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Pré-projeto de pesquisa de mestrado

Edital 2/2018 PPGP/FE/UFG


Argus Tenório Pinto de Oliveira

Universidade Federal de Goiás


Faculdade de Educação
Programa de Pós-Graduação em Psicologia
Pré-Projeto de Pesquisa
Argus Tenório
Subjetivação, Técnica e Política: o diagrama de Foucault como ferramenta interventiva

I – Delimitação do Tema e Justificativa;

O presente pré-projeto de pesquisa aborda dois grandes temas principais. O primeiro é


o da Produção de Subjetividade ou Subjetivação, isto é, o processo pelo qual nos tornamos o
que estamos sendo. Tema demasiadamente amplo, já que subjetividade é frequente e
genericamente apresentada como o objeto “das psicologias”[ CITATION Ana99 \l 1046 ].

O que será abordado dentro deste grande tema, porém, relaciona-se com a
subjetividade no sentido da produção de sujeitos, e menos no sentido de uma interioridade em
oposição a uma exterioridade objetiva. Trata-se de uma abordagem que considera “fatores”
que são, em sua maioria, objetos de outras disciplinas. Em outras palavras, uma abordagem da
subjetividade que leva em conta aspectos históricos, sociais, econômicos, geográficos,
políticos de uma realidade que apenas artificialmente é divisível em disciplinas.

Com isso, este pré-projeto se alinha desde já com preocupações do campo emergente
da Psicologia Política Latinoamericana (PPL), que nasce a partir da(s) realidade(s) do
continente, em respostas a problemas ético-políticos localizados e com desafios que envolvem
seu próprio desenvolvimento teórico, metodológico e instrumental como campo científico e
profissional, além do desafio de uma efetiva interdisciplinaridade [ CITATION Lac13 \l 1046 ].

Em certa medida, é em resposta a estes desafios que a presente proposta acontece,


compartilhando das críticas da PPL à Psicologia no que concerne a seu reducionismo e
psicologização, mecanicismo, individualismo, a-historicidade, “despolitização”, neutralidade,
assepsia e principalmente na sua contribuição, voluntária ou não, à legitimação dos poderes
constituídos [ CITATION Hur181 \l 1046 ].

Do intento de contribuição para o desenvolvimento do campo, este projeto adquire


uma relevância científica; do esforço para que esta contribuição não sirva às incontáveis
formas de exploração, dominação e assujeitameto, este projeto adquire uma relevância ético-
política. E é basicamente isto que o justifica.
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Este valor científico e ético-político será tanto maior quanto maior for seu potencial de
uso, ou seja, um valor relativo a sua relevância prática. Disso decorre – além do método,
adiante - o segundo grande tema que propõe debater, que é o da Técnica. Um tema aqui
subordinado ao primeiro e que se torna necessário pelo anunciado anseio de contribuição para
o desenvolvimento teórico, metodológico e instrumental do campo. Avanço que se dará, mais
especificamente, pela proposta de uma técnica/ferramenta.

O projeto não pretende, entretanto, uma contribuição a todo o campo da PPL. Neste há
diferentes perspectivas teóricas, ligadas aos feminismos [ CITATION Tim11 \l 1046 \m Fáv15] , ao
marxismo, ao construcionismo social, à psicanálise, entre outras, e que variam deste uma
perspectiva crítica mais radical do estado de coisas até abordagens mais “moderadas”,
preocupadas com a gestão das políticas públicas e um bom governo [ CITATION Hur181 \l
1046 ].

Entre as distintas perspectivas teóricas, este trabalho se situa no “subcampo” ligado à


filosofia da Diferença e sua correlata, a Esquizoanálise/Cartografia (esquizoanalítica). É bem
verdade que esta filosofia não baseia somente trabalhos de dentro do campo da PPL e
tampouco somente do campo da Psicologia. No que concerne ao âmbito acadêmico-
profissional, ela também vem sendo absorvida por outros campos que trabalham
prioritariamente com a produção de subjetividades, a exemplo dos trabalhos de Tomaz Tadeu
da Silva [CITATION Tom00 \n \t \m Sil02 \n \t \l 1046 ] na Educação e, com menor difusão, o
de Valter A. Rodrigues [CITATION Val01 \n \t \l 1046 ] na Comunicação.

As críticas desta filosofia são, por sua vez, direcionadas ao capitalismo e suas capturas
dos processos da vida, à psicanálise, ao estruturalismo, à disciplina, controle, logocentrismo,
às hegemonias, à colonização, à linguagem e, em suma, a “tudo” que aí está – aproximando-se
da fórmula anarquista “tá tudo errado!”. Por conseguinte, trata-se de uma filosofia
“politicamente” posicionada próxima do anarquismo ou anarco-comunismo ou pelo menos de
uma ideia menos ingênua tanto quanto possível de liberdade.

Talvez por não dispormos de uma certa distância histórica dessa filosofia amiúde
classificada “contemporânea”, não haja em qualquer campo horizonte para esgotamento dos
seus “postulados” e possibilidades. Cada disciplina trabalha uma parte dela e, no que concerne
à PPL, uma entrada neste rizoma [ CITATION Bar03 \l 1046 ] se dá pelo conceito de Força.
Política é definida justamente como ação das relações de força/poder/potência [ CITATION
Dom18 \l 1046 ].
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Neste entendimento com que trabalharemos, a subjetividade também é uma força,


definida pela relação com as demais forças em jogo. Mais exatamente, a produção de
subjetividade é dobra, prega, uma inflexão de força, sem referência a qualquer noção de
interioridade, de sujeito estável ou qualquer dicotomia entre “dentro” e “fora”; as forças de
fora se tornam “dentro” sem deixar de ser fora[CITATION Tom001 \t \l 1046 ]. Ao mesmo
tempo, a esta composição de jogo de forças coextensiva a todo o campo social se denomina
Diagrama, que se atualiza em Dispositivos [CITATION Del90 \t \m Del05 \n \t \l 1046 \m
Dom18]. Os afetos, por sua vez, são variações de força.

Estes conceitos e outros do mesmo “grupo” – já são, por si só, instrumentalizações da


filosofia da diferença. Do mesmo modo que o conceito de agenciamento psicopolíticos
[ CITATION Dom18 \l 1046 ] já são instrumentos desta PPL esquizoanalítica/cartográfica ou
diferencial. Sejam eles adotados como “caixa-de-ferramentas”, sejam adotados componentes
do cosmo ou visão-de-mundo.

Entretanto, essa filosofia é criticada, na Psicologia, por não ser “aplicável”, não ter uso
clínico/interventivo. Isto é, mesmo por aqueles que dela “simpatizam” alegam que seus
questionamentos não têm “saída” para o trabalho cotidiano.

Neste trabalho, há “simpatia” ou acordo com as críticas que fizeram necessária a


criação dos conceitos de dobra e diagrama, que tratam da subjetivação; acordo a ponto de
almejar instrumentalizá-lo para intervenções psicossociais com o cuidado para que esta
instrumentalização leve em conta estas mesmas críticas que deram origem aos conceitos –
críticas à captura capitalista e à representação, por exemplo. Para não cair no mero
pragmatismo naturalizado do colonizador ou acabar por reforçar aquilo com o que busca
romper. Daí a necessidade de um estudo paralelo e subordinado das diferentes filosofias da
Técnica.

Ademais, este estudo precisará de um viés mais substantivo do que adjetivo. Ou seja,
interessa o que é dito sobre ou acerca da Técnica e sobretudo como estes dizerem podem
auxiliar numa instrumentalização para o trabalho psicossocial com a subjetivação. Interessa
menos, portanto, o pertencimento do discurso a tal ou qual escola, a tal ou qual tempo
histórico, a tal ou qual perspectiva, malgrado estes adjetivos sejam notados.

Por fim, cumpre salientar que o presente planejamento não aspira expandir ou
adicionar novas críticas sociais, científicas ou filosóficas. Seu escopo é o desenvolvimento
instrumental de parte do campo científico-profissional de maneira coerente com as críticas
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que fizeram o campo necessário. Em suma, a presente proposta visa estudo sobre
subjetivação, pelos conceitos de Dobra e Diagrama e sua instrumentalização, que exigirá um
estudo da Técnica.

II – Referencial Teórico

Como apresentado, este pré-projeto se destina à instrumentalização da filosofia da


diferença a que poderíamos fazer corresponder, na lógica de alguns manuais de pesquisa, a
esquizoanálise/cartografia como método de pesquisa e intervenção. A exemplo da explicação
de Prodanov e Freitas [CITATION Cle13 \n \t \l 1046 ], em que ao racionalismo corresponde o
método dedutivo; ao empirismo corresponde o método indutivo; ao neopositivismo, o
hipotético-dedutivo; ao materialismo dialético, a dialética; à fenomenologia, o
fenomenológico.

Seguindo esta lógica e a subdivisão do campo entre ciência e profissão – embora


idealmente estas duas instâncias sejam indissociáveis1 -, diríamos que o “estado da arte” da
instrumentalização da filosofia da diferença apresenta a cartografia e esquizoanálise como
método de pesquisa-intervenção (Cintra, Mesquita, Matumoto, & Fortuna, 2017) e abordagem
de atuação profissional, bem como embasa esforços menos robustos de instrumentalização,
assim como reflexões “avulsas”.

Neste cenário, no que tange à subjetivação, destacamos quatro trabalhos: as Klínicas


de Gregorio Baremblitt; a Cartografia Sentimental, de Suely Rolnik; os dois volumes de
Pistas do Método da Cartografia, vinculado a coletivos da Universidade Federal Fluminense
e; mais recentemente, o Psicologia, Política e Esquizoanálise de Domenico Hur, já citado, mas
que comentaremos brevemente com os demais, a seguir, a fim de fornecer um panorama geral
(ou generalizante) de interesse para esta pesquisa.

Com o Cartografia Sentimental [ CITATION Rol07 \l 1046 ], temos uma espécie de


prescrição do que seja o trabalho “do cartógrafo” e uma série de definições conceituais, com
destaque para o conceito de afeto, mais próximo de Desejo que de Força. A autora não
distingue pesquisa de intervenção, mas faz uma vinculação da cartografia com a antropofagia
que acaba por equalizar todas as teorias (e técnicas correlatas), afirmando que todas são
cartografias do desejo no campo social a serem “devoradas” a depender do contexto.
1
No próprio Código de Ética Profissional do Psicólogo[CITATION Res05 \n \t \l 1046 ], consta que um de seus
deveres fundamentais é a contribuição para o desenvolvimento científico. Princípio que também ressoa com o
perfil de egresso estabelecido pelas Diretrizes Curriculares Nacionais da graduação em Psicologia[CITATION
Con04 \n \t \m Con \n \t \l 1046 ], segundo as quais o psicólogo deve estar apto a pesquisar desde a
graduação.
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Diversamente da autora, não pressupomos que as técnicas sejam neutras, mas que seja
possível o desenvolvimento relativamente autônomo de instrumentos próprios ao campo, por
assim dizer, e ao largo das abordagens mais ou menos conformadas sob a Psicologia, como
por exemplo a psicanálise.

No Pistas do Método da Cartografia [CITATION Edu091 \t \m Pas13 \t \l 1046 ] , o objeto


não é a cartografia/esquizoanálise “em si”, mas a cartografia como método de pesquisa
intervenção. Em interface predominante com o campo da Saúde Coletiva, com a Análise
Institucional e “a Clínica”, temos uma apreensão dos respectivos conceitos como
ferramentas[CITATION Gil82 \t \l 1046 ] e esta é a contribuição possível destas obras ao presente
projeto, com destaque para às passagens e textos que tangenciam e abordam o conceito de
força [ CITATION Cés13 \l 1046 ]. Porém, valem-se ainda de instrumentos e técnicas de outros
campos – o que também faremos -, a exemplo do diário de pesquisa da etnografia; e correm
neste trabalho o risco de configurarem-se muito mais como um álibi, uma justificativa para
institucionalização da esquizoanálise – risco que também corremos -, do que como um
desenvolvimento com potencial transformador.

Com trabalho liderado por Baremblitt[CITATION Hur \t \l 1046 ], temos notícia de uma
prática klínica desenvolvida a partir da esquizoanálise que envolvem ferramentas
(“dispositivos”) e chegam a configurar uma abordagem nova, o Esquizodrama [ CITATION
Gre08 \l 1046 ]. Malgrado a aparente afinidade deste trabalho com o que é aqui proposto, os
escritos acerca dos dispositivos klínicos de Baremblitt dependem – assim como os textos
técnicos da clínica com C – de uma um “enquadre” educacional para que sejam eficazes na
comunicação; sem esta proximidade “prática” com as klínicas, que é condição sine qua non
para que textos sobre as klínicas façam sentido, estes escritos resultam infelizmente
inacessíveis, embora possam ser lidos.

Finalmente, no Psicologia, Política e Esquizoanálise [CITATION Dom18 \t \l 1046 ] tema


uma discussão pormenorizada de conceitos esquizoanalíticos por meio de um conjuntos de
temas que articulam Psicologia e Política – e muito possivelmente divisarão este “subcampo”
da PPL -, com destaque, aqui, para as temáticas do Poder, Subjetividade, Capitalismo e
Estado. Adicionalmente, traz conceitos novos como o de tecnopolítica como um tipo de
agenciamento psicopolítico conforme o qual o diagrama de rendimento faz(-nos) desejar o
saber-fazer, numa conjugação saberes, técnicas e práticas “naturalmente” afeitas ou
capturadas para a gestão da vida e da população, transferidas do aparelho de Estado para as
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organizações, empresas e nós mesmos. Neste texto figura, assim, uma das raras apreensões da
Técnica no campo da Psicologia que não pressupõe, como no senso comum, que as técnicas
são neutras, importando apenas – quando muito – o seu uso.

Embora brevemente explicado, o conceito de tecnopolítica coaduna, a nosso ver, com


o conceitos de tecnosfera e psicosfera constantes em um outro trabalho que será importante
referência para a pesquisa: A Natureza do Espaço[CITATION Mil09 \t \l 1046 ]. Nele, ambas
esferas são componentes do espaço; ao passo que a tecnosfera – conjunto de técnicas 2
disponíveis – “se adapta aos mandamentos da produção” e traduz interesses distantes, a
psicosfera (sentidos, paixões, ideias, crenças) fornece as racionalidades segundo as quais a
interação entre tecnologias e valores sociais e apoia a instalação de uma técnica. “Ambas –
tecnosfera e psicosfera – são locais, mas constituem o produto de uma sociedade bem mais
ampla que o lugar” (p. 256), a sociedade capitalista – mundial e integrada, com suas leis de
integração.

Ocorre que uma das ideias basilares é de que tudo começa e termina no Espaço, pedra
angular para a análise de Milton Santos sobre as relações entre técnica e política - assim como
em Hur esta relação é apresentada a partir de elementos psicopolíticos. A preocupação de toda
obra é uma definição ontológica e epistemológica do Espaço geográfico e é em função deste
conceito que a vasta revisão e análise acerca da Técnica se dá. Mas embora pertença a outro
campo, tem preocupações ético-políticas próximas às da PPL e ajuda a suprir a carência deste
debate na Psicologia, em que também as técnicas são “apolíticas”.

Desta obra cumpre destacar, de início, a ideia segundo a qual entre as ações e a técnica
há intencionalidade, do que decorre que quanto mais desenvolvido ou “tecnológico” é um
objeto e técnica, maior a intencionalidade nele “embutida”, maior a interdependência com
objetos da mesma família e menor a possibilidade de uso diverso do projetado.

Esta noção coincide em parte com o que Latour [CITATION Lat94 \n \t \l 1046 ] chamará
de inscrição, a partir de bases filosóficas distintas do marxismo e fenomenologia de Milton
Santos e de um campo também distinto, mais subordinado à Antropologia. Mas tanto
inscrição quanto intencionalidade já bastam para apontar o caráter político da Técnica “em
si”, isto é, não apenas a política da escola de que técnica utilizar ou instalar, no trabalho de
pesquisa ou intervenção psicossocial ou na vida como um todo.

2
Neste ponto não há distinção entre técnica, tecnologia, instrumentos de trabalho nem objeto técnico.
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Com o estudo das “filosofias da técnica”, não pretendemos necessariamente apontar a


historicidade ou intencionalidade dos testes psicológicos, ou a manicomialidade “encravada”
no ato de realizar um psicodiagnóstico. Mas tão-somente considerar os aspectos ético-
políticos na proposta de uma técnica.

Além dos trabalhos mencionados, outros podem contribuir no mesmo sentido. Numa
enumeração sumária, a fim de fornecer uma paisagem das filosofias das técnicas, podemos
apresentar diferentes perspectivas, de bases e campos e temas igualmente diversos. Mas estes
aspectos são suplantados pela sua possível contribuição a uma ferramenta “crítica”, isto é, que
considere críticas ético-políticas que justificam o campo mais radical da PPL, entre outras.

É o caso dos conceitos de objeto técnico e tecnicidade de Simondon [ CITATION Fra12 \l


1046 \m Mar171], pelos quais é possível pensar a relação “primitiva” entre técnica e
magia/sagrado e, com isso a sobrecodificação entre cosmovisões e dominação entre povos,
além do próprio processo de individuação [CITATION Gil041 \t \l 1046 ] ; a partir de
Benjamin[ CITATION Con17 \l 1046 ] e Flusser[CITATION Vil85 \n \t \l 1046 ], a relação entre
(imagem) técnica e percepção, arte e magia, bem como mediação técnica e história. Em suma,
há uma miríade de interpelações acerca da Técnica que permitem não só problematizar suas
as consequências, como também esmiuçar tal alcance político.

III – Definição do Problema e Objetivos

“continuar delimitação do tema – listar as críticas que preocupam e delimitar Itens dos
objetivos” definir o que se quer dizer com Técnica (técnicas, instrumento, instrumentalização,
operacionalização, artefato,

No que foi exposto até aqui, a problemática colocada neste pré-projeto envolve a
pretensão de desenvolvimento instrumental do campo emergente da Psicologia Política
Latinoamericana, considerando críticas que o caracterizam e algumas que são extensíveis às
técnicas, como a “despolitização” e levando em conta também o desafio da
interdisciplinaridade. Para tanto, será necessária uma investigação do que já foi produzido em
outros campos acerca da técnica e ao mesmo tempo possa auxiliar neste desenvolvimento
“operacional” e eticamente coerente. Em outras palavras, a problemática envolve Produção de
Subjetividade, Técnica e Política.

No que concerne à Técnica, há uma vasta polissemia cujas nuances serão ignoradas na
delimitação do problema. Entendemos por Técnica uma categoria ou instância, como Cultura,
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Espaço, Social, num sentido mais geral e abstrato[ CITATION Mil09 \l 1046 ]. Ao passo que por
“técnica” designamos as técnicas específicas ou modos regulares de ação ou trabalho, como
técnicas psicoterápicas, técnicas de controle. “Ferramenta”, por sua vez, está aqui entendida
como sinônimo de “instrumento”, objeto usado para uma ação ou trabalho, uma técnica
objetificada e que tem finalidades; “instrumentalização”, por seu turno, é a produção de
objetos, ferramentas ou instrumentos, diferente de “operacionalizar”, que quer dizer
simplesmente “fazer funcionar”, com ou sem objeto. Tratam-se de definições provisórias, haja
vistas que mistura diversas bases e a fase pré-projeto.

Mas nesse sentido, um esquema [CITATION Dom18 \t \l 1046 ] ou desenho no papel é já


uma objetivação e, na medida em que faz funcionar algo e tem um telos ou finalidade
específica, conforma uma instrumentalização. Nossa hipótese é de que assim possa ser feito
em relação ao Diagrama de Foucault[CITATION Del05 \t \l 1046 ].

Antes de apresentar o desenho do diagrama – que tem como centro a dobra


(subjetivação) -, Deleuze apresenta sua leitura da obra do amigo e diversos conceitos
atribuídos a ele3, como força, poder e diagrama; começa por apresentar Vigiar e Punir –
primeira e principal texto em que Foucault trata das sociedades disciplinares – e Foucault
como cartógrafo. Em outro momento, apresenta o conceito de Dispositivo como composto de
linhas de dizibilidade, visibilidade, força e subjetivação [CITATION Del90 \t \l 1046 ]; num
terceiro, apresenta a Cartografia como “traçado de linhas que compõem alguém” [CITATION
Del18 \t \l 1046 ].

Quando dizemos “Diagrama de Foucault”, então, nos referimos à sua análise da


subjetividade disciplinar, que não é nem uma interpretação nem uma operação de
significação, mas um traço cartográfico. Do mesmo modo como Hur [CITATION Dom18 \n \t \l
1046 ] faz o traçado da subjetividade capitalista, marcando as distinções do investimento
desejante no espectro político dadas pelos agenciamentos psicopolíticos no Diagrama de
Rendimento.

Os diagramas podem ser variados ou virtualmente infinitos, quiçá para cada descrição
de sociedade. Só a análise singularizada pode dar a entender que linhas ou fluxos e que
diagrama está a afetar um indivíduo ou grupo nele implicado. Pois trata-se de um traçado das
margens, mais do que do rio, isto é, das correlações de força em que alguém está “dobrado”, o
que leva à exprema coerência a inversão ou deslocamento do Eu para os processos

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Há comentadores e leitores de Foucault que divergem da leitura de Deleuze
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(psicossociais)4. Mais ainda, voltar-se aos fluxos criativos, as linhas de fuga. Sem isso não há
porquê.

Embora estes conceitos que buscamos instrumentalizar (dobra e diagrama) estejam


mais propensos a escapar dos riscos de representação, significação, reducionismo,
despolitização, institucionalização, mecanização (“testeiros”), sobrecodificação, rendimento,
e, em suma, contribuição com os poderes dominantes – daí sua escolha; ainda assim há o risco
de uma instrumentalização descuidada e esvaziadora da força disruptiva e criativa na
intervenção que almejamos. Ou ao menos um instrumento que não esteja de saída a serviço da
dominação.

Por assujeitamento, entendemos todo regime de forças “injusto”, seja em termos de


exploração – expropriação do trabalho/poiésis; mistificação ou engano; dominação ou
subjugação - entre povos, países, classes, raças, sexos, pessoas; seja a nível macro (dialético)
ou micropolítico (diferencial).

Assim sendo, a questõe proposta é precisamente: como instrumentalizar os conceitos


diferenciais de Dobra e Diagrama de modo a viabilizar instervenções psicossociais que
considerem radicalmente as problemáticas do assujeitamento?

Objetivo Geral

Instrumentalizar os conceitos diferenciais de Dobra e Diagrama de modo a viabilizar


instervenções psicossociais que considerem radicalmente as problemáticas do assujeitamento.

Objetivos Específicos

 Deliberar as filosofias da técnica mais adequáveis a garantir e embasar uma


instrumentalização coerente com a consideração das problemáticas colocadas;
 Relacionar as filosofias da técnica selecionadas com os conceitos de Dobra, Diagrama
e cognatos, necessários ao alcance do objetivo geral;
 Propor uma ferramenta experimental de delineamento de composições de força para
intervenções psicossociais com indivíduos ou grupos;
 Reformular a proposta a partir da experimentação com indivíduos ou grupos.

VI – Metodologia

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Explica o fato, por exemplo, de todos os sujeitos cronificados terem a mesma evolução, independentemente
do diagnóstico; o diagnóstico é o quadro ou fotografia da correlação de forças em que o sujeito está implicado,
mais do que do sujeito.
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Para os dois primeiros objetivos específicos, relacionados ao estudo aprofundado das


diferentes filosofias da técnica, serão abordados trabalhos de autores já mapeados. Para
autores completamente desconhecidos, primeiro faremos a leitura de comentadores e, uma vez
identificada a relevância para o objetivo geral, o estudo do original.

Um estudo preliminar identificou os primeiros autores a serem trabalhados: Milton


Santos; Bruno Latour; Walter Benjamin; Gilles Deleuze; Gilbert Simondon; Martin
Heidegger; Vilém Flusser; Valter A. Rodrigues; Mary Spink; Pierre Levy; Ortega y Gasset e
Michel Foucault.

Para o exame e conexão dos diferentes trabalhos, eles serão apreciados em função dos
conceitos que apresentam. Para isso, partiremos também da filosofia da diferença de Deleuze
e Guattari [CITATION Gil92 \n \t \l 1046 ] , segundo a qual os conceitos (filosóficos, por
natureza) nascem de problemas e determinações não-filosóficas (Imanência, Razão); ressoam
entre si (Consistência, Entendimento) e; correspondentes ao personagens conceituais, os
“autores” (Insistência, Imaginação).

Com isso, buscaremos não só a definição de Técnica de interesse, como também os


demais conceitos interdependentes (plano de consistência) em função dos respectivos
problemas a que o (imaginamos que) os autores tenta resolver com os conceitos (plano de
imanência). As regras de co-adaptação dos conceitos serão dadas pelo Gosto [CITATION Gil92 \t
\l 1046 ], isto é, nossa própria implicação e o problema de pesquisa.

O “mesmo” processo ocorrerá com relação aos conceitos de Dobra e Diagrama e os


demais necessários. Como instrumento, faremos uso de uma matriz conceitual para
fichamento de cada trabalho, em que discriminaremos conceito, problemas e conexões. Com
isso esperamos responder às questões condicionantes referentes à técnica, satisfazer os
requisitos ético-políticos colocados e efetuar as conexões necessárias à elaboração da
ferramenta. Cremos só então ter condições de definir o modo com a ferramenta será
elaborada.

Na segunda parte da pesquisa, de posse da primeira proposta, buscaremos


experimentá-la em intervenções psicossociais com grupos ou indivíduos seja em atendimento
clínico em enquadre tradicional, seja com grupos formados para este fim, de acordo com a
situação e possibilidades do momento [CITATION Edu091 \t \l 1046 ]
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VII – Referências Bibliográficas

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