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MECANISMOS DE DEFESA

Síntese
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MECANISMOS DE DEFESA DO EGO

Mecanismos de Defesa são processos psíquicos inconscientes que aliviam o EGO do

estado de tensão psíquica havida entre o ID intrusivo, o Superego ameaçador (ou

censor) e as fortes pressões que emanam da realidade interna e externa.

Dito de outro modo, mecanismo de defesa ou ajustamento designa em psicologia, em

geral, e na teoria psicanalítica, em particular, as ações psicológicas que têm por

finalidade reduzir qualquer manifestação que pode colocar em perigo a integridade

do ego em que o indivíduo não consiga lidar com situações que por algum motivo

considere ameaçadoras. São processos inconscientes que permitem à mente

encontrar uma solução para conflitos não resolvidos no nível da consciência. As bases

dos mecanismos de defesa são, geralmente são assim consideradas, as angústias. De

comum, quanto mais angustiados estivermos, mais fortes os mecanismos de defesa

são ativados.

1. MECANISMOS DE DEFESA DO EGO NA OBRA DE FREUD

a) SONHOS, FANTASIAS (ONIPOTENTES) E DEVANEIOS

Segundo Freud, sonhos são fenômenos psíquicos dos quais realizamos

desejos inconscientes. O sonho é o resultado de uma conciliação.

Dorme-se e, não obstante, vivencia-se a remoção de um desejo. Satisfaz-

se um desejo, porém, ao mesmo tempo, continua-se a dormir. Ambas as

realizações são em parte concretizadas e em parte abandonadas. Trata-

se de mecanismo essencial à saúde mental e que se insere como um

essencial mecanismo de defesa.


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O devaneio ou sonho diurno é um roteiro imaginário, desenvolvido em

estado de vigilância a favor de um relaxamento da censura e análogo, por

suas características gerais e suas funções, ao sonho noturno.

Suzan Isaacs definiu a Fantasia inconsciente como sendo a representante

psíquica da pulsão. Os psicanalistas kleinianos consideram, em verdade,

que o Inconsciente é constituído de fantasias de relações de objeto que

correspondem à representação psíquica primitiva das pulsões.

É claro que não se pode desprezar o sonho (notadamente o noturno) como

palco de outras atividades e composto por outros elementos — como se

dá em face do que a metafísica é capaz de prover.

Por outras palavras, e aí não se trata da teoria da Psicanálise em si,

registra-se, há quem acredite (e mais do que acredite, tem por verdade

— algo que nosso instituto partilha) da real viabilidade de contatos com

outras dimensões, de contatos com espíritos e outras representações de

mundos e entidades diversas.

b) REPRESSÃO E RECALQUE

Repressão ou recalque é um dos conceitos fundamentais da psicanálise,

desenvolvidos por Sigmund Freud. Denota um mecanismo mental de

defesa contra ideias que sejam incompatíveis com o EU. Freud dividiu a

repressão psicológica em dois tipos, a repressão primária, na qual o

inconsciente é constituído, e repressão secundária, que envolve a rejeição

de representações inconscientes.

A repressão é o processo psíquico através do qual o sujeito rejeita

determinadas representações, ideias, pensamentos, lembranças ou


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desejos, submergindo-os na negação inconsciente, no esquecimento,

bloqueando assim os conflitos geradores de angústia.

Segundo Sigmund Freud, os conteúdos refutados, longe de serem

destruídos ou esquecidos definitivamente através da repressão psíquica,

ao se ligarem à pulsão mantêm sua efetividade psíquica no inconsciente.

O reprimido (ou recalcado) constitui, para Freud, o componente central

do inconsciente. "O recalcado se sintomatiza", diz o fundador da

psicanálise. Ou seja, pela repressão, os processos inconscientes só se

tornam conscientes através de seus derivados — os devaneios, os sonhos

ou os sintomas neuróticos.

O conceito de repressão psicológica não foi originalmente definido por

Freud. No século XIX, já havia sido utilizado por Johann Friedrich

Herbart e por Theodor Meynert. Mas foi Freud quem conseguiu

descrevê-lo como um mecanismo essencial da cisão originária entre o

consciente e o inconsciente, no aparato psíquico.

Para Freud, a repressão opera porque a satisfação direta da moção

pulsional, que se destina a causar prazer, poderia causar desprazer ao

entrar em dissonância com as exigências provenientes de outras

estruturas psíquicas ou exigências do meio exterior.

Em sentido estrito, trata-se do mecanismo típico da neurose histérica,

mas, em sentido amplo, é um processo que ocorre em todos os seres

humanos, dado que constitui originariamente o inconsciente.

O conceito foi adotado por distintas escolas e orientações dentro da

psicanálise, mas também por outras teorias psicológicas, resultando em

definições às vezes muito diferentes entre si.

Lacan, por exemplo, nos anos 1950, reinterpretou a teoria da repressão e

do deslocamento de Freud usando as categorias linguísticas de metáfora


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e metonímia. Na medida em que a metáfora envolve a substituição de um

termo por um outro que "desliza por baixo do balcão", ela seria, segundo

Lacan, o correlato linguístico do mecanismo de repressão ou recalque.

c) SOMATIZAÇÃO

Histeria e o Caso Dora (1905)

A histeria é uma classe de neuroses que apresentam quadros clínicos

muito variados. Seu desenvolvimento está diretamente ligado a conflitos

psíquicos inconscientes e ao recalcamento de fantasias que se exprimem

sob a forma de simbolizações. A doença, muitas vezes, traz consigo

sintomas conversivos (na histeria de conversão) ou fóbicos (na histeria

de angústia), embora eles não sejam obrigatórios.

Outras características comuns relacionadas ao recalcamento são as

amnésias e ilusões da memória. Freud considerou como conflito central da

histeria a “impossibilidade de o sujeito liquidar o complexo de Édipo e

evitar a angústia da castração, que o leva a rejeitar a sexualidade”. Essa

característica explicaria a sensação de asco que histéricos geralmente

apresentam em situações que normalmente causariam excitação sexual.

O Caso Dora, relatado por Freud (1905), é um importante exemplo de caso

de neurose histérica, resumidamente comentado a fim de ilustrar o quadro

da doença.

Dora era uma moça de 18 anos que foi encaminhada a Freud por seu pai.

Ela vivia com ele, sua mãe e seu irmão, tendo sido sempre muito próxima

ao pai. Ele teve em sua vida muitas enfermidades, e Dora sempre se


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responsabilizou por seus cuidados. A maturidade da garota foi também

responsável por aproximá-los desde cedo, já que o pai encontrou nela uma

agradável companheira e confidente. A relação entre seus pais,

importante ressaltar, não era muito boa, sendo os dois bastantes

distantes.

Quando Dora tinha seis anos, a família se mudou para outra cidade, e lá

fizeram amizade com um casal, o Sr. e a Sra. K. O pai de Dora se

aproximou bastante da Sra. K., que muitas vezes cuidou dele quando sua

saúde piorava. A princípio, Dora tinha também grande afeição por ela, mas

depois de certa época passou a não mais suportá-la, afirmando que ela e

seu pai tinham um caso amoroso. A moça, inicialmente, tinha boa relação

também com o Sr. K, mas aos 16 anos acusou-o de lhe fazer uma proposta

amorosa, passando desde então a evitá-lo.

Quanto à saúde de Dora, ela já apresentava desde a infância sintomas

histéricos. Com sete anos apareceu o primeiro sintoma conversivo,

enurese noturna, passando, ao longo dos anos, por dispneia, tosse nervosa,

afonia, enxaquecas, depressão e insociabilidade histérica. Todos esses

sintomas estavam relacionados a um recalcamento sofrido por Dora algum

tempo antes.

Uma das interpretações de Freud a respeito deste caso de histeria se

baseia principalmente na relação entre Dora, seu pai e a Sra. K.

Dora, em sua infância, teria se apaixonado por seu pai, acontecimento

bastante comum nas crianças, compreendido como Complexo de Édipo. Essa

paixão, embora aceitável pela criança quando ainda é muito jovem e não

permeada por questões morais, com o passar do tempo pode se traduzir em

culpa, já que começa a perceber que esse relacionamento não seria possível,

nem aceito.
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Dora deve então ter recalcado tal lembrança, tornando-a inconsciente, de

forma a proteger seu próprio eu. Esses sentimentos e lembranças ficaram

adormecidos por algum tempo, mas alguns fatos foram responsáveis por

trazer esse material à tona, embora nunca de forma explícita.

d) IDENTIFICAÇÃO

O indivíduo pode diminuir ou evitar a angústia identificando-se com outras

pessoas ou grupos, de forma a se proteger. Por exemplo, uma pessoa que

sofreu um recente fracasso pode identificar-se com o triunfo de outras,

como se aquele triunfo também fosse dela. Também, ameaças externas

ao eu podem ser reduzidas quando a pessoa passa a ver essas ameaças

voltadas para um grupo mais amplo ao qual se identifica e não apenas a

ela. Por isso, temos a tendência de fazer algo que consideramos perigoso

quando estamos em grupo, assim o sentimento de culpa e angústia ligados

a tal ação se dilui no grupo inteiro.

A maior parte das identificações ocorre no mundo da fantasia, temos

como exemplo a criança que se identifica com seu herói favorito, a moça

que se identifica com a “mocinha” da novela etc. Algumas ocorrem, ainda,

em grupos antissociais, como grupos neonazistas, por exemplo: essas, a

longo prazo, trarão dificuldades ainda mais sérias de ajustamento.

De forma branda, a identificação pode ajudar a pessoa a torna-se mais

confiante e ajudar em seus ajustamentos. Porém, em excesso, causa

dependência e impede o indivíduo de enfrentar seu problema. Um caso

excepcional de identificação defensiva é a identificação com o agressor:

nesse tipo de identificação, o indivíduo procura se identificar com


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pessoas ou grupos que o ameaçam — ele é transformado de agredido para

agressor. Isso explica a síndrome de Estocolmo.

A histeria que Dora desenvolveu, neste idem “d”, agora retomada,

representava uma verdadeira IDENTIFICAÇÃO com seu pai, estando

este no lugar de sujeito desejante. Ela compartilhava com ele, portanto,

o desejo pela Sra. K.

Em toda fantasia, entretanto, o sujeito ocupa o lugar do sujeito

desejante, mas também o lugar do objeto de desejo, sendo possível

entender então que a moça se identificava também com a Sra. K. Esta

senhora era uma mulher jovem que tinha o amor de seu pai, assim como

ela havia desejado ter.

A identificação com ela possibilitou, inicialmente, que Dora cultivasse a

amizade entre as duas, mesmo desconfiando da relação entre ela e seu

pai. Em um segundo momento, entretanto, a moça deixou de aceitar essa

situação, passando a odiar a Sra. K, por ter roubado seu posto e a acusar

seu pai. Essa mudança ocorre justamente quando as lembranças

recalcadas voltam com mais força, provavelmente pelo que será explicado

a seguir.

O afeto que a moça tinha pelo Sr. K., na verdade, acabou se traduzindo

em um apaixonamento que Dora tentou veementemente evitar. Para evitar

tais sentimentos, acabou trazendo outros à tona, justamente os que havia

recalcado na infância: o desejo pelo pai. Quando o Sr. K. mostrou então

interesse por ela, Dora passou a evitar o relacionamento entre os dois. E

foi então que deixou de aceitar também o relacionamento do pai com a

Sra. K. É importante lembrar que a paixão de Dora pelo pai ainda se

mantinha em nível inconsciente, sendo que ela não podia compreender seus
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sentimentos, nem guiar suas ações racionalmente (o trauma e a teoria da

sedução).

Quando confrontada com essas hipóteses, sobre já haver se apaixonado

(ou ainda estar apaixonada) por seu pai ou pelo Sr. K., Dora negou

prontamente, ou simplesmente afirmou não lembrar disso. Nesse caso, a

moça não estava mentindo conscientemente. O que ocorre é que essas

lembranças foram apagadas quando ocorreu o recalque, deixando em seu

lugar amnésias, ou mesmo ocupando-a (a mente) com memórias falsas.

Isso é bastante comum nos casos de neurose, em que também ocorrem

confusões e dúvidas quanto às lembranças em decorrência de alterações

na cronologia dos fatos, fator que também faz parte do processo de

recalcamento.

Os sintomas apresentados por Dora, como a tosse de que ela tanto se

queixava quando foi consultar Freud, têm também relação com o recalque

dessa fantasia. Dora acreditava, por certas razões, que a relação sexual

que seu pai e a Sra. K. tinham era basicamente oral. Tendo esta paixão

inconsciente por seu pai, ela se identificava com a amante dele, e desejava

estar em seu lugar. Sua tosse era a forma como essa fantasia do sexo

oral se converteu em um sintoma. Ao mesmo tempo, esse sintoma também

representava uma identificação ao pai; era o desejo de entender por que

o pai se sentia atraído pela amante, por qual razão era ela seu objeto de

desejo.

O sintoma também pode ser entendido como uma identificação ao pai

quando lembramos que este teve tuberculose quando ela tinha seis anos,

doença facilmente relacionada à tosse. É possível observar, pelo exemplo


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de Dora, como os conflitos psíquicos recalcados se traduzem, de forma

simbolizada, em sintomas corporais, nos casos de histeria de conversão.

O caso Dora tem ainda muitas outras questões importantes que podem

ser analisadas e relacionadas com a histeria. Freud considerou a

possibilidade de mais de uma interpretação para os relatos da moça, que,

por ter se originado de apenas três meses de análise, não possibilitou

investigações mais aprofundadas, nem novos fatos.

e) ATUAÇÃO

A atuação pode ser definida como uma ação impulsiva com o intuito de

substituir uma recordação, uma verbalização, um pensamento. Quem atua

faz isso para não pensar, não lembrar, não verbalizar, não simbolizar e não

elaborar.

Desde sua origem, a noção de atuação não atinge uma concordância

conceitual. Há indícios, como menciona Etchegoyen, de que Freud se refere

pela primeira vez ao tema em 1901, em “Psicopatologia da vida cotidiana”,

quando empregou o que significaria um ato-sintoma e que existiria para

manter distante da consciência algo que não pode ser recordado.

Em 1905, no caso Dora, Freud usa outro termo, agieren, que, em português,

é traduzido como “atuar”.

Dessa forma, o que verdadeiramente importa é que Freud percebe esse

comportamento em seu trabalho e Dora (novamente citada) o ajuda a

compreender a atuação, noção já presente, portanto, nos primeiros escritos

da área.
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Assim, encontramos no caso Dora, de Freud, uma exemplificação de

atuação, quando Dora, ao invés de falar sobre seus desejos, suas fantasias,

seus conflitos, ela os atua perante o seu analista. Em seus escritos, diz

Freud que [...] “ela se vingou de mim como queria vingar-se dele, e me

abandonou como se acreditara enganada e abandonada por ele. Assim, atuou

uma parte essencial de suas lembranças e fantasias, em vez de reproduzi-

las no tratamento”.

Por conseguinte, Freud percebe que a atuação tinha ocorrido no lugar do

relato, isto é, tomou a sua função. Etchegoyen concorda com o

entendimento de Freud a respeito da atuação de Dora e, ao se referir a

esse caso, diz: “ela atuou um fragmento de suas fantasias e recordação em

vez de reproduzi-lo no tratamento”, destacando a expressão "em vez de",

porque, para esse autor, aí está a principal característica da atuação.

Etchegoyen considera a atuação capaz de perturbar a tarefa que é, em

termos gerais, a aquisição do insight. Também afirma que a atuação é um

ato neurótico; porém, é digno de nota que nem todo ato neurótico é, em si,

uma atuação. Esse mesmo autor enfatiza que essa substituição da palavra

pelo ato pode ser um meio de se expressar ou não. Isso quer dizer que há

uma atuação que está a serviço da comunicação e, dessa forma, é possível

reconhecer a relação com o objeto; portanto, esse ato está envolvido no

desenvolvimento do tratamento. No entanto, também existe uma atuação

que não quer comunicar, mas apenas perpetuar a onipotência, a onisciência

e o narcisismo do paciente.
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f) REGRESSÃO

A regressão é um mecanismo de defesa que se caracteriza pela existência

de um retorno a um nível de desenvolvimento anterior ou a um modo de

funcionamento psíquico mais simples ou mais infantil.

Caso, por exemplo, de crianças que após algum trauma voltam a chupar o

dedo ou a sofrer de enurese (emissão involuntária de urina).

É um modo de aliviar a angústia sentida, fugindo de um pensamento real

para comportamentos que, em anos anteriores, conseguiam reduzir a

ansiedade. Serve como uma necessidade de procurar um refúgio psicológico

seguro quando se está sob tensão psicológica.

A regressão é um modo de defesa bastante primitivo e, embora reduza a

tensão, frequentemente deixa sem solução a fonte da ansiedade original.

Para Freud, a regressão é evocada em termos de regressão da libido,

regressão do ego ou ainda da regressão objetal.

É o retorno do indivíduo a níveis anteriores do desenvolvimento sempre que

depara com uma frustração. É uma espécie de antessucessão a designar o

retorno do sujeito a etapas ultrapassadas do seu desenvolvimento. Por

exemplo, o choro das pessoas em certas situações pode ser uma regressão

à infância, que pode ter tido uma situação em que o choro “resolveu” o

problema, então a pessoa inconscientemente usaria daquele mesmo método

para “resolver” a nova situação.

Usamos a regressão para fantasiar, com o objetivo de criar uma “válvula

de escape” — popularmente falando. Defender-nos de ameaças e angústias

é muito eficiente, pois dissipa a angústia e nos torna capazes de enfrentar

novamente o problema. Entretanto, de forma constante, nos afasta da


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realidade, nos fornece falsos e efêmeros sentimentos de triunfo e o

despertar para a realidade (através das constantes pressões do mundo

objetivo) pode ser extremamente doloroso.

A regressão geralmente é assemelhada a um ato infantil, mas é mais comum

do que as pessoas imaginam. Fumar e usar outros tipos de objetos orais

que nos proporcionam prazer momentâneo é uma regressão também porque

nos remete à satisfação do bebê com a boca e o ato de sugar o leite —

sinaliza-se.

g) INVERSÃO CONTRA O EU E REVERSÃO

Inversão ou transformação ao contrário: mecanismo que muda de ativa

para passiva a conduta apresentada pela pessoa. Assim, modificando sua

postura de ativa para passiva, a pessoa alivia sua angústia por certa

conduta. Por exemplo, uma pessoa que sente culpa por observar em

demasia certas pessoas de sua família e julgá-las sonha, acordado, que

está vendo pessoa de sua família para ele se exibir, dele ganhando elogios,

tornando-se passivo da situação e aliviando a culpa.

O exemplo não é dos melhores, mas, relendo-o e utilizando-o

analogamente, não deixa de ser válido.

h) INIBIÇÃO

A inibição, como o próprio nome diz, aplicando-se ao fenômeno

psicanalítico, é aquilo que a si é tolhido, impedido; é um bloqueio,


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suspensão ou retardamento de um processo comunicacional, conquanto

possa também se dar pelo caminho fisiológico.

Cuida-se de condição mental em que há limitação do desempenho, por

assim dizer, como o caso de hesitar-se a dar continuidade a algo. Essa

timidez ou constrangimento — hesitação — é mecanismo de defesa muito

interessante. Temendo-se a rejeição, afasta-se. É modo, outrossim, de

controle do objeto do desejo, pode-se ponderar.

i) DESLOCAMENTO

Consiste o deslocamento em transferir as características ou atributos de

um determinado objeto para outro objeto. Exemplo: receber uma bronca

do chefe e, assim que chegar em casa, chutar algo como se este algo fosse

o responsável pela frustração. O deslocamento como mecanismo de

defesa é, dito de outro modo, o deslocamento de ações de um alvo

desejado para um alvo substituto quando há alguma razão em que o

primeiro alvo não seja permitido ou não esteja disponível.

O objeto fóbico é um grande exemplo deste processo resultante do

mecanismo de deslocamento.

O deslocamento ocorre quando o Id quer fazer algo que o Superego não

permite. O Ego encontra assim alguma outra maneira de liberar a energia

psíquica do Id. Assim, há uma transferência de energia a partir de uma

catexia reprimida de certo objeto inicial para um objeto mais aceitável.

Ações tendem a ser deslocadas para áreas ou assuntos relacionados. Se

eu quero gritar com uma pessoa, mas sinto que eu não posso, então vou

gritar com alguém que eu sei que não vai me jogar um piano, embora isso

ainda possa acontecer se não há outra maneira de libertar minha raiva.


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j) ISOLAMENTO

É o mecanismo de defesa que envolve uma “separação de sistemas” para

que os sentimentos perturbadores possam ser isolados, de tal forma que

a pessoa se torna completamente insensível em relação ao acontecimento

sublimado e passe a comentá-lo como se tivesse acontecido com terceiros.

Nosso pensamento parece capaz, em certas circunstâncias, de manter,

lado a lado, dois conceitos logicamente incompatíveis, sem tomarmos

consciência de suas gritantes divergências, o que também chamamos de

“comportamentos lógicos de estanques”.

É um processo de isolar uma, dentre as várias partes do conteúdo mental,

de tal forma que as interações normais que ocorreriam entre elas se

reduzam e assim os conflitos sejam evitados.

k) SUBLIMAÇÃO

A sublimação consiste na busca de modos socialmente aceitáveis de

satisfazer, ao menos parcialmente, as pulsões do id. Caracteriza-se por

apresentar uma inibição do objeto e uma dessexualização deste. É

responsável pela civilização, já que é resultante de pulsões subjacentes

que encontram vias aceitáveis para o que é reprimido. Dessa forma, é o

único mecanismo que nunca é patológico.

É o transmutar certo impulso em arte, em trabalho voluntário etc.

Exemplo interessante: um indivíduo com alta agressividade pode se tornar

cirurgião, para o que necessita cortar tecidos sem hesitação; é uma forma

de socializar a agressividade.
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l) NEGAÇÃO

A negação talvez possa ser considerada o mecanismo de defesa mais

ineficaz, pois se baseia em simplesmente negar os fatos acontecidos à

base de mentiras que acabam se confundido e na maioria das vezes

contrariando uma à outra. Um bom exemplo de negação é um garoto que,

ao ser acusado de roubo (e realmente é culpado), diz: "Eu não tenho nada

comigo! Eu achei no chão ou o dono da loja me deu!".

l) DENEGAÇÃO

A denegação, realça-se, por vezes classificada junto à negação, é um

mecanismo de defesa em que o sujeito se recusa a reconhecer como seu

um pensamento ou um desejo que foi anteriormente expresso

conscientemente.

A denegação é um fenômeno que se pode observar, por exemplo, em

pacientes que descobrem possuir uma doença incurável ou em casos de

perda de um ente amado.

A denegação é, assim, a percepção de um acontecimento doloroso em que

surge uma desestruturação de si cuja primeira reação é ver, mas ao mesmo

tempo não ver, ouvir, mas não escutar, entender, mas não compreender.

Freud constatou a existência da denegação como resistência no

tratamento da histeria em que uma representação consciente é recusada

e posteriormente recalcada. A palavra também pode ser empregada para

definir a aliciação do espectador pelo filme de ficção. Ainda que consciente

do fato de estar diante de uma falsa realidade, o espectador se engaja no

filme, deixando-se afetar pelo universo fictício.


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2. MECANISMOS DE DEFESA DO EGO NA OBRA DE ANNA FREUD

Anna Freud em "O Ego e os Mecanismos de Defesa" (1946) , formula a

hipótese de que o maior temor do ego é o retorno ao estado de fusão inicial

com o id, caso a repressão falhe ou os impulsos sejam intensos demais. Para

manter o grau de organização atingido, o ego procura proteger-se da

invasão das demandas instintivas/pulsionais, provenientes do id, e do

retorno dos conteúdos reprimidos

a) REGRESSÃO

Regressão é um retorno a um nível de desenvolvimento anterior ou a um

modo de expressão mais simples ou mais infantil. É um modo de aliviar a

ansiedade escapando do pensamento realístico para comportamentos que,

em anos anteriores, reduziram a ansiedade. Linus, nas estórias em

quadrinhos de Charley Brown, sempre volta a um espaço psicológico

seguro quando está sob tensão. Ele se sente seguro quando agarra seu

cobertor, tal como faria ou fazia quando bebê.

A regressão é um modo de defesa bastante primitivo e, embora reduza a

tensão, frequentemente deixa sem solução a fonte de ansiedade original.

b) REPRESSÃO

A essência da Repressão consiste em afastar uma determinada coisa do

consciente, mantendo-a à distância (no inconsciente) (1915, livro 11, p. 60

na ed. bras.). A repressão afasta da consciência um evento, ideia ou

percepção potencialmente provocadoras de ansiedade e impede, dessa


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forma, qualquer "manipulação" possível desse material. Entretanto, o

material reprimido continua fazendo parte da psique, apesar de

inconsciente, e que continua causando problemas.

Segundo Freud, a repressão nunca é realizada de uma vez por todas e

definitivamente, mas exige um continuado consumo de energia para se

manter o material reprimido. Para ele os sintomas histéricos com

frequência têm sua origem em alguma antiga repressão. Algumas doenças

psicossomáticas, tais como asma, artrite e úlcera, também poderiam

estar relacionadas com a repressão. Também é possível que o cansaço

excessivo, as fobias e a impotência ou a frigidez derivem de sentimentos

reprimidos.

c) FORMAÇÃO REATIVA

Esse mecanismo substitui comportamentos e sentimentos que são

diametralmente opostos ao desejo real. Trata-se de uma inversão clara

e, em geral, inconsciente do verdadeiro desejo. Como outros mecanismos

de defesa, as formações reativas são desenvolvidas, em primeiro lugar,

na infância. As crianças, assim como incontáveis adultos, tornam-se

conscientes da excitação sexual que não pode ser satisfeita, evocam

consequentemente forças psíquicas opostas a fim de suprimirem

efetivamente este desprazer. Para essa supressão elas costumam

construir barreiras mentais contrárias ao verdadeiro sentimento sexual,

como por exemplo, a repugnância, a vergonha e a moralidade.

Não só a ideia original é reprimida, mas qualquer vergonha ou auto-

reprovação que poderiam surgir ao admitir tais pensamentos em si próprios

também são excluídas da consciência. Infelizmente, os efeitos colaterais


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da Formação Reativa podem prejudicar os relacionamentos sociais. As

principais características reveladoras de Formação Reativa são seu

excesso, sua rigidez e sua extravagância. O impulso, sendo negado, tem que

ser cada vez mais ocultado.

Através da Formação Reativa, alguns pais são incapazes de admitir um

certo ressentimento em relação aos filhos, acabam interferindo

exageradamente em suas vidas, sob o pretexto de estarem preocupados

com seu bem-estar e segurança. Nesses casos a superproteção é, na

verdade, uma forma de punição.

O esposo pleno de raiva contra sua esposa pode manifestar sua Formação

Reativa tratando-a com formalidade exagerada: "não é querida..." A

Formação Reativa oculta partes da personalidade e restringe a

capacidade de uma pessoa responder a eventos e, dessa forma, a

personalidade pode tornar-se relativamente inflexível.

d) ISOLAMENTO

É quando um sentimento fica separado ou desligado do acontecimento

original. Ex: quando fomos agredidos por alguém e depois de um tempo só

sentimos uma raiva que não sabemos do que. Ou quando contamos um

acontecimento traumático sem nenhuma (aparente) emoção.

e) ANULAÇÃO

Quando a pessoa tem uma ação que visa apagar o rastro do impulso ou ação

anterior, como num ato mágico. Ex: bater na madeira quando se tem um
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desejo inaceitável ou fazer o sinal da cruz quando tem um pensamento

ruim. Tem pessoas que acham que o pedido de desculpa deveria anular

imediatamente a ação destrutiva anterior.

f) PROJEÇÃO

O ato de atribuir a uma outra pessoa, animal ou objeto as qualidades,

sentimentos ou intenções que se originam em si próprio, é denominado

projeção. É um mecanismo de defesa através do qual os aspectos da

personalidade de um indivíduo são deslocados de dentro deste para o meio

externo, para o outro.

A ameaça é tratada como se fosse uma força externa. A pessoa na

Projeção pode, então, lidar com sentimentos reais, mas sem admitir ou

estar consciente do fato de que a ideia ou comportamento temido é dela

mesma.

Alguém que afirma textualmente que "todos nós somos algo desonestos"

está, na realidade, tentando projetar nos demais suas próprias

características. Ou então, dizer que "todos os homens e mulheres querem

apenas uma coisa, sexo", pode refletir uma Projeção nos demais de estar

pessoalmente pensando muito a respeito de sexo. Outras vezes dizemos

que "inexplicavelmente Fulano não gosta de mim", quando na realidade sou

eu quem não gosta do Fulano gratuitamente.

Sempre que caracterizamos algo de fora de nós como sendo mau,

perigoso, pervertido, imoral e assim por diante, sem reconhecermos que

essas características podem também ser verdadeiras para nós, é provável


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que estejamos projetando (quando algo do outro nos incomoda muito é

porque nos pertence).

g) INTROJEÇÃO

Estreitamente relacionada com a identificação, visa resolver alguma

dificuldade emocional do individuo, ao tomar para a própria personalidade

certas características de outras pessoas.

h) INVERSÃO CONTRA O EU (CULPA)

O sujeito apresenta pensamento ou o afeto que deveriam ser dirigidos para

o exterior e que são invertidos contra o próprio sujeito. Assim, qualquer

coisa que aconteça o sujeito sente-se culpado, dirigindo contra si mesmo a

responsabilidade e a culpa. Este é um comportamento típico de sujeitos

masoquistas e depressivos.

Mito de Clítia: (gira-sol)

Clítia, ninfa aquática, se apaixona por Apolo e este não lhe corresponde. Ela

senta-se no chão frio e fica a olhar para o sol, desde que ele se erguia na

nascente até se esconder no poente, dia após dia. Maldiçoava a si e ao seu

infortúnio, culpabilizando-se pelo sentimento não correspondido. Assim

permaneceu e no seu curso diário vê apenas suas próprias dores, seu

infortúnio. Conta-se que seus pés se enraizaram, e ela se transformou numa

flor, que se move constantemente em seu caule, de maneira a estar sempre


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voltada para o sol em seu curso diário, conservando assim a lembrança do

sentimento que a ninfa dedicava a Apolo.

i) REVERSÃO

A reversão através do oposto representa o processo pelo qual o objetivo

de uma pulsão se transforma em seu contrário na passagem da atividade

a passividade. Ela está em geral estreitamente ligada ao retorno sobre si

em que a pulsão substitui um objeto pela própria pessoa.

É o caso particularmente nos casais de opostos que andam vestidos iguais:

sadismo e masoquismo, voyeurismo e exibicionismo. O retorno do sadismo

através do masoquismo implica ao mesmo tempo a passagem da atividade

a passividade e uma inversão dos papéis entre aquele que ministra e que

experimenta os sofrimentos.

Ex: Ódio de uma menina a sua mãe

• Inversão do ódio para dentro de si mesma, torturando-

se com autoacusações e sentimento de inferioridade.

• Reversão do ódio de si mesma, pela convicção de que

era odiada por todos.

j) NEGAÇÃO EM FANTASIA / NEGAÇÃO EM PALAVRAS E ATOS

É quando se bloqueia o reconhecimento de uma verdade incontestável

(dolorosa ou inoportunamente prazerosa). Ex: pais que se recusam a lidar

com a sexualidade dos filhos (ou simplesmente perceber que cresceram).


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Ou quando uma pessoa não assume que pode ter sentimentos afetivo-

sexuais por um membro da família.

k) IDENTIFICAÇÃO COM O AGRESSOR

A identificação com o agressor e a renúncia altruísta, descritas por Anna

Freud em 1936 em seu livro “O Ego e os mecanismos de defesa” foram os

dois mecanismos de defesa não descritos por Freud. Para Anna Freud, a

identificação com o agressor está na origem do superego, pois para esta

autora a principal fonte do superego é a agressão externa, enquanto que

para Melaine Klein é a agressão interna, ou seja, a pulsão de morte.

Clínica

Através da identificação com o agressor (pessoa) ou com a agressão (ação

exercida pela pessoa temida) consegue-se transformar a

angústia/ansiedade desencadeada pelo objeto temido em segurança e, ao

mesmo tempo, sair da posição de passividade, geralmente associada com

sentimentos de fragilidade, vitimização e humilhação, para a de atividade,

geralmente associada com sentimentos de força, competência e poder.

A SÍNDROME de ESTOCOLMO é um tipo de identificação com o

agressor, registra-se.
23

O nome desse distúrbio é oriundo do famoso assalto de

Norrmalmstorg do Kredibanken em Norrmalmstorg, em Estocolmo,

que durou do dia 23 a 28 de agosto de 1973. Nesse assalto, as vítimas

normalmente defendiam os sequestradores, mesmo após os seis dias

de sequestro terem chegado ao fim e apresentaram comportamento

reservado durante os processos judiciais do caso. O termo foi

assinalado pelo criminólogo e psicólogo Nils Bejerot, que auxiliou a

polícia no período do assalto.

l) AUTRUÍSMO

Arrolada por Gabbard (2005), como um dos mecanismos maduros,

renúncia altruística ou simplesmente altruísmo, consiste em

“Comprometer-se com as necessidades dos outros mais do que com as

próprias. O comportamento altruísta pode ser utilizado a serviço de

problemas narcisistas, mas pode também ser fonte de grandes

realizações e contribuições à sociedade.”

Ex: cuidados extremados a mãe que quem se deseja que morra

Vale também ponderar sobre o retorno do recalcado:

Conceito da psicanálise que descreve o processo ou mecanismo psíquico

mediante o qual os conteúdos que foram recalcados, ou seja, expulsos da

consciência, tendem constantemente a reaparecer de maneira distorcida

ou deformada (retornando, por exemplo, como sintomas, sonhos, atos

falhos e lapsus, fantasias oníricas diurnas ou como sintomas


24

psicopatológicos). Essas formações do inconsciente, através das quais

opera o retorno do recalcado, constituem formações transacionais, isto é,

são o resultado de uma espécie de negociação entre a instância psíquica

repressora e as representações reprimidas, representantes da pulsão.

3. MECANISMOS DE DEFESA DO EGO NA OBRA DE MELANIE KLEIN

(1937 -1963)

a) IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA

M. Klein (1882-1960), que se dedicou predominantemente ao estudo do

relacionamento humano nas etapas iniciais da vida e foi uma das precursoras

do tratamento psicanalítico de crianças pequenas, em 1946 descreveu um tipo

particular de identificação que julgava estabelecer o protótipo de uma relação

agressiva. Através de um mecanismo inconsciente aspectos, sentimentos e

desejos de uma pessoa, e por ela rejeitados, são projetados para o interior de

um objeto (não necessariamente animado) para o lesar, o possuir ou o

controlar, a identificação projetiva

Clínica

Por ser um mecanismo primitivo, seu uso denota uma regressão mais intensa e

maior incapacidade da pessoa lidar com sua realidade interna. Seu uso

excessivo implica em um importante empobrecimento e enfraquecimento

egóico.
25

Notas sobre alguns Mecanismos Esquizoides (1946)

b) INTROJEÇÃO E PROJEÇÃO / CISÃO DO OBJETO

Medos Persecutórios decorrentes dos Impulsos sadico-Orais do Bebe:

Cisões de Objetos, Idealização, Negação da Realidade Interna e

Externa, Abafamento das Emoções.

A divisão relacionada com a projeção e introjeção

(cisão egoica)

"Como vim a reconhecer, à luz de meu trabalho psicanalítico com crianças, a

introjeção e a projeção funcionam desde o começo da vida pós-natal como uma

das atividades mais primitivas do ego, que a meu ver opera a partir do

nascimento. Considerada sob esse ângulo, na introjeção significa que o mundo

externo, seu impacto, as situações que a criancinha vive, e os objetos que ela

encontra, são experimentados não só como externos mas são recebidos dentro

do eu e se tornam parte da vida interna dela. A vida interna não pode ser
26

avaliada mesmo no adulto sem esses acréscimos à personalidade que se

originam da introjeção contínua." (Klein, 1963a, p.6).

Klein entendeu que além de desviar o ego do instinto de morte (tanátos), este

mecanismo de defesa (introjeção e projeção) auxilia o ego “a superar a

ansiedade, livrando-o do perigo da maldade”. amor e o ódio para com a mãe

estão vinculados à capacidade da criança em idade muito tenra de projetar

todas as suas emoções sobre ela, tornando-a assim tanto um objeto bom como

perigoso. A introjeção e a projeção, no entanto, embora tenham raízes na

infância, não são apenas processos infantis.

Constituem parte das fantasias da criança, que segundo me parece também

operam desde o começo e ajudam a plasmar sua impressão do ambiente; e pela

introjeção este quadro modificado do mundo externo influencia o que se passa

em sua mente. Desse modo, estrutura-se um mundo interno que é, em parte,

reflexo do externo. Isto é, o duplo processo de introjeção e de projeção para

a interação entre os fatores externos e internos.

Esta interação continua através de cada estágio da vida. Da mesma forma, a

introjeção e a projeção prosseguem pela vida afora e se modificam no curso

da maturação; mas nunca perdem sua importância na relação do indivíduo para

com o mundo que o cerca. Mesmo no adulto, portanto, o julgamento de realidade

jamais está inteiramente isento da influência de seu mundo interno." (Klein,

1963, p.7). "Quando alguém se acha inteiramente sob o domínio de situações e

relações primitivas, seu julgamento das pessoas e dos fatos estará

perturbado. Normalmente, tal vivência das situações primitivas se limita e se

retifica pelo juízo objetivo." (Klein, 1952, p.235)


27

A introjeção e a projeção é uma “via de mão dupla” e ocorrem durante a vida

toda, mas, tal como todos os outros processos, também estão sujeitas a

evolução e desenvolvimento e são influenciadas pelas cada vez mais amplas

funções do ego. Seu principal propósito, isto é, obter prazer e evitar a dor,

permanece inalterado, mas o que constitui prazer ou dor muda de acordo com

a progressão total da pessoa. Os mecanismos de introjeção e projeção têm

início sob o predomínio dos instintos orais, mas, a partir do propósito corporal

primitivo e egocêntrico de captar ou ejetar ("comer ou cuspir"), desenvolve-se

o dar e receber das relações maduras, a função superpessoal da procriação na

sexualidade adulta, assim como o intercâmbio sublimado d a criatividade

concreta ou abstrata.

c) MECANISMOS ESQUIZO PARANOIDE

Posições esquizo-paranoide e depressiva do sujeito do inconsciente

O termo "posição foi preferido por Klein em relação a "estágio" porque

ele enfatiza o efeito do ponto de vista da criança sobre suas relações

de objeto. A posição paranoide-esquizoide e a posição depressiva

ocorrem na primeira e segunda metade, respectivamente, do primeiro

ano de vida. Elas também podem ocorrer em diversos momentos na vida

e estão envolvidas em conflitos relacionados a todos os níveis

psicossexuais.
28

d) POSIÇÃO DEPRESSIVA

Na posição depressiva, a libido predomina sobre a agressão, o bebê

reconhece que sua mãe tanto gratifica como frustra e ele se torna

ciente de sua própria agressão voltada em direção a ela. O

reconhecimento da mãe como uma pessoa integral torna a criança

vulnerável à perda, especialmente perda causada pela agressão da

criança. O mecanismo da idealização evolui durante o período

depressivo na idealização do objeto bom (mãe) como uma defesa contra

a agressão da criança em direção a ela e sua culpa acompanhante. Este

tipo de idealização conduz a uma superdependência sobre outros.

Os maus aspectos de pessoas necessárias são negados, levando a um

empobrecimento tanto da experiência de realidade como da testagem

de realidade. A posição depressiva também mobiliza defesas maníacas,

cuja principal característica é a negação de realidades psíquicas

dolorosas. Sentimentos ambivalentes e dependência de outros são

negados; objetos são onipotentemente controlados e tratados com

desprezo, de modo que a sua perda não dá lugar a dor ou culpa.

e) TEORIA DO SUPEREGO

O superego kleiniano funciona como o superego freudiano clássico. Ele

coloca valor sobre o comportamento e ele pune ou proíbe o

comportamento que ele considera ser errado ou mau. Klein sustentou

que o desenvolvimento do superego começa durante a posição

depressiva; a pressão de superego excessiva causa regressão para a


29

posição esquizo-paranóide. O superego desenvolve-se de maus objetos

projetados cindidos experimentados como persecutórios, que são

posteriormente introjetados.

Culpa é a reação aos impulsos sádicos atribuída a estes introjetos que

se tornam parte do self. No período depressivo, os objetos são

introjetados tanto no ego como no superego. O ego assimila os objetos

com os quais ele pode identificar-se positivamente. O superego assimila

os aspectos proibitivos exigentes destes objetos.

O predomínio normal de amor sobre ódio na posição depressiva resulta

na internalização de objetos principalmente bons no superego. Estes

objetos bons neutralizam os objetos internos maus, mas mesmo sob

circunstâncias ideais predominantemente bons objetos de superego são

contaminados pelos objetos maus. O superego, portanto, tem

qualidades persecutórias (derivadas de introjeções persecutórios) e

exigentes (derivadas dos aspectos exigentes dos pais bons

idealizados).

Através da culpa ou preocupação em relação à perda de amor parental,

o superego protege seus objetos bons introjetados. Quanto mais

idealizados são os bons objetos contidos no superego, mais

perfeccionistas são as exigências do superego. A idealização de

objetos internos bons geralmente conduz a bom comportamento.


30

f) ESTÁGIOS INICIAIS DO COMPLEXO DE ÉDIPO

Os estágios iniciais do complexo de Édipo começam durante a posição

depressiva. Klein supôs um conhecimento inato dos genitais de ambos sexos,

com fantasias orais e genitais influentes desde o nascimento em diante. O

desejo por dependência oral da mãe é deslocado para o pai. Ansiar pelo seio

bom torna-se um desejo pelo pênis do pai. O seio mau é também deslocado

para o pênis mau. A predominância nos meninos de uma boa imagem do pênis

do pai promove o desenvolvimento do complexo de Édipo positivo; confiar em

um pai bom e dotar a mãe com um pênis bom inicia um complexo de Édipo

positivo em meninas (imaginarização e anulação do enigma).

Quando a agressão predomina, o menino edípico vê o pai como um

perigoso castrador potencial. O medo de castração é, de fato, o medo

do desejo oral-sádico projetado de destruir o pênis do pai. Este medo

torna a identificação com o pai difícil e predispõe à inibição sexual e

medo de mulheres. Culpa em relação à agressão em direção ao pai

reforça a repressão do complexo de Édipo. Boas experiências orais em

meninas resultam na expectativa de um pênis bom; esta expectativa

baseia-se na experiência de um seio bom.

Agressão excessiva em meninas pode dar lugar a fantasias

inconscientes de roubar a mãe do amor, do pênis e dos bebês do pai e

pode estimular medos de retaliação materna. Em meninas, os desejos

orais e genitais pelo pênis do pai combinam com inveja do pênis

desenvolvendo-se como um derivativo da inveja do seio interior. Deste

modo, a inveja do pênis deriva de sadismo oral e não é uma inveja


31

primária dos genitais masculinos ou um aspecto primário da sexualidade

feminina.

À medida que a cisão decresce durante o primeiro ano de vida, a

criança torna-se ciente de que bons e maus objetos externos são em

realidade um só. Os bebês então reconhecem sua agressão em direção

ao objeto bom e também reconhecem os aspectos bons das pessoas a

quem eles atacaram por ser más.

Este reconhecimento corta o mecanismo de projeção. Além disso, as

crianças tornam-se cientes das suas próprias partes infernais, mas, em

contraste com o medo de prejuízo externo encontrado na posição

esquizo-paranoide, o medo principal na posição depressiva é de

prejudicar os objetos externos e internos bons daí a necessidade para

o superego.

A tarefa emocional principal da posição depressiva é lidar com o medo

do ego de perder os objetos externos e internos bons. As reações

emocionais correspondentes são ansiedade e culpa. A preservação de

objetos bons torna-se mais importante do que preservar o próprio ego.

Objetos maus internalizados que foram anteriormente projetados

compõem o ego primário, o qual ataca o ego com sentimentos de culpa.

Os maus objetos dentro do superego, conforme observado acima, podem

contaminar os bons objetos internos do superego que se tornaram

incorporados no superego devido às suas demandas por determinados

tipos de comportamento (eu amarei você se você fizer bem as suas

tarefas; eu aceitarei você apenas se você trabalhar duro).


32

g) REPARAÇÃO

Normalmente, os mecanismos de reparação, aumentados pela testagem

de realidade, aceitação de ambivalência, gratidão e luto capacitam a

criança a resolver o período depressivo. A reparação, o antecedente da

sublimação, é um esforço saudável para reduzir culpa em relação a ter

atacado o objeto bom tentando reparar o dano, expressando amor e

gratidão e assim, preservando-o.

A criança chora, corre para a mãe, joga seus braços ao redor

dela e diz "desculpa".

A testagem de realidade aumentada resulta na cisão reduzida e na

capacidade crescente de avaliar objetos inteiros e o self total. Os

objetos introjetados são vistos como inteiros e vivos, ao invés de como

fragmentos autônomos. Através de ser amadas, as crianças vêm a

enxergar a si mesmas e a seus objetos internos como bons. A crescente

percepção de amar e odiar a mesma pessoa promove a capacidade de

experimentar e tolerar ambivalência, idealmente com uma

preponderância de amor sobre ódio.

Klein acreditou que o luto normalmente reativa a culpa da posição

depressiva, a diferença sendo que, durante o desmame na posição

depressiva, a mãe boa real ainda está presente e ajuda o bebê a

reconstituir e consolidar objetos internos bons.


33

h) FIXAÇÃO

Muitos tipos de psicopatologia severa são atribuídos à fixação em uma

das duas posições kleinianas. A fixação na posição esquizo-paranoide

conduz a alguns transtornos psicóticos. Os transtornos psicóticos em

geral negam a realidade, usam projeção extensamente e engajam-se em

dissociação. Escape para um objeto interno idealizado conduz a estados

exaltados autistas; dissociação generalizada e reintrojeção de objetos

fragmentados múltiplos conduz a estados de confusão.

Medo predominante de perseguidores externos é a marca registrada

do transtorno delirante; projeção de perseguidores sobre o próprio

corpo resulta em hipocondríase. As pessoas com transtorno de

personalidade esquizoide são emocionalmente superficiais e

intolerantes de culpa, tendem a experimentar os outros como hostis e

retraem-se de relações de objeto.

A partir da fixação, na posição depressiva vem o luto patológico

(depressão) ou o desenvolvimento excessivo de defesas maníacas. O

luto patológico resulta da destruição fantasiada por ataque sádico de

objetos internos e externos bons. Os objetos internos maus que

permanecem funcionam como um superego sádico primitivo evocando

culpa excessiva e estimulando o sentimento de que todos os objetos

bons estão mortos e que o mundo não tem amor (melancolia).

O superego sádico é cruel, exige perfeição e opõe-se aos instintos.

Tentativas são feitas para idealizar objetos externos como um meio de

autopreservação; deste modo, quaisquer reprovações são feitas contra


34

o eu, ao invés de aos outros. O suicídio pode incorporar a noção de que

o objeto externo bom pode ser preservado apenas através da

destruição do self mau.

i) DEFESAS MANÍACAS

Síndromes hipomaníacas e maníacas são promovidas por um predomínio

de defesas maníacas, incluindo onipotência, identificação com o

superego, introjeção, o triunfo maníaco e idealização maníaca. A

onipotência resulta da identificação com um objeto bom idealizado e

negação do resto da realidade. A identificação com um superego sádico

permite que objetos externos sejam tratados com desprezo. A

introjeção é manifestada como fome de objeto, com negação de perigo

para e dos objetos;

O triunfo maníaco é manifestado por um senso de ter conquistado o

mundo; e idealização maníaca é manifestada por fantasias de fusão com

deus.

TÉCNICA:

Klein acreditava que todas as situações produtoras de ansiedade,

incluindo a hora analítica, reativam ansiedades das posições paranóide,

esquizóide e depressiva. As defesas e medos primitivos são

interpretados da primeira sessão em diante tão profundamente quanto

possível e envolvem material tanto de transferência (você deseja me


35

aniquilar) como de não transferência (você desejou eliminar o seio mau

da sua mãe).

A mesma técnica é usada com todos os pacientes, focalizando sobre

fantasias inconscientes que representam o conteúdo e as operações

defensivas nos níveis mais primitivos da mente. A técnica foi usada até

mesmo com crianças com menos de 6 anos de idade, usando seu

brinquedo livre como a base para a interpretação em sessões de 50

minutos cinco dias por semana. Para Klein, o brinquedo livre de uma

criança era análogo as livre-associações de um adulto.

Suas visões opuseram-se às de Anna Freud, a outra analista infantil

dominante do dia que sustentava que a análise do complexo de Édipo de

crianças pré-latência não é possível, já que ela pode interferir com

relacionamentos parentais; a análise desta criança é em grande parte

uma experiência educacional para a criança; que uma neurose de

transferência não pode ser efetuada devido à atividade dos pais na vida

diária da criança; e que o analista deveria fazer todo o esforço para

obter a confiança da criança.

Klein sustentou que uma neurose de transferência pode ser efetuada e

então resolvida por interpretação. Ao invés de tentar obter favores

com a criança, Klein imediatamente interpretava transferências

negativas (você quer se ver livre de mim) e verificou que fazer isso

aliviava a ansiedade ao invés de intensificá-la.


36

Terapeutas kleinianos são interessados em tratar pacientes nos

quais conflitos e defesas primitivos predominam. Eles fazem isso

assumindo uma posição estritamente interpretativa, interpretando

tanto aspectos negativos como positivos da transferência, mas

especialmente enfatizando os aspectos negativos.

4. PRINCIPAIS MECANISMOS DE DEFESA DO EGO NA OBRA DE


DONNALD WINNICOT (1960)

• Verdadeiro e Falso self

• Potencia - Onipotência

• Criatividade

• Pedidos de Socorro do Ego

• Concernimento

Verdadeiro e falso self, a cisão do self

Winnicott desenvolve o conceito de verdadeiro e falso self tomando como

partida a idéia de Freud de self constituído por um núcleo central que é

controlado pelos instintos e uma outra parte voltada para o exterior e

relacionada com o mundo.

Distanciando-se agora de Freud, Winnicott se preocupa em estudar os

diferentes níveis de cisão entre verdadeiro e falso self. Para isso ele parte do

pressuposto que considera a cisão entre verdadeiro e falso self como um

estado essencial inerente a todo ser humano saudável. O que vai determinar a
37

cisão entre verdadeiro e falso self como um aspecto da saúde ou não é a

relação que o indivíduo mantém entre o mundo subjetivo e a realidade.

Para Winnicott, na saúde essa cisão ocorre num grau de normalidade onde o

indivíduo se relaciona com a realidade mas mantém uma ligação com o mundo

subjetivo (verdadeiro self). Na patologia o indivíduo tipo falso self funciona

como um objeto do mundo sem noção de si mesmo.

Usando exemplos da literatura para estabelecer distinções entre os aspectos

relacionados a uma personalidade do tipo falso self e outra do tipo verdadeiro

self. Para tanto escolheu-se a personagem Macabéa da Clarisse Lispector no

livro Hora da Estrela como exemplo de alguém que nutre um sentimento

profundo e verdadeiro de self em oposição a poeta Silva Plath que escreve

sobre o drama de viver sentimentos de irrealidade e futilidade próprios de

uma personalidade tipo falso self.

Falso self – mecanismo de defesa

As esquizofrenias (e patologias borderline) formam-se no que Winnicott

denomina estágio de dependência absoluta, no qual o bebê vive totalmente

fusionado (a quem cuida dele, mãe ou substituto) e sofre as falhas ambientais

de forma também absoluta, tendo de formar um falso self cindido para lidar

com elas, quando ultrapassam certo limiar de suportabilidade.

Então, esse falso self, na função de escudo protetor, mantém o self verdadeiro

resguardado do perigo, isolando-o tanto do ambiente perigoso quanto dos


38

impulsos instintivos (ainda não apropriados), que se tornam ameaçadores

quando não são satisfeitos pelo ambiente num tempo adequado. Isolado dessa

forma, o self verdadeiro está fadado a permanecer num estado primário de

não integração (ou de integração insipiente).

Por outro lado, o falso self – tornado a ponte de ligação com o mundo, quando

sobrecarregado, sofre decomposições (já que é tão somente uma casca

exterior, formada por mimetizações ambientais) . Quando o falso self falha, o

self verdadeiro é obrigado a expor as suas cisões e fragmentações originárias

no confronto com as demandas ambientais, aí sem mediações. Então, o psíquico

é praticamente invadido pelo mundo, produzindo estados fusionais e

confusionais de grande magnitude (o assim chamado surto esquizofrênico).

Nessa concepção, o estado borderline designa a esquizofrenia latente, nos

períodos em que o falso self funciona a contento, propiciando um escudo

protetor ao self verdadeiro e algum tipo de adaptação ambiental possível.

Na patologia o falso self é:

 Usado e tratado como real – o indivíduo nutre sentimentos de

irrealidade e futilidade

 Construído na submissão – os impulsos instintivos cedem a função de

auto-preservação usado como escudo na função defensiva de proteção

do self verdadeiro – dissociação entre a mente e o psicosoma (splitting).

 A patologia típica Falso Selfica é o Transtorno Borderline de

Personalidade
39

Aspectos Constituintes da Personalidade na Teoria de Donald Winnicott

A obra de Winnicott é marcada pelo estudo de estágios primitivos na

constituição do desenvolvimento humano, principalmente ao que se diz a parte

emocional, com suas experiências como psicanalista e médico pediatra, deu

enfoque no desenvolvimento da criança.

De acordo com ZIMERMAN (1999) o desenvolvimento dentro dos padrões de

normalidade, para Winnicott, seria composto de três etapas: 1) a

personalização, ou seja, a formação da noção de um esquema corporal para o

bebê; 2) a fase de adaptação da realidade externa, onde o bebê nota-se ainda

como dependente da figura da mãe e entende o mundo real e objetivo e por

último a fase 3) onde ocorrem as descargas de agressividade ou crueldade

primitiva.

Nessas três fases citadas na obra Desenvolvimento emocional primitivo, em

1945, o teórico demonstra o desenvolvimento infantil, mas também

conjuntamente abrange as primeiras noções na sua teoria sobre a constituição

da personalidade adulta. Mas não só o papel da criança em desenvolvimento foi

observado pela análise winnicottiana, mas a relação da dupla mãe e bebê

(mãe-bebê), e como essa relação da criança “desamparada” com o seu apoio

materno busca a constituição de uma personalidade.

Outro ponto importante a ser abordado é a questão das relações objetais

desenvolvidas com a dupla mãe-bebê, Winnicott constrói o termo objeto

transicional para os primeiros objetos (reais) que o bebê manipula e deposita

atenção e afetuosidade, um exemplo seria uma chupeta, um brinquedo e etc.


40

O valor dessa primeira relação objetal está no fato de auxiliar na criação dos

sentimentos de confiança e criatividade da criança, nesse momento a figura

materna deverá agir como facilitadora desse processo.

Segundo LESCOVAR apud WINNICOTT (2001, p.46)

O início das relações objetais é complexo. Não pode ocorrer se o meio não

propiciar a apresentação de um objeto, feito de um modo que seja o bebê quem

crie o objeto. O padrão é o seguinte: o bebê desenvolve a expectativa vaga que

se origina em uma necessidade não formulada. A mãe, em se adaptando,

apresenta um objeto ou um manejo corporal que satisfaz as necessidades do

bebê, de modo que o bebê começa a se sentir confiante em ser capaz de criar

objetos e criar o mundo real. A mãe proporciona ao bebê um breve período em

que a onipotência é um fato da experiência.

Somente em 1960 é que Winnicott investe no estudo aprofundado das relações

entre pais e filhos, principalmente a questão do bebê e sua mãe, buscando uma

definição das funções da mãe (assim como o pai e o ambiente) para a

determinação da personalidade. Conceitos como preocupação materna

primária, ego auxiliar, e as funções essenciais da “mãe suficientemente boa”

serão indissociáveis para qualquer pesquisador que busque entender a teoria e

prática winnicottiana.

A Mãe Suficientemente Boa

Um dos aspectos mais trabalhados em Winnicott são as funções exercidas pela

mãe no desenvolvimento da personalidade do bebê, essas funções podem ser

resumidas como a qualidade de uma mãe ser “suficientemente boa”.

A “mãe suficientemente boa” de Winnicott, não condiz com um modelo materno

de padrões utópicos e onde se agrupa todas as características que retratam o


41

Bem, mas uma mãe que exerce na sua relação com o filho (a) qualidades

essenciais de apoio, proteção e aceitação.

De acordo com LOBO apud PHILLIPS (2008) se na França houve um retorno a

teoria freudiana, com Lacan, na escola psicanalítica britânica houve um retorno

a mãe e a todo contorno de significados importantes a maternagem, através

de Winnicott.

São três as características que devem estar presente na figura materna para

classifica - lá como

“suficientemente boa” de acordo com Winnicott, sendo elas conceituadas como

Holding,Handling, e a apresentação dos objetos.

Segundo MONTEIRO apud WINNICOTT, (1975); VALLER, (1990);

COUTINHO, (1997), “[...] nos primeiros meses da vida do bebê, a “mãe

suficientemente boa” tem três funções, assim sintetizadas por Winnicott:

holding (sustentação), handling (manejo) e a apresentação dos objetos”.

Especificando esses termos, temos o holding como à “sustentação” praticada

pela mãe ao bebê, um conjunto de comportamentos que visam apoiar a criança,

como a amamentação, firmeza, o carinho e entre outras ações para satisfação

a dupla. O handling faz referência à manipulação do bebê pelas mãos

cuidadosas da mãe, e contato físico da dupla, que construirá as noções

corporais ainda frágeis do bebê; e por último temos a apresentação dos

objetos como à qualidade da mãe demonstrar-se como passível de ser

substituída, e apresentar novos modos da criança agir no ambiente, por conta

do seu próprio esforço e criatividade.

Winnicott afirmou, várias vezes, que pouco ou nada havia contribuído para a

teoria e a técnica psicanalítica relativas às neuroses.


42

De fato, ninguém negaria uma maior importância às suas pesquisas sobre os

períodos mais primitivos do desenvolvimento infantil, envolvendo contribuições

à etiologia das esquizofrenias (e dos estados borderline). Ou deixaria de

destacar a sua forma original de compreender as diversas formas de

delinquência e de tendência anti-social, associando-as a um certo tipo de

privação ambiental e descrevendo os seus sintomas como pedidos de socorro.

De forma análoga, não poderia desconsiderar as suas complexas elaborações

sobre o estágio do concernimento e a formação de toda a gama de patologias

depressivas.

Winnicott, especialmente em seu trabalho “O desenvolvimento da capacidade

de concernimento” , ao examinar as relações entre mãe e bebê, identifica um

estágio que ele chama concernimento (concern), em que a criança pode, ou não,

começar a desenvolver a capacidade de importar-se-com, de se preocupar com,

o outro, de sentir e aceitar responsabilidade. Em seu sentido negativo, o

concernimento pode ser definido como sentimento de culpa; para Winnicott, a

capacidade para sentir culpa pode ser considerada o fundamento da moralidade:

o que nos leva à responsabilidade pelos possíveis danos que possamos provocar

nos outros em nossa relação com eles.


43

5.MECANISMOS DE DEFESA NA TEORIA DA VINCULARIDADE

DE WILFRED RUPRECHT BION

O psicanalista britânico Wilfred Ruprecht Bion (1897-1979) integrou as ideias

de Sigmund Freud e Melanie Klein de modo inovador, sem se deixar levar pelas

disputas teóricas que ameaçavam transformar a psicanálise em um dogma.

Embora ainda seja relativamente pouco conhecido por quem não pertence

diretamente à área “psi”, merece ser considerado um dos gênios da psicanálise

e um verdadeiro inovador da teoria, técnica e prática clínica deste campo.

Nascido na Índia, Bion estudou medicina, letras, história, filosofia e teologia e

preenche os requisitos necessários para ser caracterizado como fundador de

uma nova escola de psicanálise, que pode ser denominada vincular-dialética, se

levarmos em conta que a ênfase do psicanalista recai sobre a importância dos

“vínculos” internos e externos presentes em toda pessoa e respectivos grupos

de convívio. O modelo “dialético” implica nova maneira de ver a relação entre

analista e analisando, o que implica capacidade de “pensar” as experiências

emocionais.

Bion foi psiquiatra no exército britânico durante a Segunda Guerra Mundial,

diretor da Clínica de Psicanálise de Londres, de 1956 a 1962, e presidente da

Sociedade Psicanalítica Britânica, de 1962 a 1965. Acompanhando o crescente

movimento de psicoterapia de grupo da sua época, lançou obras consideradas

relevantes ainda nos dias atuais, como Experiências com grupos (1961), O

aprender com a experiência ( 1962) e Transformações (1965).

Mecanismos de Defesa na Obra de Bion

• Vinculo amor/ ódio

• Conhecimento /ataque ao conhecimento ( instinto epistemológico)


44

• Amor a verdade / mentira

• Reconhecimento

• Defesas contra a inveja:

- desvalorização

- negação

- bajulação

- projeção

- idealização

- retirada (medo do sucesso e do amor, inveja de si mesmo)

A TEORIA VINCULAR E MECANISMOS DE DEFESA

a.) Vinculo uma estrutura relacional emocional entre duas ou mais pessoas

ou entre duas ou mais partes da mesma pessoa.

b.) O que estabelece o vinculo é a emoção, sem emoção não há Vinculo

c.) A dupla face da emoção:

• Amor (L) e Ódio (H)

• Amor (+ L), menos Amor (- L)

• Ódio (+ H), menos Ódio ( - H)

• Menos Ódio não é Amor

• Menos Amor não é Ódio


45

Como consequência do acima exposto pode-se concluir que se o individuo

tem um sistema vincular harmônico, provavelmente isto ocorrerá

também com os vínculos interpessoais.

d.) Vinculo de Ódio (três tipos):

• Aqueles que não conseguem odiar

• Aqueles que não conseguem parar de odiar

• Aqueles que odeiam e perdoam

e.) Vinculo do Amor:

• Amor Erótico

• Amor Platônico

• Amor tirânico Obsessivo (Sádico) – Neurose Obsessivo

Compulsiva Amor Dependente (Masoquista) – Neurose Histérica

f.) Vinculo do Conhecimento

• Querer conhecer a Verdade

• Ter posse da Verdade

• Amor à Verdade

• Verdade em Paradoxos

A onipotência substitui o pensamento conceitual, a onisciência a

capacidade de aprendizado com a experiência.


46

A prepotência no lugar da dependência, a confusão e ambiguidade

substitui a capacidade de discernir, o Supra Ego (David Zimerman)

dita as próprias leis e fica no lugar do juízo crítico e da autocrítica.

A imitação substitui uma verdadeira identificação, de modo que

um falso self pode ocupar o espaço do verdadeiro Self.

g.) Vinculo do Reconhecimento (David Zimerman)

• Certeza de ser aceito

• Respeitado

• Reconhecido pela forma de ser, reconhecendo o outro ( Alter

Ego)

A respeito da inveja, Bion utilizou os conceitos kleinianos, dando ênfase à

importância dos mecanismos de defesa do ego e da permanente interação da

“posição esquizoparanoide ”com a “posição depressiva”, havendo uma

alternância entre elas, o que considera muito importante para a criatividade.

Tal como Winnicott, Bion tem uma visão positiva destes mecanismos.

Zimerman nos traz que, para Bion, os mecanismos de defesa do ego são

“diferentes formas de evasões da verdade, através de mentiras e

falsificações” e são utilizados pelos indivíduos para negar as verdades penosas,

que são substituídas por diversas formas de fugas e falsificações.


47

Assim como em Melanie Klein, Bion acredita que se a criança possui uma

excessiva inveja ou “demanda insaciável”, fica diminuída a possibilidade da mãe

de estar sendo “suficientemente boa”, como nos diz Winnicott. Semelhante a

este, Bion considera como de fundamental importância no desenvolvimento da

criança as influências do ambiente, dispensando especial atenção à

necessidade dos cuidados da mãe. Se ela não conseguir atuar de forma

adequada, resultará na criança um aumento de sentimentos de rejeição e de

culpa.

Para Bion é de vital importância o vínculo que se estabelece entre mãe e

bebê, havendo desde cedo uma empatia entre eles, tornando possível uma

comunicação não-verbal.

Bion se aprofundou no entendimento da mente das pessoas, levando em

consideração tanto o consciente como o inconsciente, a realidade interna,

quanto a realidade externa, ou seja, o ambiente. Ele nos enfatiza a desarmonia

que existe na mente humana, onde sentimentos opostos emergem, a todo

momento, considerando a necessidade das pessoas em conhecer essas

diferentes partes de seu psiquismo para conseguir uma convivência harmônica

entre elas.

Assim, oferece grande contribuição aos estudos a respeito do indivíduo dentro

dos grupos e das dinâmicas dos grupos, em que cada um conquista seu espaço

no grupo, que possui direitos e deveres, percebendo a realidade vigente entre

os participantes e sentindo-se como fazendo parte do grupo, que representa,

inconscientemente, aqueles primeiros cuidados da mãe para com ele.


48

Defesas do Ego nos Mecanismos de Funcionamento no Grupo

 Dependência

 Acasalamento

 Luta e fuga

 Trabalho

Mecanismos de Defesa da Inveja

Manfred F. R. Kets de Vries cita La Rouchefoucauld (apud Chanlat, 1996, p.

71), quando escreve que “a inveja é uma paixão tímida e vergonhosa, que nunca

nos atrevemos a confessar” e complementa que “de fato, reconhecer a

presença da inveja em si mesmo equivale a admitir um sentimento de

inferioridade”. Para este autor, o ser humano tem uma tendência a esconder a

sua inveja, pois tem vergonha dela, e para tal utiliza-se de uma mistura

complexa de mecanismos de defesa. O uso de um mecanismo não exclui o outro,

podendo ser utilizados vários mecanismos ao mesmo tempo, e essa

conformação não é fixa, ou seja, os mecanismos usados em um determinado

momento poderão evoluir para outros, em outro momento.

Na teoria psicanalítica, as defesas contra a inveja são diversas e reforçam-se

mutuamente, sendo as principais: desvalorização, negação, bajulação, projeção,

idealização e retirada.
49

• Desvalorização é o “denegrimento das boas qualidades do objeto”, ou

seja, visa destruir as qualidades do que é invejado. Os indivíduos que a

utilizam podem ter o desejo de vingança e/ou de provar que são

melhores que aquele que invejam, e para isso usam a maledicência, as

críticas negativas e a humilhação.

• Negação: há uma dificuldade do invejoso em aceitar esse sentimento

de inveja e para isso nega-o, evitando o encontro com o outro, de quem

tem inveja.

• Bajulação: Outra forma de camuflar seus sentimentos de inveja é

através da bajulação do invejoso para com a pessoa invejada,

demonstrando apreço a ele e ressaltando suas qualidades, mas quando

aquele não está presente, faz o contrário, denegrindo sua imagem.

• Projeção: quando utiliza a projeção, o indivíduo também nega seus

sentimentos e se vê como uma pessoa não-invejosa, e projeta a inveja,

que não aceita nos outros, percebendo os como pessoas invejosas e

destrutivas.

• Idealização: o indivíduo procura colocar a pessoa invejada fora de seu

alcance, exacerbando suas qualidades e atributos, colocando-a acima

dos “mortais” (mitos, heróis, super-homens, etc.), coloca-a em um

“pedestal”, sendo que esse exagero representa uma tentativa de

diminuir sua inveja; o invejoso se coloca numa posição muito inferior,

afirmando que não é possível para ele ser ou ter aquilo tudo. O invejoso

que se utiliza deste mecanismo poderá “derrubar” a pessoa invejada na


50

primeira oportunidade que tiver, ressaltando nesta, a todos, o quanto

aquela pessoa não “era aquilo tudo” que parecia.

• Retirada: ocorre quando o indivíduo se sente incapaz de tolerar seu

próprio sentimento de inveja; ele nem tenta entrar em competição, e

procura desvalorizar-se a si mesmo. Este comportamento é

característico da “síndrome do medo de sucesso” para não causar inveja,

ou seja, não busca seu crescimento para não ser vítima da inveja.

Em todos estes Mecanismos, o invejoso pode até perceber seus

sentimentos de inveja, mas não os aceita e não consegue lidar com eles,

gerando maiores dificuldades para si e para os outros em seu convívio.

Freud e Melanie Klein no desenvolvimento conceitual da psicanalise se

basearam no estudo das psicopatologias do ego e, portanto, estudaram os

MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA correlacionados a visão de um

“inconsciente doente”.

Winnicott e Bion têm uma visão do desenvolvimento ANORMAL, mas também

do desenvolvimento

Normal do EGO. E, portanto conceituam MECANISMOS DE DEFESA

SUPERIORES, correspondentes a uma percepção de um inconsciente normal.

Autores contemporâneos como Fenichel, Gabbard, e outros conceituam

MECANISMOS SUPERIORES e MECANISMOS MADUROS DE DEFESA,

como sequência ao pensamento de Winnicott e Bion.


51

MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA

Defesas Primitivas

REPRESSÃO

Em princípio, a repressão é definida como método de defesa usado pela mente

humana para evitar que a consciência tenha acesso às representações

desconfortáveis, ligadas ou não à pulsão frente às exigências do próprio ego.

O ego se organiza face ao perigo de perder o controle e fazer uma loucura.

Também pelos medos: o medo menor de ser julgado, condenado e punido e o

medo maior, de ser aniquilado. Assim, esse mecanismo de defesa controla a

pulsão, organiza o ego e assegura o amor do objeto (ALMEIDA, 1996).

De acordo com Glassman e Hadad (2008, p. 251)

A repressão é definida como o bloqueio das pulsões do id no nível do

inconsciente, é o mais primitivo de todos os mecanismos de defesa [...] a

dificuldade básica é que ela não consegue resolver as exigências que conduzem

a seu uso, porque não ocorre nenhuma gratificação. Pior ainda, pode requerer

quantidades significativas de energia mental para manter o bloqueio contra as

crescentes pressões por gratificação [...] a repressão pode também produzir

distorções da realidade, como quando são bloqueadas as lembranças que

poderiam desencadear o escoamento de conflitos básicos para a consciência.

De acordo com Glassman e Hadad (2008, p. 251)


52

PROJEÇÃO

A projeção faz parte da dinâmica relacional, pois para ela existir tem que

existir o outro, a quem um primeiro sujeito atribui qualidades semelhantes às

de seu mundo interior. O sujeito projeta o que nega em si próprio, em função

do desconforto psíquico e da ansiedade gerada, no plano inconsciente,

atribuindo ao outro, qualidades, sentimentos ou desejos que seriam

originalmente seus (ALMEIDA, 1996).

De acordo com Freud, o efeito do mecanismo de projeção busca romper a

ligação entre os representantes ideativos das moções pulsionais perigosas e o

ego, impedindo que seja percebido deslocando para o mundo externo.

Manifesta-se a projeção quando o Ego não aceita reconhecer um impulso

inaceitável do Id e o atribui à outra pessoa. É o caso do menino que gostaria

de roubar frutas do vizinho sem, entretanto, ter coragem para tanto, e diz

que soube que um menino, na mesma rua, esteve tentando pular o muro do

vizinho (FENICHEL, 2000).

DISSOCIAÇÃO

Dentro da hierarquia dos mecanismos de defesa, enquadra-se a dissociação

como uma das defesas primitivas. Gabbard (2005) assim o descreve:

Interromper o senso pessoal de continuidade nas áreas de identidade,

memória, consciência ou percepção como modo de preservar uma ilusão de


53

controle psicológico diante do desamparo e perda de controle. Ainda que

semelhante à cisão, a dissociação pode em casos extremos envolver alteração

de memória de eventos devido à desvinculação do self no evento.

NEGAÇÃO

O mecanismo de defesa denominado “negação” tem como origem a repressão;

ou seja, as imagens têm acesso à consciência de modo parcial, contudo, são

negadas, sendo temporariamente removidas ou reprimidas. A negação da

realidade, adiamento de compromissos, recusa a enfrentamentos

desagradáveis, doenças imaginárias, criam falsas situações para evitar a

realidade neste mecanismo de defesa (ALMEIDA, 1996).

REGRESSÃO

É o processo psíquico em que o Ego recua, fugindo de situações conflitivas

atuais, para um estágio anterior. É o caso de alguém que depois de repetidas

frustrações na área sexual, regrida, para obter satisfações, à fase oral,

passando a comer em excesso. Considerada em sentido tópico, a regressão se

dá, de acordo com Freud, ao longo de uma sucessão de sistemas psíquicos que

a excitação percorre normalmente segundo determinada direção.

No seu sentido temporal, a regressão supõe uma sucessão genética e designa

o retorno do sujeito a etapas ultrapassadas do seu desenvolvimento (fases

libidinais, relações de objeto, identificações, etc.).No sentido formal, a


54

regressão designa a passagem a modos de expressão e de comportamento de

nível inferior do ponto de vista da complexidade, da estruturação e da

diferenciação.

A regressão é uma noção de uso muito frequente em Psicanálise e na Psicologia

contemporânea; é concebida, a maioria das vezes, como um retorno a formas

anteriores do desenvolvimento do pensamento, das relações de objeto e da

estruturação do comportamento.

Freud é levado então a diferenciar o conceito de regressão, como o demonstra

esta passagem acrescentada em 1914 em três espécies de regressões:

a) Tópica, no sentido do esquema do aparelho psíquico. A regressão tópica é

particularmente manifestada no sonho, onde ela prossegue até o fim.

Encontra-se em outros processos patológicos em que é menos global

(alucinação) ou mesmo em processos normais em que vai menos longe

(memória).

b) Temporal, em que são retomadas formações psíquicas mais antigas.

c) Formal, quando os modos de expressão e de figuração habituais são

substituídos por modos primitivos. Estas três formas de regressão, na sua

base, são apenas uma, e na maioria dos casos coincidem, porque o que é

mais antigo no tempo é igualmente primitivo na forma e, na tópica psíquica,

situa-se mais peto da extremidade perceptiva.


55

MECANISMOS SUPERIORES DE DEFESA

DEFESAS DE NÍVEL SUPERIOR (Neuróticas)

IDENTIFICAÇÃO

A identificação envolve a incorporação de características de um objeto da

pulsão no ego da própria pessoa (GLASSMAN, HADAD, 2008).

Conforme Almeida (2006), a identificação pode ser estudada em dois vieses:

O da estimulação do psiquismo humano, e o da atividade defensiva do ego. O

primeiro permite a humanização do sujeito, seu crescimento afetivo,

intelectual, social e espiritual. O indivíduo toma outra pessoa como modelo e

assimila dela um aspecto, permitindo-se uma transformação total ou parcial.

No segundo, o indivíduo agredido identifica-se com o agressor a ponto de

assumir, não só a sua ideologia ou atitude agressiva, mas também o seu

compromisso social, conceitos morais, simbolismo e postura física.

DESLOCAMENTO

De acordo com Fenichel (2000), deslocamento é um processo psíquico pelo qual

o todo é representado por uma parte ou vice-versa. Também pode ser uma

ideia representada por outra, que, emocionalmente, esteja associada a ela.

Esse mecanismo não tem qualquer compromisso com a lógica. É o caso de alguém

que, tendo tido uma experiência desagradável com um policial, reaja

desdenhosamente, em relação a todos os policiais.


56

É muito corrente nos sonhos, onde uma coisa representa outra. Também se

manifesta na Transferência, fazendo com que o indivíduo apresente

sentimentos em relação a uma pessoa que, na verdade, lhe representa outra

pessoa do seu passado (FENICHEL, 2000).

Através dele, descarregamos sentimentos acumulados, em geral, sentimentos

agressivos, em pessoas ou objetos menos perigosos. Ex. suportamos o mau

humor do chefe e em casa brigamos com os filhos ou chutamos o cachorro.

FORMAÇÃO REATIVA

Consoante Gabbard (2005), a formação reativa enquadra-se dentre os

mecanismos de defesa de nível superior ou defesas neuróticas, com a seguinte

descrição: “Transformar um desejo ou impulso em seu oposto.”

Caracteriza-se por uma atitude ou um hábito psicológico com sentido oposto

ao desejo recalcado. P.ex. desejos sexuais intensos podem ser transformados

em comportamentos extremamente pudorosos. Estes desejos são sentidos

como perigosos; ou seja, que o indivíduo perderia seu controle caso cedesse a

eles. Firmar-se em uma atitude moralista, ou seja, atuar contrariamente ao

que se deseja é um meio de auto-preservação.


57

RACIONALIZAÇÃO

De acordo com Almeida (1996), é o mecanismo de defesa que compreende uma

necessidade psíquica que motiva o organismo em direção à meta a ser

alcançada, pode ocorrer um desejo oriundo do anseio de querer da cobiça

consciente, ou de desejos mais primitivos, inconscientes relacionados à pulsão

sexual.

Quando ocorre um conflito que causa ameaça à psiqué, surge este mecanismo

de defesa com a finalidade de recobrar o equilíbrio; de maneira inconsciente,

o mecanismo seleciona as escolhas, intelectualizando cada uma delas

(ALMEIDA, 1996).

É importante não confundir racionalização com pensamento racional, pelo fato

de que o pensamento racional leva a razões boas e justas, enquanto a

racionalização quer alcançar boas razões para explicar os comportamentos,

(ALMEIDA, 1996).

SEXUALIZAÇÃO

Emprestar significado sexual a um objeto ou a uma atividade para transformar

uma experiência negativa em excitante ou estimulante ou ainda para afastar

ansiedades associadas ao objeto.

Ex: quando em um ambiente de trabalho as pressões são demasiadas, as

pessoas podem sexualizar (erotizar) colegas para se defenderem da angustia.


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ASCETISMO

Tentativa de eliminar aspectos prazerosos da experiência em função de

conflitos internos produzidos por tal prazer. Este mecanismo pode estar a

serviço de objetivos transcendentes ou espirituais, como no celibato.

ANTECIPAÇÃO

Retardamento de gratificação imediata ao planejar e pensar sobre realizações

futuras.

MECANISMOS MADUROS DE DEFESA

RENÚNCIA ALTRUÍSTICA

Arrolada por Gabbard (2005), como um dos mecanismos maduros, renúncia

altruística ou simplesmente altruísmo, consiste em “Comprometer-se com as

necessidades dos outros mais do que com as próprias. O comportamento

altruísta pode ser utilizado a serviço de problemas narcisistas, mas pode

também ser fonte de grandes realizações e contribuições à sociedade.”

SUBLIMAÇÃO

De acordo com Fenichel (2000), Sublimação é o mais eficaz dos mecanismos

de defesa, na medida em que canaliza os impulsos libidinais para uma postura


59

socialmente útil e aceitável. Ainda, conforme o autor, as defesas bem-

sucedidas podem colocar-se sob o título de sublimação, expressão que não

designa mecanismo específico; vários mecanismos podem usar-se nas defesas

bem sucedidas; por exemplo, a transformação da passividade em atividade; o

rodeio em volta do assunto, a inversão de certo objetivo no objetivo oposto.

O fator comum está em que, sob a influência do ego, a finalidade ou o objeto

(ou um e outro) se transforma, sem bloquear a descarga adequada. Na

sublimação, cessa o impulso original pelo fato de que a respectiva energia é

retirada em benefício da catexia do seu substituto. Nas outras defesas, a

libido do impulso original é contida por uma contra catexia elevada.

HUMOR

Freud discute pela primeira vez a respeito das formas de comicidade em 1905,

na obra Os chistes e sua relação com o inconsciente. O assunto é trazido

novamente à tona mais de vinte anos depois, no texto O humor (1927), produzido

pelo autor para ser a abertura do X Congresso Psicanalítico Internacional que

ocorre em Innsbruck.

Em princípio, Freud diferencia os chistes do humor. De acordo com Ribeiro

(2008), Freud diferencia-os inclusive quanto as suas origens no Inconsciente:

O chiste é construído por uma ideia recalcada no Inconsciente, que sob certa

pressão, força passagem surgindo pronto na Consciência.


60

É uma formação do Inconsciente, assim como os sonhos, os atos falhos e os

sintomas. (...) Já o humor tem sua origem no Pré-consciente, por atuação do

Superego, na evitação de um sentimento doloroso iminente. Não tem a mesma

explosão de prazer e riso encontrados no chiste, porém é mais sublime e

enobrecedor.

Ambos estão a serviço do princípio do prazer, mas de formas diferentes,

e é bem verdade que o estudo do humor tem suas raízes nos chistes.

Outros mecanismos que, conquanto haja bastante repetição e ratificação

aqui, costumam caminhar longe das classificações mais tradicionais dos

grandes autores.

 Introjeção: mecanismo de defesa que consiste na adoção de regras e


comportamentos que podem nos livrar de uma situação ameaçadora ou
perigosa. Ela se inicia na infância, quando começamos a aceitar como nossas,
regras e valores sociais, não porque acreditávamos que isto fosse o correto a
fazer, já que ainda não tínhamos uma opinião formada sobre a vida, mas porque
isto nos foi imposto, tanto pela nossa família quanto pelo que éramos capazes
de perceber no comportamento dos que nos rodeavam e sabíamos que, “se não
dançássemos conforme a música”, seríamos punidos ou marginalizados.
Temos como exemplo o ditado popular: “se não pode vencê-los, junte-se a
eles”.[9]

 Intelectualização: "Eu sei, eu já li tudo isso! Não é bem assim, tem muita
discussão nova!". É quando se lida de modo intelectual com o problema,
afastando os afetos; assemelha-se ao isolamento e à racionalização.

 Anulação: ações, rituais mágicos que contestam ou desfazem um dano que


o indivíduo imagina que pode ser causado por seus desejos. Exemplo: fazer o
sinal da cruz para afastar um pensamento pecaminoso.
61

 Deslocamento: consiste em transferir as características ou atributos de um


determinado objeto para outro objeto. Exemplo: receber uma bronca do chefe
e, assim que chegar em casa, chutar o cachorro como se ele fosse o
responsável pela frustração.

 Idealização: consiste em atribuir a outro indivíduo qualidades de perfeição,


vendo o outro de modo ideal. É o que fazem os adolescentes com seus ídolos,
a quem consideram perfeitos.

 Substituição: o inconsciente oferece à consciência um substituto aceitável


para ela e por meio do qual ela pode satisfazer o id ou o superego. É a
satisfação imaginária do desejo. Processo pelo qual um objeto valorizado
emocionalmente, mas que não pode ser possuído, é inconscientemente
substituído por outro, que geralmente se assemelha ao proibido. É uma forma
de deslocamento. Um exemplo é o bebê chupar o dedo ou a chupeta para sentir
o prazer como se estivesse no seio da mãe.

 Fantasia: é um processo psíquico em que o indivíduo concebe uma situação


em sua mente, que satisfaz uma necessidade ou desejo, que não pode ser, na
vida real, satisfeito. Exemplo: Um homossexual que precisa manter o
casamento e que, quando procurado pela esposa para o sexo, fantasia que está
tendo relações homossexuais e não heterossexuais durante o ato. Fantasiar
pode ajudar em certos conflitos psicológicos, mas não "resolve" o conflito.
Certas pessoas podem passar a vida inteira fantasiando, mas, quando caem na
realidade, o conflito retorna.

 Compensação: é o processo psíquico em que o indivíduo se compensa por


alguma deficiência, pela imagem que tem de si próprio, por meio de um outro
aspecto que o caracterize, que ele, então, passa a considerar como um trunfo.
Exemplo: um aluno ruim nos esportes se consola por ser bom em matemática.

 Expiação: é o processo psíquico em que o indivíduo quer pagar pelo seu


erro imediatamente. Sendo que imediatamente quer dizer que a pessoa,
62

incapaz de lidar com o sentimento de culpa, precisa "expiar" ou projetar em


alguém já pré-determinado essa angústia. Para isso existem os tais "bodes
expiatórios" sempre prontos para levar a culpa.

 Clivagem: é a separação dos aspectos bons e maus do outro. Exemplo:


identificação com o agressor, negando o aspecto violento, como uma
sequestrada que se identifica com seu sequestrador.

 Resistência: é o processo de resistência ao trabalho terapêutico, no qual o


paciente tenta manter no inconsciente os acontecimentos esquecidos.

 Sentido de humor: posição ou uma atitude em relação ao sofrimento.


Freud enfatiza o caráter do humor como uma atitude subjetiva, uma "operação
elevada" que não depende de propósitos conscientes, mas de uma
necessidade inconsciente, tanto de quem o gera quanto de quem o recebe. O
senso de humor facilita a conexão com o inconsciente, e a conexão com o
inconsciente facilita o senso de humor.

 Fixação: Fixação é uma atividade defensiva regressiva, mecanismo de


defesa que consiste numa parada ou cessação do desenvolvimento
psicossexual em determinado ponto do processo de maturação. Pode tratar-
se de um bloqueio temporário e normal da maturação ou ser permanente e
patológico, dando origem a neuroses ou desvios de personalidade. Este
mecanismo foi, em verdade, inicialmente estudado por Freud, na sua teoria
do desenvolvimento da personalidade, de forma que a fixação pode ocorrer
na fase oral, anal ou fálica do desenvolvimento. A fixação numa destas fases
é então responsável pelos desvios sexuais em que o órgão da fase em
questão é o foco do interesse e da atividade sexual anormal.
63

 Simbolização: O mecanismo de defesa da simbolização é a


capacidade do Ego de usar símbolos que traduzam suas forças afetivas
inconscientes, podendo ser símbolos universais, como por exemplo, folclore,
lendas, mitos entre outros. Trata-se da manifestação do inconsciente
podendo estar relacionado à própria história.

 Anulação: É um mecanismo de defesa que serve para fortalecer a


repressão, um processo ativo consiste em desfazer o que se fez. O sujeito
faz uma coisa que, real ou magicamente, é o contrário daquilo que, na
realidade ou na imaginação se fez antes. Há vezes em que a anulação não
consiste em compulsão em fazer o contrário do que se fez antes, mas em
compulsão em repetir o mesmíssimo ato (ALMEIDA, 1996).
Ainda de acordo com o autor, a anulação constitui um mecanismo
narcisicamente muito regressivo. Ela deve operar quando os processos
mentais mais clássicos, à base de desinvestimento e de contra-investimento
não sejam mais suficientes. A anulação irá incidir sobre a própria realidade,
pois é a temporalidade, elemento importante do real, que se acha negada,
alterada.
Em outras palavras, anulação é um processo ativo que consiste em desfazer
o que se fez. As representações incômodas evocadas em atos, pensamentos
sejam considerados como não tendo existido. É o mecanismo dos rituais
obsessivos, nos quais uma atitude é anulada por outra, destinada a suprimir
as consequências da primeira, etc.

 Conversão: Como mecanismo de defesa serve para fortalecer a


repressão, consiste em uma transposição de um conflito psíquico e uma
tentativa de resolução desse conflito por meio de expressões somáticas como
dores de cabeça, náuseas, vontade de urinar ou defecar, e entre outros
sintomas. Passa-se o problema da mente para o corpo, se tratando de um
conflito emocional através de manifestações somáticas.
Consiste, assim, em uma transposição de um conflito psíquico e uma tentativa
de resolução desse conflito por meio de expressões somáticas como dores de
cabeça. Passa-se o problema da mente para o corpo.
64

Outros pontos que devemos levar em conta sobre os mecanismos de defesa são:

 Os diferentes mecanismos de defesa apresentam-se em todos os indivíduos, e só se


tornam anormais quando aparecem de maneira excessiva.
 Não são escolhidos e empregados conscientemente pelo indivíduo.
 O mecanismo que vai atuar em um dado momento depende da natureza da situação
específica e das características da pessoa.
 As mesmas situações podem ter mecanismos de defesa diferentes em pessoas
diferentes.
 Os mecanismos que se mostraram mais eficazes na resolução de conflitos anteriores
tendem a serem usados para resolverem novos conflitos.
 Seu uso prolongado e excessivo pode ter consequências graves no ajustamento efetivo à
vida. Nesse sentido, alguns são piores que outros, como a fuga, que impede a pessoa de
ser capaz de enfrentar seus problemas; e a repressão, que cega para a natureza dos
mesmos.
 Os mecanismos de defesa podem ser frustrados: a racionalização pode ser desmentida;
a identificação, negada; a fuga, evitada; a repressão, revelada, etc. Tornando, assim, o
conflito ainda mais intensificado.
 Quando tais mecanismos falham, podem ocorrer transformações ainda mais violentas no
comportamento; tais transformações apresentam-se sob a forma de perturbações
psicológicas severas, sendo um efeito da psicose.

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