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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ – UEM

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO – PPA

Disciplina: Epistemologia da Administração


Prof. Dr. João Marcelo Crubellate
Aluna: Franciele do Prado Daciê

O ESTRUTURALISMO: fundamentos, contribuições e abordagens

Como compreender a forma de pensar, os comportamentos e relações, as culturas e o


modo de viver? A sociedade desenvolveu-se historicamente pela ação do homem ou houve
outras estruturas que podem explicar hábitos? O estruturalismo, corrente de pensamento
intelectual que atingiu seu apogeu na segunda metade da década de 1960, depreende a realidade
social a partir de um conjunto elementar de relações e opera a fim de descobrir estruturas que
sustentam as ações, pensamentos, percepções e sentimentos humanos. Assim, os fenômenos da
vida humana seriam inteligíveis por meio de suas interrelações – a estrutura das coisas, e das
variações locais dos fenômenos superficiais (Schultz & Fried, 1992). Nessa perspectiva, esse
ensaio tem como objetivo apresentar os fundamentos, contribuições e abordagens do emprego
do estruturalismo na análise de fatos.
O estruturalismo, sob o ponto de vista epistemológico, consiste na análise da realidade
por meio de modelos, chamados estruturas. Esses modelos, por sua vez, são elementos
abstratos, um todo formado de fenômenos solidários, que atuam por meio de relações,
permitindo que os fenômenos explicados sejam observados de forma conexa, dinâmica e
ordenada. A realidade em análise torna-se inequívoca quando integrada no sistema, na estrutura
da qual faz parte e onde tem um lugar definido; e sua base cognitiva, a dedução, atua a partir
de um sistema filosófico que clássica e avalia os fatos a posteriori (Garvin, 1955). Assim, não
opera como um método exclusivo e único, como visto pelo empirismo – que avalia a realidade
a partir de fatos isolados, mas considera o novo como uma oportunidade de mudança para a
ciência, uma vez que a alteração de um elemento implica no reajuste da posição dos demais. A
sustentação dos estruturalistas é a abordagem metodológica adotada, que expõe estruturas não
aparentes, ocultas sob o que é manifesto e intencional.
Nesse modelo de explicação, as percepções e os pensamentos não são naturais, mas
construídos ao longo do desenvolvimento das sociedades (Bonomi, 1973). Originalmente, o
termo vinculava-se ao estudo da linguística geral, na qual era vista como um sistema em que
existiam elementos relacionados, de modo equivalente ou de oposição, a outros elementos (em
destaque pelo trabalho de Ferdinand de Saussure, 1916). Marcado por filósofos como Ferdinand
de Saussure, Radecliffe-Brow, Claude Lévi-Strauss, Max Weber e Karl Marx, a análise foi, ao
longo do tempo, ampliada também para a cultura, a filosofia da matemática e a sociedade. Nas
ciências sociais as tradições estruturalistas são organizadas em quatro grandes grupos, o
estruturalismo abstrato, o estruturalismo concreto, o estruturalismo fenomenológico e o
estruturalismo dialético (Freund, 1968; Viet, 1967).
No primeiro deles, representado por Lévi-Strauss, a estrutura não se relaciona com o
empírico, mas com modelos baseados nele. O estruturalismo concreto, marcado por Radecliffe-
Brow e Gurvitch, entende a estrutura como uma definição de objeto, de modo que o conjunto
de relações sociais constitui a estrutura de análise. O terceiro grupo, o estruturalismo
fenomenológico, corrente de Raymond Aron e Max Weber, emprega a atitude de voltar ao
mundo antes que ele seja submetido à determinação da ciência, compreendendo o significado
das intenções do outro a partir de condutas. Nele a estrutura é um conjunto que tem um sentido
– se se constitui, altera e organiza – e atua como um ponto de apoio (Freund, 1968). Por fim, o
último grupo segue a linha de pensamento de Karl Max, que defende um esforço dialético no
qual usa a análise para a descoberta das partes, e a diferença entre elas leva-as a integração/a
totalidade. Uma vez adquirida a autonomia, as partes relacionam-se de forma recíproca,
restaurando o todo (Viet, 1967).
De modo geral, o estruturalismo explora as interrelações (estruturas) – as relações
subjacentes aos elementos – que reproduzem o significado de uma cultura, das relações em
família, da mitologia, da sociedade, etc. (Levi-Strauss, 1993). Busca-se o modus operandi dos
objetos analisados, no qual os elementos universais da atividade são entendidos como partes
irredutíveis e suspensas em relação ao tempo, que perpassam todo o modo de pensar dos seres
humanos (Levi-Strauss, 1962). Sua concepção leva a ideia de que todo pensamento humano
opera através de pares de oposição (Levi-Strauss, 1978). As influências da dialética e da
fenomenologia sobre esse pensamento epistemológico estimula respostas para pesquisas de
campo, a fim de conciliar teoria e prática, realizar uma ponte entre lógico e empírico, de modo
que atenda a diversidade e não se torne uma simples descrição do empírico imediato (um
instrumento deduzido) (Levi-Strauss, 1971).
A distinção do estruturalismo de outras correntes epistemológicas consiste no
tratamento dos objetos de análise enquanto posições em sistemas estruturados e não como
elementos independentes de uma estrutura. Além disso, no estruturalismo, sistema e estrutura
são divergentes; o primeiro deles envolve o conjunto de entidades interdependentes que operam
juntas e de forma harmônica; enquanto o segundo envolve um conjunto de relações, concretas
ou abstratas, que nem sempre apresentam funcionalidade (Caws, 1974). Nesse sentido, esse
pensamento epistemológico explora o conjunto de relações, o determinante na explicação dos
objetos psicossociais, fato que o diferencia de outras correntes de pensamento, como o
positivismo lógico e a fenomenologia, que se concentram no funcionamento das coisas (o
sistema).
Convém ressaltar que esse posicionamento epistemológico não nega condições
históricas dos fatos, mas se opõe a estudá-los isoladamente, ou seja, vai de encontro a noção
filosófica do historicismo – que desconsidera as diversidades no espaço e descontinuidades no
tempo, empregando uma única categoria de compreensão (Levi-Strauss, 1958). Em sua defesa,
o estruturalismo considera a existência de causas e relações causais, mas desacredita na
reconstrução da história dos fenômenos sociais, ou ainda, que tais relações sejam determinantes
na compreensão do mundo.
Não existem, portanto, elementos principais/determinantes e o propósito de análise não
revela a origem nem o modo como as estruturas operam, mas em quais condições elas existem,
uma vez que os fenômenos são analisados por meio de sistemas de relações. Assim, o protocolo
epistemológico para sua aplicação consiste em examinar as condições que tornam possível à
estrutura passar de um estado a outro, ordenando elementos em uma perspectiva unificante,
identificando relações, propriedades, estados e transformações pelas quais elas podem passar.
Seu objetivo não se limita a decomposição de elementos, mas compreensão de sua totalidade.
As contribuições do estruturalismo no pensamento sociológico voltam-se à percepção
de que o comportamento das estruturas é reflexo das ações – ignorando o exame particular dos
objetos de análise. As ações são formatadas pelo ambiente e por suas estruturas subjacentes,
formadas por elementos intrínsecos e traços inerentes ao comportamento, que buscam constituir
modelos arquetípicos das organizações e das formas de organizar (Levi-Strauss, 1971). Assim,
o emprego estruturalismo permite avanços em relação ao empiricismo, pois supera uma
descrição direta do sensível; a fenomenologia, ao ir além do vivido; e ao historicismo, ao
expandir o conceito de gênese. Se distingue, então, pela análise racional da estrutura (Viet,
1973).
Diante dos problemas que emergem nas ciências de gestão, como na área da
Administração, o estruturalismo promove meios para análise social a partir da construção de
modelos que exploram as relações entre elementos, como as trocas econômicas, os laços sociais,
os sistemas de aproximação e distinção. A perspectiva da interrelação defende a existência de
sistemas implícitos que atuariam, então, de forma conjunta aos elementos observáveis,
fortalecendo a análise estrutural. Os temas seminais recorrentes de aplicação do estruturalismo
se relacionam a dependência de recursos, a gestão de ativos e aos custos das transações. No
entanto, os avanços do século XXI promoveram superações epistemológicas em relação essa
perspectiva, que passou a explorar questões como cultura organizacional, desempenho e
racionalidade, e produtividade e trabalho (Lounsbury & Ventresca, 2003).
As abordagens mais recentes da teoria das organizações procuram unir o estruturalismo
fenomenológico e o dialético, sintetizando as escolas de administração científica (de Taylor e
Fayol) e as relações humanas (de Mayo, embora com algumas críticas). O trabalho de Etzioni
(1965), estimulou, por exemplo, esforços para a análise de poder (superiores versus
empregados) quanto aos seus tipos, sua distribuição e seu efeito na motivação. Já Walker &
Guest (1962), incentivou a ampliação da quantidade de variáveis nos estudos de relações
humanas, que costumeiramente fracassavam devido a incapacidade de promover uma
significação (conclusões a casos aparentemente semelhantes). Assim, a análise estruturalista
das organizações considera como um sistema em constante relação de intercâmbio com seu
ambiente, explorando estruturas subjacentes da organização formal e informal nos diversos
campos (empresas, escolas, hospitais, etc.).

Referências
Caws, P. (1974). Operational, representational, & explanatory models. American
Anthropologist, 76 (1).
Etzioni, A. (1965). Political Unification. Nova Iorque, Holt, Rinehart and Winston Inc.
Freund, J. (1968) Sociologie de Max Weber. Paris, Presses Universitaires de France. p. 53.
Garvin, P. L. (1955). A Prague school reader on esthetics, literary structure, and style. Front
Cover, Washington Linguistic Club.
Lévi-Strauss, C. (1958) Antropologia Estrutural, Antropologia Estrutural. Paris, Libraire Plon.
Lévi-Strauss, C. (1962). La pensée sauvage. Librairie Plon.
Lévi-Strauss, C. (1971). Entrevista de L'Express, 15 de março de 1971. Les entretiens de
L´Express. L'Express, 1983.
Lévi-Strauss, C. (1978). Myth and Meaning. University of Toronto Press.
Lévi-Strauss, C. (1993). Antropologia Estrutural Dois. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro.
Schultz, W., & Fried, L. L. B. (1992). Jacques Derrida: An Annotated Primary and Secondary
Bibliography. New York, NY, Routledge Revivals.
Lounsbury, M., & Ventresca, M. (2003). The new structuralism in organizational theory.
Organization, 10 (3), 457-480.
Saussure, F. (1916). Cours de linguistique générale. Edited by Charles Bally & Albert
Sechehaye.
Viet, J. (1967). Los métodos estructuralistas en las ciencias sociales. Buenos Aires: Amorrurtu
Editores.
Walker, C. R., & Guest, R. H. (1962). The Man on the Assembly Line. Cambridge, Harvard
University Press, 1962. C. R. Walker & R. H. Guest. The Man on the Assembly Line.
Cambridge, Harvard University Press.

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