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Diversidade Cultural,

Identidade e Diferença
no Contexto Brasileiro
Nesta unidade, iniciaremos
nossos estudos com um olhar
para as relações do homem e a
sociedade, a f i m de suscitar in-
terrogações críticas sobre si mes-
mo e o meio que o cerca. Logo,
você perceberá a capacidade de
construirmos nossa própria histó-
ria e as de muitos outros.
Este é um convite para mer-
gulharmos na História, que impli-
ca ref lexões de longo alcance.
3.1 Para Início de Conversa...

Nesta unidade, faremos alguns apontamen-


tos, a fim de compreender o processo de constituição
da identidade por meio de conceitos como: diferen-
ça, alteridade e relações de pertença. Buscamos tra-
zer algumas reflexões sobre as diversidades culturais
presentes no país, especialmente a diversidade étnica.
Acreditamos que tais reflexões, possibilitarão o maior
entendimento das futuras discussões, que pretende-
mos fazer, relacionadas ao contexto educacional.
Antes de iniciar o texto, gostaríamos de cha-
mar a atenção para a relação entre os termos citados.
Nos textos que se seguem você perceberá que a di-
ferença poderá ser entendida como um produto da
identidade, grosso modo, as diferenças são as carac-
terísticas que compõem uma determinada identidade.
No entanto, as diversas identidades, que se concen-
tram em culturas distintas, compõem, por sua vez, a
Diversidade Cultural.

55
3.2 Diversidade
Cultural como Parte
do Processo Histórico
Ao expor que o Multiculturalismo processa-
-se histórico-socialmente, é relevante destacar que a
realidade social é constituída pelas mais variadas for-
mações de grupos sociais. Nas entrelinhas do Multi-
culturalismo podemos identificar a diversidade, pela
qual a sociedade brasileira é organizada, e ainda a for-
ma como esta sociedade apresenta-se diante desta.
Você observou que até o momento, utilizamos
o termo “diversidade” e isso se deve aos mais amplos
sentidos do termo, ou seja, estamos fazendo referência
a diferenças culturais, econômicas, sociais, étnicas, reli-
giosas, de gêneros, de gerações, dentre outras.
É nesse viés que nos referimos à diversidade
cultural, uma vez que esse termo vai muito além do
que, até então, era entendido pelas vagas percepções
de costumes e modos de comportar-se numa determi-
nada sociedade, porém que engloba, sobretudo, uma
visão particular, uma forma de relacionar-se com o
outro, enfim, uma forma de expressar um sentimento
de pertença a um determinado grupo.
Na configuração da diversidade cultural
consideramos os fatores de um determinado local,
desta maneira o espaço físico e geográfico influen-
ciam a cultura de um determinado grupo social e
suas relações de troca com outros grupos, entretan-
to não são determinantes.

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Cabe aqui uma ilustração. Na 1ª unidade,
você teve a oportunidade de assistir ao documentário:
“Pantanal – O Pantaneiro”, onde mostrou claramente
os relacionamentos do homem com o ambiente físico.
Ao contrário, que se possa pensar que o homem foi
determinado no espaço, tomado pela aquela natureza
exuberante, nossa visão deve alçar voos maiores. Per-
ceber que cada indivíduo e grupo constroem formas
diferentes de se adaptar e modificar o espaço em que
vive, em face às suas necessidades.
Isso significa que cada um atribuirá uma res-
posta diferente frente às relações com outros indiví-
duos e com o espaço que o cerca. Tanto é verdade,
que o espaço referenciado no documentário apresen-
ta configurações humanas multifacetadas, como um
mosaico cultural, em constante relacionamento com
o meio físico e social.
Ainda tomando como base o documentário,
como um paralelo de discussão, torna-se profícuo
pensarmos nos traços humanos, que a sociedade pas-
sa a ser desenhada, sobretudo pelos deslocamentos de
grupos indígenas para certas áreas do Pantanal, soma-
da à chegada de migrantes de várias regiões brasileiras
e de países oriundos de vários continentes.
Todo esse “caldeirão cultural” não dispensa
as expressões simbólicas identificadas por caracterís-
ticas como: a culinária, a vestimenta, línguas, crenças,
religiões, produções manuais e artísticas (artesanato,
música e dança), entre vários outros. Somente a guisa
de ilustração, o Mato Grosso do Sul, Estado que en-

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globa maior parte do território pantaneiro, tem, hoje,
uma das maiores comunidades indígenas, paraguaia e
japonesa, no contexto nacional.
Assim como, o Mato Grosso do Sul, muitos
dos estados e regiões brasileiras têm uma configura-
ção social e cultural com múltiplos grupos sociais, que
se diferenciam culturalmente e igualmente. A confi-
guração dessas sociedades tem um caráter histórico
interligado com a História nacional.
Pare para pensar na cidade e estado em que
vive. Lembre-se dos nomes das ruas, dos monumen-
tos e construções, as comidas típicas, as festividades
locais, os dialetos, o artesanato, as músicas regionais,
as fenotipias de cada indivíduo à sua volta. Desafio-
-o a dizer que nenhum desses itens recorda culturas
oriundas de grupos sociais diferentes. Pois bem! Essa
é apenas uma mostra da diversidade cultural.
De acordo com a Declaração Universal da
Unesco sobre a Diversidade Cultural1 (2002, p. 3), o
Artigo 1 expõe:

A cultura adquire formas diversas através do tem-


po e do espaço. Essa diversidade se manifesta na
originalidade e na pluralidade de identidades que
caracterizam os grupos e as sociedades que compõem
a humanidade. Fonte de intercâmbios, de inovação

1
Disponível em: http://unesdoc.unesco.org/
images/0012/001271/127160por.pdf

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e de criatividade, a diversidade cultural é, para o
gênero humano, tão necessário como a diversidade
biológica para a natureza. Nesse sentido, constitui
o patrimônio comum da humanidade e deve ser
reconhecida e consolidada em benefício das gerações
presentes e futuras.

No Brasil, as discussões sobre diversida-


de cultural são importantes, pois através das leis,
busca-se mobilizar a população para um olhar mais
atencioso para o outro, o ‘diferente do eu’. Manter
e preservar tradições culturais, costumes manifestos
nos territórios brasileiros é reconhecer a presença de
grupos existentes no Brasil e suas contribuições para
a memória coletiva.
A Declaração Universal sobre a Diversidade
Cultural, faz ainda a ligação da diversidade cultural ao
pluralismo cultural (2002, p. 3), em seu Artigo 2;

Em nossas sociedades cada vez mais diversificadas,


torna-se indispensável garantir uma interação har-
moniosa entre pessoas e grupos com identidades cul-
turais a um só tempo plural, variadas e dinâmicas,
assim como sua vontade de conviver. As políticas
que favoreçam a inclusão e a participação de todos
os cidadãos garantem a coesão social, a vitalidade
da sociedade civil e a paz. Definido desta maneira,
o pluralismo cultural constitui a resposta política à
realidade da diversidade cultural. Inseparável de um

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contexto democrático, o pluralismo cultural é propício
aos intercâmbios culturais e ao desenvolvimento das
capacidades criadoras que alimentam a vida pública.

Podemos dizer que o Brasil é um país plu-


ral, dessa maneira, não podemos afirmar que temos
um país homogêneo, somos, hoje, de maneira geral,
frutos de uma grande mistura étnica e cultural, que
carrega consigo as heranças culturais de muitos povos
e culturas diferentes.
A cultura por ser dinâmica transforma-se,
onde cada indivíduo tende a agregar valores, ressig-
nificá-los e reinterpretá-los frente às relações sociais,
favorecendo a troca e os diálogos culturais. Por esse
motivo, muito se discute na atualidade, a promoção
dos intercâmbios culturais como uma possibilidade
de fomentar o livre acesso entre diferentes mundos,
sem embates entre grupos. Os estudos a partir de uma
perspectiva intercultural caminham nesse sentido.
Portanto, concluímos o pensamento, que a
diversidade cultural deve ser reconhecida a partir de
uma perspectiva identitária, processualmente consti-
tuída histórica e socialmente.

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3.3 Identidade e
Diferença
Tolerar a existência do outro,
E permitir que ele seja diferente,
Ainda é muito pouco.
Quando se tolera,
Apenas se concede
E essa não é uma relação de igualdade,
Mas de superioridade de um sobre o outro.
Deveríamos criar uma relação entre as pessoas,
Da qual estivessem excluídas
A tolerância e a intolerância.
(José Saramago2)

Antes de entender a existência de identidades,


é necessário que entendamos a existência das diferen-
ças entre os indivíduos, pois essas diferenças serão
elementos primordiais para identificar e reconhecer as
identidades distintas. Com base nas palavras da epí-
grafe, é preciso ir além do princípio da tolerância e
fomentar diálogos para práticas de respeito ao outro.
Reafirmamos que a identidade não é algo
pronto e acabado, mas sim em constante processo de
formação. O “quem sou eu?” constitui-se e desvela-se
a partir do tempo e das influências do espaço onde
vive, bem como, das interações que estabelece com o

2
José Saramago (1922 - 2010). Escritor e jornalista português.

61
outro. Segundo Boaventura Souza Santos (1993, p. 31):

[...] as identidades culturais não são rígidas nem,


muito menos, imutáveis. São resultados sempre tran-
sitórios e fugazes de processos de identificação. Mesmo
as identidades aparentemente mais sólidas, como a de
mulher, homem, país africano, país latino-americano
ou país europeu, escondem negociações de sentido, jogos
de polissemia, choques de temporalidades em constan-
te processo de transformação, responsáveis em última
instância pela sucessão de configurações hermenêuticas
que de época para época dão corpo e vida a tais iden-
tidades. Identidades são, pois, identificações em curso.

Em termos humanos, a constituição da iden-


tidade inicia-se desde a origem da vida em sociedade,
nas muitas formas de cotidianamente incorporar va-
lores, construir visões de mundo e representá-las.
Como um jogo de diferenciação, cada su-
jeito expressa respostas singulares nas relações com
o outro. Dessa forma, é na igualdade e na diferença
que a identidade processa-se, tendo em vista que
constantemente nos assemelhamos e nos diferen-
ciamos dos outros.
As maneiras como nos relacionamos com o
outro é o que chamamos de relações de alteridade, a
qual propicia estabelecer diferenciações e relações de
pertença a um determinado grupo social e a uma cole-
tividade. No mesmo sentido, Barth (1998) afirma que

62
tais relações resultam no estabelecimento de frontei-
ras invisíveis entre o “nós” e os “outros”, para assim
ter uma identidade reconhecida.
Dessa forma, a maneira como um indivíduo
e determinado grupo expressa-se, perpassam as ma-
neiras de portar-se, de vestir-se, de apresentar gostos
diversos, interesses profissionais e pessoais, para afir-
mar pensamentos, que se defendem e modos em co-
mum de ver o mundo.
Giddens (2002) complementa que o termo
autoidentidade, ampara os pontos que trouxemos
quando pesamos a influência do meio, ele afirma que:
“... mudanças em aspectos íntimos da vida pessoal es-
tão diretamente ligadas ao estabelecimento de cone-
xões sociais de grande amplitude... ”eu” e “sociedade”
estamos inter-relacionados num meio global”. (GID-
DENS, 2002, p. 36)
Nesse sentido, podemos reafirmar que um
grupo tem um papel, que favorece os contornos sin-
gulares, ao mesmo tempo em que conformam uma
unicidade coletiva. Pensemos como Ortiz (1994, p.
137), identidade será: “... sempre um elemento que de-
riva de uma construção de segunda ordem”, de forma
que nenhuma identidade constitui-se individualmente.
Toda identidade é constituída socialmente. Reafirman-
do, assim, a origem da identidade do “global” ao sin-
gular, ou do singular ao global.
Partindo do pressuposto de que identida-
de e diferença são elementos inseparáveis, aponta
Silva (2000, p.75-76):

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[...] consideramos a diferença como um produto deri-
vado da identidade. Nesta perspectiva, a identidade é
a referência, é o ponto original relativamente ao qual
se define a diferença. Isto reflete a tendência a tomar
aquilo que somos como sendo a norma pela qual des-
crevemos ou avaliamos aquilo que não somos.

Nesse sentido, Silva (2000) entende que iden-


tidade e diferenças são resultantes de criações sociais
e culturais. Na atualidade, esse autor levanta um pon-
to importante, tendo em vista que nos estudos sobre
diversidade, é necessário saber que a constituição da
identidade envolve as relações de poder.

A identidade e a diferença estão, pois, em estreita co-


nexão com relações de poder. O poder de definir a
identidade e de marcar diferença não pode ser separa-
do das relações mais amplas de poder. A identidade e
a diferença não são, nunca, inocentes. [...] São outras
tantas marcas da presença do poder: incluir/excluir
(“estes pertencem”, “aquele não”); demarcar frontei-
ras (“nós” e “eles”); classificar (“bons e maus”; “pu-
ros e impuros”; “desenvolvidos e primitivos”; “racio-
nais e irracionais”); normalizar (“nós somos normais;
eles são anormais”). (SILVA, 2000, p. 81-80)

Ao reconhecer a identidade no âmbito das di-

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ferenças, o sujeito passa a repensar sua relação como
o outro, pois uma vez que este sujeito está inserido às
diferentes relações de poder, poderá demonstrar ou ser
alvo de situações de intolerância do outro. Essa intole-
rância que por vezes pode gerar a exclusão social.
Nesse sentido, pensar a intolerância é tam-
bém pensar preconceito e discriminação, grosso
modo, podem ter a mesma definição. A intolerân-
cia caracteriza-se pelo repúdio a alguma coisa e a
alguém, negando o diferente. O preconceito com-
preende um juízo antecipado, pré-concebido e sem
fundamento. A discriminação atribui sentido de dis-
tinção e separação, isto é exclusão social, sobretudo,
uma exclusão que priva o consumo de bens materiais
e culturais (BRASIL, 1997)
A intolerância, o preconceito e a discrimi-
nação manifestam-se sob diferentes formas e em
diferentes situações, desde as atitudes escamotea-
das às práticas de eliminação e extermínio do outro.
Parte do princípio que o diferente não é aceito, é
subalterno e ameaçador.
Tal princípio sempre foi e continua a ser
preocupante na sociedade, sobretudo, pelas ten-
dências universalizantes de se propagar uma cultura
dominante, que busca estabelecer padrões culturais.
Valores estes que recaem sobre as diferenças: étnica,
fenotípica, religiosa, de opções sexuais, de gênero e
de modos de vida humanos.
O preconceito e a intolerância tende a mani-
festar-se ao colocar-se em posição de superioridade,

65
constituindo como ponto de partida para as práticas
de discriminação. Nesse sentido, concordamos com
Crochick (1997, p. 11):

“[...] como tanto o processo de se tornar indivíduo,


que envolve a socialização, quanto o do desenvolvi-
mento da cultura tem se dado em função da adapta-
ção à luta pela sobrevivência, o preconceito surge como
resposta aos conflitos presentes nesta luta”. (CRO-
CHIK, 1997, p.11)

Nesse viés, discriminar é realizar práticas de


segregação, de discernir, de realizar práticas de violên-
cia física ou simbólica, inferiorizando os indivíduos.
O que queremos salientar é que não se trata
de abandonar “nossa verdade”, nossas próprias for-
mas de pensar o mundo, mas, sobremaneira, de res-
peitar o “outro”. Esse, que como pudemos perceber
em nossas reflexões, tem papel fundamental no reco-
nhecimento do “eu”.
Segundo Gusmão, (2003, p. 89) complemen-
ta: “... o eu e o outro, como nós, somos parte de um
contexto relacional marcado, antes de tudo, por rela-
ções de hierarquia e poder.” Essa autora provoca re-
flexões de longo alcance, que nos desafia a pensar as
maneiras como os indivíduos e suas diferentes iden-
tidades podem transitar entre mundos diversos, sem
tensões e conflitos. Certamente, esse é um questio-
namento, que impossibilita uma resposta prescritiva,

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mas que merece discussões.
Do ponto de vista da identidade étnica, Go-
mes (2002) explora aspectos importantes para pensar-
-se a identidade negra e mesmo que seus interesses
de discussões estejam voltados para um dado grupo
e suas especificidades, ainda assim podem-se esten-
der as reflexões, ao acolher os princípios básicos da
construção histórica e cultural das identidades, dos
diferentes grupos que compõem a sociedade.

[...] a identidade negra como uma construção social,


histórica e cultural repleta de densidade, de conflitos
e de diálogos. [...] implica a construção do olhar de
um grupo étnico/racial ou de sujeitos que pertencem
a um mesmo grupo étnico/ racial, sobre si mesmos, a
partir da relação com o outro. Um olhar que, quando
confrontado com o do outro, volta-se sobre si mesmo,
pois só o outro interpela a nossa própria identidade.
(GOMES, 2002, p. 39)

Nesse contexto, cada grupo social possui cul-


turas distintas, que desenham a identidade individual
e de grupo. Em face disso, nossa sociedade não é ho-
mogênea, pois, como afirma Ortiz (1994), as culturas
apresentam-se como heterogêneas, e suas característi-
cas específicas não partilham de traços comuns. No-
ção que muitas vezes não é respeitada e que provoca
ações de preconceito e discriminação.

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Sugestões para
Aprofundamento de Estudos
 Documento: Declaração Universal sobre Diversida-
de Cultural.
Disponível em:
http://unesdoc.unesco.org/
images/0012/001271/127160por.pdf
 Livro: Estigma. A deteriorização da identidade so-
cial. (Everg Goffman).
 DVD: Pluralidade Cultural – Colonialidade de Saber
e de Poder (vol. 2).
 Documentário “Eu Sou Assim” - Documentário
que aborda, através das percepções do universo infan-
to-juvenil, questões relacionadas às diferenças entre in-
divíduos e aos preconceitos. Paralelamente, tem relatos
pessoais de crianças em três momentos, que refletem
as questões de diversidade e desigualdade. Discussão
extra sobre “educação e diferenças”, com a Pedagoga
Ana Canen, o economista Marcelo Paixão e o Sociólo-
go Ahyas Siss. Produção: CNPq e UNIAFRO.

Exercício Proposto
1) Observe a tirinha da Mafalda e procure aprofun-
dar-se nos estudos, buscando acessar as sugestões de
complementação de estudos, assim como outras fon-
tes diversas relacionadas ao assunto. Por fim, reflita
sobre o conteúdo estudado, nessa unidade, e posicio-
ne-se, criticamente, elaborando um texto de no míni-

68
mo 10 linhas, expondo a sua opinião.
Mafalda – Preconceito racial

Disponível em: http://centraldastiras.blogspot.


com/2010/10/mafalda-preconceito-racial.html

Sugestão de Roteiro

a) O que a tirinha suscita acerca da intolerância, pre-


conceito e discriminação?
b) Quais os possíveis efeitos da discriminação na
constituição da identidade de um sujeito?
c) Imagine que a tirinha é uma situação real, o que
você faria se presenciasse tal cena?

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Diálogos com a Teoria de
Pierre Bourdieu para
Entender o Multiculturalismo
no Contexto Educacional
Nesta unidade, você terá a
oportunidade de conhecer um
pouco sobre a teoria do sociólo-
go Pierre Bourdieu e suas contri-
buições para os estudos educacio-
nais, levando em consideração a
questão da diversidade cultural e
as manifestações no meio escolar.
As discussões, aqui, apresen-
tadas são imprescindíveis para a
construção de uma visão crítica
de um profissional da Educação,
pois dessa maneira poderemos
elaborar estratégias de aversão
e ações contra a violência física
ou simbólica.
4.1 Para Início de Conversa...

O sociólogo e antropólogo francês Pierre Bourdieu


destaca-se entre os grandes pensadores contemporâ-
neos, pela relevância de sua obra, e no conjunto da
mesma ressaltam-se importantes estudos acerca da
educação. De fato, há entre seus trabalhos várias
análises que privilegiam a educação e os sistemas
de ensino. (CATANI; CATANI; PEREIRA,
2006, p. 127.

Nesta unidade, apresentamos diálogos com


a teoria de Pierre Bourdieu, com o objetivo de reu-
nir elementos para o estudo do Multiculturalismo no
âmbito educacional brasileiro, sobretudo, a partir dos
conceitos de realidade social, campo, hábitos, agente,
capitais e violência simbólica.
Antes de iniciarmos as discussões dos con-
ceitos elencados, apresentaremos breves aponta-
mentos da vida e obra de Pierre Bourdieu, também
conhecido com “o investigador da desigualdade”,
sobretudo a partir de seus estudos sobre o sistema
educacional, nos quais defendia a tese de que a esco-
la não é um campo neutro, mas, ao contrário, consti-
tui-se como espaço que tende a conservar e legitimar
as desigualdades sociais, tal como os diversos outros
campos do espaço social.
Num segundo momento, realizaremos uma

73
leitura do Multiculturalismo no contexto educacional,
a partir do suporte teórico de Pierre Bourdieu, sobre-
tudo com o propósito de iluminar questões que com-
petem ao assunto. A existência da diversidade cultural,
suas manifestações no meio escolar e os possíveis im-
plicativos geradores de desigualdade social.
Por fim, é válido deixar claro que as discussões
não se encerram no estudo dessa unidade, uma vez que
a vasta produção desse autor suscita maior aprofunda-
mento de estudo, em face dos vários elementos teóricos
que merecem vir à luz do conhecimento.

4.2 Pierre Bourdieu: a


vida do investigador da
desigualdade

Pierre Bourdieu nasceu em 1 de agosto


de 1930, em Denguim, um vilarejo da província de
Béarn, localizado na região rural da França. Oriundo
de uma família de camponeses, cujo pai foi funcio-
nário dos correios e mãe pertencente a uma família
de agricultores, Bourdieu estudou no Liceu de Pau e
no Liceu Louis-le-Grand, beneficiando-se “... do efi-
ciente sistema público de ensino do país, consolidado
ao longo da III República (1870 – 1940)” (CATANI;
PEREIRA, 2006, p. 128)
Sua trajetória escolar foi marcada pelo bri-
lhantismo, e conforme observaremos nas discussões
seguintes, sua história de vida não deixou de ilustrar

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sua própria teoria ao reconhecer sua experiência em
dois universos culturais distintos: o familiar e o da elite
escolar, é como afirma Nogueira (2008, p. 9) 10):... atri-
buía a si mesmo um “habitus clivado”, produto de forte
dissonância entre uma “alta consagração escolar e uma
baixa extração social”.
A auto-análise de Bourdieu é constatada,
principalmente, pela sua formação acadêmica na École
Normale Supérieur, local de formação da elite intelec-
tual francesa; diplomando-se em Filosofia aos 25 anos.
Além de realizar estudos na Faculdade de Letras de Pa-
ris, a Sorbonne. (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2008)
Mais tarde, tornou-se professor de Filoso-
fia no Liceu de Moulin (França) e entre 1955 a 1958,
prestou serviço militar na Argélia, ao norte da África
e após conclusão do serviço militar, permaneceu no
país durante dois anos como professor onde iniciou
suas primeiras pesquisas em sociologia.

Foi na Argélia, durante um serviço militar imposto


pela guerra e depois prolongado pela ocupação de um
posto de assistente na faculdade de Argel, que Pierre
Bourdieu descobre a sociologia e a antropologia e se
desvia da filosofia, mais precisamente, da fenomenolo-
gia, para a qual se encaminhavam seus interesses até
então. Essa mudança de orientação não tem motivos
puramente intelectuais. Perante o horror que lhe ins-
pirava a situação na qual se encontrava mergulhado
o seu malgrado, ele se apropria da sociologia como
de uma fonte contrapeso – assim como a maioria

75
dos jovens intelectuais de sua geração – e, do mesmo
modo, em relação à emoção imediata, assumir uma
distância reflexiva que, sem incorporá-la, permite
dominá-la e orientá-la para a ação. (ENCREVÉ;
LAGRAVE, 2005, p. 155)

Bourdieu foi ainda, professor na faculda-


de de Letras de Lille, diretor na École dês Hautes
Études em Sciences Sociales e diretor do Centre de
Sociologie de l`Èducation et de la culture em Paris,
a partir de 1964.
Em 1981, tornou-se professor da cadeira de
Sociologia do Collège de France, uma das mais tradi-
cionais instituições educativas da França. Em 1970,
publicou, juntamente com Claude Passeron a obra: “A
reprodução”, que irá ser de grande influência entre os
educadores, especialmente no Brasil.
Em 23 de janeiro de 2002, aos 71 anos, Bour-
dieu morreu na França, consagrando-se um dos mais
importantes e influentes teóricos do século XX.

76
4.3 Principais conceitos
de Pierre Bourdieu para
compreender o Multicultura-
lismo no contexto educacional
Para iniciarmos nossas reflexões, salientamos
que estudar Pierre Bourdieu é importante porque o
sujeito social é colocado como o centro e a chave das
análises sociológicas, um ponto imprescindível, que
colaboram com os estudos do Multiculturalismo que
em seu bojo, defende as diferentes identidades.
As bases, que sustentam a teoria de Pierre
Bourdieu, posicionam-se entre o objetivismo e o sub-
jetivismo, uma vez que o sociólogo foge ao determi-
nismo do objetivismo e defende as estruturas sociais
como esteio de produção, e por outro lado, escapa ao
subjetivismo que argumenta a constituição do sujeito,
alheio às influências das estruturas.
Nesse pensar, Bourdieu (1996) concebe a re-
alidade social a partir de uma leitura de espaço social,
considerando: “... a dimensão simbólica ou cultural na
produção e reprodução da vida social.” (NOGUEI-
RA; NOGUEIRA, 2006, p. 29)
Do ponto de vista epistemológico, Bourdieu
buscou em Durkheim as compreensões acerca dos
sistemas simbólicos como estruturas, que são estrutu-
rantes, uma vez que esses elementos “... organizam o
conhecimento ou mais amplamente a percepção que
os indivíduos têm da realidade.” (NOGUEIRA; NO-
GUEIRA, 2006, p. 2006)

77
Igualmente, busca em Saussure, entendimen-
tos de como se organizam as realidades, com base
numa estrutura subjacente, a qual busca identificar.
Por fim, o Marxismo contribuiu com elementos que
explicam as formas de dominação ideológica, capaz de
legitimar o poder de uma dada classe social. As con-
tribuições desses teóricos postularam a visão de reali-
dade social para Bourdieu, configurada como sistemas
simbólicos, que agem como estruturas organizadas, e
como esclarece Nogueira e Nogueira (2006, p. 30):

Dito de outra forma, as produções simbólicas seriam


capazes de organizar (estruturar) a percepção dos in-
divíduos e de propiciar a comunicação entre eles exa-
tamente porque seriam internamente estruturadas,
apresentariam uma organização ou lógica interna,
passível de ser articulado pela investigação científica.
[...] Bourdieu argumenta que a estrutura presente nos
sistemas simbólicos e que orienta (estrutura) as ações
dos agentes sociais reproduz, em novos termos, as prin-
cipais diferenciações e hierarquias presentes na socieda-
de, ou seja, as estruturas de poder e dominação social.

Segundo Bourdieu (2007), o espaço social


constitui uma noção que abarca as produções sim-
bólicas geradas e classificadas, cujo maior aprofunda-
mento de estudo merece pontuar a noção de campo.
Os campos são determinados espaços/setores locali-
zados na realidade social, onde determinados tipos de

78
bens são produzidos, consumidos e classificados.
Este conceito concebe as transformações so-
ciais, tendo em vista que a ideia de que distribuição so-
cial do trabalho torna-se cada vez mais complexa na
contemporaneidade. No campo, inserem-se os agentes
que travam lutas simbólicas e hierarquicamente posi-
cionam-se de acordo com a distribuição de um capital.
Trata-se do que Bourdieu compara com
um jogo, em que os agentes estão engajados e que
lhes cabe realizar a escolha de aceitação e reconhe-
cimento de sua posição de inferioridade no campo,
ou contestar e ser avesso aos padrões da cultura dos
grupos dominantes.
Certamente, não há uma neutralidade nos
campos sociais, haja vista as constantes lutas simbó-
licas travadas entre os agentes em face dos critérios
de classificação cultural. Como ressaltou Bonnewitz
(2003), o campo é conflituoso e hierarquizado pela
desigual distribuição dos capitais.

Certos padrões culturais são considerados superiores


e outros inferiores: distingue-se entre alta e baixa cul-
tura, entre religiosidade e superstição, entre conheci-
mento científico e crença popular, entre língua culta
e fala popular. Os indivíduos e as instituições que
reproduzem formas dominantes da cultura buscam
manter sua posição privilegiada, apresentando seus
bens culturais como naturalmente ou objetivamen-
te superiores aos demais. (NOGUEIRA; NO-
GUEIRA, 2996, p. 33)

79
Podemos pensar que o campo opera sob uma
lógica que determina a posição de cada agente, e nessa
perspectiva, acabam por reproduzir as desigualdades?
É certo que não. Primeiro, porque o agente poderá
reconhecer a superioridade da cultura dominante ao
buscar aproximar-se, entretanto, Bourdieu reconhece
as contraposições de agentes à hierarquia da cultura
dominante, buscando reverter sua posição por meio
de uma contracultura.
Contracultura caracteriza-se pela reação do
grupo do dominado à cultura dominante, ou seja, “...
quando os grupos se opõem à cultura dominante e
procuram promover a instauração de novas normas
culturais.” (BONNEWITZ, 2003, p. 95) Com base
nessa concepção, observamos que as relações entre
agentes e campos sociais não se constituem de forma
rígida e determinista, no sentido de sempre reprodu-
zir a hierarquização e promover a hegemonia cultural.
Mas, de que bens reais e simbólicas (capitais)
estamos referindo-nos e que é capaz de posicionar
hierarquicamente um agente em campo social? Em
linhas gerais, engloba-se o acúmulo de posses de di-
versas ordens distribuídas como: capital cultural, capi-
tal econômico, capital simbólico e capital social. Con-
ceitos que com base em Nogueira e Nogueira (2006)
resumem-se da seguinte forma:
• Capital cultural: apresenta-se de três formas: o capi-
tal cultural objetivado (posse de objetos culturais va-
lorizados como livros e obras de arte), o capital cultu-
ral incorporado (é a legítima cultura incorporada por

80
um agente, tais como: postura corporal, habilidades
linguísticas, sem síntese são hábitos, atitudes e com-
portamentos internalizados e relacionados à alta cul-
tura - cultura dominante) e por fim, o capital cultural
institucionalizado (são as posses de diplomas, ou seja,
certificados escolares, cursos, dentre outros).
• Capital econômico: todos os bens e serviços con-
quistados por volume de capitais.
• Capital social: são as amizades, contatos profis-
sionais, laços de parentesco, os quais são mantidos
pelos indivíduos e pelas suas famílias.
• Capital simbólico: é a reputação e o prestígio so-
cial. Em geral, acumular capital simbólico é levar
em consideração o acúmulo de pelo menos um dos
outros três capitais.
Bourdieu (2008) argumenta com proprie-
dade e fundamentação que o volume desses capi-
tais que esses agentes possuem, postulam distin-
ções. Essas distinções são possíveis de serem lidas
nas várias formas de expressão dos agentes, cuja
leitura acaba por destacar sua posição no campo,
enfim na realidade social.
O volume dos capitais constitui-se a partir
de uma trajetória, que os agentes traçam ao longo da
vida. Tal trajetória é inerente ao espaço social no qual
faz parte, pois seus valores, crenças, visões, tradições,
ações e relações que estabelece com o mundo confi-
guram a noção de “habitus”.

[...] habitus - entendido como um sistema de dispo-

81
sições duráveis e transponíveis que, integrando todas
as experiências passadas, funciona a cada momen-
to como uma matriz de percepções, de apreciações e
de ações – e torna possível a realização de tarefas
infinitamente diferenciadas, graças às transferências
analógicas de esquemas, que permitem resolver os
problemas da mesma forma, e às correções incessantes
dos resultados obtidos, dialeticamente produzidas por
esses resultados. (BOURDIEU, 1983, p. 65)

Bonnewitz (2003) ajuda a compreensão de


habitus, ao destacar essa noção como uma interme-
diação entre agente e as estruturas; capaz de garantir
a coerência entre indivíduo e sociedade que impulsio-
nam atitudes e comportamentos, isto é, operam uma
lógica de ação social.
Uma vez compreendido a noção de realidade
social, campo, agente, capitais e habitus, torna-se viável
realizar articulações com o foco desse estudo. Nesse
sentido, algumas interrogações são possíveis, a fim de
nortear nossos estudos: como é possível pensar o Mul-
ticulturalismo a partir da teoria de Pierre Bourdieu, ten-
do em vista sua essência pautada na defesa dos grupos
minoritários, e respectivas reivindicações de direitos e
livre expressão cultural? Como analisar o Multicultura-
lismo e suas configurações no campo educacional bra-
sileiro, a partir da leitura da teoria de Pierre Bourdieu?
Sem dúvida, a discussão emerge dos aponta-
mentos de Bourdieu acerca da inculcação dos valores

82
de grupos dominantes como referência de cultural
ideal. Como desenvolvemos anteriormente, a socie-
dade alicerçada na égide do Capitalismo e suas várias
faces assumidas ao longo da História, coloca a domi-
nação como forma necessária para a sustentação do
sistema político-econômico.
Seja de forma conflituosa às duras penas
ou espreitamente oculta, constata-se a presença de
estratégias de grupos dominantes, que buscam fo-
mentar padrões de pensamento e comportamento
social, insistindo em perdurar e difundir seus valo-
res numa sociedade que, historicamente, se cons-
truiu por divisões sociais.
De um lado, os grupos de elite sempre busca-
ram encontrar meios de posicionar-se em patamar de
distinção e assim, fomentar o acúmulo de poder e de
capitais. De outro, as camadas desfavorecidas à mer-
cê da dominação, optam por duas alternativas: aceitar
a dominação e adequar-se à convivência harmoniosa
para a sua existência ou contrapor-se à dominação.
Ambas as alternativas pagam preço alto,
seja sofrendo as resignações da aceitação e forjan-
do sua identidade nos moldes culturais de grupos
dominantes, passíveis à violência simbólica, ou por
outro lado, ficando disponíveis a pagar o preço de
exclusão seletiva, à margem da sociedade, em face
de sua contraposição.
Acontece, com efeito, que o preço a ser
pago nem sempre é visualizado com a consciência
necessária, atribuindo força para uma tendência à

83
culpabilização do singular, amplamente difundida na
sociedade neoliberal. O exemplo de grupos sociais,
você já deve ter ouvido que o índio é preguiçoso e
teimoso, por dispensar “ajuda”; que o negro é rebel-
de e malandro; que o paraguaio é sempre envolvido
com o tráfico ou o contrabando.
Enfim, são infinidades de atribuições nega-
tivas que não é interesse provocar o sentimento de
“coitadisse” do outro, mas apenas de conduzi-lo à
reflexões acerca dos estereótipos generalizados, que
podem estar rotulando um povo, e além disso, se
nossa forma de enxergar o outro esteja tomando
contornos etnocêntricos ao tomarmos uma cultura,
como absoluta, única e verdadeira.
Notoriamente, Bourdieu (2008) mostra como
os sistemas simbólicos imbricados nos campos so-
ciais, tendem a reproduzir sutilmente as desigualdades
culturais e sociais, legitimando uma cultura dominan-
te, de grupos dominantes. Trata-se de um arbitrário
cultural que se manifesta por essa “não consciência”
ou visão naturalizada de que tudo é normal, ou seja,
“é do jeito que tem que ser e ponto final”.
A conivência é, portanto, aliada da reprodu-
ção dessas desigualdades, porque implica em aceita-
ção e com isso, abre brechas para as múltiplas práticas
de violência simbólica (BOURDIEU, 2008). Antes
que se defina a noção de violência simbólica, você já
parou para pensar que os apontamentos levantados
até o momento não deixam a escola de fora?
Pois bem! A escola, também, configura-se

84
como campo e como tal, assume características hie-
rarquizantes, posicionando seus agentes com base
no volume de capitais e de forma alarmante; faz da
ação pedagógica uma tendência à reprodução da de-
sigualdade. Pense no professor como agente, uma
autoridade na sala de aula.
Imagine se esse professor não está prepara-
do para reconhecer e lidar com a diversidade? É cla-
ro que ele não fomentará uma prática pedagógica de-
mocrática de respeito, de tolerância e de interventor
de ações preconceituosas e discriminatórias. Agora,
você percebe a dimensão que a teoria de Bourdieu
alcança? E ainda, o quanto é importante promover o
conhecimento para tirar as vedas do senso comum,
tão responsável por práticas discricionárias?
Levantadas essas reflexões, retornemos ao
conceito de violência simbólica. Para Bourdieu (2008),
entende-se por violência simbólica, as formas de do-
minação econômica e social imposta para reproduzir
os mecanismos de ação, percepção e julgamento aos
dominados, por meio de uma referência cultural, tão
necessária para a perpetuação dos valores de um gru-
po, de uma sociedade.
Como salientou, a cultura é arbitrária, pois,
não se assenta numa única realidade, que por sua vez,
também arbitrária. Socialmente construída, o sistema
simbólico propõe a incorporação da cultura por todos
os seus membros: um arbitrário cultural. Sem perce-
ber, a violência simbólica é legitimada pela aceitação
do dominado que não se percebe como vítima desse

85
processo, ao contrário, o oprimido conforma-se pela
situação “natural e inevitável”.
Mostrou Bourdieu (2008) que a escola tende
a concordar com a seleção e divisão social. De fato,
seus estudos voltaram-se para a realidade francesa,
mas, amplamente, difundida no Brasil pelas concor-
dâncias de sua leitura teórica frente à escola brasileira.
As práticas de violência simbólica, em âmbi-
to escolar, apresentam-se de forma mais corriqueira
do que se imagina, sobretudo, numa sociedade mar-
cada pelas diferenças étnicas, religiosas, de gênero,
de classe, de opção sexual, e dentre tantas outras.
Como disse Pereira (2010, p. 33): “Somos todos di-
ferentes em algum aspecto”.

86
Sugestões para
Aprofundamento de Estudos

 DVD - A sociologia como esporte de combate -


(La Sociologie est um sport de combat)

Resumo: Durante três anos (1998-2001), Pierre Carles


seguiu Pierre Bourdieu em palestras, manifestações
sociais, entrevistas para rádio e TV, tentando compre-
ender suas posições teóricas e seu processo de cria-
ção. Segundo Bourdieu, a Sociologia é um esporte de
combate, não uma ferramenta para validar as decisões
da elite dominante. As pessoas precisam da Sociologia
para entender as origens das dissimetrias, das violên-
cias simbólicas, e reagir, buscando uma saída para o
fatalismo econômico da ideologia hegemônica atual.

 Livros

BOURDIEU, P. Esboço de uma teoria da prática. In:


ORTIZ, R. (Org.). Pierre Bourdieu. Sociologia. São
Paulo: Ática, 1983. p. 46-81.
BOURDIEU, P. Razões práticas: sobre a teoria da
ação. 9ª. Ed. Tradução: Mariza Corrêa. Campinas/SP:
Papirus, 1996.
BOURDIEU, P. Sobre as artimanhas da razão impe-
rialista. In: NOGUEIRA, M. A. (Org.). Escritos de
educação. Petrópolis: Vozes, 1998, p. 72-79.
BOURDIEU, P. A miséria do mundo. 5ª Ed. Tra-

87
dução: Mateus S. Soares Azevedo. Petrópolis: Vozes,
2003.
BOURDIEU, P. Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense,
2004.
BOURDIEU, P. O poder simbólico. 11ª. Ed. Tradu-
ção: Fernando Tomaz. Rio de Janeiro; Bertrand Brasil,
2007.
NOGUEIRA, M. A; NOGUEIRA, C.M.M. Bour-
dieu e educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
TURI, M. L.R. et. al. (Org). Sociologia para educa-
dores. Rio de Janeiro: Quart, 2006.

 Periódico

REVISTA NOVA ESCOLA. Bourdieu, o investi-


gador da desigualdade. Disponível em: http://revis-
taescola.abril.com.br/historia/fundamentos/pierre-
-bourdieu-428147.shtml.

Exercício Proposto
1) Assista ao filme “Quem quer ser um milionário?”.
Procure lembrar-se do que foi estudado da teoria de
Pierre Bourdieu e reflita sobre o Multiculturalismo no
contexto educacional. Faça um texto de no mínimo
15 linhas a partir do roteiro proposto.

QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO?


Duração: 120 minutos

88
Gênero: Drama
Ano de lançamento: 2008
Diretor: Danny Boyle, Loveleen Tandan
Elenco: Dev Patel, Anil Kapoor, Saurabh Shukla,
Raj Zutshi, Jeneva Talwar, Freida Pinto, Irfan
Khan, Azharuddin Mohammed Ismail, Ayush
Mahesh Khedekar, Sunil Aggarwal, Jira Banjara,
Sheikh Wali, Mahesh Manjrekar, Sanchita Couhda-
ry, Himanshu Tyagi.

Sinopse:

Jamal Malik (Dev Patel)


tem 18 anos, vem de
uma família das favelas
de Mumbai, Índia, e está
prestes a experimentar
um dos dias mais im-
portantes de sua vida.
Visto pela TV por toda
a população. Jamal está
Fonte: http://www.andrevita. apenas a uma pergunta
com/borasolano_aprendiz/ de conquistar o prêmio
de 20 milhões de rúpias
na versão indiana do programa Who Wants To Be A
Millionaire? No entanto, no auge do programa, a po-
lícia prende o jovem Jamal por suspeita de trapaça. A
questão que paira no ar é: como um rapaz das ruas
pode ter tantos conhecimentos? Desesperado para

89
provar sua inocência, Jamal conta a história da sua vida
na favela - onde ele e o irmão cresceram -, as aventuras
juntos, os enfrentamentos com gangues e traficantes
de drogas e até mesmo, o amor por uma garota.

Sugestão de Roteiro

a) Quais relações você realizou com o filme e o con-


ceito de realidade social?
b) É possível perceber o Multiculturalismo no filme?
Em qual (is) momento (s)?
c) Quais relações você realizou com o filme e o con-
ceito de capital econômico, cultural, simbólico e so-
cial?
d) Há momentos do filme que você identifica a vio-
lência simbólica? Quais?
e) Na sua opinião, você acha que Jamal (protagonista
do filme), conquistou o prêmio máximo do programa
de televisão por pura sorte?

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