembleia da
República:
h) Deliberar sobre o Plano e Orçamento do Estado e o respectivo relatório de execução.”
126
BRAZ TEIXEIRA, ob. Cit., pp. 124 e 125.
127
PITTA E CUNHA, Equilíbrio orçamental e político anticíclico, Lisboa, 1962.
46
Nos Estados Unidos da América e na Inglaterra, pelo contrário, o ano económico já não
coincide com o ano civil.
Estas visam evitar que escape à autorização politica, na fase de previsão, ao controle
político e administrativo, na fase de execução e à responsabilização jurisdicional e
parlamentar, na fase de prestação de contas, uma quantidade significativa de fundos públicos,
por efeito da desorçamentação das despesas e receitas públicas.
Esta unicidade128 do orçamento torna-o mais claro, simples e de fácil análise, necessária
para uma adequada e consciente fiscalização prévia das receitas e das despesas pelo órgão
constitucionalmente competente – a Assembleia da República.
Esta determinação dos custos e previsão das receitas, de modo autónomo, garante
eficácia, flexibilidade de gestão e eficiência na cobrança de receitas.
128
BRAZ TEIXEIRA, ob. Cit., p. 126.
47
4. Princípio da discriminação orçamental
Pela regra de especialização cada receita e cada despesa vem individualizada e, sem
exagero de pormenor, mas com rigor, clareza e simplicidade, especifica-se o seu conteúdo e o
seu fim com o objectivo de não defraudar os objectivos do orçamento.
Esta regra decorre da regra da universalidade. Ela impõe a inscrição das receitas pelo
valor integral, sem dedução de qualquer natureza, como por exemplo, os encargos de cobrança.
As despesas públicas, no nosso país, são especificadas de acordo com a sua natureza
económica, funcional, orgânica e territorial e a especificação das receitas é feita de acordo com
os classificadores económico e territorial.
Não parece que assim seja; desde logo, porque não há uma vinculação desta receita a
certas despesas, estando apenas determinado que ela não pode ser usada para certas despesas.
129
No caso das autarquias a consignação tem de obedecer a regulamentação do Governo (Art. 6 da Lei n.o 11/97,
de 31 de Março.
130
É este, alias, o sentido do n.o 3 do Art. 40 da Lei n.o 11/97, de 31 de Maio, quando define que o produto das
transferências desse Fundo é de livre aplicação pelas autarquias sem prejuízo de não dever ser aplicado em
remunerações dos autarcas.
48
Esta regra visa evitar que cada serviço ou Ministério constitua-se num mundo à parte,
com receitas e despesas próprias. Uma vez mais, procura-se evitar o fenómeno da
desorçamentação, o qual dificulta o controlo regular das despesas e receitas, impede uma
gestão integrada das mesmas e compromete a planificação orçamental, pondo em causa a
coerência das opções financeiras do Estado.
Em Moçambique, como noutros países, admitem-se excepções a esta regra no caso dos
organismos que gozam de autonomia financeira (orçamento próprio e receitas próprias). Estas
instituições poderão afectar as suas receitas à cobertura (parcial ou total) das suas despesas,
tendo as razoes para tal sido já apontadas.
5. Princípio da publicidade
Como lei em sentido formal que o orçamento é, deve, como requisito de validade, ser
publicado no Boletim da República.
Como lei especial exige-se que para além da publicação ela tenha a necessária
publicidade.
O legislador, para além de indicar especificamente aquelas formas mínimas que deve
revestir a publicidade a dar ao relatório depois da aprovação pelo órgão deliberativo
competente (Art. N.o 3 do Art. 5 da Lei n.o 11/97, de 31 de Maio) deixa claro que este
procedimento é sem prejuízo de outras formas adequadas de publicação (n.o 2 do Art. 7 da
mesma Lei).
Em relação ao Orçamento estadual não é claro como deve ser dada publicidade. Nem o
que já é costume na prática legislativa moçambicana de publicar-se pelos principais jornais do
país, verdadeira publicitação, não tem acontecido com o orçamento.
De todo o modo, podemos concluir que um orçamento não publicado não é orçamento.
É através da publicação do orçamento que se concretiza a autorização política das receitas e
despesas e se dá conhecimento formal à Administração Pública do conteúdo desta autorização.
49
Também só com a publicação do orçamento os cidadãos terão um conhecimento do mesmo,
estando assim em condições de controlar e criticar a sua natureza e execução.
6. Princípio do Equilíbrio
6.1. Caracterização
A definição material, que busca a resposta quanto a saber que tipo de despesa deve ser
coberto por determinado tipo de receitas (equilíbrio substancial132, conduz a várias orientações
para cuja abordagem seguimos de perto os ensinamentos do Prof. Sousa Franco133.
131
Não nos concentramos aqui a saber o tipo de recursos que podem ser receitas tributárias, creditícias,
patrimoniais, donativos ou doações.
132
Ao equilíbrio substancial contrapõe-se o equilíbrio formal de mais fácil satisfação que consiste na igualdade
contabilística entre receitas e despesas.
133
Ob. Cit., p. 365 a 397.
134
Explica o Prof. TEIXEIRA RIBEIRO, ob. cit., p. 91, que o orçamento superavitário explica-se pela necessidade
de cobrir o risco de sobreavaliação das receitas, produzindo menos do que o previsto, ou por se pretender com o
excesso constituir um fundo para usar em períodos de deflação.
50
Entendido doutro modo, o equilíbrio orçamental pode estar garantido no processo de
aprovação ou apenas no processo de execução, mais precisamente, quando da aprovação da
Conta.
Entende-se daqui que o recurso a receitas não efectivas para suportar os encargos
públicos conduziria a um défice orçamental só admissível em casos de sobrevivência nacional,
tais seriam os relativos à guerra ou calamidade pública.
135
Fala-se também em concepções ou orientações. Nesse sentido, veja-se BRAZ TEIXEIRA, ob. cit., p.p. 134 e ss.
e PEREIRA DE SOUSA, ob. cit., pp. 103 e ss.
136
Devem entender-se por normais os rendimentos provindos do património e dos tributos.
137
TEIXEIRA RIBEIRO, J.J., ob. Cit., p. 93.
138
Serão os empréstimos porque repetitivos em certos orçamentos, receitas ordinárias? A resposta será negativa se
precisarmos que a condição essencial para uma despesa ou receita ser qualificada de ordinária é a sua repetição em
todos os orçamentos e não ciclicamente, isto é, de tantos em tantos orçamentos, casos em que seria despesa
recorrente.
51
Segundo este critério, um orçamento é equilibrado quando as despesas ordinárias são
cobertas pelas receitas ordinárias, e as despesas extraordinárias podem ser cobertas pelo
excedente de receita ordinária e pelas extraordinárias.
Este critério não alia a sua clareza e simplicidade ao rigor, que não tem, devido à sua
elasticidade, que permite deturpações na aplicação uma vez que deixa a escolha dos meios de
financiamento ao arbítrio dos governos, protegidos pela qualificação concreta das receitas e
despesas (podendo qualificar-se de extraordinários gastos perfeitamente enquadráveis em
ordinários).
Deficitário seria então o orçamento que tivesse as despesas correntes cobertas por
receitas de capital.
É um critério que permite uma regularidade na gestão financeira sendo, por isso,
considerado de sanidade financeira substancial142.
139
BRAZ TEIXEIRA parece optar por designá-lo de orçamento corrente (ob. cit., p. 136). Nesse sentido,
PEREIRA DE SOUSA (ob. cit., p. 103).
140
São correntes as receitas e despesas que não oneram nem aumentam o valor do património duradouro do Estado
(ibidem).
141
A seu tempo veremos que as receitas e despesas de capital são as que no horizonte anual alteram a situação
activa e passiva do património duradoiro do Estado (SOUSA FRANCO, ob. cit., p. 370).
142
SOUSA FRANCO, A., ib. cit., p. 371.
52
- o critério do orçamento corrente,
- o critério do défice antes de donativos; e
- o critério do défice após donativos.
Um défice que em Moçambique pode ser bastante elevado, não tem, por exemplo,
qualquer expressão numa economia como a norte-americana.
Esta situação é consequência dos esforços de contenção das despesas correntes, e não
tanto de um aumento das receitas correntes, nomeadamente de impostos. Tal tem gerado
diversos problemas ao nível da criação de condições salariais e materiais atractivas que
possibilitem a retenção e renovação dos quadros médios e superiores da função pública.
Esta é uma das razões pelas quais a reforma fiscal em curso e os esforços no sentido de
se melhorar a eficiência na cobrança de receitas pela Administração Pública assumem uma
importância vital no contexto moçambicano.
53
Juntamente com o critério do orçamento corrente, utilizam-se em Moçambique dois
outros critérios de (des)equilíbrio orçamental, o de défice antes e após donativos.
Ele constitui uma medida da dependência externa do Estado no financiamento das suas
despesas, já que os donativos e os empréstimos provêm do exterior.
Contudo, tal não se verifica, já que um dos objectivos da política orçamental no nosso
país tem sido o de evitar o recurso ao crédito bancário, de forma a não desviar poupanças
bancárias que poderão ser canalizadas para o financiamento do investimento privado.
Por outro lado, o Estado não está em condições de recorrer aos empréstimos internos,
em virtude das elevadas taxas de juros praticadas pelos bancos.
O défice após donativos, por sua vez, dá-nos o montante das necessidades de
financiamento do orçamento do Estado que é coberto por empréstimos.
Uma redução do peso da dívida pública externa, no longo prazo, só será possível com
uma redução das necessidades de financiamento das despesas públicas através do recurso a
empréstimos; daí a importância de se reduzir o défice após donativos.
Capítulo III
A Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado (LEOE)
A LEOE e toda a legislação que lhe é complementar, veio criar um quadro orçamental
mais adequado às necessidades de uma intervenção pública moderna, eficaz e eficiente, que
cumpre com as exigências de uma economia de mercado funcional e uma democracia
parlamentar.
A sua introdução constitui um passo importante para que o orçamento do Estado passe
a cumprir de forma mais satisfatória as funções que lhe competem, sejam elas de natureza
económica ou política.
Foi já dito que o orçamento tem a natureza jurídica de lei formal, posição que decorre,
aliás, do n.o 1 do artigo 26 da Lei do SISTAFE que estabelece que a Assembleia da República
delibera a proposta de Lei do Orçamento do Estado143.
A LEOE, antes Lei n.o 15/97, hoje é a própria Lei do SISTAFE no seu Capítulo I do
Título II dedicado ao subsistema do Orçamento do Estado.
É uma lei reforçada não podendo ser contradita por concretos actos orçamentais, sob
pena de ilegalidade ou inconstitucionalidade indirecta144.
A Lei do Orçamento do Estado não é uma mera lei de organização mas um acto
concreto de disposição de cuja conformidade depende a validade de actos administrativos145 e
cuja violação determina sanções.
143
Em sentido idêntico estabelecia a Lei n.o 15/97, de 10 de Julho, Lei de Enquadramento do Orçamento do
Estado, no seu artigo 12, n.2, alia a).
144
SOUSA FRANCO, A., ob. Cit., p. 397.
145
Não é, porém, uma lei a prazo pois os seus efeitos fazem-se sentir para além dos termos do período orçamental.
55
Pode falar-se de legalidade específica uma vez que os actos desconformes ao orçamento
não devem ser autorizados afectando os actos dele carecidos.
Capítulo IV
O processo orçamental
1. Introdução
O processo orçamental tem sido, ao longo das últimas cinco décadas e um pouco
por todo o mundo, alvo de uma constante evolução.
Esta evolução é o resultado, entre outros factores, das mudanças operadas nos sistemas
políticos, nas teorias económicas, nas abordagens de gestão orçamental, nos princípios
contabilísticos e na conduta da administração pública.
O processo orçamental deve ainda ser visto como um processo contínuo, não se
limitando a cada ano económico. Por outras palavras, não é um processo que se esgota no
próprio ano económico, mas que tem continuidade ao longo do tempo.
- Um processo orçamental mais amplo, com uma dimensão temporal mais vasta,
que inclui não só a orçamentação anual de recursos e a sua execução, mas também o
estabelecimento dos objectivos, políticas e programas de curto, médio e longo prazo que estão
na base dos orçamentos anuais;
- Um processo orçamental mais estrito, que tem apenas a ver com a orçamentação
e execução anual das receitas e das despesas, e que se repete todos os anos. Este processo
encontra-se bem descrito na LEOE.
Como veremos já de seguida, estes dois processos não são independentes entre
si. O primeiro engloba e determina o segundo, mas é também, por sua vez, influenciado por
este.
56
A fase seguinte compreende o desenvolvimento de programas ou planos
financeiros de curto, médio e longo prazo. Ela envolve a realização de projecções no tempo e
de previsões, bem como a formulação de critérios para a selecção de programas. Estes
programas implicam, necessariamente, uma priorização de sectores e áreas, de acordo com as
políticas seleccionadas e as metas e os objectivos traçados.
Por último, e para completar o ciclo orçamental, segue-se uma fase de monitoria
e avaliação do orçamento executado, dos programas financeiros e das metas, de forma a
garantir a necessária transparência, eficácia e eficiência de todo o processo.
Esta avaliação servirá, então, de base para a revisão dos objectivos, metas, políticas e
programas do governo.
57
O processo orçamental em Moçambique, tal como descrito na LEOE, compreende 5
fases distintas.
Começa com a elaboração da proposta de Lei do Orçamento (fase 1), que é a seguir
apresentada à Assembleia da República para sua aprovação (fase 2).
Uma vez aprovado, o orçamento é executado (fase 3), podendo ser sujeito a alterações
previstas na lei.
No final do ano económico, procede-se ao encerramento das contas (fase 4), as quais
são depois fiscalizadas (fase 5).
Dada a sua natureza política, existem ainda outras instituições externas ao Governo que
também participam no processo orçamental, tais como a Assembleia da República (nas fases de
aprovação e fiscalização) e o Tribunal Administrativo (na fase de fiscalização).
Capítulo V
Preparação e aprovação do Orçamento
1. Aspectos gerais
146
No sentido de que situa-se entre o Orçamento do Estado e os planos do mesmo Estado.
147
Referimo-nos a vinculação de votar e não a vinculação de aprovar, não obstante haja defensores do
entendimento de que é um dever que impende sobre a Assembleia aprovar o Orçamento e que a sua não aprovação
significaria um acto de paralização do Estado, equivalente a um golpe de Estado (SOUSA FRANCO, ob.. cit., p.
408) ou a um voto de não confiança ao Governo.
148
A votação pode conduzir a uma aprovação total ou parcial do Orçamento.
149
SOUSA FRANCO, ob. cit., p. 411.
58
Significa isto que o montante e o tipo de receitas e despesas a inscrever no orçamento
deverão estar de acordo com a política do Governo e o momento económico, político e social
que se vive no país. O Orçamento constitui um instrumento privilegiado de política do
Governo, tendo não só repercussões económicas mas também políticas e sociais, as quais não
podem nem devem ser ignoradas.
Deve-se, contudo, ter bem presente que a fixação dos limites globais de despesa
não é apenas determinada pela avaliação das necessidades financeiras para o alcance dos
objectivos definidos no programa do Governo. Ela é também condicionada pelas obrigações
financeiras do Estado decorrentes da lei e do contrato, tais como o serviço da dívida pública, o
pagamento de salários aos funcionários do Estado e a comparticipação interna em projectos,
conforme os acordos celebrados com as agências internacionais.
150
Artigo 45 do Regulamento do SISTAFE.
59
Uma vez elaborada a proposta de Lei do Orçamento para o ano seguinte, esta
será apresentada ao Conselho de Ministros pelo Ministro do Plano e Finanças, para sua
apresentação à Assembleia da República.
Para a fixação dos montantes das despesas e previsão das receitas a afectar à sua
cobertura são adoptados critérios ou métodos pelas unidades orgânicas, nomeadamente:
3.2.1. Despesas
As despesas são calculadas por cada serviço ou unidade orgânica do Estado, tendo em
conta a sua avaliação directa dos gastos passados e dos programados, não havendo uma
confrontação entre custos e benefícios nem as vantagens de soluções alternativas para a
actividade em análise.
3.2.2. Receitas
Para a previsão das receitas há métodos que são utilizados que podem ser assim
agrupados:
a) De avaliação directa; e
b) Métodos automáticos.
Tomando como ponto de partida a assunção de que as receitas variam de ano para ano,
este método defende que o valor a orçamentar é o registado no último ano com dados
completos de execução orçamental
Estes critérios são baseados nos métodos de modelos econométricos e podem ser
modelos de decisão 153 ou modelos de previsão154, visam impor uma crescente racionalidade na
previsão, reduzir a prevalência de métodos empíricos e tecno-burocráticos e construir uma
escolha política racional155.
Este critério conjuga a meta do máximo de bem-estar social com o mínimo de sacrifício
fiscal o que exige dos políticos e dos gestores públicos critérios de correcção económica e boa
gestão.
151
SOUSA FRANCO, ob. cit., p. 416.
152
SOUSA FRANCO, ibidem.
153
Esclarecem as consequências económicas de uma medida ou estratégia de política económica.
154
Com base na análise de bases estatísticas disponíveis projecta-se no tempo a evolução que pode logicamente
esperar-se.
155
SOUSA FRANCO, ob. cit., p. 419.
61
Para este efeito podem ser adoptados orçamentos funcionais156, orçamentos de
programas de actividades e de controlo económico157 , orçamento de base-zero158, orçamento
de tarefas159, orçamento de resultado ou de desemprego160, todos baseados na eficiência
gestionário161.
4. A proposta do Orçamento
156
O orçamento funcional agrupa as despesas de acordo com as funções materiais do Estado, isto é, tipos de bens
ou serviços.
157
Os orçamentos de programas concentram-se nos conjuntos articulados de acções ou projectos tendentes a
produzir um resultado.
158
Por este orçamento (Z.B.B. –zero base budgeting) o poder legislativo e o executivo (Governo e Administração)
devem periodicamente (cinco anos) analisar o mérito de certas despesas com vista a controlar o seu crescimento
desmesurado.
159
Este orçamento por tarefas justifica as despesas pelas actividades avaliadas pelos serviços.
160
O orçamento de resultados avalia resultados das actividades dos funcionários e dos gestores, razão por que se
entende tratar-se mais de um sistema de execução – avaliação do que de previsão.
161
Para mais desenvolvimento ver ensinamentos do Prof. .SOUSA FRANCO, ob. cit., pg. 420 e ss.
162
Uma medida compreende despesas de um programa orçamental que corresponde a projectos ou acções ou
ambos, especificados, caracterizados, articulados e complementares que concorram para a concretização dos
objectivos do programa em que se inserem.
163
Projecto ou acção corresponde a unidades básicas de realização do programa ou medidas com orçamento e
calendarização rigorosos.
62
Elaborado o anteprojecto do Orçamento pela Administração é submetido à aprovação
do Governo; este adopta-o e submete-o à Assembleia da República como proposta do
orçamento para o ano seguinte, harmonizado com as acções do PES (Plano Económico e
Social) e PQG (Plano Quinquenal do Governo), compatibilizado com os orçamentos de
investimentos plurianuais164 e observando, em suma, estritamente a conformidade com a
política económico-financeira e o programa anual do Governo165.
Nem a LEOE, nem o seu Regulamento parece referirem-se a esta matéria que
era bem e oportunamente tratada pelo artigo 15 da antiga LEOE167, a Lei n.o 15/97, de 10 de
Julho.
164
Artigo 21, n.o 2 da LEOE.
165
Artigo 24 n.o 2 da LEOE.
166
Artigo 53 do Regulamento da LEOE.
167
Um parêntesis a propósito da referência à antiga Lei, pois é duvidoso que esta Lei tenha sido revogada pelo
artigo 69 da Lei nº 9/2002, de 12 de Fevereiro, que estabelece que é revogada toda a legislação anterior que
contrarie a presente Lei. Sendo certo que a n.o 15/97 é anterior, não é pacífico declará-la contrária. Não seria uma
lei especial da Lei geral do SISTAFE? Então, talvez mais correctamente pudéssemos falar de suas partes
eventualmente derrogadas. O legislador do SISTAFE, quanto a nós, devia ter sido mais inequívoco se a sua
vontade fosse derrogar totalmente a Lei 15/97 com a publicação do SISTAFE. Se a vontade era processar uma
revogação da Lei especial então fá-lo mal pois não cuidou de regular em moldes que pudéssemos deduzir uma
revogação global regulando totalmente a matéria da lei revogada (WATY, Teodoro Andrade, Introdução ao
Direito Fiscal, pp. 95 ss). Por isso, em bom rigor, estamos perante uma derrogação.
63
c) mapas dos limites das despesas correntes, de âmbito central e provincial,
classificados de acordo com os critérios orgânico, territorial, económico e funcional;
d) mapa das despesas de capital, de âmbito central e provincial, classificados de
acordo com os critérios orgânico, territorial, económico, funcional e por fontes de recursos.
A discussão segue a tramitação normal das outras leis sendo relevante o trabalho da
Comissão do Orçamento da Assembleia da República que discute na especialidade os aspectos
marcadamente técnicos168.
5.2. Aprovação
II. Uma vez aprovado o Orçamento do Estado o Governo, nos termos do nº. 2 do
art. 26 da LEOE, fica autorizada a:
168
Deve ser ponderada, à luz do princípio da interdependência dos poderes legislativo e executivo e da
transparência dos seus actos a apreciação do Orçamento na Assembleia da República por Deputados que pelas suas
funções no Executivo, conheçam ou devessem conhecer a proposta do Orçamento e devem ter interesse que ele
seja aprovado pela Assembleia com o mínimo de emendas … Não é matéria do Orçamento mas a necessidade de
seriedade na sua analise justificaria a revisão do Estatuto do Deputado. Afinal, nas regras desportivas é universal
que o jogador não pode ser árbitro!
64
a) proceder à gestão e execução do Orçamento do Estado aprovado, adoptando as
medidas consideradas necessárias à cobrança das receitas previstas e à realização das despesas
fixadas;
b) proceder à captação e canalização de recursos necessários, tendo sempre em
conta o princípio da utilização mais racional possível das dotações orçamentais aprovadas e o
princípio da melhor gestão de tesouraria;
c) proceder à abertura de créditos públicos para atender ao défice orçamental;
d) realizar operações de crédito por antecipação da receita, para atender à défices
momentâneos de tesouraria.
Tais iniciativas poriam em causa a validade do orçamento como documento que define,
racionaliza e limita a actuação do Estado no que se refere à arrecadação e afectação de recursos
financeiros.
A terem lugar, estas alterações apenas serão incluídas em orçamentos futuros. Seria o
caso, por exemplo, da construção de um novo hospital ou a concessão de novos incentivos
fiscais ao investimento, que apenas poderiam ter lugar em anos económicos futuros.
6. Publicitação
169
Este nº. 3 do art. 26 faz da LEOE uma verdadeira lei-travão
170
Artigo 54 do Regulamento da LEOE.
65
II. A fim de assegurar e dar continuidade ao funcionamento da máquina
administrativa, o orçamento executado no ano antecedente continuará em vigor até que um
novo orçamento seja aprovado171.
Implica isto que durante este período transitório serão cobradas todas as receitas e
realizadas todas as despesas correspondentes ao orçamento do ano anterior, já com as
alterações que nele tenham sido introduzidas ao longo da sua execução172.
Naturalmente, não serão cobradas as receitas que se destinavam a vigorar apenas até ao
final do ano anterior.
O novo orçamento que entretanto vier a ser aprovado deve integrar as receitas e
despesas efectuadas até à sua entrada em vigor.
CAPÍTULO VII
A Execução Orçamental
1. Regras Gerais
171
Nº. 1 do art. 27 da LEOE e nº. 2 do art. 54 do Regulamento da LEOE
172
Nº. 2 do Art.. 27 da LEOE.
173
Nº. 3 do Art. 27 da LEO.E
174
Embora independentes consideram-se nesta matéria, Administração os outros órgãos de soberania – Presidente
da Republica, Assembleia e Tribunais enquanto executam os seus orçamentos.
66
A execução obedece a três princípios: o da legalidade, o da economicidade e o da prévia
justificação..
II. O princípio da economicidade entende-se que é constituído por duas regras:
(1ª) a da utilização mais racional possível das dotações orçamentais aprovados; e
(2ª) a da melhor gestão de tesouraria 175 176.
a) Liquidar e cobrar, nem inscrever no orçamento, uma receita que não esteja
autorizada por lei.
b) realizar despesas que, não obstante tenham base legal, não se encontrem
inscritas no orçamento ou não tenham cabimento na correspondente verba orçamental, isto é,
superem o montante de verba fixado no orçamento.
a) No caso das receitas, apenas se condiciona a espécie de receita que poderá ser
inscrita no orçamento (tipicidade qualitativa), não o seu montante que, podendo ser
ultrapassado, não é vinculado;
b) No caso das despesas, pelo contrário, impõem-se limites aos montantes que
poderão ser gastos (tipicidade quantitativa). Elas não poderão exceder as dotações globais
fixadas no orçamento: são autorizadas em espécie e em quantidade.
175
Neste sentido SOUSA FRANCO (ob. cit,, p. 430).
176
Estas regras são considerados por BAZ TEIXEIRA, (ob. cit., p. 169) como princípios fundamentais.
177
SOUSA FRANCO, ob. cit., p. 430.
67
Como ponto de partida para executar o orçamento, o órgão coordenador do SISTAFE
emite as instruções para a execução do orçamento178.
c) tomar as medidas necessárias para que os recursos sejam libertos com vista à
cobertura das despesas previstas em cada período.
O primeiro princípio que tem de ser respeitado na execução das receitas é, como foi
atrás referido, o da legalidade. A receita só poderá ser cobrada se, cumulativamente, for legal e
tiver inscrição orçamental180.
A cobrança das receitas pode ocorrer sob forma de pagamento voluntário ou por recurso
à cobrança coerciva e, no que às dívidas tributárias diz respeito, a cobrança poderá também
processar-se sob a forma de cobrança virtual ou cobrança eventual183.
178
Nº. 2 do art. 56 do Regulamento da LEOE
179
Nº 2 do Art. 56 do Regulamento da LEOE
180
Nº. 1 do Art. 62 do Regulamento da LEOE
181
Art. 58 do Regulamento da LEOE.
182
Conjunto de serviços ou unidades orgânicas do Estado ou outras entidades colaboradoras que procedem às
operações de arrecadação e cobrança de fundos públicos.
183
Art. 63 do Regulamento de LEOE.
68
O processo de execução orçamental relativo às despesas é mais complexo.
Não obstante ele só inicia sob condição necessária de a despesa em causa ser legal.
1º. As despesas só poderão ser assumidas durante o ano económico para o qual
estiverem orçamentadas e deverão sempre respeitar os princípios de economia (minimização
dos custos), eficiência (maximização dos resultados) e eficácia (obtenção dos resultados
pretendidos).
2º. Uma despesa para ser executada tem de estar inscrita numa classe e verba
prevista no Orçamento do Estado, e tem de ter cabimento orçamental (ou seja, tem de haver
verba disponível). No caso das despesas obrigatórias, a utilização da dotação orçamental – do
montante inscrito na rubrica de despesa – é obrigatória, enquanto que no caso das despesas
facultativas a sua utilização é opcional.
3º. A execução das despesas deverá obedecer à regra dos duodécimos, segundo a
qual em cada mês do ano não poderá ser utilizada uma verba superior a 1/12 da verba global
fixada no orçamento, acrescida dos duodécimos dos meses anteriores vencidos e não gastos.
As excepções previstas por lei incluem ainda despesas que pela sua especificidade
beneficiem de um regime especial de utilização das dotações orçamentais.
184
Art. 67 do Regulamento da LEOE.
185
Há doutrina e ordenamentos jurídicos que prevêem as seguintes fases para a realização duma despesa:
a) Autorização,
b) Processamento,
c) Verificação,
d) Liquidação,
e) Autorização de pagamento,
f) Pagamento,
das quais apenas vale a pena explicar duas:
1o. O processamento corresponde a inclusão em “folha” do crédito motivado pela despesa.
2o. A verificação da despesa implica confirmar o respeito pelas normas legais reunindo todos os documentos
justificativos da despesa.
69
a) cabimento orçamental: a verificação da inclusão da despesa em processo próprio e
do cumprimento de todos os requisitos legais e financeiros aplicáveis;
d) autorização do pagamento: a permissão dada por quem tem competência para tal,
para que se proceda ao pagamento da despesa;
Podemos, pois, aditar especificamente para a execução das despesas uma outra regra,
para além da legalidade e economicidade, a da prévia justificação para a sua eficácia técnica,
eficiência económica.
5. Alterações orçamentais
O orçamento, como previsão que é, não deixa de estar sujeito a situações imprevistas
decorrentes de mudanças de conjuntura, de calamidades ou de quaisquer outros novos
condicionalismos.
Como lei que é, como já vimos, a propósito da sua natureza judicial, seria de pensar que
nada há a fazer pois dura lex sed lex. Pois, assim não é; evita-se uma excessiva rigidez e
procede-se à introdução de alterações ao orçamento.
70
A alteração orçamental pode estar confiada à esfera da autoridade orçamental - a
Assembleia da República, ou à da administração orçamental ou às duas partilhando-as
conforme, respectivamente, sejam estruturais ou subordinadas.
E compreende-se que assim seja pois, se é verdade que uma alteração orçamental é uma
consequência da sua execução, já não é pensar que ela deva ser considerada um mero processo
de execução, não podendo na plenitude ser feita no exercício dos poderes de execução
orçamental de que estão investidos o Governo e a Administração.
3º. A redistribuição de dotações, que apenas poderá ser realizada entre rubricas de
despesa ou projectos distintos do mesmo órgão ou instituição, mantendo-se o respectivo limite
orçamental global inalterado.
De referir que, durante o ano económico, apenas poderão ocorrer três redistribuições
para a mesma instituição, projecto ou programa.
186
Prevista no nº. 3 do Art. 13 do LEOE
71
Todas estas alterações deixam intactos os limites globais no Orçamento do
Estado e por essa razão não carecem de aprovação parlamentar.
Não achamos porém, que seja boa politica legislativa permitir o Governo alterar o
orçamento aprovado mediante recurso à dotação provisional.
A razoabilidade deste comando legal devia ser acompanhado por uma particular atenção
do Parlamento quanto aos valores inscritos na dotação provisional sob pena de esvaziar de seu
alcance o principio de legalidade orçamental.
O que é certo é que o Governo no exercício do seu poder de execução pode produzir
alterações ao orçamento, rectificando-o.
Quando as alterações implicam uma rotura com os limites constitucionais de despesa,
elas só poderão ser efectuados por lei, sob proposta devidamente fundamentada do Governo,
estando então sujeitas à aprovação da Assembleia da Republica.187
187
A este propósito veja-se a posição do tribunal administrativo relativamente `a Conta do estado de 2000 “O regime geral das
alterações ao Orçamento do Estado está consignado no artigo 24 da Lei nº. 15/97, de 10 de Julho.
De acordo com o nº. 1 daquele artigo, é da competência da Assembleia da República aprovar, sob proposta do Governo devidamente
fundamentada, as alterações dos limites globais fixados na Lei Orçamental.
- as inscrições de verbas com recurso à dotação provisional inscrita no Orçamento para fazer face a despesas não previsíveis e
inadiáveis da competência do Governo, que têm de ser devidamente fundamentadas (nº. 2 do artigo 24);
- as alterações dos limites fixadas na Lei Orçamental para os “órgãos e instituições do Estado, decorrentes do ajustamento de preços
para despesas correntes (nº. 3).
Para além destas alterações, o Governo só pode proceder à redistribuição de verbas dentro dos limites estabelecidos pela Assembleia
da República.
Por sua vez, as alterações orçamentais do Governo estão reguladas no Capítulo IX (artigos 25 a 34) do Decreto no. 7/98, de 10 de
Março, diploma que aprovou o Regulamento que rege a execução e as alterações do Orçamento do Estado da competência do Governo.
Estas alterações orçamentais consistem na modificação das dotações orçamentais dentro dos limites globais fixadas na Lei
Orçamental, com excepção, como já foi referido, das decorrentes do ajustamento de preços e da distribuição da dotação provisional, podendo
assumir as seguintes formas:
188
Mesmo que tivesse alguma relevância jurídica discutir o assunto nunca estaríamos perante um orçamento
rectificativo pois este estaria no âmbito dos poderes do Executivo.
72
CAPÍTULO VIII
Fiscalização do Orçamento
1. Generalidades
Neste contexto, dá-se uma particular atenção ao cumprimento dos limites impostos pela
Lei do Orçamento.
2. Tipos de controlo
189
Controlo, seguindo o Prof. SOUSA FRANCO (ob. cit,, p. 452, nota 1), é uma palavra importada da justaposta
contre-rôle e designou segundo registo para verificar o primeiro; hoje é utilizada em várias acepções significando
domínio ou poder, disciplina discricionária, ou processo social de vigilância e sanção para assegurar a
conformidade dos comportamentos dos agentes aos critérios, regras ou normas prescritos.
73
financeira, isto é, verificar se ao custo previsto ou abaixo dele foi possível obter o resultado
pretendido).
Qualquer que seja o controlo, jurídico-político ou económico, ele pode ser genérico190
ou específico; tem esta designação quando é exercido com meios “próprios exclusivos e
adequados à actividade financeira”191.
Embora as fronteiras não sejam nítidas, o controlo pode ser jurídico ou não jurídico,
politico (relativo à oportunidade e à conveniência), de legalidade ou de mérito (técnico), e
informal192.
190
É genérico, por exemplo, o controlo que é efectuado através de interpelações parlamentares, da tutela
administrativa, da responsabilidade disciplinar ou de inquéritos jurisdicionais, inquéritos parlamentares e controlo
de constitucionalidade.
191
SOUSA FRANCO, ob. cit,, p. 454.
192
O controlo informal embora importante não passa disso; é exercido por poderosos meios de controlo que são a
comunicação social e a opinião pública.
193
A fiscalização externa ou independente é conferida a um auditor de contas, dotado de estatuto politico de
independência plena e estritamente vinculado à cooperação com o Parlamento (cf. SOUSA FRANCO, ob. cit, p.
458). No nosso sistema tal órgão é o Tribunal Administrativo, na sua qualidade de Tribunal de Contas que na sua
jovem histórica está inelutavelmente a proceder, para além do julgamento das contas, à avaliação da gestão
financeira (numa perspectiva técnica, económico-social e de sua economicidade).
194
N.o 2 do Art. 35 da LEOE que também fixa a necessidade de publicidade adequada (em Boletim da República) desta
informação.
74
Tal exercício será de extrema importância para o futuro acompanhamento e monitoria
da execução orçamental.
3.2. Fiscalização
A fiscalização jurisdicional assume uma especial importância, não só pela sua “força”,
mas também pelo facto de depender de um órgão externo e independente do Governo. Garante-
se, assim, a separação do poder executivo e jurídico, essencial para o funcionamento de
qualquer democracia.
É de salientar que a fiscalização não incide apenas sobre a Conta Geral do Estado: não é
feita somente depois de executado o orçamento. Ela é também realizada ao longo da própria
execução orçamental. Trata-se, neste caso, de uma fiscalização prévia195 por oposição à
fiscalização sucessiva196.
195
Também designada de controlo concomitante.
196
A fiscalização sucessiva incide sobre a conta global que resume, reflecte e encerra a execução orçamental, a
Conta Geral do Estado.
75
Um último exemplo: quando a Assembleia da República aprecia os relatórios
trimestrais do Governo sobre a execução das despesas e das receitas, ela está a exercer o
controlo sobre essa mesma execução.
CAPÍTULO IX
A Conta Geral do Estado abrange todos os organismos do Estado, com excepção das
instituições autónomas, empresas públicas e autarquias, que, como já se disse, se regem por
legislação própria.
Enquanto que o orçamento constitui uma previsão das receitas e despesas para um
determinado ano, a conta regista as receitas e despesas que foram efectivamente cobradas e
efectuadas durante esse ano. Constitui, por isso, um meio de controlar, a posteriori, a execução
orçamental e de responsabilizar os agentes dessa mesma execução.
A Conta Geral do Estado não é um registo síntese com o objectivo de evidenciar apenas
a execução orçamental e financeira, mas tem também como objecto apresentar o resultado do
exercício e a avaliação do desempenho dos órgãos e instituições do Estado.
Porque, nos termos da lei197 a Conta Geral do Estado deve reflectir a observância do
grau do cumprimento dos princípios e regularidade financeira198, legalidade199,
economicidade200, eficiência201 e eficácia202 financeiras, entendemos que deve ter uma estrutura
197
Nº. 2 do art. 46 da Lei do SISTAFE
198
Regularidade, para verificar se todas as despesas e receitas são efectuadas ou cobradas no respeito pelos limites
financeiros e pelo período autorizado.
199
Legalidade, como se tem insistido, para verificar se as operações registados estão em conformidade com a
legislação, geral e especifica em vigor.
200
Economicidade, para verificar se a aquisição de recursos, humanos, materiais e financeiros foi a adequada em
qualidade e quantidade, no momento oportuno e pelo menor custo.
201
Eficiência, para verificar se os recursos foram em ordem a maximizá-los nos resultados e minimizá-los para
determinados resultados.
76
idêntica à do Orçamento do Estado, deve, para além de princípios próprios, observar os
princípios orçamentais e os seguintes da contabilidade pública203 204:
a) Consistência;
b) Materialidade;
c) Comparabilidade;
d) Oportunidade205;
e) Digráfico206;
A Conta Geral do Estado deve, para além dos princípios supletivos, ser elaborada com
estrita respeito aos princípios que lhe são específicos ou próprios207, nomeadamente:
a) clareza;
b) exactidão; e
c) simplicidade.
3. Prazos
3º. Por último, a apreciação e aprovação da Conta Geral do Estado pela Assembleia
da República deverá ser feita, após recepção do Parecer do Tribunal Administrativo, na sessão
seguinte à entrega do Relatório e Parecer pelo Tribunal Administrativo210.
4. Conteúdo e estrutura
A Conta Geral do Estado deve constituir uma informação completa relativa a211:
202
Eficácia para verificar o grau de realização dos objectivos visados, segundo relação custo/beneficio favorável.
203
Art. 39 da Lei do SISTAFE
204
Aliás é este o entendimento que deve ter-se do nº. 3 do art. 46 da Lei da SISTAFE que estabelece que a conta
deve ser elaborada com base nos princípios e regras de contabilidade geralmente aceites.
205
Em interpretação correctiva da alínea e) do art. 39, da Lei da SISTAFE, no sentido de a informação dever ser
produzida em tempo oportuno e útil, isto é, nos prazos legais, para que as decisões dos órgãos a que se destina
sejam tomadas nos prazos definidos.
206
Art. 40 da lei da SISTAFE
207
Art. 45 da lei de SISTAFE
208
Nº. 1 do art. 50 da Lei do SISTAFE.
209
Nº. 2 do art. 50 da Lei do SISTAFE.
210
Deve entender-se, em bom rigor, que a conta deve ser aprovada antes de 31 de Dezembro de cada ano. Com
efeito, a sessão da Assembleia da Republica seguinte à entrega do Relatório e Parecer pela Tribunal Administração
(nunca depois de 30 de Novembro) (nº. 3 do art. 50 da Lei de SISTAFE) realiza-se em data posterior àquela e antes
de 16 de Dezembro, de modo que a até 15 de Dezembro, nos termos do art. 26 da LEOE, seja aprovada a Lei do
Orçamento. Mas não é assim, como resulta da análise do Regimento da Assembleia da República.
77
a) receitas cobradas e despesas pagas pelo Estado;
c) fundos de terceiros;
Para o efeito, a Conta Geral de Estado será estruturada de modo a conter os seguintes
documentos de natureza básica:
c) Balanço;
e) Demonstração de resultados;
211
Art. 47 da Lei do SISTAFE.
212
Por tomar as contas deve entender-se receber as contas.
213
SOUSA FRANCO, ob.cit, p, 477.
78
Este Relatório e Parecer precedem o juízo que a Assembleia faz das contas do Estado,
não podendo pronunciar-se sobre elas antes de conhecer a apreciação do Tribunal
Administrativo.
De acordo com o artigo 32 da Lei nº. 15/97, de 10 de Julho, a Conta Geral do Estado é
um documento no qual estão apresentadas as receitas arrecadadas e as despesas efectuadas num
determinado ano económico, assim como os devedores e credores existentes no fim do ano, e é
baseada nos princípios e regras da contabilidade pública.
O resultado da execução orçamental consta da Conta Geral do Estado, a qual tem por
objectivo possibilitar um controlo da execução do Orçamento do Estado, bem como dos
devedores e credores do Estado (artigo 33).
Nos termos do artigo 35 da mesma Lei, a Conta Geral do Estado deve ser elaborada
com clareza, exactidão e simplicidade, de forma a possibilitar a sua análise económica e
financeira, devendo dela constar informação completa sobre:
d) Fundos de terceiros;
e) Caixas do Estado;
Em termos de composição, a Conta Geral do Estado, refere a mesma Lei (artigo 36),
compreende:
b) o mapa das entradas e saídas de fundos do Estado, por cofres, com respectivos
saldos existentes no início e no final do ano económico;
79
Adicionalmente, a Conta Geral do Estado deverá ainda integrar a seguinte informação
anexa (art. 37):
b) resumos das receitas, despesas e saldos por cada instituição autónoma, empresa
publica e autarquia.
Quanto ao âmbito (artigo 34), a Conta Geral do Estado abrange as contas de todos os
organismos do Estado que não tenham natureza, forma e designação de instituição autónoma,
empresa pública ou autarquia, que se regem por legislação própria.
Assim, não apresentando a Conta informação relativa a estes aspectos, e não dispondo
ainda o Tribunal de um sistema de informação autónomo, não tem podido, no âmbito de
Parecer, proceder à sua apreciação.
De referir ainda que, no decurso das verificações efectuadas pelos serviços do Tribunal
e na sequência dos pedidos de esclarecimento feitos, são remetidos pelo Ministério do Plano e
Finanças mapas.
A Conta Geral do Estado foi elaborada pela primeira vez para o exercício de 1998,
sendo apontadas muitos inconsistências e insuficiências que podem ser desenvolvidamente
compreendidas nas Recomendações do Tribunal Administrativo e que podem ser assim
resumidas:
6.2. Parecer
O n.o 1 do Artigo 3 da Lei nº. 14/97, de 10 de Julho, estabelece que a Conta Geral do
Estado deve ser remetida pelo Governo à Assembleia da República e ao Tribunal
Administrativo, até 31 de Dezembro do ano seguinte àquele a que respeite. O nº.2 deste Artigo
estabelece que o relatório e o parecer do Tribunal Administrativo sobre a Conta Geral do
Estado devem ser enviados à Assembleia da República, até 31 de Agosto do ano seguinte
àquele em que a mesma for apresentada.
81
d) as subvenções, subsídios, benefícios fiscais, créditos e outras formas de apoio
concedidos, directa ou indirectamente.
6.3. Metodologia
214
P. 3 do Relatório e Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 1999 (Agosto de 2001).
215
Ibidem.
216
Ressalve-se o primeiro, o relativo a 1998, não foi enviado ao Governo.
217
A título exemplificativo, veja-se o seguinte trecho do Relatório e Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 1998, p. 4: “(...)
Porém, comparando aqueles valores com os constantes da publicação do Orçamento do Estado, da Imprensa
Nacional, de Janeiro de 1998, verificam-se diferenças que totalizam o montante de 340 133,22 milhões de
meticais.
Questionado o Ministério do Plano e Finanças sobre o assunto, justificou-se nos seguintes termos:
“A diferença de 340 133,22 milhões de meticais refere-se à margem de ajustamento de preços para o
funcionamento interno e externo. Enquanto na Lei nº. 1/98 o limite estabelecido está a preços correntes, a
publicação os limites sectoriais a preços constantes, pelo que entre estes dois montantes existe uma diferença de
340 milhões de contos, como se demonstra … De salientar que a actualização destes montantes teve em conta a
taxa de inflação média anual, para o caso do financiamento interno, e a taxa de desvalorização cambial média, para
o financiamento externo”.
A justificação acima transcrita, embora plausível, não afasta a necessidade de haver uma uniformidade na
apresentação dos valores, sendo que, a publicação orçamental feita através da Imprensa Nacional, como documento
onde estão desagregadas as dotações orçamentais aos vários órgãos/instituições, e por ser um instrumento de
controlo orçamental, deve conter as dotações a preços reais, ou seja, a preços correntes (…)”.
82
PARTE IV
INSTRUMENTOS FINANCEIROS
Capitulo I
TESOURO PÚBLICO
1. Conceito
Numa acepção objectiva, e também com o recurso à mesma Lei, artigo 53, o Tesouro
Público pode ser definido como uma instituição financeira instrumental que tem por objecto a
elaboração da programação financeira, os desembolsos e os pagamentos relativos à execução
orçamental e financeira.
2. Funções do Tesouro
Ao Tesouro devem, assim, em princípio, afluir a generalidade das receitas e a ele cabe
proceder os pagamentos das despesas ocorridas em execução do orçamento.
218
Artigos 8 e 9 do Regulamento do SISTAFE.
219
O pagamento na Tesouraria do Estado, nos termos do Artigo 115 do Regulamento do SISTAFE pode ser por
transferência bancária, por cheque ou em numerário.
83
Podemos, então, dizer que ao Tesouro, na sua actividade cabe realizar operações
orçamentais que se distinguem de operações de Tesouro, por darem origem à inscrição
definitiva na Conta Geral do Estado e estão previstas no orçamento.
a) Anualidade;
b) Unidade;
c) Equilíbrio;
d) Uniformidade;
e) Descentralização; e
f) Indispensabilidade de informação.
3.1. Anualidade
3.2. Unidade
220
Artigo 120 do Regulamento do SITAFE.
221
Artigo 121 do Regulamento do SITAFE.
84
Este princípio de unidade de tesouraria significa que todos os recursos públicos, de
origem fiscal, extra-fiscal, ou creditícia, devem ser canalizados ao Tesouro, com vista a uma
maior capacidade de gestão, dentro dos princípios de eficácia, eficiência e economicidade.
Para a materialização deste princípio o nosso legislador instituiu a regra da Conta Única
do Tesouro (CUT) titulada junto do Banco de Moçambique ou do Banco que desempenhe as
funções de Caixa do Tesouro ou de Banqueiro222 do Estado.
3.3. Equilíbrio
3.4. Uniformidade
Com este princípio pretende-se que a cobrança de receitas seja uniforme em toda a Rede
de Cobranças do Estado, em termos de objectivos, registos, fluxo de informação a
disponibilizar, depósito em contas bancárias e controlo224 .
3.5. Descentralização
Capitulo II
PATRIMÓNIO PÚBLICO
222
Compreende-se, então, porque é impróprio designar o próprio Tesouro de Banqueiro do Estado.
223
Artigo 55 da Lei do SISTAFE e 92 do respectivo Regulamento.
224
Matérias tratadas nos artigos 99 a 107 do Regulamento do SISTAFE.
225
Artigo 101 do regulamento do SISTAFE
226
Artigo 102 do Regulamento do SISTAFE.
227
Artigo 117 do Regulamento do SISTAFE.
85
1. Razão da ordem
2. Noção de Património
Equivale isto a dizer que essas entidades podem deter riqueza sob a forma de
património constituído por bens económicos (coisas, serviços, direitos) disponíveis num
determinado período de tempo e afectáveis à satisfação das necessidades próprias ou colectivas.
3. Delimitação do património
O património do Estado é constituído por bens que podem ser do seu domínio público
ou do seu domínio privado.
O legislador, mais poupado em palavras mas mais explícito define como “bens de
domínio público os que assim são classificados pela Constituição da República233 ou os
submetidos por lei à titularidade do Estado e subtraídos ao direito privado”234.
228
SOUSA FRANCO, ob. cit., pp. 305 e ss.
229
Considera-se activo o conjunto de bens e direitos que se detém.
230
Constituem o passivo conjunto de responsabilidades que impendem sobre os bens e direitos detidos
231
O Balanço é a avaliação do património num dado momento.
232
O nº 2 do Art. 202 do Código Civil diz: “Consideram-se, porém, fora do comercio todas as coisas que não
podem ser objecto de direitos privado , tais como as que se encontram no domínio público e as que são, por sua
natureza, insusceptíveis de apropriação individual”
233
Art. 35.
234
Nº 2 do Art. 126 do Regulamento do SISTAFE.
86
O domínio privado do património do Estado abrange todos os bens que se encontram
submetidos às regras do Direito Privado, que podem ser de conteúdo real ou de conteúdo
obrigacional como, por exemplo e respectivamente, os prédios rústicos e urbanos, por um lado,
e os capitais afectos às empresas, os capitais mutuados e os títulos de participações financeiras,
por outro.
São considerados de domínio privado pelo legislador, “os bens que o Estado livremente
adquire no âmbito do direito privado, sendo em princípio susceptíveis de alienação”235.
b) Património móvel;
c) Capitais em participações;
d) Capitais mutuados;
e) Títulos em carteira; e
f) Direitos de exploração.
c) Património geral que integra todo o activo e passivo patrimonial não especial; e
- Patrimónios de gestão, assim designados por terem uma “relação com uma
particular função material ou tarefa no programa do Estado”241.
239
SOUSA FRANCO, ob. cit., pp. 306 a 318.
240
Nº5 do Art. 126 do Regulamento do SISTAFE.
241
SOUSA FRANCO, ob. cIt., P. 307.
242
SOUSA FRANCO, ob. cit,, p. 307, nota 3.
88
f) Património imobiliário, constituído pelos direitos sobre bens imóveis;
j) Património de uso: aquele que é constituído por bens aptos a prestar utilidades
por uso; e
k) Património de rendimento que será o que é constituído por bens cuja função
primordial é gerar rendimentos. Designa-se também de “património fiscal”.
Bem se vê que o património do Estado poderá ter cumulativamente duas ou mais destas
classificações, consoante as delimitações objectivas que forem adoptadas, assim, em razão da
permanência na titularidade do Estado, da intervenção ou não do homem para a sua
constituição, etc.
a) Aspectos Gerais
Desde a independência nacional que a natureza e extensão dos bens e direitos que
constitui o património do Estado têm sido sujeitos a consideráveis mutações, numa primeira
fase, beneficiando de alargamentos e, numa segunda, sofrendo restrições.
b) No âmbito de Transição
243
Preâmbulo do Decreto-Lei nº 16/75, de 13 de Fevereiro.
89
c) No âmbito da Constituição do Tofo (25 de Junho de 1975)
Não importa discutir aqui o processo mas esclarecer que a questão sobre a
constitucionalidade deste processo é controvertida.
244
Mais tarde PRES – Programa de Reabilitação Económica e Social
245
Em apêndice, extraído da “Principal Legislação”, Vol. XIV, Ministério da Justiça, DIL, 1987, pp.. 214 a 249.
246
Preferimos dizer na vigência porque entendemos que o intervencionismo não é facilmente lido na Constituição
formal, embora seja inquestionável na prática constitucional e legislativa, na prática económica e na prática
financeira.
247
Art. 1 do Decreto nº 28/91, de 21 de Novembro
248
Este processo sofreu metamorfoses, tendo começado por “trespasses, vendas, cedências por diversas formas
pelos Ministérios e Secretarias de Estado (…) sem regulamentação adequada”; reconheceu-se que porque “os bens
em questão constituem património do Estado (…) a sua alienação tem de ser o mas mais transparente possível”;
iniciou-se a regulamentação do processo de cessação de propriedades do Estado através de alienação a titulo
oneroso, dos bens e dos direitos patrimoniais sobre o capital privado de que o Estado é titular e que deles desejasse
prescindir (veja-se preâmbulo do Decreto nº 21/89, de 23 de Maio).
90
O ponto de partida será o artigo 3 daquela Constituição249 e, seguidamente saber se, de
facto, o processo era orientado na base da linha politica definida pela FRELIMO.
No que diz respeito aos bens dominais não há qualquer alteração, quanto ao direito de
propriedade, parecendo absoluta a observância do artigo 35 da Constituição252 e dos artigos 46
a 48 sobre a propriedade da terra e os métodos de seu uso e aproveitamento.
Quanto ao património do domínio privado do Estado a redução é de tal ordem que pode
dizer-se para além daquela evolução que parece ter sido querida pelo legislador constituinte ao
prever empreendimentos “reservados à propriedade ou exploração exclusiva do Estado” que
decorre da interpretação do art. 45, nº 2 .
Parece que no domínio económico já não há áreas que sejam monopólio estatal do
mesmo modo que não parece que a orientação seja no sentido de manter as poucas empresas
públicas existentes – a Electricidade de Moçambique EP., a Aeroportos de Moçambique, EP., e
a Empresa de Caminhos de Ferro de Moçambique, EP Correios de Moçambique.
a) Impenhorabilidade,
b) Inalienabilidade,
c) Regularidade financeira,
d) Economicidade,
e) Eficiência,
f) Eficácia255.
a) Concessão de exploração;
c) Arrendamento; e
d) Cessão do usufruto257.
4.4. Aquisição
254
Criado pelo Decreto nº 46/2001, 21 de Dezembro, com o objecto de gerir, coordenar e controlar as participações
do Estado nos diferentes tipos de sociedade.
255
Art. da Lei do SISTAFE e Art. 122 do seu Regulamento.
256
Art. 122 do Regulamento do SISTAFE.
257
Nº 1 do Art. 164 do Regulamento do SISTAFE.
92
I. Os bens do Estado podem ser adquiridos internamente e no exterior (Art. 129 do
Regulamento do SISTAFE) por concurso, em principio, centralizado pelo órgão coordenador
do SPE - Subsistema do Património do Estado258.
II. A aquisição pode ser feita, para além da compra, por meio de259:
b) apropriação;
c) expropriação;
d) produção; e
A alienação de bens abatidos pode ser feita, para além de outras previstas por lei, por
uma das seguintes formas:
a) leilão;
c) troca262.
4.6. Inventário
4.6.1. Noção
258
Art. 127 do Regulamento do SISTAFE.
259
Art. 128 do Regulamento do SISTAFE.
260
Cfr. MARCELO CAETANO, ob. e vol. cits., pp. 909 e ss., A. MOUTEIRA GUERREIRO e CRISPIM
GOUVEIA, ob. e vol. cits., pp. 71 e ss. ARMANDO NOBRE, ob. cit., pp. 69 e ss., JOSÉ PEDRO FERNANDES,
ests. e loc. cits e NUNO SÁ GOMES, Nacionalizações e privatizações, Lisboa, 1988.
261
Arts. 166 e 16 7 do Regulamento do SISTAFE.
262
Art. 169 do Regulamento do SISTAF.E
93
4.6.2. Tipos
II. Os inventários podem ser também de base266 ou especiais; estes podem ser
inventários patrimoniais e inventários de protecção.
a) Por desaparecimento; e
- venda;
- troca; e
- remição de domínios;
f) prescrição;
g) abates; e
h) substituição.
4.7.3. Abates
5. Fiscalização do Património
A apreciação é feita com base num Anexo Informativo à Conta Geral do Estado e em
informações adicionais recolhidas pelo Tribunal, na Direcção Nacional do Património do
Estado (DNPE), entidade que, nos termos do artigo 12, do Diploma Ministerial nº. 2/97, de 1 de
Janeiro, tem como competências a verificação “dos processos de contas dos bens patrimoniais
dos organismos do Estado”, elaboração “da Conta Geral do Património do Estado”, bem como
“assegurar a gestão dos bens patrimoniais do Estado, procedendo ao respectivo tombo”.
Deste Anexo Informativo que foi apresentado pela primeira vez na Conta Geral do
Estado de 2001, pode concluir-se da ausência de legislação sistematizada e adequada sobre a
inventariação dos bens do Estado e que o valor líquido do Património do Estado, era de cerca
de 103 100 milhões de dólares norte-americanos270 descriminados como segue, com referência
a 31 de Dezembro de 2001271:
269
Artigos 156 a 165 do Regulamento do SISTAFE.
270
Este valor está em constante actualização ultrapassando em Junho de 2003 (ver cfr. Relatório e Parecer do
Tribunal Administrativo sobre a Conta Geral do Estado de 2001,pg. 108) 200.000 milhões de dólares norte-
americanos.
271
Fonte: Conta Geral do Estado de 2001 – Anexo Informativo n.o. 7
95
Móveis 877.695.317 36.577.984
Veículos
531.285.580 22.141.346
Imóveis
1.064.572.266 44.366.088
O Património do Estado avaliado limita-se, pois, apenas aos bens afectos às seguintes
entidades:
Pode esperar-se que nos próximos anos o trabalho de actualização venha proporcionar
uma informação mais fiável em termos de:
96
CAPÍTULO III
AS RECEITAS PÚBLICAS
1. Introdução
Ao definirmos o orçamento falámos de “deve” e “haver”, o que pressupõe a existência
de dois “braços”, um de débito e outro de crédito, correspondentes, respectivamente e em
princípio, a despesas e a receitas.
Não pode, portanto haver despesa pública sem que, em algum momento, no ciclo de
execução orçamental haja uma receita.
2. Conceito
I. Porque de receitas públicas estamos a falar, podemos dizer que receita pública é
um recurso patrimonial definitivo obtido, num período financeiro, pelo Estado, ou outro entes
públicos ou com funções públicas, para cobrir necessidades públicas.
a) Elementos objectivos:
b) Elemento subjectivo
272
Para melhor compreensão, ver nosso Introdução ao Direito Fiscal, ob. cit., p. 108
97
O elemento subjectivo descobre-se na referência aos possíveis beneficiários dos
recursos: o Estado, em primeiro lugar, outros antes públicos ou com funções públicas.
c) Elemento teleológico
Um dos fundamentos que desde já podemos adiantar para alicerçar a exclusão desta
condição, que estão a seu cargo273, é a existência de recursos que o Estado, no âmbito da
descentralização, tem que encaminhar aos entes descentralizados e aqueles que alguns destes
terão a obrigação de encaminhar ao Tesouro.
3. Figuras semelhantes
Com a definição dada é possível identificar as seguintes figuras que, embora próximas,
não podem ser classificadas como receitas:
a) Recursos de Tesouraria
São fundos normalmente depositados nos cofres a título de caução e que o Estado tem
que reembolsá-los verificadas certas condições.
O regime jurídico das receitas deverá ser em ordem a não violar os princípios
orçamentais e da contabilidade pública, nomeadamente:
a) Princípio da legalidade
Pelo princípio da legalidade deve entender-se que as receitas não podem ser liquidadas
ou cobradas sem que cumulativamente274:
273
O Prof. SOUSA FRANCO (ob. cit., p. 299) na definição “genérica” que dá de receitas públicas inclui o
elemento “que estão a seu cargo”.
274
Art. 62 do Regulamento do SISTAFE.
275
Ressalve-se, porém, que, nos termos de nº 2 do art. 62 do Regulamento do SISTAFE a liquidação e cobrança
[de receitas] podem ser efectuadas excedendo-se os valores mínimos previstos na respectiva inscrição orçamental
98
b) Princípio da anualidade
Este princípio também designado de renovação anual276 ou, com mais propriedade, de
autorização anual de cobrança, pressupõe que as receitas só podem ser cobradas quando
constantes do orçamento que é aprovado pela Assembleia da República e reveste a forma da lei
formal.
Os critérios classificatórios das receitas são variados. Os mais comuns são os seguintes:
276
SOUSA FRANCO,, ob. cit., II Vol., p. 49.
277
Por isso a regra de cobrança pelo Tesouro que pode ser considerada uma emanação do princípio da unidade de
Tesouraria segundo o qual todos os recursos públicos devem ser canalizados [a uma única Tesouraria] com vista a
uma maior capacidade de gestão, dentro dos princípios de eficácia, eficiência e economicidade (alínea a) do nº. 1
do art. 54 do Regulamento do SISTAFE.
278
Considera-se virtual a cobrança de receita em que ao Recebedor são entregues, previamente, os respectivos
títulos, constituindo-se o Recebedor, por esse acto, na obrigação de cobrar e só se extinguindo a obrigação pelo
pagamento voluntário ou coercivo, pelo encontro com o título de anulação ou pela prescrição da dívida (nº 4 do
art. 65 do Regulamento do SISTAFE).
279
É eventual a cobrança de receitas quando o título da dívida é entregue pelo interessado ao Recebedor no próprio
acto de pagamento, em princípio, no dia da liquidação (nº 5 do art. 63 do Regulamento do SISTAFE).
280
Ver nosso Introdução ao Direito Fiscal; ob. cit., p. 17
281
Esta última denominação é do Prof. SOUSA FRANCO, ob. cit. p. 48.
99
5.1. Receitas voluntárias
As receitas voluntárias são aquelas que o Estado cobra actuando como sujeito de direito
privado como, por exemplo, em rendas de prédios urbanos ou rústicos, rendimentos de títulos.
Embora se compreenda que todas as receitas são coercivas, são assim denominados
aqueles que têm como base uma obrigação irremovível ou aquelas a que o Estado tem acesso
no uso dos seus ius imperii.
Estas receitas, as originárias, são as que derivam de uma actividade financeira directa e
própria do Estado.
I. São efectivas as receitas constituídas por recursos definitivos e que não criam
imediata ou mediatamente qualquer encargo.
II. As Receitas não efectivas são aquelas que constituem um recurso imediato e
encargo futuro para o Estado.
a) Receitas patrimoniais,
b) Receitas tributárias,
c) Receitas creditícias.
6.1.1. Conceito
As receitas patrimoniais podem ser definidas como aqueles recursos provindos do uso
oneroso282 dos direitos e obrigações com conteúdo económico e bens do Estado susceptíveis de
avaliação pecuniária.
Não se conclua da definição dada que todas as receitas ligadas ao património do Estado
são patrimoniais, “porquanto, se revestem inquestionavelmente [de] tal natureza as
provenientes do domínio privado estadual, já que no que concerne às derivadas da utilização
282
E, por isso mesmo, capazes de produzir rendimento
100
do domínio público o mesmo não se verifica uma vez que (…) o uso privativo dos bens desta
espécie ou o seu uso comum, quando não gratuito, implicam o pagamento de uma taxa”283.
O regime jurídico das receitas do património segue na essência o critério dos elementos
da própria receita.
Assim quanto ao sujeito activo das relações jurídicas de que promanam os rendimentos,
será sempre o Estado ou outro ente público ou com função publica; o sujeito passivo poderá
ser o inquilino (prédios urbanos arrendados), as empresas públicas ou privadas (remuneração
de capital), etc.
As receitas tributárias são aquelas que mais expressão têm no conjunto das receitas do
Estado.
283
BRAZ TEIXEIRA, A, ob. cit, p. 229.
284
O uso comum dos bens públicos caracteriza-se pela generalidade, igualdade e, em regra, gratuitidade.
285
Tal será o caso de juros de empréstimos concedidos pelo Estado, mais-valias, dividendos, juros de obrigações.
286
Dividendos ou lucros de empresas em que o Estado tem participação financeira directa, não incluindo as rendas
de concessionário.
101
São considerados receitas tributárias:
a) o imposto;
b) as taxas; e
c) as contribuições especiais.
6.2.1. Imposto
6.2.2. Taxas
A taxa é uma espécie tributária, que corresponde a uma prestação patrimonial, legal, a
favor de ente público como contraprestação específica e individual de um serviço público ou
de remoção de obstáculo jurídico ao comportamento da actividade de particulares289.
Não há dúvida quanto a taxa ter uma natureza obrigacional, dúvida residindo, apenas,
quanto a qualificar o vínculo obrigacional de legal ou voluntário.
Podemos ainda, conforme o seu destinatário, falar de taxas gerais, taxas consignadas e
taxas emolumentares.
Assim, serão gerais as taxas destinadas ao Tesouro; consignadas são as taxas destinadas
a entidades com tesouraria própria; de emolumentares são designadas todas aquelas taxas
287
P. 106
288
Ibidem.
289
Para mais desenvolvimento aconselhamos o nosso Introdução ao Direito Fiscal,, ob. cit., p.p. 114. ss
290
Do Art. 70 da Lei nº.11/97, de 31 de Maio, pode extrair-se a seguinte definição de tarifa: As tarifas são tipo de
taxas cobradas pela prestação directa de determinados serviços públicos numa base de recuperação de custos. Para
mais desenvolvimento veja-se no nosso Introdução ao Direito Fiscal,, ob. cjt., p.. 115.
291
As licenças são uma contrapartida de uma remoção, por acto administrativo, de obstáculos jurídicos a um
comportamento de particulares.
292
As taxas administrativas são aquelas em que se incluem as propinas e os valores pagos pelos actos de registos.
293
As taxas judiciais: incluem-se neste grupo, as custas e o imposto de justiça.
102
consignadas ao pagamento de funcionários, agentes ou entidades intervenientes em certos
serviços.
O Prof. Sousa Franco295 explica porque não pode ser imposto consignado nem imposto
especial, apesar de, no fim, dada a dificuldade de destrinçar com clareza estes tipos de
satisfações [votadas à prestação de utilidades divisíveis], a ausência de autonomia jurídica e da
reduzida importância (…) concluir que “devemos reputá-la verdadeiro imposto”296
a) imposto,
b) preço.
c) tarifa.
III. A taxa distingue-se do preço na medida em que este é fixado sempre na base do
custo de produção e com o objectivo de conseguir um lucro (preço económico)297. A taxa
considerada preço politico298 - normalmente é fixada abaixo dos seus custos de produção.
A hipótese de isenções em relação às taxas não existirá em relação ao preço por força
do princípio de exclusão que lhe está inerente, por não ser aplicável a bens aptos a satisfazer
necessidades de satisfação passiva.
IV. Esta posição continua válida mesmo que estejamos, perante um tipo de taxa
especial que é a tarifa; com efeito, a tarifa sendo fixada com o objectivo de cobrir os custos
efectivamente suportados, mesmo assim, será fixado o valor abaixo do que o mercado fixaria.
294
WATY, Teodoro Andrade, Introdução ao Direito Fiscal, p. 115
295
Ob. cit., Vol. II, pp. 62 ss.
296
Temos estado a ensinar que não é verdadeiro imposto louvados no facto de haver, particularmente., uma
contraprestação especifica, (b) um vinculo anterior. Mas … Magister dixit!
297
BRAZ\ TEIXEURA, ob. cit., pp. 250 e ss.
298
Ibidem
103
6.3. Receitas creditícias
Delas nos ocuparemos demoradamente mais adiante sobre o título de crédito público.
CAPÍTULO IV
AS DESPESAS PÚBLICAS
Elas podem ser definidas como o encargo do Estado ou outro ente público para
aquisição de bens ou prestação de serviços susceptíveis de satisfazer necessidades públicas.299
A despesa pública abrange várias e distintas realidades sendo por isso importante para
compreender o conteúdo da actividade financeira dum Estado.
II. A diversidade das despesas sugere para maior precisão do conceito uma
delimitação de alguns traços comuns a todas as realidades que possam ser definidas como tal.
a) Tipo de operação
b) Sujeito da operação
A despesa só será pública se efectuada pelo Estado ou outro ente público ou com
funções públicas.
c) Finalidade
Para que uma despesa seja pública deverá destinar-se a um fim público, isto é, deve
destinar-se a satisfazer necessidades públicas.
299
Esta definição é próxima da que é adoptada pelo Prof. SOUSA FRANCO (ob. cit.,p. 297)
104
A despesa nacional é constituída pelos consumos dos particulares (consumo privado),
das empresas e do sector público (despesas do sector público administrativo).
Pode, então, ver-se que a Despesa Pública e despesa nacional não são a mesma
realidade e que a despesa pública (relativa ao sector público administrativo) é parte da despesa
nacional.
Adolfo Wagner, financista alemão, dá nome a uma lei – a lei de Wagner - segundo a
qual em sociedades modernas há uma tendência para o aumento das despesas públicas que não
pode ser interpretada como significando, em absoluto, uma crescente actividade financeira do
Estado.
Este aumento nem sempre é real, podendo ser aparente, quando se refere às despesas
nominais cuja subida pode dever-se a vários factores, dentre as quais, há que dar lugar de
destaque à subida de taxas de câmbio acompanhadas de desvalorização da moeda, subida de
preços e ao aumento demográfico.
Entende o Prof. Teixeira Ribeiro que por não haver ainda demonstração cabal a Lei de
Wagner permanece sempre com laivos de índole de uma Lei empírica301.
As causas imediatas do aumento das despesas públicas podem assim ser identificadas:
Resumindo diremos:
300
Para maiores desenvolvimentos, ver
I. SOUSA FRANCO, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Vol. II, 4.a ed., Almedina, 1993, pp. 7 e ss.
II. TEIXEIRA RIBEIRO, ob. cit, pp. 133 a 138, MUSGRAVE, Public Finance, in Theory and practise, 5a. ed., p.
114 e ALBANO SANTOS, A Lei de Wagner e a realidade das despesas públicas em Estudos de Economia, VI
(1986) pp. 161 e ss.
301
Ob.ct., p. 138.
302
Seguimos aqui os ensinamentos do Prof. SOUSA FRANCO, ob.cit. Vol. II, pp. 8 e ss
105
a) Desvalorização monetária;
b) Aumento da população; e
c) Crescimento do Produto Nacional Bruto.
Entre as causas reais do crescimento das despesas públicas, as mais importantes são as
seguintes:
A explicação dos dois tipos de expansão, isto é, saber porque há, nas despesas públicas
essa tendência, não tem resposta definitiva. Pensar na intervenção e a na actuação como causa
suficiente não colhe, pois, em situações de mera ordenação a Lei de Wagner parece também
verificar-se.
303
Em economia de guerra há um forte estatismo, perfeitamente tolerado pelos contribuintes. Retomada a
normalidade em paz armada e sob o efeito de deslocação, as despesas continuam em níveis elevados.
304
Afora o intervencionismo, já tratado, o Estado-Providência, fácil de entender, a democracia é um custo
crescente nos Estados.
305
A dicotomia decisão política e decisão financeira ajudará a compreender como as despesas podem subir por
causas financeiras pelas quais, por exemplo, o equilíbrio orçamental pode ser subalternizado.
106
Definidas as despesas como uma operação de dispêndio para aquisição de bens ou
prestação de serviços e visto que elas têm uma tendência a crescer, fácil será compreender que
elas têm efeito na economia.
Importa, agora, saber quais são esses efeitos que as despesas criam na economia.
Desde lodo todas as despesas públicas criam utilidades e como tal são produtivas.
O mesmo não se dirá, por exemplo, nos casos de despesas-compra, e das despesas-
transferência.
Falaremos, portanto, dum efeito positivo para as finanças no caso das despesas-compra
porquanto criam rendimento nacional.
306
No capital fixo incluímos não só os investimentos em património mas também no capital humano (saúde,
instrução e cultura).
307
Pois, já se vê, a simples produção destas utilidades torna incorrecto classificar essas despesas públicas de
improdutivas.
308
Esta é opção do Prof. TEIXEIRA RIBEIRO, ob.cit., p. 144.
309
Termo usado pelo Prof. SOUSA FRANCO na sua obra Finanças Públicas e Direito Financeiro, Volume II, 4.a
Edição, Almedina, 1993, p. 4.
310
Tal será o caso das despesa-transferência efectuadas para o exterior.
311
Entende-se por rendimento nacional o valor dos bens finais obtidos durante certo período, menos o valor dos
bens intermediários importados ou provindos de períodos anteriores e as quotas de amortização dos capitais fixos,
mais o valor dos bens intermediários produzidos durante o período e existentes no fim dele e mais o saldo positivo
ou mesmo o saldo negativo, do balanço internacional de rendimentos.
107
4.4. Propensão ao Consumo.
Essa relação de causa-efeito é designada propensão ao consumo que pode ser média313
ou marginal.314
Servirá para reflectir e compreender se dissermos que quanto mais pobre maior será a
propensão para o consumo, isto é, os rendimentos disponíveis mais servirão exclusivamente
para o consumo mínimo. Aos ricos acontecerá que por maior que seja o consumo os
rendimentos não se ressentirão.
Não se vá concluir que os ricos e, por multiplicação, as nações ricas tenham a sua
propensão ao consumo crescente. A indicação que há é de que os ricos, com menos propensão
ao consumo, têm as respectivas nações mais ricas e consomem percentagens constantes da sua
riqueza.
Qualquer que seja o tipo de investimento, ele é útil à economia na medida em que a
despesa feita para a sua constituição transforma-se em rendimento acrescido e aumento de
consumo.
É o efeito multiplicação que pode verificar-se com maior ou menor rapidez, isto é, do
período do multiplicador.
O efeito propulsão pode ser explosivo ou apenas produzir efeitos nos períodos iniciais,
o que contribuirá para o consumo de bens importados, a inflação, engarrafamento e a
obsolescência dos equipamentos industriais.
316
Um sentido mais bancário entende o entesouramento como a manutenção dos saldos líquidos fora do circuito
bancário, fenómeno frequente em muitas zonas do nosso país onde não existe ainda a bancarização.
317
Os estrangulamentos dão-se por o aumento da procura que não acompanhado pelo correspectivo aumento da
oferta, provoca a subida dos preços que, sem corresponder ao aumento dos rendimentos reais, provoca um
aumento dos rendimentos monetários. Compreensivelmente, numa situação de pleno emprego, dá-se também o
pleno emprego.
109
I. As despesas-compra do Estado actuam como se destinassem ao investimento na
medida em que podem multiplicar o consumo, não obstante não aumentem, na sua totalidade, o
rendimento nacional; sabido que parte delas, despesas-compra, resultam de transferências de
rendimentos ou de emissão monetária.
Se tiver que manter a sua expansão, não podendo ser pela actuação e tendo que manter
o equilíbrio orçamental, terá que recorrer a crédito bancário.
Algumas destas despesas já foram explicadas. Concentremo-nos nas que podem exigir
algum aprofundamento.
A diferenciá-los está o facto de poder ser feita uma despesa com o reembolso dum
crédito, que será uma despesa de capital, que não será, necessariamente, uma despesa de
investimento que exigiria que a despesa tivesse sido destinada a formação de capital técnico do
Estado.
110
As despesas de funcionamento, também impropriamente designadas de correntes, são
aquelas que se destinam a suportar os custos relativos ao normal funcionamento da actividade
da máquina administrativa do Estado.
Estas despesas foram já devidamente trabalhadas havendo apenas que acrescentar que
elas podem subclassificar-se em:
a) Transferências de rendimento
b) Transferência de capital
c) Transferências directas
d) Transferências indirectas
São aquelas que aumentam o rendimento disponível, de modo indirecto, por exemplo,
através da possibilidade do aumento do consumo; será o caso de um subsídio aos preços.
Sem ser possível definir um plafond, isto é, definir um limite global, social, política e
economicamente adequado para as despesas públicas, parece ser necessário produzir critérios
para estancar seu crescimento elástico:
111
a) Travar o crescimento das despesas quase-improdutivas318 como as despesas de
funcionamento;
b) Travar transferências improdutivas, em perfeita posição individualista de
minimização do papel do Estado;
c) Travar as substituições de gastos deixando o sector privado operar, seguramente
com mais eficácia e eficiência.
A dívida deverá ser limitada em função dos seus efeitos na economia. Então podemos
dizer que o limite da dívida deve corresponder à capacidade da geração presente, de renúncia
ao consumo e, das gerações futuras, de obter rendimento e de suportar o serviço da dívida
(amortização do capital e juros).
A dívida interna pode ser um ónus para a geração presente319 e para as gerações
320
futuras .
8. As despesas em Moçambique.
8.1. Generalidades
O aspecto mais saliente das despesas públicas nos últimos anos tem sido o seu aumento
muito acentuado a partir de 1975.
O aumento das despesas públicas poderá ser estudado, aliás, não só a partir do aumento
das despesas do Estado – Orçamento Geral do Estado, mas do conjunto do sector público,
abrangendo os restantes sectores e subsectores não incluídos no Orçamento Geral do Estado.
318
Partindo do entendimento de que todas as despesas, como já visto, criam utilidades, não teríamos despesas
absolutamente improdutivas. As despesas quase-improdutivas, corresponderão às despesas meramente produtivas.
Parece ser melhor e afasta a errónea posição de designá-las improdutivas.
319
Ónus para a geração presente quando decorre de empréstimos que provocam a subida de juros.
320
A dívida é ónus para as gerações futuras quando suportada por empréstimos não usados para investimentos
públicos.
112
O aumento das despesas públicas prende-se essencialmente, para além da própria
desvalorização monetária (que não traduziria por si só um real aumento do peso), com a
alteração do papel do sector público na economia e com as transformações ocorridas no
Aparelho do Estado.
Os PSI’s têm como ponto de partida as estratégias e políticas sectoriais com base nas
quais se faz uma projecção de recursos financeiros e a programação de médio prazo das
despesas.
1. Generalidades
O Estado enfrenta por vezes carências na sua tesouraria. Tal sucede quando, ao longo
do ano económico, as suas cobranças são inferiores aos montantes dos pagamentos a efectuar.
Mas por tratar-se de um défice passageiro ou transitório, uma vez que o orçamento prevê
receitas suficientes para cobrir as despesas, os empréstimos contraídos para este efeito
constituem uma antecipação de receitas que irão ser cobradas no curto prazo (ao longo do ano
económico) e destinadas ao pagamento ou reembolso do e empréstimo.
Por esta razão, quando o Estado se endivida para financiar o seu défice de tesouraria,
ele recorre aos empréstimos a curto prazo – a empréstimos que serão reembolsados no próprio
período financeiro em que foram contraídos.
Esta primeira função dos empréstimos públicos assume uma especial importância para a
gestão orçamental, já que evita a ocorrência de atrasos na realização das despesas públicas por
falta de fundos de tesouraria. Garante-se, assim, uma melhor execução do orçamento.
321
Alínea d) do n¦º. 3 do Art. 91 do Regulamento do SISTAFE .
114
Um segundo motivo, e talvez o mais importante, para o recurso ao crédito público é,
naturalmente, a necessidade de cobertura do défice global no Orçamento do Estado. São
frequentes as situações em que as receitas públicas não são suficientes para fazer face às
despesas do Estado. Nestes casos, torna-se necessário cobrir o défice orçamental através dos
empréstimos. Uma vez que estes não poderão ser reembolsados durante o próprio ano
económico, mas apenas nos anos seguintes, é imperioso que eles tenham uma maturidade
superior a um ano.
Esta visão negativa do endividamento público para efeitos de cobertura dos défices
orçamentais veio a ser revista ao longo do presente século. Tal revisão do pensamento clássico
resultou, antes de mais, do reconhecimento de que também o Estado desenvolve actividades
produtivas, tais como o investimento em capital físico e humano. Quando tal sucede, justifica-
se o recurso a poupanças privadas – a empréstimos públicos – para financiamento das despesas
do Estado.
Por outro lado, e no que se refere aos encargos que a dívida pública representa para as
gerações futuras, começou-se a tomar em consideração o facto de estas beneficiarem dos
aumentos no rendimento nacional derivados das aplicações produtivas dos empréstimos
públicos. O investimento em infraestruturas económicas e sociais, e as despesas correntes em
educação e saúde, por exemplo, têm um impacto notório na capacidade produtiva de uma
economia e no bem-estar das gerações futuras.
Por último, se o Governo não recorrer ao Banco Central para financiar os défices no
orçamento, o endividamento público deixa de ter um impacto forte na taxa de inflação.
115
Contudo o crédito público pode também ser utilizado com fins extra-financeiros. Por
exemplo, como instrumento de estabilização macroeconómica, de intervenção nos mercados de
capitais e de promoção do desenvolvimento económico.
O Banco Central pode fazer uso dos empréstimos públicos tendo em vista o controlo da
massa monetária, a qual tem um impacto no nível de procura agregada e, por conseguinte, nos
níveis de inflação e desemprego.
Por exemplo, se o governo quiser reduzir a taxa de inflação através de uma contracção
da quantidade de moeda em circulação, ele colocará Bilhetes do Tesouro (títulos de dívida a
curto prazo) no Banco Central, que os vende às instituições bancárias ou parabancárias. Estas
passarão a dispor de uma menor quantidade de meios monetários para a concessão de crédito
aos agentes económicos, reduzindo-se assim a oferta monetária. A contracção da oferta de
moeda na economia conduzirá a uma subida das taxas de juro e, consequentemente, a uma
redução do investimento e da procura agregada. Tal terá um impacto positivo na redução da
inflação.
- Vimos anteriormente que um aumento das taxas de juro tem um efeito de travão
na procura agregada e, consequentemente, no crescimento do nível geral de preços. Contudo,
nas economias com um mercado de capitais desenvolvido e aberto, a subida das taxas de juro
poderá implicar uma entrada de capitais externos, a qual se traduzirá numa expansão da massa
monetária, contrariando, desta forma, o objectivo inicial de redução da oferta monetária. Neste
caso, a politica monetária restritiva seria ineficaz, não tendo o efeito pretendido nas taxas de
juro, na procura agregada e na inflação;
116
O aumento consequente da oferta de emprego traduzir-se-á, em princípio, numa
diminuição da taxa de desemprego.
Para tal, utilizará os empréstimos a médio e longo prazo. Através da emissão de dívida
pública – por exemplo, Obrigações do Tesouro –, o Estado poderá influenciar a taxa de juro de
mercado. Fá-lo-á através da fixação das taxas de juro dos empréstimos por ele emitidos e do
aumento da oferta de títulos, que se traduz numa diminuição das taxas de juro.
O défice de tesouraria, que pode ocorrer várias vezes num exercício de orçamento
equilibrado, acontece sempre que num dado período de execução orçamental haja mais
despesas a pagar do que receitas cobradas, provocando-se um défice transitório proveniente de
falta de sincronismo entre as cobranças e os pagamentos.
O défice orçamental é coberto por receitas não efectivas arrecadadas por via de crédito
de médio ou longo prazo.
117
c) Esterilização do poder de compra
3.1. Conceito
O Crédito Público é uma receita não efectiva provinda de uma relação jurídica com
dilação temporal em que o Estado, como beneficiário de activos financeiros, se assume na
obrigação de reembolsar o capital e juros ou rendas.
Assim:
a) Crédito principal
b) Crédito acessório
É acessório o crédito quando o Estado não é devedor directo mas quando, de forma
subsidiária, responde pelos créditos de outras entidades.
118
Este tipo de crédito acontece quando o Estado se assume em crédito acessório como se
fosse o devedor principal mas com garantia de reembolso
d) Aval do Estado
e) Crédito efectivo
f) Crédito fictício
O crédito é fictício quando o Estado é devedor de fundos autónomos ou de entidades
públicas fora do sector empresarial do Estado.
g) Crédito vitalício
h) Crédito empresarial
Como já se viu, o crédito público pressupõe uma transferência efectiva de liquidez pela
qual o Estado fica vinculado a deveres de natureza pecuniária.
4. Figura semelhantes
119
c) Criação monetária
A criação monetária apesar de ser apta a mobilização poupanças forçadas não implica
relações com qualquer credor específico.
d) Imposto reembolsável
Fora do conceito que deixamos atrás registado admitem-se impostos reembolsáveis que
se caracterizam por a prestação ser coactiva, podendo o Estado reembolsar quando se mostre
possível.
e) Crédito forçado
5. Empréstimos públicos
A questão que tem sido amiúde colocada é se o empréstimo público e o crédito são
figuras semelhantes ou se são conceitos sinónimos.
O Prof. Sousa Franco parece usar os dois termos distintamente, quando no seu Vol. II,
tem o §4. subordinado a “Receitas de Crédito Público”324 que em 6.14 fala de ”Crédito
Público” e em 6.17 de “Empréstimos Públicos”.
5.2. Conceito
322
O Prof. BAZ TEIXEIRA, no seu Manual (ob. cit.) na p. 303 tem o capítulo IV dedicado aos Empréstimos
Públicos e no seu §1.o, sobre as Noções Gerais, aborda “o recurso ao crédito público”( n.o 65) e diz que “para
concluir a análise das receitas públicas cabe-nos agora considerar os empréstimos públicos … e, mais à frente, na
mesma página, pergunta: “Sendo assim, quais as razões que levam o Estado a recorrer ao crédito?” Este autor
parece usar os dois termos sem preocupação de saber se eles têm qualquer diferenciação.
323
O Prof. TEIXEIRA RIBEIRO, no seu Lições de Finanças Públicas (ob.cit.) tem uma III Parte (p. 183)
destinada ao Crédito Público cujo §1.o, consagrado aos Empréstimos Públicos, fala do recurso ao crédito (n.o 17),
das espécies dos empréstimos (n.18) e emissão dos empréstimos (n.o 19). Não parece pretender fazer forte
distinção entre o crédito e o empréstimo.
324
Ob. cit, p. 80.
120
Dada a natureza instrumental do empréstimo em confronto com o Crédito,
compreender-se-á a similitude das espécies do Empréstimo e das do Crédito, já estudadas.
a) Empréstimos voluntário
b) Empréstimos forçados
a) Empréstimo externo
b) Empréstimo interno
Será interno o empréstimo público que seja emitido no país, não sendo relevante a
qualidade da moeda e dos subscritores.
a) Empréstimo temporário
325
SOUSA FRANCO, ob. cit., Vol. II , p. 92.
121
Os empréstimos certus an, incertus quando podem revestir a forma de:
O empréstimo temporário amortizável por sorteio tem o seu reembolso feito todos os
anos a um número constante ou variável de títulos sorteados, garantindo-se o reembolso total
ao fim de certo prazo.
Os empréstimos certus an, certus quando podem, por seu turno, revestir a forma de:
b) Empréstimos perpétuos
2o. São irremíveis os empréstimos perpétuos que o Estado, mesmo podendo, não
tem a faculdade de efectuar o reembolso do capital recebido de empréstimo.
3.a. E a posição que se aproxima da 2.a. e dela se distingue por defender tratar-se de
um contrato de direito privado.
Os que sustentam que o empréstimo público é um contrato defendem que tem, antes de
mais, uma estrutura bilateral e que a sua natureza é contratual.
Acentua-se que apesar de não existir a faculdade de fixar, em negociação com Estado, o
conteúdo da obrigação, é indiscutível a sua liberdade de celebrar ou não o contrato.
Entende-se ser um raciocínio correcto este da “doutrina Drago”326 327 no que aos
empréstimos internos diz respeito. Com efeito, se estes podem ter as suas condições alteradas
sempre que o Estado decida ou entenda, o mesmo não deverá ser equacionado em relação aos
empréstimos externos. Seria uma grave violação do Direito Internacional, análoga à da violação
de um Tratado.
Seria então um contrato colectivo entre o Estado com o conjunto dos subscritores.
326
LUÍS MARIA DRAGO é o jurista que dá nome à doutrina. Veja-se Les empreents d’Etat et leurs rapports avec
la politique internationale, in Revue Générale de Droit International Public, 1907, p. 251.
327
Braz Teixeira, ob. Cit. pg. 311.
123
Há os que o consideram um contrato de adesão que se constitui pela subscrição do
empréstimo que é uma manifestação de concordância com as condições em que o Estado quer
constituir-se devedor.
Defende-se que não sendo nem contrato administrativo nem legislativo, é um contrato
financeiro, celebrado no âmbito das finanças públicas e subordinadas a normas do Direito
Financeiro.
d) Contrato misto
Pelas mesmas razoes, entendem outros que não seria um contrato misto mas um
contrato sui-generis.
Pelo critério de interesses, não parece ser de discutir que o empréstimo tem como
objectivo cumprir uma das funções do Tesouro Público, a antecipação de receitas para financiar
as despesas.
124
Em termos teleológicos, não há qualquer dúvida que o empréstimo público visa cobrir
despesas aptas a satisfazer necessidades públicas, no interesse público.
- Autorização legislativa,
- Titulação,
- Subscrição.
a) Autorização legislativa
Deve, pois, ser entendida como um acto politico através do qual a Assembleia da
República autoriza indirectamente o Governo a recorrer ao crédito público, podendo lançar
empréstimos públicos da espécie e nas condições que ele próprio fixará.
É uma lei meramente formal, condição essencial para a válida emissão do empréstimo e
cuja falta conduz à nulidade do empréstimo.
a) Denominação do Empréstimo;
c) Formas de titulação;
d) Mecanismos de colocação;
f) Potenciais tomadores;
g) Natureza do Empréstimo;
i) Taxa de Juro;
k) Garantias; e
É este o entendimento que deve ter-se do Decreto n.o 5/2002, de 26 de Março331 que
constitui, em nosso entender, um exemplo de Autorização legislativa (delegada) de emissão.
331
Decreto n.o 5/2002,
De 26 de Março
A promoção de condições para um crescimento económico sustentável que conduza à redução da pobreza,
é um dos objectivos principais da política do Governo. Não obstante o empenho do Governo no sentido de
126
aumentar o volume de receitas arrecadadas, verifica-se que estas continuam abaixo das necessidades do Estado
para o alcance deste objectivo fundamental, o que tornam necessário o recurso a diversas fontes de financiamento
do défice do Orçamento do Estado.
Assim, pretendendo promover a captação de poupança na economia nacional, e a sua reorientação para a
realização dos objectivos da política económica do Governo, a emissão de Obrigações do Tesouro desempenha um
papel importante, não só para o financiamento do défice do Orçamento do Estado, como também contribui para a
estabilização da moeda, o equilíbrio da produção e do consumo e consequente funcionamento normal do Mercado.
Nestes termos, no uso das competências atribuídas pelo artigo 5 da Lei nº 2/2002, de 2 de Janeiro, o
Conselho de Ministros decreta:
Artigo 1
1. É autorizada a Ministra do Plano e Finanças a contrair um empréstimo interno, amortizável, denominado
«Obrigações do Tesouro – 2002», até à importância total de dois mil trezentos e noventa biliões de meticais.
2. O empréstimo «Obrigações de Tesouro-2002», será representado por vinte e três milhões e novecentas mil
obrigações, que serão emitidas em moeda nacional, com o valor nominal de cem mil meticais cada.
3. O serviço da dívida das «Obrigações do Tesouro –2002», nomeadamente o pagamento de juros e reembolso de
capital, compete ao Ministério do Plano e Finanças.
4. As «Obrigações do Tesouro –2002», serão emitidas por um prazo de pelo menos dez anos.
Artigo 2
1. As «Obrigações do Tesouro-2002» serão representadas por valores mobiliários escriturais, não havendo por
isso lugar à emissão física de títulos.
2. Por despacho da Ministra do Plano e Finanças, as «Obrigações do Tesouro-2002» poderão ser colocadas
através de um sindicato de instituições financeiras.
3. A organização do sindicato de instituições financeiras e a colocação da emissão poderá ser efectuada por um
intermediário financeiro seleccionado para o efeito.
Artigo 3
As ««Obrigações do Tesouro –2002» serão admitidas à cotação na Bolsa de Valores de Moçambique, de forma a
serem transaccionadas em mercado secundário entre investidores institucionais e /ou particulares.
Artigo 4
Na data de liquidação da subscrição da emissão, o Banco de Moçambique, como Caixa do Estado, debitará a conta
de cada uma das instituições subscritoras/colocadoras pelo valor das respectivas subscrições/colocações e creditará
o Estado.
Artigo 5
O regime da taxa de juros da emissão das «Obrigações do Tesouro–2002» será estabelecido no diploma ministerial
a que se refere o artigo 9 do presente decreto.
Artigo 6
1. As «Obrigações do Tesouro-2002» gozam da garantia de reembolso integral, incluindo o capital e os juros.
2. O Banco de Moçambique, como Caixa do Estado, creditará a conta de cada uma das instituições financeiras
onde os valores mobiliários representativos das «Obrigações do Tesouro-2002» se encontrem registados pelos
montantes necessários ao serviço da dívida.
3. Os titulares das «Obrigações do Tesouro–2002» serão creditados pelos montantes de juros e/ou capital a
reembolsar, através das instituições financeiras onde os respectivos valores mobiliários se encontrem
registados.
Artigo 7
Serão inscritas no Orçamento do Estado as verbas necessárias ao serviço da dívida pública regulada pelo
presente decreto.
Artigo 8
As obrigações representativas deste empréstimo gozarão dos seguintes direitos:
a) Pagamento integral dos juros e reembolso do capital subscrito;
b)Isenção de todos os impostos sobre o rendimento (Contribuição Industrial e Imposto Complementar) e Imposto
de Selo.
Artigo 9
A Ministra do Plano e Finanças regulamentará, por diploma ministerial, as condições específicas da emissão, os
mecanismos do processo de emissão e do respectivo mercado secundário, bem como outras questões de índole
técnica.
Aprovado pelo Conselho de Ministros.
Publique-se.
127
b) Emissão da obrigação geral
c) Instituições colocadoras; e
d) Ficha técnica.
Ficha Técnica
Emissão de Obrigações do tesouro 2002 – 2.ª Série
v) Organização e liderança.
Esta descrição não é vinculativa, como pode ver-se de uma opção diferente no
Empréstimo denominação Obrigações do Tesouro–2002, cuja Obrigação Geral é constituída
pelo Diploma Ministerial n.o. 52/2002, de 17 de Abril.
c) Titulação
333
Anexo
Ficha Técnica
Emitente: República de Moçambique
Modalidade: Emissão de Obrigações do Tesouro.
Montante: 1.393,0 biliões de meticais
Representação: 13.930.000 desmaterializadas e ao portador, registando-se a emissão, subscrição e subsequentes
translações de acordo com a legislação em vigor.
Subscrição: Particular e directa com tomada firme
Valor nominal: 100 mil meticais
Preço de emissão e subscrição: 100 mil meticais por obrigação
Data de subscrição e liquidação financeira: 29 de Mar de 2002.
Prazo máximo: 10 anos, a, contra do dia 31 de Março de 2002.
Taxa de juro: A taxa de juro que remunera cada obrigação será mensalmente com base na “ultima taxa infracção
homóloga resultante do índice de preços no consumidor da cidade de Maputo («IPC»), tal como determinado pelo
Instituto Nacional de Estatística de Moçambique, utilizando a formula {[«IPC»]},, tal como determinado pelo
Instituto Nacional de Estatística de Moçambique, utilizando a formula {[(IPC do mes A do ano n/ IPC do mês A do
ano n-1) – 1] *100}, acrescido de margem de 7,5%.
130
A tribulação corresponde ao desdobramento da obrigação geral em títulos
representativos do empréstimo.
d) Subscrição
Assim, o Tesouro tem sempre a certeza de que o empréstimo está sempre totalmente
subscrito (e realizado) cabendo ao Banco de tomada firme ou sindicato de Bancos recolocá-lo
junto do grande público.
Os empréstimos subscritos podem ter sido colocados acima ou abaixo do par. Será
abaixo do par quando o valor da subscrição é inferior ao valor nominal do título; acima do par
será o caso dos títulos estarem com valor superior ao da subscrição.
As obrigações do tesouro, cujo regime jurídico é definido pelo Decreto n.o 24/2003, de
20 de Maio, constituem-se em instrumento privilegiado para o funcionamento e gestão da
tesouraria do Estado, assegurando o equilibro dos fluxos de receitas e despesas e para a
dinamização do mercado financeiro.
334
Também designados de cautelas.
131
Os Bilhetes do Tesouro são títulos desmaterializados representativos da dívida pública
emitidos por prazos de 28, 63, 91, 182 e 364 dias, abaixo do par, pelo montante correspondente
à diferença entre o valor nominal e a importância dos juros correspondente a cada subscrição.
Deve, porém, entender-se que o Ministro deve, por cada emissão, fazer uma solicitação
dirigida ao Banco de Moçambique, o que se explica pelo facto de ser o Ministério que
superintende o subsistema do Tesouro e competir-lhe garantir, no quadro das políticas fiscal e
orçamental, a arrecadação e afectação de recursos financeiros do Estado337.
• Isenção de impostos;
• Impenhorabilidade dos títulos;
• Livre importação e exportação dos títulos,
• Prémio de reembolso338;
• Prémio de amortização339; e
• Garantias de cambio340.
5.5.4.1. Cumprimento
a) Sistema de amortização
335
Art. 5 do Decreto n.o. 24/2003.
336
No. 2 do Art. 5 do Decreto n.o 24/2003, de 20 de Maio.
337
Alínea g) do art. 3 do Decreto Presidencial no. 2/96, de 21 de Maio, que define as competências do Ministério
do Plano e Finanças
338
O prémio de reembolso ocorre em casos de emissões abaixo do par sendo a amortização feita pelo valor
nominal
339
Nos sorteios os prestamistas recebem valor superior ao nominal
340
Através da indexação a moeda estável. Não se confunda, porém, com a própria definição, que é passível dos
juros em moeda convertível, não obstante em tais casos também podermos estar perante uma garantia de câmbio.
132
O cumprimento da relação jurídica do empréstimo dá-se pelo comprimento do variado
leque de deveres dos quais o mais importante é a amortização da divida pública que o
empréstimo dá origem.
A amortização pode ser feita por anuidades obrigatórias para o que é inscrita no
orçamento uma verba de amortização que apesar de ser regular e contínua pode implicar a
contracção de novo empréstimo sempre que receitas efectivas não sejam suficientes.
A amortização poderá também ser feita recorrendo aos saldos orçamentais. Claro está, a
amortização será irregular pois só será feita à e na medida em que os há, no fim de cada
exercício, o que pressupõe, em princípio, um orçamento superavitário ou ex ante ou ex post.
b) Modalidade de pagamento
c) Momento de amortização
Os empréstimos amortizáveis em data fixa são todos pagos, capital e juros, na data
preestabelecida na ficha técnica aprovada pela obrigação geral.
a) Conversão
341
SOUSA FRANCO, ob. cit ., pp. 543 e ss. TEIXEIRA RIBEIRO, ob. cit., p. 170 e BRAZ\TEIXEIRA, ob. cit,,
p. 356.
133
A conversão traduz-se numa novação objectiva, sobre a qual atrás falamos a propósito
do pagamento duma dívida por novo empréstimo, com juro mais baixo do que o que se
pretende pagar.
A conversão cobre o capital, juros e outras obrigações acessórias.
b) Prescrição
c) Anulação
d) Confusão
e) Repúdio
342
Não parece terem sido pagos os títulos representativos das obrigações emitidos no âmbito do Plano de
Desenvolvimento do Vale do Zambeze (GPZ) emitidos pelo Governo da Província de Moçambique. Pode falar-se
de um repúdio ainda que não formal, que pode ter conduzido a uma prescrição. Na História Universal são várias as
situações para mais desenvolvimento, ver BRAZ TEIXEIRA, ob. cit., p. 362
134
f) Remissão
Capítulo IV
DÍVIDA PÚBLICA
1. Conceito.
Dívida pública é o “conjunto das situações passivas que resultam para o Estado do
recurso a crédito público”343, directa344 ou indirectamente.345
I. A dívida pública, pode dizer-se, tem as formas do crédito e dos empréstimos que
lhe dão origem.
Nesta ordem de ideias a dívida pública poderá ser interna ou externa, consoante seja
interno ou externo o respectivo empréstimo.
Com este entendimento a dívida será externa346 quando seja relativa ao conjunto de
dívida da comunidade a outros países e instituições internacionais de crédito.
III. Tendo em conta a sua duração, a dívida poderá ser de curto prazo também
designada de flutuante, ou de longo prazo347 ou fundada.
343
SOUSA FRANCO, ob. cit,, Vol. II, p. 87.
344
Quando o recurso ao crédito público é directo temos uma dívida pública em sentido restrito
345
Dívida Pública em sentido amplo incluindo-se as situações derivadas de outro tipo de operações de crédito
como as derivadas de avales, créditos administrativos, vitalícios, monetários, etc.
346
Segundo o Prof. SOUSA FRANCO, ob. cit. Vol. II, p. 87.
347
Entende-se, neste caso, superior ao período orçamental, de um ano.
135
A dívida fundada pode ser, tanto quanto o respectivo empréstimo, perpétua, consolidada
ou temporária.
Será consolidada quando a dívida não tenha prazo de reembolso e seja reembolsável sob
determinadas circunstâncias – dívida perpétua remível - , ou não, - dívida perpétua irremível.
A dívida titulada pode ser por títulos nominativos (com a designação de titular), ao
portador (susceptíveis de circulação por simples traditio manu ou por endosso, por não
conterem o nome do titular) ou mistos sendo nominativos em relação ao direito às prestações
de capital e ao portador em relação aos cupões destacáveis, representativos de elementos
acessórios – os juros.
4.1. Generalidades.
Dada a importância e peso da dívida pública externa, que representa a quase totalidade
da dívida pública moçambicana, é pertinente fazer-se aqui uma exposição dos principais
argumentos que estão normalmente presentes neste debate.
348
A amortização é regular quando é feita de acordo com um programa escalonado de reembolso
349
Diz-se irregular a amortização da dívida variável de ano para ano, de acordo com as variações de conjuntura.
136
- A primeira refere-se aos empréstimos contraídos junto de bancos comerciais
estrangeiros, a taxas de juro de mercado;
- A dívida bilateral, por sua vez, resulta dos empréstimos provenientes de outros
Estados (por exemplo, a Dinamarca, através da DANIDA e o Canadá, através da CIDA);
Tal já não sucede no caso dos empréstimos internos. O recurso a este tipo de
empréstimos por parte do Estado absorve poupanças internas, reduzindo assim o volume dos
recursos financeiros disponíveis para o sector privado.
Uma terceira desvantagem dos empréstimos externos tem a ver com os efeitos da
desvalorização da moeda e da inflação no valor da dívida. A dívida externa sofre um
agravamento cada vez que a moeda nacional se desvaloriza, já que serão necessárias mais
unidades de moeda nacional para pagar os juros e o capital em moeda externa. Por outro lado, o
valor real da dívida pública externa não diminuiu com a inflação.
A dívida pública externa representa sempre uma potencial perda de soberania do país
devedor, já que este se encontra susceptível a interferências e pressões de outros Estados
soberanos ou de instituições externas. A condicionalidade subjacente aos programas de
estabilização e ajustamento estrutural do Banco Mundial e do FMI é disso sintomática350.
350
Não só. Poderá o Parlamento moçambicano fazer uma escolha absolutamente soberana do tipo de sistema
eleitoral que mais convém ao País, ou tem que tomar em consideração o ponto de vista dos financiadores do
processo?
138
● efeitos negativos da desvalorização da moeda nacional e ausência dos efeitos
positivos da inflação no valor real da dívida; e
● perda de soberania nacional
A capacidade de um país pagar a dívida pública é-nos dada, antes de mais, pelo seu
rendimento. Quanto maior for o rendimento nacional, menor será o peso da dívida e,
consequentemente, maior será a sua sustentabilidade. O valor da produção de bens e serviços
numa economia, isto é, o Produto Interno Bruto (PIB), constitui uma medida aproximada do
rendimento de um país.
No caso da dívida externa, a relação entre os encargos por ela gerados e a exportação
de bens e serviços constitui o indicador de maior relevo. É a capacidade exportadora de um
país, a capacidade de uma economia gerar divisas, que nos diz se a dívida externa é ou não
sustentável. Uma economia que não gera suficientes receitas em moeda externa não terá os
meios necessários ao pagamento da dívida externa.
Uma dívida que absorve uma parcela considerável do fluxo de receitas correntes ao
Estado (fiscais e não fiscais) não será sustentável, pois não disporá dos meios necessários para
fazer face aos encargos da sua dívida sem pôr em causa o normal funcionamento da
administração pública e a provisão de bens públicos essenciais.
Um Estado não deve sobrecarregar-se com empréstimos para além da capacidade futura
de os reembolsar, sendo os limites da dívida pública estabelecidos pelos recursos futuramente
disponíveis para a pagar.
A dívida deve ser de créditos cuja aplicação rege-se por critérios rigorosos de eficiência
e eficácia conseguidas para minimização de desperdícios na sua utilização e maximização do
seu impacto no rendimento nacional. Nas receitas fiscais e na capacidade exportadora de um
país.
139
O endividamento não deve provir de financiamento de gastos supérfluos e de consumos,
que pouco ou nada contribuem para a expansão do PIB e das exportações, do investimento
público em áreas com um forte impacto no desenvolvimento do sector privado, (como sejam a
educação e a melhoria das infra-estruturas económicas), com um efeito no significativo
aumento das receitas e como parte integrante de uma estratégia conducente ao crescimento da
economia e das exportações.
351
Regra geral, só com o aval destas duas instituições financeiras é possível a um país ter acesso fácil a créditos
concessionais da comunidade internacional. A prossecução, de forma continuada, de políticas macroeconómicas
rigorosas e de um ambicioso programa de reformas económicas por parte das autoridades moçambicanas
constituem duas importantes razões por detrás do apoio que a comunidade internacional tem concedido a
Moçambique.
140
Existem diversas razões para o predomínio absoluto do endividamento externo
relativamente aos créditos internos. Para além dos motivos atrás apontados elevados défices na
balança de transacções correntes e facilidades de acesso a créditos externos, é de salientar:
O stock de dívida ascende a USD 5.5 biliões, ou seja, a aproximadamente USD 350 por
habitante. A dívida pública externa corresponde a 210% do PIB e a quase 7 vezes do valor
global das exportações de bens e serviços.
Uma porção considerável dos empréstimos contraídos pelo Estado acabou sendo
canalizada para o financiamento da guerra de despesas imprescindíveis e de projectos de
investimentos que se vieram a revelar insustentáveis.
Moçambique tem podido cumprir com o serviço da sua dívida externa apenas devido
aos sucessivos reescalonamentos e ao perdão parcial ou total concedido por alguns países
credores, que fazem com que o país tenha vindo a pagar anualmente somente cerca de 30% do
montante de juros e capital devidos.
141
poder servir a sua dívida passada, o que gera um crescimento contínuo e insustentável do stock
de dívida.
Apesar das frequentes operações de alívio, o serviço anual da dívida pública externa
continua, a absorver cerca de 20% a 25% das receitas fiscais e de exportação.
Moçambique não estará em condições de suportar tal cenário. Para além dos efeitos
negativos nos défices do orçamento do Estado e na balança de pagamentos, há que considerar
que:
Face à gravidade do problema da dívida pública externa, Moçambique foi eleito para
fazer parte da iniciativa do Banco Mundial e do FMI para os países pobres altamente
142
endividados (HIPC). Tendo o país cumprido com certos critérios relacionados com a
continuação das reformas nas áreas económica e social, beneficiou a partir de Junho de 1999,
de uma redução do valor actualizado líquido do stock de dívida para USD 1.2 biliões. Tal
traduziu-se numa redução do serviço da dívida pública externa para 12% das receitas correntes
do Estado.
Mutuante
1998 1999 2000 2001
ADB (1)
1.7
ADDF(1)
227.5
BAD
38.3 28.9 (a) 1.9
BADEA
15.2 17.3 22.7 27.3
BID
32.7 0.2 3.7
FAD
378 389 a) 218
FED
8.2 7.4 (b) 0
FIDA
39 40.8 42.4
FMI
232 0 (c) 0
IDA
1.361.20 1.381.60 (a) 759.3 746.5
IDB (1)
3.9
IFAD (1)
45.4
NDF
10.5 12 12.7 12.2
352
Estes valores de stocks de dívida podem não coincidir com os de outras fontes o que levou o Tribunal
Administrativo, em sede de Relatório e Parecer sobre a CGE de 2001 (p. 105) a deixar registado o seguinte:
“Uma vez mais importa salientar quão é importante apresentar na Conta Geral do Estado, informação fidedigna
relativamente ao stock da dívida pública na medida em que mostra a situação do Estado,, como entidade devedora
e responsável pelo cumprimento integral de suas obrigações”.
143
NTF
1.9 1.6 1.3 1.9
OPEC
15.7 17.5 19.1 25.1
EIB
45.7 47.6 46.0
Total
2.133.50 1.942.00 1.128.70 1.137.5
Bilateral
1.971.20 1.804.60 1.837.90 1.841.8
Áustria
20.7 17.6 17.5
Espanha
38.9 11.9 16.2
EUA
50.7 50.3 54.3
França
512,6 375.8 478.9
Itália
454.8 512.1 484.0
Japão
80.5 83.3 102.3
Portugal
435.2 439.3 378.1
Reino Unido
146.3 141 143.6
RFA
210.8 155.1 158.2
Suécia
20.7 18.2 8.7
Bilateral
Outros 1.018.20 1.009.50 916.6 917.2353
Brasil
518.1 513.2 389.9
Russia
500.1 496.3 527.2
Total 2
2.989.4 2.814.1 2.754.5 .759.0
353
Neste total não se inclui a dívida bilateral relativa aos Países do Leste e outros que assim descriminada, em
milhões de USD:
1998 - 933.1
1999 – 865
2000 – 876
2001 – 862.5.
144
No quadro seguinte a dívida pública extrema de Moçambique diminuiu 7,7% em 1999 e
11,8% em 2000, pela política de redução da dívida mencionada anteriormente, não se tendo
registado variações significativas no ano de 2001 (0,5%).354
Quadro C – Stock da Dívida Pública Extrema
V 1 V 2 V 2 V
1997 1998 ariação 999 ariação 000 ariação 001 ariação
6 8 5 7 4 1 4 -
.643.1 .120.78,5 .5% .647.7 ,7% .982.10 1.8% .955.3 0,5%
Fonte: Boletim Estatístico no. 38/Ano 10 – Dezembro de 2002 – DEE – Banco de Moçambique
APÊNDICE
Publique-se.
O Presidente da República, Joaquim Alberto Chissano.
Senhores Deputados,
354
Referência extraída do relatório e Parecer do Tribunal Administrativo sobre a CGE de 2001, p. 102.
145
aqui presentes vindos de todas as províncias do nosso País. Esta saudação é também uma
saudação a todo o povo moçambicano pela coragem com que tem vindo a enfrentar a violência
que nos é imposta do exterior.
É contra esta unidade da Nação Moçambicana que esta Assembleia bem representa que
tem vindo a erguer-se a fúria assassina (...).
Com a vossa generosa permissão queremos aproveitar esta tribuna para prestar a
homenagem aos nossos compatriotas que já se sacrificaram em defesa da pátria e da revolução.
O nosso profundo respeito vai igualmente para aqueles que com determinação e
heroísmo defendem a pátria em todos os recantos do nosso País.
Senhores Deputados,
Assim, as despesas de defesa e segurança passaram para cerca de 33 por cento das
despesas totais, quando em 198 representavam apenas 20 por cento. As receitas do Orçamento
do Estado eram insuficientes para cobrir as sempre crescentes despesas a que o Estado tem de
fazer face.
A evolução que apresentamos levou a que houvesse muito dinheiro para poucos
produtos, provocando a subida dos preços, criando condições para os candongueiros fazerem
lucros fabulosos em negócios ilícitos. A experiência revelou que este grave problema de subida
de preços e da candonga não se resolve apenas com medidas administrativas.
As receitas das exportações reduziram de $280 milhões em 1981 para $80 milhões, em
1986, cobrindo apenas 14 por cento do valor das importações. No mesmo ano, as receitas em
divisas do tráfego ferro-portuário internacional foram apenas de 17 por cento do nível de 1981.
A diferença entre as receitas e despesas foi crescendo atingindo $600 milhões em 1986.
Ao longo dos anos estes défices foram sendo cobertos recorrendo–se a empréstimos
internacionais.
Em 1986 a dívida externa de Moçambique totalizava 53.2 biliões, dos quais $1.2 biliões
representam dívida em atraso. As poucas importações que conseguimos fazer foram realizadas
essencialmente através de donativos ou créditos governamentais especiais. Como exemplo,
neste momento cerca de 80 por cento dos produtos alimentares importados são donativos.
147
A situação que se acaba de descrever levou a:
Entre outras medidas introduziram-se: o novo sistema de gestão cambial que visava
estimular os exportadores, a abolição do controlo de alguns preços; a racionalização de certas
empresas estatais e a distribuição das terras disponíveis ao sector familiar e privado; nova
legislação para aumentar a produtividade.
No plano externo, para aliviar o fundo externo cambial do Estado dos encargos anuais
da divida externa conclui-se o primeiro reescalonamento da dívida.
Entretanto, estes programas e medidas, porque pontuais, não foram suficientes para
revitalizar a economia, corrigir os desequilíbrios e anomalias, aliviar a tendência para o
agravamento do déficit da balança de pagamentos.
Por isso, por instrução explícita do Bureau Político o Governo elaborou o Programa de
Reabilitação Económica, um programa que visa em quarto anos, até 1990, promover a
recuperação da actividade economia com um crescimento do produto interno bruto da ordem
dos 12 por cento.
- aumentar a produção agrária, com especial prioridade para o sector familiar com
vista a garantir o consumo interno, promover as exportações e assegurar o aprovisionamento da
agro-industrial;
148
- reabilitar as infra-estruturas económicas (estradas, linhas-férreas), com
prioridade para a rede comercial para reactivar as actividades directamente produtivas e
recuperar o tráfego ferroviário e portuário;
Para alcançar estes objectivos foram adoptadas medidas nas seguintes áreas:
- Orçamento de Estado;
- Moeda e crédito;
- Impostos;
- Preços;
- Forças de trabalho e salários;
- Reforma institucional;
- Relações económicas externas.
Na nova política orçamental e fiscal prevê–se que o aumento substancial das receitas
resulte principalmente duma mudança profunda no sistema de impostos e de maior eficácia na
cobrança. Assim, os impostos indirectos – o imposto de consumo sobre determinados bens de
consumo e o imposto de circulação serão os mais importantes.
Estas medidas têm por objectivo proteger o nível de vida de milhares de trabalhadores
subsidiando os preços de bens essenciais e assegurando o emprego a dezenas de milhares de
trabalhadores.
149
São medidas de grande alcance social, mas que distorcem a realidade económica e
financeira, com a prática de preços fictícios e a conservação de postos de trabalho
improdutivos. É preferível gastar cinco ou seis vezes mais na criação de actividades produtivas
economicamente úteis do que manter e financiar actividades parasitárias.
A coragem de hoje na tomada de medidas correctas vai nos poupar sacrifícios maiores
no futuro e vai, certamente, criar bases sólidas para a nossa prosperidade e da dos nossos filhos.
É neste contexto que temos de apreciar a revisão do sistema de rendas de casa e temos
de prosseguir com a implementação das taxas de utilização da terra de forma a estimular o uso
mais racional e produtivo deste capital precioso que é a terra.
Nos primeiros seis meses do ano, constatamos que as despesas mantiveram-se dentro
dos limites previstos e as receitas atingiram 22,3 milhões de contos, ligeiramente acima das
receitas planificadas.
A cobrança aquém das previsões dos impostos indirectos foi, no entanto, compensada
pelo sobrecumprimento em mais de três milhões de contos nos impostos sobre o rendimento,
em particular, na contribuição industrial que incide sobre os lucros como resultado das acções
de combate às fraudes fiscais e de maior exigência na cobrança de impostos.
As estruturas governamentais têm de dar maior apoio a este trabalho vital, que está a
revelar um grande índice de evasão fiscal e evitar as interferências administrativas estranhas ao
processo de auditoria e de fixação de matéria colectável por parte de alguns elementos com
responsabilidade no aparelho de Estado, na tentativa de proteger ou encobrir os erros
detectados.
Faz parte do processo normal de trabalho de administração fiscal que as decisões sobre
reclamações sejam precedidas de uma análise mais detalhada dos rendimentos das entidades ou
pessoas envolvidas. A experiência revela que os lucros acabam por ser superiores aos que
serviram de base para a definição do imposto, devendo por isso este ser agravado ainda mais.
Não devemos menosprezar a capacidade de formar opinião que estas forças têm na
nossa sociedade, movendo influências para defesa dos seus interesses.
150
Também não devemos ignorar os erros e as dificuldades surgidas no processo de
execução do novo sistema fiscal.
Por outro lado, aumentaram-se também os juros sobre os depósitos a fim de encorajar
poupanças.
No primeiro semestre, foi definido que o crédito à economia não podia ultrapassar os 8
milhões de contos e como resultados, os empréstimos bancários atingiram cerca de 7 milhões
de contos apesar do sector de transportes ter ultrapassado o seu limite em 17 por cento. A maior
parte do crédito foi concedido à Direcção Nacional de Portos e Caminhos de Ferro, à
Intermecano e às empresas açucareiras.
Concorrem também, para a redução na procura do crédito, para além das medidas já
enunciadas, as seguintes razões:
Embora ainda não existam dados suficientes para uma avaliação precisa, tudo indica
que se conseguiu um decréscimo do crédito em relação ao mesmo período do ano passado.
Dados preliminares indicam também um aumento no ritmo de crescimento dos depósitos a
prazo, reflectindo os efeitos positivos das melhores taxas de juros destes depositou que
estimulam a poupança dos cidadãos.
151
A moeda está a circular mais rapidamente, ou seja, com o mesmo nível de notas e
moedas em circulação, há um maior valor de transacções. Isto constitui um sinal de que se
desenha maior dinamismo na economia.
Para o segundo semestre, serão fixados novos limites de crédito que devem ser
respeitados, apesar de se esperar um aumento da procura de financiamento por parte das
empresas.
c) A política de preços
A política de preços visa também estabelecer um melhor equilíbrio nas relações de troca
entre o campo e a cidade, e privilegiar o produtor agrícola. No entanto, e para proteger o
consumidor, principalmente o urbano, serão concedidos pelo Orçamento do Estado subsídios
para alguns bens de consumo essenciais, o que se pretende eliminar tão breve quanto as
condições o permitam.
Os aumentos dos preços variam de produto para produto, mas como reflexo do aumento
do preço das divisas resultado da desvalorização, os bens e serviços que apresentam maiores
crescimentos nos preços são aqueles com uma componente importada elevada.
A avaliação dos resultados do aumento dos preços dos diferentes produtos deve ser feita
pela medição do crescimento médio dos preços dos bens e serviços que, em termos médios, são
mais usados pela população, e não pelo aumento do produto a produto.
Os bens e serviços, em média, mais usados pela população são determinados através de
inquéritos que se fazem aos cidadãos.
No primeiro semestre, o aumento dos preços oficiais foi de três vezes, sendo 1,7 vezes
nos bens alimentares e 3.1 vezes nos bens não alimentares. Como se pode ver, os subsídios em
produtos alimentares, em especial, milho, arroz, trigo, açúcar e óleo atenuaram o efeito de
152
aumento geral dos preços de alguns produtos que têm preços livres, nomeadamente, das
hortícolas, contribui para atenuar o efeito do aumento geral dos preços.
Duma maneira geral, os preços fixados pelo Estado estão a ser praticados,
particularmente, nas capitais provinciais onde existem mecanismos de controlo, e nota-se já
uma redução significativa na candonga de alguns produtos, por exemplo, de cigarros e cerveja,
em Maputo.
Contudo, nas áreas onde não haja sistemas de controlo implantados, ou onde graves
dificuldades de transporte fazem com que os produtos cheguem esporadicamente e são
escassos, os preços estabelecidos continuam a não ser respeitados. Surgem ainda dificuldades
adicionais em províncias tais como Niassa e Tete, onde os elevados custos de transporte tornam
os preços fixados não remuneradores para os comerciantes.
No entanto, é verdade que em alguns produtos tem havido um agravamento dos preços
além dos limites aceitáveis. Estamos a procurar organizar os mecanismos de controlo que
permitam pôr cobro e punir estes abusos.
Alguns dos reflexos mais notáveis do aumento dos preços até agora detectados são:
153
Em termos gerais o efeito de aumento geral dos preços faz-se sentir mais na população
urbana, pois ao nível rural a produção para o auto consumo familiar amortece o efeito deste
fenómeno.
Houve anomalias no processo do ajuste de preços, como por exemplo, no aumento das
taxas de electricidade contabilizadas para um período de três meses, e que como tal,
constituíam um encargo pesado nalguns orçamentos familiares. Ao verificar-se esta situação
tomou-se a decisão de permitir uma dilatação do período de pagamento dessas contas.
d) Política salarial
Nos sectores onde este processo avançou mais foi já possível introduzir revisões
salariais abrangendo milhares de trabalhadores.
Sabido que a aplicação de novas escalas e tarifas seria um processo moroso e complexo
decidiu-se um aumento generalizado de salários em 50 por cento em Janeiro com possibilidade
de aumentos selectivos de vinte e cinco por cento.
Este processo complexo não decorreu sem dificuldades, principalmente no início do ano
quando o aumento de cinquenta por cento coincidiu com a aplicação das novas tabelas salariais.
Surgiu uma certa confusão nalguns locais de trabalho ainda sem as tabelas salariais definidas,
ou onde não se estava a aplicar a legislação até então em vigor.
Isto fez com que muitos trabalhadores recebessem tardiamente os aumentos a que
tinham direito. A maioria destas situações foi sendo resolvida e não se prevêem as mesmas
dificuldades com o novo aumento de cinquenta por certo, com efeitos a partir de Agosto.
Embora muito trabalho esteja por realizar no domínio da organização salarial e muitas
situações anómalas tenham sido já registadas, elas têm origem em questões das empresas e, por
isso, não dependem de vontade ou de um acto administrativo.
Com efeito, embora ainda não seja possível uma avaliação exaustiva constata-se através
de um controlo do fundo de salários efectuado em 1166 unidades económicas, abrangendo
trinta ramos de actividade e 45 000 trabalhadores que o salário médio passou de 5 000,00 MT
para 8 470,00 MT.
154
Em alguns ramos como o de vestuário, têxtil, alimentar, navegação, indústria gráfica e
metalomecânica houve crescimento superior a 100 por cento, quando a medida dos 50 por
cento foi aplicada simultaneamente com novas tabelas salariais.
Por outro lado, existem ramos com aumentos inferiores a 50 por cento, em virtude de
algumas empresas estarem já a praticar salários acima das normas, ou ainda porque em
empresas deficitárias, não era possível aplicar as medidas em toda a sua extensão.
Neste contexto, importa referir que não é normal a desvalorização da moeda ser
acompanhada de aumentos salariais quase simultâneos, ou que o aumento se faça em proporção
tão elevada. Geralmente não se aplica esta medida de correcção salarial e quando a ela tem
lugar, realiza-se o correspondente ajustamento muitos meses depois.
A realidade económica do País não nos deixa outra solução senão a segunda, ou seja, a
racionalização da força de trabalho, procurar ao mesmo tempo alternativas de ocupação e
emprego da força de trabalho excedentária em actividades economicamente úteis, com
prioridade para a actividade agrária. Este processo já foi iniciado e muitos trabalhadores foram
já desvinculados das empresas agrícolas, e em alguns casos decorreu sem grandes perturbações
acompanhando como foi pela distribuição de terras aos trabalhadores agrícolas e apoio na
aquisição de instrumentos de produção.
Esta medida de racionalização da força de trabalho não tem por objectivo aumentar o
número de desempregados, pelo contrário, visa proporcionar melhor aproveitamento da força
de trabalho e eliminar a improdutividade e o parasitismo. Na situação actual no nosso país, em
que a capacidade de investimento é extremamente limitada, o emprego produtivo imediato está
ligado à terra. É irrealista pensar que vamos ser capazes de fazer grandes investimentos para
155
criar na indústria muitos postos de trabalho. A criação de 10 000 postos de trabalho na indústria
pode significar investimentos da ordem dos 500 a 1000 milhões de US$, dependendo da
natureza das indústrias. Ora este investimento não é possível e mesmo que fosse, não resolvia o
nosso problema da força de trabalho que tem a dimensão de várias dezenas de milhares de
trabalhadores.
e) Reforma institucional
Com efeito, na economia, as decisões de gestão e de direcção têm de ser tomadas pelos
agentes económicos, empresas, cooperativas e famílias em tempo oportuno. Não é possível
gerir a economia pela via administrativa. Não é possível, por exemplo, decidir em Maputo, qual
a camisa produzida na fábrica Progresso em Chimoio, que vai ser vendida a um camponês em
Mueda.
A influência do Estado sobre a actividade económica deve ser pela via de definição de
prioridades globais, direcção de investimentos públicos, definição de normas e de medidas nos
âmbitos de política fiscal, crédito, preços e salários, definição dos ritmos de crescimento e das
proporções em que cada ramo da economia deve crescer.
156
É necessário cortar o cordão umbilical que caracteriza a relação de pai para filho menor
entre os Ministérios e as empresas. Estas devem ser autónomas, devem prestar contas pelo seu
funcionamento, mas para isso têm de ter autonomia de decisão. Para poderem actuar como
agentes económicos dinâmicos, as direcções das empresas deverão ter a liberdade de decidir
como e quando devem mobilizar recursos, organizar a força de trabalho, angariar e gerir os
recursos financeiros para maximizar os resultados com menor custo possível. As empresas
devem ter a liberdade de decidir, de acordo com o que os seus estatutos e regulamentos
estabelecerem, como utilizar os seus excedentes para o desenvolvimento das suas actividades e
proporcionar melhores condições de vida e de trabalho aos seus trabalhadores.
O Governo está a concentrar a sua atenção nas empresas e áreas prioritárias com
prioridade na racionalização e reorganização das de maior dimensão, onde se vai introduzir
uma contabilidade eficaz para se equipar a direcção com instrumentos para uma gestão
eficiente. Ao mesmo tempo, vai se fazer o levantamento das pequenas empresas que serão
entregues a privados ou transformadas em cooperativas. Está em curso um estudo de vinte e
cinco empresas industriais e quinze agrícolas, com vista a avaliar a sua situação e identificar as
medidas a tomar.
Nalguns casos, empresas mistas estão a ser criadas com parceiros estrangeiros que
garantem a introdução de novas técnicas de produção e de gestão.
- Transportam produtos;
- Substituem importações.
Para aliviar as empresas do peso de dívidas acumuladas do passado, como já foi dito,
está a ser discutido com alguns sectores a reprogramação da dívida bancária e foi decidida a
afectação de meios financeiros para cobertura pelo Estado de parte dessas dívidas. Espera-se
que até ao fim do ano o Estado consiga disponibilizar mais de 10 milhões de contos para o
efeito.
157
Para além destas acções, outras medidas estão em estudo e serão implementadas em
devido tempo tais como o lançamento de Títulos da dívida pública, criação de Sociedades
Financeiras, programa de construção de casas para venda a crédito.
A manifestação mais gritante deste facto foi a candonga da própria moeda. Enquanto no
câmbio oficial, o Banco comprava um dólar por 45,00 meticais, no mercado negro comprava-se
um dólar por 1 800,00 MT.
- Adoptar uma política de taxa de câmbio mais flexível de forma a adequar o nível
geral dos preços ao mercado internacional e à situação real da nossa economia;
158
Por outro lado, as nossas empresas que exportam, passaram a receber dez vezes mais
meticais para a mesma quantidade de produtos, supondo que se mantêm inalteráveis os preços
dos nossos produtos no mercado internacional.
Foram reescalonados cerca de $830 milhões, a maior parte dos quais com o Clube de
Paris, que adiou o pagamento da dívida para vinte anos, com o período de diferimento de dez
anos, ou seja o reembolso do capital começa só depois de dez anos. No entanto nos primeiros
dez anos teremos que pagar juros avultados.
Podemos dizer que as negociações foram concluídas com êxito, em particular no que
refere ao prazo de vinte anos, embora questões vitais como a de juros necessitem de soluções
mais justas.
Com efeito, o trabalho de reescalonamento ainda não está concluído pois é necessário
ainda negociar bilateralmente com cada credor, país por país, as condições específicas e, em
particular, a taxa de juro a praticar.
A taxa de juro que for acordada determinará a nossa capacidade de pagar os juros pois
se estes forem muito altos o País não disporá de meios financeiros para honrar os
compromissos assumidos.
As novas estimativas revelam que em 1987 temos que pagar $US87 milhões a título de
juros, enquanto que a previsão para as exportações é da ordem de 85 milhões de US$.
Em 1988, teremos que pagar $US130 milhões com exportações previstas de cerca de
$100 milhões.
Estes valores revelam que não obstante o reescalonamento da dívida, as obrigações que
daí resultam são ainda extremamente pesadas para a nossa capacidade. Note-se que sem o
reescalonamento da dívida, os montantes a pagar em 1987 seriam da ordem dos 175 Milhões de
US$.
A questão da dívida externa, o peso que têm na Balança de Pagamentos, os juros que
temos de pagar vai exigir ao Governo muito esforço e muita atenção, porque o não pagamento
sistemático das nossas obrigações prejudica a disponibilização de fundos para os nossos
projectos de reabilitação.
159
No que se refere à mobilização de meios financeiros, o Fundo Monetário Internacional,
na base de um programa acordado, concedeu à República Popular de Moçambique um
financiamento especial constituído por 15,5 milhões de US$ e 22,0 milhões de US$ em 1988 de
dinheiro líquido para apoio à balança de pagamentos. O Banco Mundial, no âmbito do mesmo
programa, concedeu um novo crédito de reabilitação de $US110 milhões para vários sectores e
mais $US20 milhões para o sector de energia.
Foi também acordado com a CEE um apoio de $US45 milhões para importações
destinadas à comercialização agrícola e produção industrial.
Os resultados da reunião foram bastante encorajadores, embora ainda não seja possível
quantificar com exactidão os valores colocados à nossa disposição dado que alguns países
importantes como a Itália, Japão e RFA, indicarão as respectivas contribuições nas Comissões
Mistas.
Para além da diferença que ainda é necessário cobrir o aspecto mais importante, a ter
em conta, é o da chegada atempada dos recursos ao País. Trata-se de uma tarefa complexa e
difícil e não depende apenas do esforço organizativo, pois os condicionalismos impostos pelos
países doadores tornam por vezes difícil o uso em tempo destes montantes.
160
A análise da situação da balança de pagamentos no primeiro semestre revela que a
diferença entre o que gastamos e recebemos em divisas, diminuiu ligeiramente, como resultado
do aumento das exportações e diminuição das importações. Contudo, se consideramos que o
déficit registado na conta corrente ainda é de 288 milhões de dólares, constatamos que o
esforço a fazer é ainda muito grande.
No primeiro semestre, exportámos $49 milhões ou seja mais um terço do que em igual
período do ano passado, esperando-se atingir a meta anual planificada.
Outra área que vai continuar a merecer uma atenção especial é a dos invisíveis e
serviços produtivos ou seja de deslocações ao exterior, transferência de salários, de assistência
técnica, contribuições para as organizações internacionais, despesas das embaixadas e outras,
em que foi iniciado o processo conducente a maior austeridade e controle de receitas e
despesas. Contudo, muito trabalho há ainda por fazer, para que cada dólar seja correctamente
despendido.
Senhores Deputados,
Caros Convidados,
161
Acabamos de apresentar um resumo das medidas da política económica em
implementação no quadro do PRE e informações preliminares sobre os seus efeitos.
Por não existirem ainda mecanismos adequados que permitam uma avaliação profunda
dos seus efeitos, é cedo para se tirarem conclusões definitivas.
A produção industrial cresceu 34 por cento em relação ao mesmo período de 1987, nos
produtos que fazem parte do PEC. O resultado poderia ter sido ainda melhor se não tivesse
havido 747 mil horas de paralisações da indústria ligeira por falta de matérias-primas e por
cortes frequentes no fornecimento de energia.
De notar, porém, que existe ainda uma notável capacidade instalada ociosa, que não é
utilizada por falta das necessárias matérias-primas e peças sobressalentes. Quer dizer, com a
injecção de meios, podemos aumentar mais ainda a produção, melhorar o abastecimento e
incrementar as exportações.
162
As informações sobre a execução do plano de investimentos são escassas, confirmando
a falta de controlo que ainda persiste nesta área. Entretanto, tudo indica que o nível de
investimento do primeiro semestre foi muito baixo, devido principalmente à falta de materiais
de construção, prevendo-se que tenhamos de paralisar algumas obras no segundo semestre.
Mas também temos de reconhecer que muito trabalho temos de fazer: a reorganização
de algumas empresas de construções que careçam ainda de uma correcta planificação das obras,
controlo no uso dos materiais, contabilização dos gastos e gestão empresarial adequados.
Em relação às zonas rurais, apesar da guerra, fez-se um esforço muito grande e houve
avanços assinaláveis em algumas províncias onde o plano foi cumprido ou ultrapassado. De
algumas províncias ainda não é possível dar uma informação completa de todos os distritos. O
trabalho de recolha e processamento da informação prossegue pelo que, oportunamente,
teremos um conhecimento mais completo da situação nesta área.
Foi iniciada a aplicação da Lei dos Cuidados Médicos sendo ainda difícil tirar
conclusões definitivas sobre o seu impacto particularmente no que diz respeito às receitas
cobradas e eventuais variações no fluxo de atendimento cobradas e eventuais variações no
fluxo de atendimento dos doentes. Aparentemente, a nível hospitalar, não houve alteração
significativa no volume de doentes internados.
Não se fez ainda reflectir a desvalorização do metical no preço dos medicamentos para
venda ao público, excepto nas farmácias privadas e da Empresa Estatal FARMAC. Nestas o
consumo sofreu diminuições consideráveis.
Em termos globais podemos dizer, em conclusão, que apesar de não se ter conseguido
cumprir o plano, regista-se um aumento da produção e uma intensificação da actividade
económica no país. Com base no comportamento dos sectores no primeiro semestre, parece
possível vir a alcançar um crescimento semelhante ao do ano anterior, em que o PSG cresceu
em 6 por cento.
Embora haja ainda algumas medidas sectoriais por definir e implementar, a primeira
grande fase de reajustamento e mobilização de recursos foi concluída e estamos agora a entrar
numa outra fase, talvez ainda mais difícil, a de consolidação, que exigirá ainda mais trabalho e
de maior complexidade, em especial na esfera organizativa.
163
Senhores Deputados,
Não posso concluir este balanço de actividade do primeiro semestre sem me referir a
um aspecto central das preocupações do Governo ao longo do primeiro semestre.
É do amplo conhecimento que quando o PRE foi preparado ao longo de l986, não
prevíamos a grande seca que ocorreu no centro do país, nem a escalada de agressão que o
regime do apartheid promoveu, a partir de Outubro passado e através do Malawi, a invasão
maciça de milhares de bandidos armados a várias Províncias do Centro e Norte do País, em
particular nas províncias de Zambézia e Tete.
Toda esta ajuda internacional está a ser canalizada em prioridade para os deslocados da
guerra de agressão e aos afectados pelas calamidades naturais.
164
Estão a ser criados e implementados programas de distribuição de alimentos, aquisição
de meios de transportes, de recuperação de infra-estruturas económicas e sociais e de
reinstalação das populações em novos locais. Nesta acção estão envolvidas praticamente todas
as estruturas do Governo.
Ao mesmo tempo que promovemos o socorro das populações, agimos também para
minorar os dramas familiares, apoiar crianças órfãs ou que não conhecem o paradeiro dos pais.
Famílias cujos bens foram saqueados ou queimados estão também a ser apoiadas a
restabelecerem a produção para a sua auto-suficiência alimentar.
Queremos salientar aqui o enorme esforço que está a ser realizado pelas estruturas do
Governo – na educação, na agricultura, na saúde, na construção e águas, nos transportes, no
comércio, ao nível central, provincial e distrital no cumprimento das orientações do Partido
FRELIMO no contexto do Programa de Emergência. Saudamos, neste âmbito, o papel
importante que está a ser desenvolvido pelas brigadas de voluntários da OMM e da OJM nos
centros de acomodação para assegurar que as populações afectadas estabilizem o mais
rapidamente possível a sua vida e deste modo sejam reintegradas na economia e na sociedade.
A tarefa que temos à nossa frente é complexa. Estamos a enfrentar uma grave situação
de emergência. Esta é uma tarefa que envolve todo o Povo. A nossa acção deve visar estimular
a solidariedade material e moral concreta de todo o povo em apoio aos nossos concidadãos
mais directamente afectados pela acção criminosa dos bandidos armados.
É neste sentido que se torna fundamental, no segundo semestre, reforçar ainda mais as
acções que se realizam no âmbito do Programa de Reabilitação Económica com os esforços no
âmbito da Emergência.
165
Na preparação do Plano de 1988, as acções de Emergência devem constituir uma parte
integrante do Plano quer nos aspectos materiais quer nos aspectos financeiros.
Pretendemos deste modo fazer com que a emergência seja um facto transitório na nossa
sociedade. O nosso objectivo é reduzir ao máximo a dependência da ajuda externa e promover
a auto-suficiência alimentar.
Senhores Deputados,
Como já referimos, os primeiros indícios que nos dá o PEC 87, mostram que estamos
no caminho certo.
Os últimos dez meses e, em particular, os primeiros seis meses deste ano, têm sido um
período de intensa actividade. No plano interno a implementação de medidas duras, até
drásticas, sacudiram muitas das nossas instituições, abalaram muito os nossos hábitos de
“deixar andar” e depender do Estado para resolver tudo.
Em suma, o primeiro semestre deste ano foi caracterizado pela implementação duma
série de medidas de grande alcance. Nos próximos meses a preocupação central do Governo vai
para a consolidação dos resultados já alcançados e para o prosseguimento do trabalho com a
adopção de medidas mais dirigidas e por vezes mais complexas.
Isto vai exigir uma luta permanente não só em termos organizativos, mas também da
nossa própria mentalidade, da nossa atitude e compreensão do papel do Estado e do papel da
empresa.
166
Uma outra componente essencial da organização empresarial é a introdução de
mecanismos eficazes de inspecção e auditoria e é nossa intenção, intensificar e generalizar essa
prática.
Prevê-se a criação duma empresa especializada para esse efeito, com funções não só de
inspecção, como também de apoio às empresas na sua organização contabilística.
Outra grande acção refere-se à redução das despesas públicas. Foi iniciado aquando da
preparação do Orçamento de Estado, um esforço para a redução das despesas públicas correntes
e de investimentos. Tinha sido fixado a redução da despesa em 20 por cento.
- na defesa e segurança;
- nos subsídios;
- nos investimentos;
A questão actual que se coloca perante nós é a utilização da terra, terra que é hoje e será
sempre o nosso principal património. Terra generosa que espera a mão do homem para produzir
a comida de que precisamos. Temos 100 mil hectares de regadio, temos centenas de milhares
de hectares de boa terra de sequeiro desmatada e com algumas infra-estruturas. Em muitos
distritos existem boas terras para culturas tradicionais, mas continuam por cultivar.
Por outro lado, centenas de milhares, senão milhões de moçambicanos não produzem o
suficiente para a sua sobrevivência, dependendo da ajuda alimentar que vem do exterior.
Quando não se produz o suficiente para o autoconsumo então não se pode esperar que
existam também excedentes para a comercialização.
Todo o esforço e sacrifícios serão inúteis se para a próxima campanha agrícola não
mobilizarmos toda a nossa capacidade para organizarmos a produção familiar, cooperativa e
estatal.
167
Temos de distribuir a terra a quem a queira trabalhar e atribuir aos produtores o que
temos, em instrumentos de produção e sementes.
Este esforço de utilização da terra tem de ser realizado utilizando medidas económicas,
medidas de estímulo material e em estreita coordenação com a Defesa, defender todos os
centros de trabalho para produzirmos em segurança.
Senhores Deputados.
Neste sentido, ao longo do segundo semestre vai ser necessário um esforço adicional
para se garantir uma melhoria na execução do Programa de Reabilitação Económica em
algumas áreas.
a) Na política salarial
Competirá, no entanto, às Direcções das empresas darem uma atenção mais adequada às
questões salariais com vista à implementação da legislação já aprovada.
168
Até aos finais do ano, deverá estar em funcionamento o Fundo de Fomento Hidráulico e
a Caixa de Crédito Agrícola, instituições que devem estar especialmente vocacionadas, para o
apoio e concessão de crédito para o sector agrário, em condições favoráveis.
c) A nível do comércio
Na reconstrução da rede comercial rural deverá dar-se início até ao fim do ano ao
processo de venda das lojas no campo em cumprimento do que foi já decidido por esta
Assembleia. Esta acção deverá merecer uma atenção especial por parte dos Ministérios de
Construção e Águas e do Comércio nos próximos meses.
Está em estudo a melhoria dos sistemas de afectação das poucas divisas disponíveis de
forma a que elas possam cada vez mais ser canalizadas para os sectores prioritários definidos
em função da sua contribuição do produto social e da capacidade de utilização eficaz das
divisas. Não podemos continuar a alimentar em divisas sectores ou empresas que não as
utilizam correctamente enquanto outros sectores ou empresas as podem utilizar e não dispõem
de meios suficientes.
d) Na política habitacional
Senhores Deputados
Não gostaria de concluir sem tecer algumas considerações finais sobre os problemas
fundamentais que vamos enfrentar e as responsabilidades que nos cabem, como cidadãos, para
os solucionar.
Mas, travado numa direcção, o especulador, o candongueiro vai sempre procurar outros
caminhos para aumentar a sua riqueza à custa do povo, enquanto que pessoas honestas que
vivem do fruto do seu trabalho, sentem na sua vida diária as dificuldades dum programa de
austeridade como o nosso.
Assim, tende a crescer sobre os nossos quadros as pressões de pessoas sem escrúpulos
que procuram influenciar decisões a seu favor. Os métodos vão de simples prendas em troca de
favores, ou suborno em grande escala para garantir uma certa “protecção das estruturas”, até
redes organizadas de fraude e roubo.
Na luta contra estas manifestações, devemos cerrar fileiras e mantermos uma frente
unida contra essa tentativa de minar a nossa revolução. Devemos todos participar na luta sem
tréguas para impedir a degradação da ética social fornecendo todo o apoio necessário às forças
policiais e ao Ministério Público no cumprimento da sua difícil tarefa.
169
Importa ainda termos consciência de que, devido a devastação do nosso País provocada
pela África do Sul, agravada ainda mais por uma longa seca, temos hoje quase metade da nossa
população com fome ou deslocada das suas terras e, Moçambique, neste momento, é
considerado o País mais pobre do mundo.
Em várias ocasiões, este ano, tivemos que recorrer à comunidade internacional para
pedir apoio diverso, nomeadamente, para o reescalonamento da dívida, para a emergência, para
novos créditos.
E tivemos sucessos notáveis. Hoje a população, incluindo nós próprios aqui, estaríamos
a passar mais carências se não fosse a comida importada, a maior parte oferecida gratuitamente.
Esta situação não nos deve deixar tranquilos, pois que viver de caridade não é nada
confortável.
Finalmente, gostaria de saudar os grandes esforços que estão sendo empreendidos pelas
forças armadas na defesa da nossa soberania e economia.
Muito obrigado
A Luta Continua!
170
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