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em Goiás (1954-1995).
para sua disseminação data do fim do século XIX, e, a saúde mental começa a ser
Mental. Anos depois no governo de Getúlio Vargas é criado o Serviço Nacional de Doenças
Mentais (SNDM) dirigido pelo psiquiatra Adauto Botelho. Aqui a psiquiatria brasileira se
ideais eugênicos2 mais tarde utilizados na Alemanha para consolidação dos princípios
nazistas.
torno das representações que envolvem a purificação da ‘raça’, que pretendiam tornar a
população mais apta ao trabalho, o que levaria o país à modernidade imaginada. Esse
discurso foi apropriado pela elite política de Goiás nos anos de 1930, a qual dialogava
construção da nação fica expressa com a construção da nova capital, a cidade de Goiânia.
transferir o poder político para uma nova capital ao ideal de modernidade, buscando
idéia de rompimento com o passado e de um Goiás que agora reclamava para si o moderno.
Essa densa névoa que pairava sobre Goiás, que envolve modernidade, medicina e
política, fica evidente no discurso proferido pelo secretário de saúde do estado, José Peixoto
Uma delas caracteriza a construção de uma nação que aqui pode ser interpretada
como a cabeça, parte responsável pela percepção daquilo que faz mal ao seu componente
físico. Torna-se então função do governante, elaborar políticas que visem à saúde dos seus,
retirando de sua corrente circulatória os ‘vírus’ que poderiam adoecer-lhe, tornando o corpo
frágil, passível de mais infecções que o fariam sucumbir. Dessa forma, ao se referir à
em que se coloca no dito sertão, a fala do então secretário de saúde, integra o estado de
Goiás, ao almejo de uma modernidade que está sendo alcançada também com a
construção do manicômio, que funciona como um dos caminhos para igualar o estado ás
José Peixoto da Silveira, no discurso supracitado, elabora uma narrativa que possui
funções para a vida prática humana, Rusen, acredita que essa operação intelectual
positivada desse ‘processo civilizador’ dos sertões, que tem na figura dos bandeirantes o
seu símbolo maior. Esse resgate do passado assume funções de orientação temporal para o
agir presente, expresso nesse novo projeto que se instaura com a função de ‘modernizar’ o
atribuída ao sertanejo. Entretanto, para construir essa identidade moderna, o estado deveria
desvencilhar-se das amarras tradicionais, visto que a nova capital inaugurada nos anos de
ainda presentes na nova capital, em que figura uma discussão acerca da coexistência do
Weber para construir um ‘tipo ideal’, que o mesmo denomina de tipos urbanos.
Culturalmente falando, esses tipos urbanos ainda estavam ligados à imagem do ‘Jeca Tatu’
são traços que atrelam Goiânia a um passado de atraso, que se havia quisto superar com a
de categorizar os ditos tipos urbanos, ou como prefiro: ‘anormais’ dentro dessa nova
identidade projetada para o goiano. Sendo assim, não é apenas o discurso psiquiátrico que
sua nacionalidade. A saúde é uma questão de patriotismo, o caminho que se tem para
considerados anormais tem um lugar específico nessa busca pela cura, pela construção de
Estabelecem a fronteira entre o normal e o anormal. Como coloca Ana Bock em seu livro ‘A
‘zonas patológicas’, o que dá movimento a essa fronteira, visto que a interação social, as
exclusão.
os tipos que foram construídos pelo discurso psiquiátrico, dentro também de uma
como prática de disciplina corporal, que busca possibilitar ao corpo social uma vida
‘saudável’, atrelado ao pensamento político em que “toda uma pedagogia do corpo foi sendo
18).
função de auxiliar no controle social, mesmo que nos arquivos da ‘Revista Goiana de
Medicina’ desde a sua inauguração em 1955 até 1959, ele não seja citado em nenhum
artigo, não diminui a dimensão de sua atuação como auxiliar no controle da loucura
lugar estava definido. Se antes da construção do manicômio havia uma relação entre a
presente no corpo social, mesmo que como um errante pelas ruas, agora não mais. Há um
local para ele, seu nome ou apelido é substituído pela categoria de ‘doente mental’, que no
final da década de 1950 mostra-se definida, como se pode observar no artigo de Alfredo
dotada de satisfatória capacidade de trabalho, apto para amar o próximo como a si mesmo.”
Mais adiante, realizando uma classificação, uma relação das causas de insanidade
ele acrescenta:
b) Educação defeituosa:
A) Disarmônicos: sobrexcitáveis-explosivos, Instáveis-faltos de
perseveração, débeis de vontade, Instintivos ou vagabundos-
tendência às toxicomanias em geral, Fraudadores e mentirosos-
pseudologia fantástica, Insociáveis ou anti-sociais – ausentes de
3
Durante o ano de 1959, atuou como Neuropsiquiatra do Hospital Psiquiátrico Prof. Adauto Botelho – Goiânia,
Goiás.
sentimentos éticos ‘loucos morais’, Pseudopleitistas – discutidores
(discutem por esporte).
B) Paredônicos: São os que apresentam perversões da função sexual
traduzidas no impulso genético; sadismo, fetchismo, exibicionismo
(exposição dos próprios órgãos genitais e masturbação em público),
ninfomania, satiríase, homossexualismo, necrofilia (coabitação com
cadáveres), bestialidade (congresso com animais).”
Um pouco mais adiante finaliza:
“Um indivíduo portador de insanidade moral apresenta desordem na
esfera do sentimento, temperamento ou hábito, com as funções
intelectuais quase que íntegras. É a ‘Moral Insanity’ de Prichard e vive
por meio de uma norma de moralidade de pensamento subjetiva
determinada por seu próprio prazer ou por artifícios. Não reconhece
que existe um padrão objetivo para o certo e o errado, permanente e
independente do seu ponto de vista.” (Revista Goiana de Medicina
Julho/Setembro 1959)
indivíduo que seja normal como estando livre dos conflitos, pressupõe e atua de forma a
incluir dentro de uma categoria de exclusão social, outros grupos sociais que estejam fora
‘vagabundos-tendência’, dos que discutem por esporte. Aqui estão encerrados aqueles que
através do trabalho, e, os que contestam as normas estabelecidas. O autor deixa claro que
os ‘Insanos Morais’, possuem uma moralidade subjetiva criada por eles mesmos, não
impedimento de pensar e agir fora dos padrões que determinam as diferenças entre certo
discursos que constroem essas identidades, que tem como emitente o Hospital Psiquiátrico,
que se torna símbolo dessa exclusão considerada limpeza, onde são trancafiados os
Brasília no governo de Juscelino Kubistchek (1955-1960), que consolida o que havia sido
Nos anos posteriores com a Guerra Fria e da ditadura militar no Brasil, uma nova
dos espaços vazios. Em Goiás, essa política de integração, será vivida com o processo de
preenchimento dos espaços vazios, que correspondiam a região do norte do estado, atual
Tocantins.
A estrada descrita no documento acima é a GO-4 que liga a cidade de Vila Boa
(antiga capital de Goiás) a São Miguel do Araguaia, em que fica notória a expectativa de
integração, de que a rodovia abriria caminho para a marcha do dito ‘progresso’, bastante
‘novo tempo’.
Brasil sob o lema de ‘Ame-o ou Deixe-o’. A composição dessa verdadeira trindade foi
tudo àquilo que se espera de Goiás, ou melhor, passa a representar o próprio estado é
com exceção do norte (que passa a ser a antítese da identidade moderna construída para
diferenciação que atribuem uma identidade de atraso ao cone norte), onde haverá uma
campanha para sua ocupação e integração, mas que não é colocada em prática até o fim
Toda a idéia discutida nas décadas anteriores parecia estar concretizada na década
de sessenta. Para Goiás agora a busca não era a de purificação da ‘raça sertaneja’, mas a
de seguir rumo ao progresso, de continuar sua jornada utilizando dos mecanismos que
configurada, e Goiânia desponta como representante dessa meta alcançada pelo estado de
Goiás.
analisado – estão concretizados e que devem agora ser mantidos. Há uma expectativa
diante desses médicos recém formados, de se criar uma tradição que tornaria o nome da
maior visibilidade ao estado. Eram vistos como parte consolidadora dos ideais precedentes.
autoritária, não perde este caráter, mas o médico se aproxima da família, e a psiquiatria no
ano de 1970 é vista como a chave para essa proximidade entre o clínico geral e a
população, pois a abordagem psicológica dentro do curso de medicina ficará a cargo desta
disciplina.
chamado clínico geral – para uma abordagem que facilite a sua integração com sua área de
aos médicos que estavam sendo formados em Goiás para uma aproximação junto às
famílias. Esse pilar que serviu para auxiliar na construção da nação brasileira e da
modernidade do povo goiano, está agora a serviço de uma defesa nacional, que visa não
apenas higienizar a sociedade através da exclusão dos indivíduos que poderiam transmitir
Sociais.
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Fontes eletrônicas:
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Documentação: