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Fichamento

Scott, W. R. (2008). Institutions and organizations (3a ed.). Thousand Oaks, CA: Sage
Publications.

A ascensão da teoria institucional no estudo das organizações, conforme Willian


Richard Scott é um desdobramento da revolução teórica iniciada em meados da década
de 1960, quando os conceitos de organizações como sistemas abertos foram
introduzidos. Nesse sentido, primeiramente, a organização passou a ser vista como um
sistema inserido em um contexto ou ambiente amplo com o qual se relaciona.
Primeiramente, foi discutida a relação com o ambiente técnico, no qual a
organização realiza trocas de recursos e informações relacionadas a tarefas.
Posteriormente, em meados da década de 1970, pesquisadores passaram a reconhecer os
efeitos das forças sociais e culturais nas organizações, caracterizando o ambiente
institucional.
Nesse sentido, o autor afirma que as organizações passaram a ser vistas como
mais do que sistemas produtivos: elas são sistemas culturais pelos quais diferentes
práticas, rotinas e comportamentos institucionalizados que influenciam em sua dinâmica
cotidiana.
No entanto, é necessário considerar que existem diferentes significados para o
termo instituição, de modo que Scott procura explorar essa diversidade apresentando
diferentes abordagens e discussões que remetem desde o século XIX até perspectivas
contemporâneas. Além disso, o autor procura desenvolver um framework de pesquisa
que auxiliará pesquisadores a entender as diferentes possibilidades do estudo dos
fenômenos sociais a partir do institucionalismo.

CAPÍTULO 1 - Primeiros institucionalistas

No primeiro capítulo, é apresentado um panorama histórico da teoria


institucional do final do século XIX até meados do século XX, destacando as correntes
teóricas desenvolvidas em três campos de estudo: Economia, Teoria Política e
Sociologia.

Teoria institucional na economia


Os institucionalistas da Economia estavam primeiramente interessados em
desenvolver críticas aos pressupostos clássicos da economia de estabelecer leis gerais
para seus fenômenos, muitas vezes desconsiderando aspectos históricos e padrões
sociais. Nomes clássicos desse período foram: Thorsntein Veblen, John Commons e
Westley Mitchell.
Para Veblen, o comportamento humano não seria um simples cálculo de
prazeres e dor (a concepção hedonística do homem), mas sim um fenômeno também
influenciado por hábitos e costumes, ou seja, instituições; tidas como “hábitos
estabelecidos de pensamento comuns à maior parte dos homens”. “São regras de
conduta que definem limites dentro dos quais indivíduos e firmas podem perseguir seus
objetivos” (Scott, 2008: 3). As instituições moldam as transações que são
indeterminadas (não atendem ao equilíbrio perfeito) e mudam ao longo do tempo, de
modo que também cabe à Economia atender à mudança.
Ao contrário da noção da escolha racional e utilitária, a preferência dos
indivíduos nas trocas é moldada pelas instituições sociais, que deveriam ser objeto de
análise. Contudo, os primeiros economistas institucionalistas não prevaleceram (apesar
de nomes do Schumpeter e Polanyi terem utilizado alguns desses conceitos), justamente
pela carência de uma teoria robusta para apoiar suas descrições, sendo aprimorada
somente na década de 1970 pela “nova economia institucional”.

Teoria institucional na Ciência Política


A teoria institucional na ciência política, sobretudo nos EUA, teve como nomes
principais J. W. Burgess, Woodrow Wilson e W.W. Willoughby. Suas bases estavam
nas leis constitucionais e na filosofia moral. Assim, a teoria institucional desenvolvida
nesse ambiente preocupava-se essencialmente com estruturas formais e sistemas legais
tais como órgãos do governo, parlamentos, constituições, cortes, etc. Além disso, eram
investigadas as configurações de sistemas políticos particulares (regras, direitos e
procedimentos) e seus princípios normativos.
Essa abordagem estava interessada principalmente em estudar a origem das
instituições mas não sua mudança. Essa ciência tratava essencialmente de apresentar
uma configuração histórica
Contudo, apesar de muitos estudos de sistemas políticas abstratos derivados de
princípios filosóficos, os institucionalistas procuravam entender o mundo real
(sobretudo pela influencia positivista), de modo que o conceito de instituição estava
relacionado a fatos construídos por instituições políticas formais (leis, gabinetes,
cargos).
Adiante, com o advendo da perspectiva comportamentalista (invidualismo
metodologóco, public choice, utilitarismo) na ciência política, essa noção de
institucionalismo foi perdendo força. Movimentos de reação a essa outra onda surgiram
durante a década de 1970, quando o novo-institucionalismo emergiu como uma
possibilidade de integração (não oposição) entre a perspectiva micro e macro no estudo
da política, reestabelecendo a importância de sistemas de regras e estruturas normativas
que constrangem e empoderam a o comportamento social e político.

Institucionalismo na sociologia
As instituições tem sido tem recorrente na sociologia desde os primórdios do
campo. Assim, Scott apresenta uma digressão desse pensamento ao longo de diferentes
escolas.
Primeiramente, Herbert Spencer (1876) via a sociedade como um sistema
orgânico envolvido pelo tempo. A adaptação a esse sistema acontecia por meio de
“órgãos” estruturados como subsistemas institucionais, num movimento evolucionário
(aatividades individuais, costumes e instituições completamente desenvolvidas). Nessa
mesma direção, Summer (1906) entendia uma instituição como: um conceito (ideia,
noção, doutrina, interesse), que define os propósitos e funções da instituição; e uma
estrutura”, ou seja, os instrumentos que envolvem o conceito e possibilitam que o
mesmo seja colocado em ação. Esse conceito é base da noção de instituição como
arenas funcionais especializadas (campos, setores). As esferas sociais são constrangidas
por diferentes instituições.
Adiante, Scott trata das contribuições de Cooley, que enfatizava a
interdependência de indivíduos e instituições, ou seja, a noção de que o indivíduo é
sempre causa e efeito da instituição (e.g. linguagem, Estado, igreja, leis, propriedade).
Da mesma forma Hughes (1936) defendia ideia semelhante (instituições são o
estabelecimento de tipos sociais de permanência e distinções relativas; conjunto de
costumes ou regras formais que podem ser preenchidas por pessoas agindo
coletivamente). Essa perspectiva pressupõe que embora instituições representam
continuidade e persistência, estas só existem na medida em que são reproduzidas
por indivíduos de forma integrada (coletiva) e padronizada. Conforme Hughes,
instituições interagem com indivíduos “criando identidades, moldando o curso da vida
(carreiras), provendo uma licença para praticar tarefas proibidas e uma racionalidade
para lidar com erros inevitáveis que ocorrem quando se desempenha um trabalho
complexo” (Scott, 2008: 10).
Por fim, Scott apresenta as contribuições ao pensamento institucionalista de
autores clássicos da sociologia como Marx (a construção social da realidade a partir do
materialismo histórico), Durkheim (fatos sociais são cristalizados como instituições),
Weber (sistemas de regras culturais), Parsons, Mead, Schultz (dimensão simbólica das
instituições), Bourdieu e Berger e Luckmann (a construção social da realidade e a
impotância dos sistemas cognitivos na leitura de sistemas simbólicos).

CAPÍTULO 2 - A teoria institucional se encontra com a teoria organizacional

No segundo capítulo, Scott procura desenvolver a trajetória da teoria


institucional no campo dos estudos organizacionais.
As organizações passaram a ser foco de pesquisadores institucionalistas apenas
recentemente na teoria social. Contudo, existiram diferentes pesquisadores que
abordaram os temas ao longo da evolução dos estudos organizacionais, principalmente
após a publicação dos escritos seminais de Weber sobre a burocracia. Scott apresenta,
então as discussões desses autores.

Abordagens pioneiras em instituições e organizações


As primeiras discussões em torno da influência das instituições no cotidiano das
organizações iniciaram-se na universidade de Columbia, tendo como principais modelos
os estudos desenvolvidos por Robert Merton e Selznick na década de 1940. A partir dos
estudos de Merton sobre as forças da burocracia em produzir disciplina e ordem nas
organizações (a partir de regras institucionalizadas), Selznick desenvolveu suas
contribuições, tornando-se o principal pesquisador no âmbito do institucionalismo
organizacional.
Para Selznick, a institucionalização é um processo que acontece ao longo do
tempo na organização, no qual as características dos atores envolvidos, suas crenças,
práticas e costumes são incorporados às atividades e passam a representar e refletir na
própria organização (os valores da organização são institucionalizados de modo que a
própria organização torna-se uma instituição). Contudo, as organizações, quanto mais
precisos forem seus objetivos e tecnologias, menor está sujeita à institucionalização.
Nessa direção, as organizações em Selznick não são organismos racionais, mas
sim estruturas marcadas por valores incorporados a partir de práticas e praticantes,
muitos deles institucionalizados de forma escusa, diferindo de objetivos oficiais. Mais a
frente, um aluno de Selznick, Stichcombe, argumenta que a manutenção dos valores e
interesses institucionalizados somente acontece devido ao poder dos indivíduos
interessados. Power-holders retain and regenerate the same instituitions.
Outra referência dos primeiros institucionalistas no estudo das organizações foi
Talcott Parsons. Parsons estudava, a partir do modelo de instituição-cultural, como
sistemas de valores são legitimados nas organizações devido a suas conexões com
padrões institucionais principais em diferentes contextos (sistemas de normas que
definem de forma objetiva como as organizações e indivíduos devem se portar). Esses
sistemas (muitas vezes inseridos em um nível societal) são o que legitima a existência
de determinas organizações e suas práticas e ações. Instituições são sistemas normativos
de regras. Além disso, Parsons ainda argumenta que a organização tende a se tornar
diversificada verticalmente a partir de três dimensões: técnica, gerencial e institucional.
Por fim, no escopo dos primeiros institucionalistas a estudar as organizações,
Scott destaca a Carnegie School, cujas principais referências foram Herbert Simon e
March, que questionavam as pressuposições de racionalidade dos indivíduos nas
organizações. Para os autores, a razão e a ação do sujeito é constrangida por normas e
regras (programas de performance) que reduzem sua agência, ou seja, o comportamento
na organização está estritamente relacionado às estruturas (normas, práticas rotinizadas,
procedimentos, etc), ou instituições, que a permeia.
Em suma, a primeira geração de pesquisadores sobre instituições e organizações
procuravam descrever e entender a influência das instituições no desempenho e na
atividade organizacional. Como processos de incorporação de valores ou sistemas
normativos legitimam/constrangem a organização.

Bases da teoria neoinstitucional


Na sequência, Scott procura avançar no desenvolvimento histórico da teoria
institucional no âmbito das organizações, destacando o movimento denominado
neoinstitucionalismo e suas implicações teórico-empíricas. Scott ressalta que apesar do
nome, esse movimento não representou uma ruptura com os autores anteriores, mas sim
o acréscimo de novas ênfases e insights. Assim, o autor apresenta as principais ideias da
perspectiva nos campos da Economia, Ciência Política e Sociologia.

Economia
No âmbito da Economia, o neoinstitucionalismo se preocupou essencialmente
em desenvolver uma teoria econômica sobre as instituições. Nesse sentido, as
discussões se voltaram para: uma nova concepção do “agente econômico”,
incorporando as contribuições de Simon quanto a racionalidade limitada e racionalidade
procedimental (economia libertária austríaca); o foco no estudo de processos
econômicos ao invés do estudo dos estados de equilíbrio, reconhecendo a dinamicidade
da economia e o aprendizado dos agentes no mercado e; a noção de que a atividade
econômica não é apenas uma questão de trocas mediadas no mercado, mas é
influenciada por outros tipos de estruturas institucionais tais como o Estado, etc.
Nessa abordagem, as instituições não são mais vistas como variáveis exógenas
que afetam o comportamento econômico, mas há a preocupação em entender como as
instituições influenciam na criação, manutenção e transformação de transações
econômicas.
As principais correntes de estudo dessa abordagem são: a economia dos custos
de transação (Coase, Williamson) e; a economia evolucionária (Nelson e Winter).

Ciência Política
Como afirmado anteriormente, o neoinstitucionalismo político emergiu como
uma reação aos estudos com foco comportamentalista que dominaram a ciência política
em meados do século XX. Nesse sentido, dois movimentos se destacaram: o
institucionalismo histórico e a teoria da escolha racional.
O institucionalismo histórico (March e Olsen; Katzenstein; etc.) entende as
instituições como “estruturas formais, regras informais e procedimentos que
estruturam a conduta” (Thelen & Steinmo, 1992: 2 apud Scott, 2008: 31). Um dos
principais focos de estudo são as estruturas do Estado e o modo estas moldam o
comportamento e os interesses dos atores políticos, bem como estruturam o conflito por
meio da distribuição de poder aos atores. Estes pesquisadores adoram uma postura
sócio-construcionista ao defenderem que as ações e a natureza dos indivíduos não
devem ser analisadas de forma isolada de seu contexto institucional mais amplo. As
instituições constroem os atores e definem seus modos de ação, constrangindo seu
comportamento ao mesmo em que os tornam capazes de agir. O foco dos pesquisadores
está essencialmente na reconstrução histórica das instituições que estruturam a arena
política. Além disso, reconhecem os interesses dos atores nesse espaços e a
possibilidade de mudança institucional.
Por sua vez, a teoria escolha racional (Moe, Sheplse e Weingast) vê as
instituições como sistemas de governança ou regras estabelecidos por indivíduos que
estão procurando promover ou proteger seus interesses, estando próxima da teoria dos
custos de transação e teoria da agência, de modo que entendem eleitores e consumidores
como agentes de comportamento semelhante. O foco é o estudo de como as instituições
afetam a escolha dos indivíduos. As instituições resolvem problemas e facilitam ganhos
nas trocas.

Sociologia
O neoinstitucionalismo na sociologia procurou discutir a influência de aspectos
cognitivos e culturais na construção de instituições, tomando como raízes teóricas
estudos de campos como Psicologia, Antropologia e Fenomenologia/Etnometodologia.
Na Psicologia, a principal contribuição está na teoria cognitiva, que vem
argumentar a capacidade reflexiva do indivíduo, apesar do mesmo estar inserido em um
contexto social e ser permeado por limitações cognitivas. Ou seja, os indivíduos
participam e percebem suas atividades, construindo sentidos e interpretando o mundo
que o cerca (desenvolvimentos mais recentes da teoria social vem articular melhor isso
como a Teoria da Estruturação).
Por sua vez, a teoria cultural, que toma como base a Antropologia, tem
contribuído para os neoinstitucionalistas na medida em que entende a cultura como um
sistema de significados produzidos pelos homens e transmitidos de diferentes formas
nas relações sociais. Assim, passam a reconhecer a importância dos sistemas simbólicos
no ordenamento da vida social. Entretanto, diversos estudiosos da cultura tem
considerado os aspectos cognitivos do indivíduo e seu caráter afetivo/emocional na
produção desses sistemas simbólicos. Essa noção permite entender a cultura como um
fenômeno dinâmico, que pode sofrer alterações. A cultura pode permitir a mudança
produzindo repertórios pelos quais os atores selecionam diferentes peças para a
construção de linhas de ação (Swidler, 1986).
Classificação cognitiva da cultura. Os genes não fixam a ação do homem. Pelo
contrário, eles são dispositivos para se extrair informação do ambiente. O padrão de
genes muda o tempo todo em nosso cérebro, frequentemente como respostas a eventos
externos. Genes são mecanismos de experiência (Ridley, 2003).
Finalmente, outra base do neoinstitucionalismo sociológico é o pensamento
fenomenológico e etnometodológico e o estudo em profundidade dos significados
associados aos símbolos. Dessa forma, tais pesquisadores se distanciaram do foco nas
normas e valores compartilhados na sociedade (Durkheim e Parsons) para o
conhecimento compartilhado e os sistemas de crenças (Berger, Schutz). Conforme
Scott afirma, a atenção em estruturas cognitivas e culturais, ao invés de sistemas
normativos, é uma das maiores distinções do neoinstitucionalismo sociológico.
Além disso, as crenças não são apenas subjetivas, na verdade elas passam a ser
observáveis em estruturas sociais objetivadas (artefatos, rituais, etc.) por meio da
externalização, objetivação e internalização, processo definido por Berger e Luckmann
como institucionalização. Procurar definição de Berger e Luckmann.
A etnometodologia proposta por Garfinkel tem auxiliado na investigação de
como indivíduos constroem sentido (make sense) das situações que confrontam. Como
constroem coletivamente as regras e procedimentos utilizados para cooperar uns com os
outros.
Essas bases de conhecimento contribuíram para a construção de uma teoria
institucional, que a partir da década de 1970, passou a ingressar de forma mais
substantiv(a nos estudos organizacionais.
Uma das primeiras tentativas de introduzir argumentos neoinstitucionais no
estudo das organizações foi por Silverman que propôs uma teoria da ação da
organização, na qual argumentava que a ação humana é influenciada pelos significados
que os mesmos constroem e estão inseridos em instituições sociais. As organizações
seriam fontes de significados para os indivíduos. Contudo, Silverman não obteve tanta
entrada.
Outros autores foram melhor sucedidos na aceitação por parte dos estudos
organizações sobre a influência das instituições, de forma específica os trabalhos de
John Meyer e Brian Rowan (1977) e Zucker (1977), que se apoiam em disposições de
Durkheim e Berger e Luckmann.
Para Meyer e Rowan, instituições são regras culturais complexas, de modo que
as organizações são o resultado da racionalização de muitas dessas regras por meio do
desenho de procedimentos (baseados nas regras) voltados a atingir objetivos. Enquanto
Meyer e Rowan apresentaram uma noção macro das instituições, Lynne Zucker
enfatizou as microfunções das instituições a partir do poder de crenças cognitivas na
construção do comportamento (o conhecimento, quando institucionalizado, pode ser
transmitivo).
Outros desenvolvimentos importantes foram os trabalhos de DiMaggio e Powell
(1983) e Meyer e Scott (1983), com ênfase na perspectiva (ambiental) que viria a ser a
principal linha de estudos do institucionalismo sociológico. Para DiMaggio e Powell, as
instituições exercem sua influencia em um campo por meio de três tipos de
mecanismos: coercitivo, mimético e normativo, de modo que a competição tende a
promover o isomorfismo estrutural nas organizações. Por sua vez, Meyer e Scott
afirmavam que as organizações dispõem tanto de forças técnicas quanto institucionais.
Todos esses autores trabalharam a noção de campo, ou setor, no qual os efeitos e
influências das instituições ocorrem e podem ser investigados. Tais pesquisadores,
apesar de solidificarem o campo de estudo, tem recebido críticas de diferentes naturezas
em desenvolvimentos recentes do institucionalismo.

CAPÍTULO 3 – Construindo um framework analítico (parte 1) – Os três pilares das


instituições

Neste capítulo, Scott procura apresentar uma perspectiva analítica para o estudo
das instituições e seus efeitos nas organizações por meio de uma integração de conceitos
das perspectivas apresentadas anteriormente.
Assim, Scott apresenta inicialmente seu conceito de instituições:

Instituições são constituídas por elementos reguladores [regras],


normativos [normas] e cognitivos-culturais [sistemas de crenças] que,
juntamente com atividades associadas e recursos, proveem estabilidade e
significado à vida social (Scott, 2008: 48).

Em outras palavras, são “estruturas sociais multifacetadas e duráveis construídas


por meio de elementos simbólicos, atividades sociais e recursos materiais” (Scott, 2008:
48). Estruturas sociais plurais, relativamente duráveis e constituídas por símbolos,
práticas e materialidade.
Algumas das características das instituições: são relativamente resistentes a
mudanças (Jepperson, 1991); tendem a ser transmitidas entre gerações para serem
mantidas e reproduzidas (Zucker, 1977). São as características mais duradouras da vida
social, ou seja, garantem solidez a sistemas sociais (Giddens, 1984).
“A perspectiva institucional dá atenção destacada aos aspectos simbólicos
da vida social, contudo, é preciso se preocupar com as atividades [práticas] que as
[re]produzem e os recursos que a sustentam” (Scott, 2008: 49).
Ou seja, como Scott afirma, não é possível estudar as instituições sem considerar
as práticas, o comportamento dos indivíduos e os recursos materiais, por meio dos quais
estas são performatizadas e exercem sua influência. Seria um erro não se preocupar com
a dimensão da materialidade e da ação social, ou da prática, uma vez que é por meio
desta que as instituições se articulam.
As instituições, apesar de proverem estabilidade à vida social, também estão
sujeitas a mudanças (seja ela revolucionária ou incremental) e, portanto, não devem ser
estudadas como uma propriedade, mas como um processo (que inclui a
institucionalização e a desinstitucionalização). Além disso, estas atuam em diferentes
níveis, desde societal até o interpessoal.

Os três pilares das instituições


Aqui, Scott discorre sobre os três pilares que são a base de sua teoria
institucional, os sistemas: reguladores, normativos e culturais-cognitivos. Esses
sistemas, quando articulados, fornecem um movimento contínuo do externo/objetivado
para o subjetivo, “do consciente para o inconsciente, do legalmente aplicado ao dado
como certo taken for granted” (Hoffman, 1997).
É importante ressaltar que as instituições podem ser suportadas por diferentes
pilares (e.g. as leis são instituições não estão baseadas apenas no pilar regulador, mas
envolvem as dimensões normativa e cultural-cognitiva).

Três pilares das instituições


Regulador Normativo Cultural-cognitivo
Base de Conveniência Obrigação social Taken for granted,
conformidade entendimento compartilhado
Base de ordem Regras reguladoras Expectativas Esquemas constitutivos
vinculadas
Mecanismos Coercitivo Normativo Mimético
Lógica Instrumentalidade Adequação Ortodoxia
Indicadores Regras, Leis e Sanções Credenciamento, Crenças comuns, Lógicas de
Certificação ação compartilhadas,
Isomorfismo
Emoções Medo, culpa / Vergonha / Honra Certeza / Confusão
Inocência
Base de Sancionado legalmente Moralmente Compreensível, Reconhecível,
legitimidade governado Culturalmente amparado
Fonte: Scott (2008)

O pilar regulador
Estudiosos interessados em estudar os aspectos reguladores das instituições
partem da noção de que as instituições constrangem (bem como empoderam) e regulam
o comportamento dos atores sociais. Desse modo, o foco da análise está basicamente
nos processos regulatórios, que envolvem “a capacidade de estabelecer regras,
inspecionar a conformidade de outros indivíduos à essas regras e, se necessário,
manipular sanções – recompensas ou punições – a fim de influenciar o comportamento
futuro” (p. 52). Esses processos podem operar por meio de mecanismos informais tais
como o envergonhamento público ou exclusão (ostracismo) ou mecanismos formais
desempenhados por atores especializados a exemplo da política ou do poder judiciário.
Nesse pilar, é comum a ideia das instituições como regras estabelecidas de um
jogo, sejam elas formais ou informais, de modo que o não cumprimento da regra
acarreta em sanções punitivas, ou seja, têm seu comportamento constrangido pela
coerção. Ressalta-se que essas regras são estabelecidas e reguladas por um conjunto de
atores específicos que possuem autoridade e baseiam sua atividade em uma estrutura
normativa que dá legitimidade às suas ações, ou seja, dá suporte e constrange o
exercício de poder.
O Estado é frequentemente tido como um ator que exerce a função de legislador
(criador de instituições), aplicador e juiz nas relações sociais. Entretanto, essas relações
podem acarretar em uma série de conflitos e disfunções, de modo que aspecto
normativos e cognitivos podem melhor explicar a lei do que apenas seu caráter
coercitivo. Ou seja, é importante considerar também os aspectos emocionais das regras
definidas.
Scott argumenta que em certos tipos de ambientes (campos) é necessário a
existência de regras reguladores, como é o caso de espaços em que existe grande
conflito de interesses e competição, como é a política e o mercado, por exemplo. Em
outros setores sociais, a necessidade de regras e da dimensão reguladora coercitiva das
instituições pode não ser necessária.

O pilar normativo
Este pilar tem como ênfase as regras normativas que introduzem uma
dimensão prescritiva, avaliativa e obrigatória na vida social. As instituições, então,
exercem uma força normativa ao atribuírem que determinado comportamento deve ser
realizado conforme uma coletividade o definiu como tal (e espera que seja cumprido).
Sistemas normativos incluem valores (concepções daquilo que é preferido e
desejável pela coletividade, bem como padrões construídos que servem de comparação
na sociedade) e normas (os meios legitimados pelos quais os valores devem ser
alcançados; definem o modo como as coisas deveriam ser feitas). Ou seja, tais sistemas
definem metas e objetivos bem como “desenham” os meios apropriados para alcança-
los (e.g. ao definir que as empresas devem lucrar de forma sustentável, o sistema deve
estabelecer os meios para que esse valor seja alcançado).
Os sistemas normativos também incluem papéis direcionados a certos tipos de
atores sociais que devem desempenhar uma função especifica para atingir certos valores
(inclusive para um “bem comum” da coletividade. Ou seja, o sistema pode atribuir
responsabilidades e normas a um grupo específico ou tipo específico de ator (os cargos
nas organizações atendem a essa configuração).
Nesse pilar normativo, os sistemas de crenças assumem uma dimensão
prescritiva para o comportamento (não é uma previsão), desempenhando ao mesmo
tempo constrangimentos e empoderamento da ação direcionados a certos grupos.
Conferem direitos ao mesmo tempo que responsabilidades.
As normas constroem procedimentos, mas o resultado do não atendimento da
norma, diferente da dimensão reguladora, está associado ao sentimento de não
pertencimento à coletividade ou vergonha, estando fortemente relacionadas a
sentimentos.
O pilar cultural-cognitivo
Esse pilar é influenciado principalmente por antropólogos (Geertz, Douglas),
sociólogos (Berger, Goffman, Meyer) e administradores (DiMaggio, Powell, Scott) e se
preocupa em entender as concepções compartilhadas que constituem a natureza da
realidade social (construcionismo) e as estruturas pelas quais o significado é produzido.
“Os símbolos – palavras, signos e gestos – moldam os significados que
atribuímos aos objetos e atividades” (Scott, 2008: 57). Os indivíduos, conforme Weber,
atribuem significado aos comportamentos. Esses sentidos, são externalizados e
objetivados, de modo que outros indivíduos atribuirão sentidos aos mesmos, num
processo de institucionalização.
As instituições nessa perspectiva são os sistemas simbólicos percebidos como
objetivos e externos aos indivíduos. São uma “cristalização de significados em uma
forma objetiva” (Berger & Kellner, 1981).
Scott chama o pilar de cognitivo-cultural para se referir a essa dualidade, ou seja
“processos interpretativos internos são moldados por estruturas culturais externas” (p.
57). A cultura, nesse caso, seria um “programa mental do software da mente”, embora
ela também seja objetiva em estruturas globais (hinos nacionais, bandeiras, ideologias
políticas, etc.). É importante ressaltar que crenças e sistemas culturais não são “lidos” de
formas iguais pelos indivíduos, de modo que estas podem ser contestadas ao ponto de
serem transformadas (sobretudo em ambientes complexos).
Os sistemas de crenças são muitas vezes seguidos e compartilhados por um
caráter normativo, uma percepção de que as coisas são reificadas, tipificadas, taken for
granted. Os papéis sociais nessa perspectiva são, diferentemente de meios prescritos e
obrigatórios para se atingir objetivos, construções sociais de certos grupos sociais que
são institucionalizadas e transmitidas na sociedade em relações de poder, ou seja, não há
o caráter prescritivo da norma.
No entanto, deve-se considerar a existência de instituições e sistemas culturais
de amplo alcance e que acabam influenciando no desenvolvimento de novas instituições
e crenças.

Os três pilares e a legitimidade


As organizações precisam de aceitação e credibilidade, ou seja, precisam de
credibilidade. Tal credibilidade é entendida como uma percepção generalizada de que as
práticas daquela organização são desejáveis e aceitáveis com base em um sistema
socialmente construído de normas, valores e crenças. Ou seja, a credibilidade é a noção
de que a organização está agindo de acordo com certas estruturas institucionais.
Cada um dos três pilares provê bases para a legitimação, cada de um de uma
maneira específica. A legitimação não é um recurso, mas sim o resultado de uma ação
alinhada a regras e leis relevantes, ou suporte normativo, ou estruturas culturais-
cognitivas. É um valor simbólico.
O nível de legitimidade varia de acordo com o pilar. O primeiro nível de
legitimidade está relacionado à regra (regulador), o segundo à norma, que pode
inclusive ir contra a regra (normativo) e o terceiro a uma produção de sentido inserida
em um sistema cultural objetivado e compartilhado por grupos de indivíduos dotados de
poder (cultural-cognitivo). Essa última é o nível mais profundo de legitimidade.
Assim, é importante destacar que a legitimidade de uma certa prática ou conduta
na organização pode estar alinhada aos três ´pilares das instituições, de modo que a
tendência é que a ação seja bem sucedida e com alta legitimidade. No entanto, é
possível que outras práticas, em outros contextos, estejam alinhadas apenas a um pilar,
ou que um pilar se sobressaia sobre os outros, o que provoca muitas vezes confusão e
gera margem para a mudança institucional.

Pressuposições básicas associadas aos três pilares


Nessa seção, Scott procura apresenta diferentes pressupostos adotados por
pesquisadores com base em suas posições ontológicas.

Regras regulativas e constitutivas


As instituições sociais referem-se ao desenvolvimento coletivo de regras
regulativas e constitutivas. Um fato ou fenômeno só tem sentido dentro de um sistema
de regras constitutivas (Searle).
Scott quer argumentar que existem tanto regras constitutivas (estudadas por
cultutal-cognitivistas) quanto regulativas (defendidas por reguladores), contudo, as
regras constitutivas são as que constroem o sentido e o contexto para a que as regras
regulativas sejam aplicadas.
A teoria institucional que Scott se posiciona está alinhada a uma postura
ontológica construcionista.
Quem defende que o indivíduo possui interesses bem definidos, voltados à
maximização de sua utilidade, geralmente costuma conceituar instituições como
estruturas reguladoras. O conceito de racionalidade é único, e geralmente instrumental,
nessa perspectiva.

CAPÍTULO 4 – Construindo um framework analítico (parte II) – Conteúdo,


agência, transmissores e níveis

Conteúdo institucional e organizações


Conforme Scott, as organizações são criadas, ou emergem, em estruturas
institucionais que preconizam ou possibilitam a racionalização (a constituição do mito
da razão). Ou seja, esse ambiente é marcado pela crença na racionalização das
atividades. A racionalização é um princípio constitutivo desse arranjo institucional.
Por exemplo, para James Coleman, as organizações são atores coletivos
significantes acordados por meio de direitos legais, capacidades e recursos
independentes daqueles assumidos por esses atores individualmente.
Então, Scott argumenta que cabe ao institucionalista assumir uma posição na
investigação das organizações. Aqueles mais orientados à perspectiva política e
econômica vão estudar os aspectos regulativos daquele ambiente ou estrutura (as
condições para a ocorrência de determinado fenômeno social), enquanto aqueles mais
alinhados à perspectiva sociológica vão dar mais ênfase no processo de construção de
tais condições.
Agência e instituições
Scott discute a relação entre a Teoria Institucional e os posicionamentos
epistemológicos que se posicionam nos extremos da relação entre estrutura e ação (ou
entre controle e liberdade). Para o autor, apesar de certos autores da TI darem maior
ênfase nos aspectos estruturais das instituições, descrevendo seus efeitos e pressões no
ambiente institucional, outros autores procuram investigar a interpretação dos
indivíduos quanto a essas pressões e influência, o modo como os atores produzem
sentido sobre o ambiente, posicionando-se no eixo da interpretação humana.
Contudo, desenvolvimentos recentes da teoria institucional têm procurado
incorporar contribuições de correntes teóricas que investigam as duas posições teóricas
desse debate, ou seja, se propõem a superar tais antinomias ou dicotomias.
Dessas influências, Scott cita as contribuições de Anthony Giddens e a teoria da
estruturação, que descreve as estruturas sociais tanto como produtoras quanto produtos
das interações sociais dos indivíduos. Em outras palavras, tais teorias reconhecem tanto
o papel das estruturas quanto da agência humana.
A agência é entendida por Scott (2008) como a “a habilidade de um ator de
produzir algum efeito no mundo social – alterando regras, laços relacionais ou
distribuindo recursos. O ser humano é apto a, mesmo sob pressões estruturais e
institucionais, a agir de forma diferente da esperada, de intervir no mundo ou de resistir
a alguma intervenção, com efeito de alterar um processo específico ou o estado das
coisas (Giddens, 1984). A agência reside nos processos interpretativos.
O indivíduo tem habilidade e recursos para contestar ou reproduzir sistemas de
poder e privilégio. Essa habilidade está relacionada a processos de interpretação do
mesmo, de modo que esse pensamento está alinhado à corrente fenomenológica.
Ou seja, Scott deixa claro que existe a possibilidade de mudança nos arranjos
institucionais. A partir da leitura do contexto institucional, o indivíduo produz um
entendimento, reflete, e decide por agir de acordo com as disposições normativas ou de
forma diferente delas. Quando uma ação é diferente do esperado e tem efeito sob a ação
de outras pessoas, que reconhecem essa ação e a passam a legitima-la, estabilizando-a,
há um movimento de mudança na configuração institucional.
Contudo, a capacidade de agência do indivíduo pode variar a depender do de
estrutura social em que está inserido. Ou seja, a agência também é estruturada
socialmente e institucionalmente (Scott, 2008). Por exemplo, em casos em que
determinada ação é constrangida por um dispositivo coercitivo, a depender da força de
repressão ou coesão social do grupo, há maior dificuldade em propagar aquele tipo de
comportamento, dificultando sua reprodução.

Operadores/Portadores diferentes
As instituições são transmitidas por diferentes tipos de veículos ou portadores.
Scott identifica quatro tipos de portadores: Sistemas simbólicos, sistemas relacionais,
rotinas e artefatos. O conteúdo da mensagem transmitida varia de acordo o operador
Níveis de análise diferentes
Scott discute que a análise institucional pode ser realizada em seis níveis
diferentes: o sistema mundial, a sociedade, o campo organizacional, a população
organizacional, a organização e o subsistema organizacional. Contudo, o nível mais
utilizado é o campo organizacional, conceituado por DiMaggio e Powell (1983) como:

as organizações, que atuando em conjunto, constituem uma área reconhecida


da vida institucional: fornecedores chave, produtores e consumidores de
recursos, agências regulatórias e outras organizações que produzem serviços
ou produtores similares (DiMaggio & Powell, 1983, p. 143, tradução nossa).

O campo organizacional também pode ser reconhecido como setor societal


(Meyer & Scott, 1983). Os campos são preenchidos por estruturas normativas e
cultural-cognitivas compartilhadas por seus membros. Esses membros são constituídos
por organizações de pessoas que interagem frequentemente.
Outro conceito frequentem utilizado é o de população organizacional, entendido
como “o conjunto de organizações que são ‘iguais em algum aspecto’ em particular, ou
‘classes de organizações que são relativamente homogêneas em termos de
vulnerabilidade ambiental’ (Hannah & Freeman, 1977: 166)” (Scott, 2008, p. 86-87).

De acordo com a tipologia dos níveis e dos pilares de análise das instituições
formulada por Scott (2008), a abordagem das lógicas institucionais está posicionada na
perspectiva da sociologia neoinstitucional e toma como pilar de análise os aspectos
culturais-cognitivos das instituições, focando no estudo dos sistemas mundiais, da
sociedade e dos campos organizacionais.

CAPÍTULO 8 – Processos institucionais e campos organizacionais

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