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Prof.

Volney Gouveia

Planejamento do Transporte Aéreo

Capítulo I – Uma Visão Geral da Aviação Comercial

Assim como em diversos setores da economia, a indústria aérea é complexa, dinâmica e


vultosa, com elevado grau de interação operacional e econômica. Assim, vale destacar alguns
números que justificam sua dimensão em âmbito nacional e internacional. Abaixo
apresentaremos um breve panorama da indústria aérea (aviação comercial), alguns números
que justificam sua relevância, um breve panorama da aviação brasileira em números e
algumas curiosidades do setor.

1.1. Panorama da Indústria Aérea

O desenvolvimento do setor aéreo brasileiro confunde-se com o desenvolvimento do setor


aéreo mundial. Desde os anos 20 a indústria aérea vem ocupando espaço econômico relevante
na economia brasileira. A aviação comercial regular quase 10% do PIB (IATA, ANAC, 2015). Essa
presença é resultado do aumento do número de empresas aéreas, do aumento do número de
passageiros e da ampliação da infraestrutura aeroportuária. O desenvolvimento econômico,
que gerou necessidades de transporte de passageiro e carga, permitiu o surgimento de
empresas que passaram a ampliar gradativamente a oferta de assentos/voos nas principais
ligações aéreas, notadamente as capitais dos estados brasileiros, e os investimentos em novas
tecnologias para fazer frente aos desafios econômicos e operacionais. Duas funções
essenciais do transporte aéreo são estimular o desenvolvimento regional e permitir maior
integração territorial.

O setor aéreo pode ser classificado em quatro elementos: econômico, gerencial, operacional e
histórico-legal. O aspecto econômico trata das variáveis preço, custo de fatores de produção,
receita operacional e resultado financeiro (lucro/prejuízo). O aspecto gerencial se relaciona às
operações aéreas propriamente ditas e suas particularidades, como movimentos de pouso e
decolagem, organização da infraestrutura aeroportuária, movimentação de aeronaves e
equipes de voo (tripulantes) e de terra (aeroporto e empresa). O elemento gerencial refere-se
à gestão das operações aéreas. Viabilizar operações aéreas diárias implica na utilização de um
completo aparato tecnológico, como sistema de gerenciamento de escala de tripulantes,
gestão de embarque e desembarque de passageiros (check-in, bagagem, compra de bilhete, e-
ticket etc.). Esse aparato garante o funcionamento regular do sistema aéreo nacional. O
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elemento histórico-legal trata da evolução histórica da indústria aérea e de seu arcabouço


legal (legislações, regulamentos, portarias, normativas etc.), fundamentais para a organização
e desempenho do setor.

O setor aéreo, importante meio de transporte, convive com uma árdua escalada econômica.
Flutuações econômicas (PIB, variação cambial, sazonalidade da demanda etc.) e alterações
bruscas nos custos de produção (preço do combustível, leasing de aeronaves e softwares,
custos trabalhistas etc.) interferem diretamente no resultado financeiro das empresas aéreas.
Essa instabilidade leva as empresas a buscarem continuamente ganhos de eficiência,
gerenciando capacidade produtiva (insumos e pessoal) para sobreviverem em um mercado
cuja competição é um ingrediente adicional que pressiona as margens de ganho.

O gerenciamento de uma empresa aérea implica em conhecer as características do produto


“assento de aeronave”. Uma empresa não vende apenas um assento, mas um conjunto de
serviços agregados cuja cadeia de valor começa no momento em que o passageiro decide pela
compra do bilhete aéreo, embarca na data programada, recebe o atendimento em voo,
desembarca no destino programado, recebe assistência, embarca de volta, desembarca no
ponto de origem e finaliza sua viagem satisfeito com o serviço prestado. Para ampliar o leque
de destinos aos passageiros, as empresas estabelecem parcerias estratégicas na forma de
interline, codeshare, joint venture ou alianças globais. O êxito nessas operações depende das
condições regulatórias existentes. Por exemplo, a existência de regras mais liberalizantes pode
limitar a eficácia da estratégia da empresa na medida em que os concorrentes podem lançar
novos voos e/ou reduzir preços. Adicionalmente, os mercados apresentam perfis de tráfego
específicos (business ou leisure), que influenciam nas políticas de preços. Isso quer dizer que
mercados business são menos sensíveis a preços e mais sensíveis à disponibilidade de voos, ao
passo que mercados leisure são mais sensíveis a preço e menos sensíveis à disponibilidade de
voos no curto prazo. A compreensão dessa segmentação determina as decisões de malha
aérea e preço praticado, o que impacta nos resultados financeiros e, em última instância, na
própria sobrevivência da companhia.

Esse ambiente específico de competição impõe às empresas a necessidade de administrarem


custos para competir em preço. As operações aéreas implicam, inicialmente, entender como
se criam os voos e quais os fundamentos envolvidos na definição da malha aérea.
Essencialmente, trata-se da alocação da demanda (passageiro e/ou carga) à oferta (aeronaves
disponíveis). O conjunto de voos criados constituem a malha aérea (networking) e o tipo de
rede aérea que será operada (voos diretos, com escala, com conexão e/ou com empresas
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parceiras). Particularmente no caso dos voos internacionais, existem regras específicas que
devem ser obedecidas pelas empresas e atentadas pelas autoridades aeronáuticas nacionais,
de maneira a que as operações estejam em consonância com as legislações vigentes.

1.2. Alguns Números da Indústria Aérea: Dimensão e Abrangência

A aviação comercial mundial oferece em média 100 mil voos e 30 milhões de assentos
diariamente! Ela emprega aproximadamente 108 milhões de profissionais especializados
direta e indiretamente e negocia anualmente mais de 600 novas aeronaves (ATAG, 2016). Do
total das exportações inter-regionais, a aviação comercial responde por 40% do total
transportado. O movimento de passageiro e carga transportados gerou, em 2009, USD 552
bilhões de receita (venda de passagens, carga e outros) e USD 535 bilhões de dólares em
custos operacionais, produzindo uma rentabilidade média de 2,9%. Comparativamente a
outros setores da economia (bancos, indústria de manufaturas etc), e à própria indústria aérea
(sistemas de distribuição de passagens, fabricantes de aeronaves, motores aeronáuticos etc), a
aviação comercial apresenta reduzidas margens de ganhos, o que explica – em parte – a
reduzida movimentação de suas ações no mercado acionário.

A média de passageiros transportados tem se aproximado dos 3,0 bilhões (doméstico +


internacional). Mediante a existência de 7 bilhões de habitantes no planeta, esse número
representa 43% da população mundial. Levando-se em conta que cada passageiro voa, em
média, duas vezes por ano, o percentual real de habitantes que voam no mundo é estimado
em 20%. Ou seja, há um potencial global de 80% da população mundial que nunca voou,
representando excelente oportunidade a ser explorada pela indústria aérea, mas cuja
exploração depende de muitos fatores os quais serão tratados mais adiante. Os impactos
econômicos diretos são estimados em USD 4,8 trilhões (8% do PIB mundial). Quando se trata
da América Latina, o tráfego representa 3% (227 milhões) do tráfego mundial e 5% (USD 27,6
bilhões) da Receita global.

No Brasil, a aviação comercial opera aproximadamente 130 voos internacionais e 2.700


nacionais diariamente! São aproximadamente 40 empresas internacionais regulares de
passageiros e carga e 13 empresas domésticas regulares de passageiros.

A densidade de tráfego é um bom indicador de avaliação de potencial de crescimento da


demanda por transporte aéreo. A figura abaixo mostra o número de viagens por habitante em
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diferentes regiões do mundo. Na América do Norte são 2,5 viagens por habitante (926 mi de
pax/408 mi de habitantes), contra 0,85 da Europa, 0,16 no Oriente Médio

PIB: 9,3 tri


Pop.: 408 mi PIB: 9,5 tri
Pax.: 926 mi Pop.: 746 mi
T.p.c.: 2,5 Pax.: 628 mi
T.p.c.: 0,85 PIB: 7,1 tri
Potencial: 3x Pop.: 3.700 mi
Pax.: 601 mi
T.p.c.: 0,16
Potencial: 14x
PIB: 1,6 tri
Pop.: 416 mi
Pax.: 189 mi
T.p.c.: 0,45 PIB: 0,5 tri
Potencial: 5x Pop.: 784 mi
Pax.: 100 mi
T.p.c.: 0,13
Potencial: 18x

Fonte: FMI, IATA, ICAO

É possível fazer uma extrapolação para identificar o potencial de expansão da aviação


comercial em alguns países selecionados, incluindo o Brasil. Os quatro principais países do
mundo com maior população (EUA, China, Índia e Brasil) transportam aproximadamente 1
bilhão de passageiros. Em relação às suas populações, este número representa 0,5 viagem por
habitante. Como estes países apresentam grande potencial de crescimento, se se chegar no
futuro à densidade de 1 viagem por habitante, estima-se que quase 1 bilhão a mais de
passageiros será incorporado ao sistema aéreo.

Em 2012, quase 3 bilhões de passageiros foram transportados em 6 regiões do globo. O gráfico


abaixo mostra a forte presença da Ásia-Pacífico, América do Norte e Europa. África, Oriente
Médio e América Latina ainda estão mais distantes:

Passageiro Transportado (mi) - 2012 (ATAG)


947,9

780,6 808,0

226,5
144,0
69,8
América

América
Africa

Europa

Oriente
Pacifico

Latina e

Médio
Caribe

Norte
Asia-

do

Fonte: ATAG, 2016


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No entanto, o número de voos é maior na América do Norte, reflexo do maior número


de aeronaves de configuração média menor (gráfico abaixo).

Número de Voos (mil) - 2012 (ATAG)

12.246

9.602 9.401

3.340
1.600 1.240
América

América
Africa

Europa

Oriente
Pacifico

Latina e

Médio
Caribe

Norte
Asia-

do
Fonte: ATAG, 2016

Já o número de aeroportos está concentrado na Europa, seguida da Ásia-Pacífico e América do


Norte.

Número de Aeroportos Comerciais

959,0
906,0
866,0

631,0

371,0

131,0
América

América
Africa

Europa

Oriente
Pacifico

Latina e

Médio
Caribe

Norte
Asia-

do

Fonte: ATAG, 2016

Quanto ao número de empresas aéreas, Europa e Ásia-Pacífico são as regiões que apresentam
o maior número. Curiosamente, América do Norte tem um número menor que o da América
Latina (167 contra 177). Tal disparidade é explicada pelo fato de nos Estados Unidos existirem
empresas tradicionais gigantes que dominam o setor (one of the biggest ones). O Oriente
Médio possui o menor número de empresas.
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Número de Empresas Aéreas

387
355

245

177 167

64

América

América
Africa

Europa

Oriente
Pacifico

Latina e

Médio
Caribe

Norte
Asia-

do
Fonte: ATAG, 2016

Por outro lado, o número de aeronaves em serviço é predominante na América do


Norte (7.776), contra uma média de 1.400 em regiões em desenvolvimento (gráfico abaixo).

Número de Aeronaves em Serviço

7.776

6.251 6.306

1.833
1.273 1.062
América

América
Africa

Europa

Oriente
Pacifico

Latina e

Médio
Caribe

Norte
Asia-

do

Fonte: ATAG, 2016

Em termos de trabalho, são empregados aproximadamente 110 milhões de trabalhadores nas


seis regiões. Desse total, quase 10 milhões estão diretamente empregadas na aviação. Os 100
milhões restantes estão distribuídos no setor do turismo (58,2 mi), nos ramos induzidos (23,2
mi) e indiretos (18,4 mi). A riqueza agregada e incorporada ao PIB mundial apenas pelo setor
da aviação soma US$ 605 bilhões (ou 1% do PIB mundial). Ao considerar o setor do turismo,
ramos induzidos e indiretos, o valor chega a US$ 6 trilhões (ou 8% do PIB mundial)

1.3. Aviação Comercial no Brasil

Ao nos referirmos às empresas aéreas brasileiras, pensamos recorrentemente nas


quatro grandes empresas que dominam o mercado brasileiro: TAM, GOL, AZUL e Avianca. Isso
é compreensível porque são estas empresas que estão mais expostas na mídia no dia a dia. No
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entanto, suas dimensões são mais profundas do que imaginamos. A aviação comercial
brasileira realiza aproximadamente 2.700 voos nacionais.

São realizadas atualmente 0,6 viagem per capita (ou quase uma viagem para cada dois
habitantes). Há dez anos este número era de 1 viagem para cada 4 habitantes. Aumentamos
100% a densidade de tráfego na última década. Estimativa da IATA indica que poderemos
chegar a 1 viagem por capita até 2030. Isso significa que há potencial para que cada brasileiro
voe pelo menos uma vez por ano. Se isso ocorrer, dobraremos o número de pessoas que voam
atualmente. Alcançar a meta depende da continuidade da política de investimentos e de
programas de estímulo governamentais à aviação regional. Em 2012 o governo lançou um
programa que contempla investimentos em 270 aeroportos espalhados pelo país e cujas
distâncias estejam a um raio de 100 km, no máximo. Esse critério permite que mais de 90%
dos municípios brasileiros estejam cobertos por malha aérea, constituindo em excelente
oportunidade para que milhões de brasileiros tenham acesso ao modal aéreo. No entanto,
aproximadamente 67 aeroportos do país movimentam os quase 100 milhões de passageiros
que utilizam o sistema anualmente, o que representa praticamente 98% de todo o tráfego
aéreo de passageiros do país. A incorporação de novos aeroportos ao sistema permitirá
ampliar tanto o número de aeroportos servidos como o número de passageiros atendidos,
ampliando assim a densidade de tráfego.

O gráfico abaixo mostra a evolução da oferta e da demanda por transporte aéreo no


Brasil para o período de 1960 a 2015. Percebe-se que, em 1960, a oferta de ASK
(assento.quilometro) era de 5 bilhões e em 2015 totalizou 117,7 bilhões; a demanda, que era
de 2,5 bilhões em 1960, totalizou 94,4 bilhões em 2015.

Evolução da Oferta (ASK) e Demanda (RPK) no Transporte Aéreo Doméstico no Brasil

117,7
119,3
116,1 115,9 116,1

102,0
93,3 94,4
87,0
88,2
81,5

70,4

50,2

42,0

35,4
23,0
17,0 22,5
11,0 22,5
9,0 12,5
4,9 10,0 16,0
5,0 4,7
4,9 8,0
2,5 2,4 2,6
1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2011 2012 2013 2014 2015

ASK RPK (DOM)

Fonte: ANAC, 2016 – elaboração própria


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Quando se analisa a relação entre crescimento econômico e demanda por transporte aéreo
(RPK), observa-se que a partir de 1994, quando o Brasil consegue estabilizar a economia e
equalizar algumas questões macroeconômicas importantes (dívida externa, hiperinflação,
dívida pública), o setor aéreo brasileiro se desloca positivamente da curva do PIB, mostrando
alto nível de sensibilidade da demanda à atividade econômica e às flutuações da renda.

Relação entre PIB e Demanda Transporte Aéreo (1960=100)


1960

1965

1970

1975

1980

1985

1990

1995

2000

2005

2010

2011

2012

2013

2014

2015
RPK (DOM) PIB % real

Fonte: ANAC, 2016 – elaboração própria

Alguns números da indústria aérea chama a atenção. Vejamos alguns:

 A taxa de acidentes nos EUA e Europa é de 0,3 por milhão de voos; no Brasil é de 1,7
desastre por milhão de voo.

 No Brasil, a chance de um acidente com mortes sem sobreviventes é de 1 em cada 2


milhões; nos países ricos, o mesmo índice é de 1 a cada 14 milhões

 Acidentes por meio de transporte (por milhão): Rodoviário: 201,3; Aquaviário: 5,3;
Ferroviário: 3,0; Aéreo: 1,0

 A chance de bater o carro a caminho do aeroporto é 500 vezes maior do que o avião
cair...

 A cada 1.000 mortes, 0,45 são aeroviários

 Probabilidade de acidente é de 1 a cada 67 mil voos; e de acidente com morte é 1 a


cada 345 mil voos

 Segundo Embraer, mercado de aeronaves executivas movimentará 260 bilhões no


período 2012-2021, representando 11.275 novas unidades

 Um voo internacional pode lançar quantidade de carbono na atmosfera equivalente ao


que um carro faria em 100 anos.

 Segundo Boeing, serão necessárias 34 mil novas aeronaves nos próximos 20 anos
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 Brasil tem segunda maior frota de aviões agrícolas do mundo (1.663), contra 5 mil dos
EUA

 3,0 bilhões de pax transportados em todo o mundo em 2012

 50 milhões de toneladas em voos cargueiros

 5,5 milhões de trabalhadores empregados

 Se a aviação fosse um país, seria o 21º PIB Mundial (US$ 425 bi)

 Um avião B747 consome 4 litros de combustível por segundo; durante 10 horas de voo
consome 150 mil litros

 Gasto da Gol com combustível: $3,3 bilhões/ano. 58 litros por minuto.

 Nº aeroportos no Brasil: 2.498 (2º no mundo); 1º EUA, com 16.507

 90% do tráfego concentra-se em 20 aeroportos. 739 aeroportos públicos e 1.759


privados

Fontes: Santana (2011), Oxford (2009), Cenipa, Boeing, Embraer, Aeromagazine, ANAC, ABAG

Capítulo II – Aspectos Gerais da Aviação Comercial

Discute-se a seguir algumas características intrínsecas do setor aéreo, as influências de vetores


macroeconômicos sobre o seu dinamismo (como o PIB, a taxa de câmbio, a inflação e suas
interações), alguns fundamentos operacionais (Curva S e QSI - Índice de Qualidade de Serviço)
e os principais indicadores econômicos e operacionais de desempenho do setor.

2.1. Características da Indústria Aérea

A indústria aérea apresenta características peculiares que a diferencia de outros setores. Como
unidade produtora, tem na oferta de voos um produto peculiar: ele se desloca a distâncias
diferentes. Essa particularidade faz muita diferença nas análises de desempenho econômico.
Compreender esta dinâmica exige que conheçamos algumas características intrínsecas do
setor aéreo, apresentados a seguir.
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2.1.1. Intensivo em Tecnologia:

A indústria aérea é intensiva em tecnologia. Ou seja, seu progresso depende da melhora


continua dos processos de produção (aeronave, operações aeroportuárias, software de gestão,
etc) e da incorporação de inovação. Mais do que una exigência operacional (melhora a
produtividade das operações aéreas e garante seus níveis de Segurança), a tecnologia permite
a obtenção de ganhos de escala de produção e, por conseguinte, a redução de custos, o que
impacta na eficiência económica e, em última instancia, na melhora dos resultados financeiros.
O senso comum diz que quanto mais tecnologia incorporada no processo produtivo, maiores
serão os prejuízos em termos de emprego. De fato, toda incorporação tecnologia implica na
redução do uso de trabalho humano. No entanto, essa desvantagem é de curto prazo, pois no
longo prazo a tecnologia acaba por gerar novas possibilidades de negócios e novas
oportunidades de emprego. Na aviação, podemos intuir q, no futuro, o avanço tecnológico
exigirá menos funcionários, tanto de voo quanto de terra, impedindo o acesso de profissionais
neste mercado. É salutar entender q, apesar desses riscos, sua chance de ocorrência é muito
limitada. Uma breve análise dos números é capaz de expressar os limites dos eventuais efeitos
nocivos da tecnologia sobre o trabalho. Atualmente o mundo conta com aproximadamente 7
bilhões de habitantes. O número de passageiros transportados pela aviação comercial mundial
é estimado em 2,5 bilhões. Considerando que desse total cada passageiro voa em média duas
vezes ao ano, tem-se algo aproximado de 1,3 bilhão de pessoas utilizando o transporte aéreo.
Com todo o avanço tecnológico das últimas décadas, percebe-se que menos de 20% da
população mundial voam! Nesta perspectiva, a tecnologia foi e continuará sendo uma grande
aliada na popularização do transporte. Assim, é essencial que seus profissionais estejam em
processo de formação contínua para fazer frente ao uso adequado das tecnologias do setor e
contribuir, assim, para a popularização e desenvolvimento da indústria aérea em escala global.

2.1.2. Alta Alavancagem Financeira

A aviação mobiliza muitos recursos financeiros. Em 2012, segundo a IATA, as empresas aéreas
regulares movimentaram $550 bilhões de dólares de Receita e $535 bilhões de custos. A
margem operacional (lucro) ficou em $15 bilhões (rentabilidade de 2,7%). Ou seja, apesar de
movimentar muitos recursos, a indústria aérea tem ganhos muito reduzidos! Movimentam-se
muitos recursos, mas se ganha muito pouco! Essa é uma característica do setor. Ele está muito
exposto às oscilações da atividade económica (sua elasticidade é alta) e os fatores produtivos
utilizados (aeronave, aeroportos, navegação, manutenção, dentre vários outros) são muito
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caros. E existe uma peculiaridade do setor que o distingue de alguns outros, por exemplo o
sistema financeiro ou fabril. Um banco, ao conquistar mais um cliente para sua carteira,
incorre em custos marginais bem menores que uma empresa aérea. A plataforma tecnológica
já instalada não precisa ser aumentada para atender a um cliente a mais; mas uma empresa
aérea precisa, na margem, adquirir mais aviões, equipamentos e pessoal para transportar um
cliente adicional. Esta particularidade coloca um desafio permanente: crescer de forma
bastante planejada para evitar desperdício de recursos! Assim, operações incrementais
implicam em custos incrementais, mantendo sua característica de baixa rentabilidade.

2.1.3. Alta Alavancagem Operacional

As operações aéreas são complexas. Desde o momento no qual um cliente decide realizar uma
viagem ou transportar sua carga até o momento do desembarque do passageiro e carga e sua
saída do Aeroporto, várias etapas devem funcionar coordenadamente para que todas as
operações aéreas sejam concluídas com segurança e eficiência (regularidade e pontualidade).
Essa situação não é irrelevante. O Brasil realiza diariamente uma média de 2,7 mil voos por dia
e, ao final do dia, com algumas exceções, tudo tem dado certo! Os 67 principais aeroportos, 06
dos quais movimentando 70% do mercado de passageiros e 02 dos quais com 90% do volume
de carga. Essas operações, por natureza, geram movimentos de fluxo de passageiros e cargas e
impõe o desafio de se evitar um "truncamento" dos serviços, comprometendo a fluidez das
operações.

2.1.4. Influência de Custos Estruturais

A aviação é uma indústria cara. Decolar aeronaves implica em uma série de custos que, nem
sempre, são cobertos pelas receitas de voo. Os mais relevantes são o combustível, o
arrendamento de aeronaves e a tripulação técnica. No caso particular do Brasil, o "efeito
dólar", o preço do combustível e a carga tributária constituem variáveis que tiram
competitividade das empresas. Estes custos serão discutidos adiante com mais detalhes.

2.1.5. Regulamentação Governamental

A aviação é um setor com forte presença regulatória dos governos. Igualmente a diversos
setores da economia, tal regulação se justifica para manter padronização das operações, níveis
mínimos de segurança, condições de desenvolvimento e atendimento adequado dos serviços.
A padronização é essencial porque organiza, segura e eficientemente, a complexa interação
dos atores aeronáuticos (aeronaves, profissionais de voo, aeroporto, equipamentos de solo e
ar etc). Sem a presença do regulador, o setor operaria discricionariamente, estabelecendo suas
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próprias regras de operação e comprometendo a segurança do sistema. É inconcebível a ideia


de empresas operarem aviões e contratarem tripulação sem que sejam cumpridas exigências
mínimas (certificação de aeronaves, homologação de treinamentos etc). A regulação não é um
mal necessário; é uma exigência. Ao se padronizar as operações, padrões de segurança são
estabelecidos, pois cada operador deve cumpri-los.

2.2. Influências Econômicas sobre a Aviação Comercial

O governo atua sobre a economia por meio do controle de preços de bens públicos, câmbio,
fluxos de capitais, comércio exterior entre outros. A incerteza acerca de políticas públicas
futuras pode contribuir para potencializar incertezas no cenário econômico e elevar os custos
de captação de empréstimos e financiamentos no mercado financeiro pelas empresas aéreas,
impactando inclusive nos prazos dos contratos. A exemplo de experiências de política
econômica do passado1, desajustes macroeconômicos (instabilidade cambial, juros altos,
descontrole inflacionário) exercem impactos nos custos das empresas e por consequência
geram ineficiências na alocação de recursos e desalinhamentos nos preços relativos. Nos
últimos anos, a política cambial e o comportamento do preço dos combustíveis – que sofre
interferência direta do governo - contribuíram para alterar as condições econômicas do setor
aéreo. A título de exemplo, em 1992, tanto as variações cambiais como os combustíveis
somaram 44% do total dos custos (23,5% para o câmbio e 10,5% para os combustíveis). Em
2002, esse percentual passou para 46,5% (23,1% e 23,4%, respectivamente).

O setor aéreo sofre diversas influências econômicos que não apenas da atividade econômica.
Elementos da economia nacional como inflação, taxa de câmbio, fluxo de comércio e de
pessoas e o preço dos insumos produtivos são determinantes. Para compreendermos a
dinâmica do setor com a atividade econômica, analisemos o chamado fluxo de processo.

2.2.1. Fluxo de Processo: a interação entre economia e aviação comercial

Muitas análises sobre o setor são difundidas em relatórios especializados e na mídia em geral.
Essas análises via regra abordam os efeitos das flutuações da economia sobre o
comportamento da demanda por transporte aéreo, do preço dos combustíveis e das variações
do preço do dólar. Cabe compreender um pouco a relação existente entre o ambiente
econômico e o setor aéreo e suas particularidades.

1
Para uma compreensão mais detalhada das experiências de política econômico recente no Brasil, sugere-se a
leitura da obra Economia Brasileira Contemporânea: 1945-2010, de Giambiagi at al.
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A atividade aérea constitui importante modal de transporte. Essa importância é reflexo da


complexidade e integração da economia dos países, cujo aumento do comércio e dos serviços
tem impactado fortemente na geração de demanda por viagens aéreas mais rápidas e seguras.
A ação produtiva dos agentes econômicos (empresas, trabalhadores, entidades e governo)
gera uma infinidade de necessidades de transporte. Uma empresa que produz chips precisa
transportá-los de forma rápida e segura para diversos mercados. Os trabalhadores que
trabalham na indústria de chips são remuneradas e demandam serviços de turismo; os tributos
incidentes sobre a comercialização de chips, arrecadados pelo governo, são aplicados, por
exemplo, na aquisição de passagens aéreas para os membros do governo, que viajam em voos
de carreira para firmarem acordos com outros países. Também os empresários precisam viajar
a negócio para fechar novos contratos de venda no mercado interno e externo. Neste simples
exemplo é possível perceber que o modal aéreo tem papel relevante pois atende a uma
demanda de viagem aérea motivada por turismo (trabalhadores), negócios (empresários e
governo) e carga (empresas). Se uma economia pudesse ser resumida em produção de chips,
diríamos que sua produção gera necessidades de transporte de passageiro e carga,
constituindo-se assim na demanda por transporte aéreo. A dimensão desta demanda
determinará o nível de desenvolvimento da aviação desta economia. Para atender a esta
demanda, as empresas aéreas mobilizam um conjunto de fatores de produção (recursos
humanos, tecnologia, matéria prima e capital) para oferecer voos na dimensão aproximada da
da demanda. Em outras palavras, as empresas geram a oferta para atender à demanda
existente; e quanto mais esta demanda cresce, mais as empresas estarão dispostas a ofertar
mais voos. Para atender à demanda então as empresas elaboram a malha aérea e precifica
seus voos de forma a obter lucratividade. A ação produtiva das empresas gera impactos
diretos e indiretos sobre a economia. Produzir voos implica em comprar aviões, o que
dinamiza a indústria aeronáutica; implica também na contratação de trabalhadores, que
recebem salários e os gastam na aquisição de bens e serviços produzidos na economia; a
obtenção de capital para investimentos amplia o movimento de crédito; o transporte de
passageiro também amplia os negócios de turismo, gerando empregos indiretos e
movimentando as economias locais; a compra de combustível, insumo que representa 35%
dos custos, impacta diretamente na indústria química. A aviação, assim, promove efeitos
diretos e indiretos sobre a própria economia, contribuindo para a geração de mais demanda
por transporte aéreo. Este ciclo virtuoso depende de quão crescentes são os investimentos
globais do sistema econômico. Mais investimentos geram mais necessidade de transporte, que
geram mais voos e mais negócios. Este ciclo é crucial para o desenvolvimento da aviação
comercial dos países. Ainda que o ciclo virtuoso exista, também há o ciclo contrário. Países que
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apresentam condições econômicas desfavoráveis (alta inflação, flutuações do preço do dólar;


elevação das dívidas externa e interna, juros elevados) impedem o crescimento da aviação. A
alta inflação tira poder de compra da renda dos trabalhadores, fazendo com que deixem de
voar ou passem a voar menos; as flutuações do dólar geram aumentos dos custos das
empresas, tornando as passagens mais caras e/ou resultados financeiros mais baixos; a
elevação das dívidas torna os financiamentos mais caros, limitando a capacidade das empresas
de adquirirem novas aeronaves. Têm-se assim que a própria estabilidade econômica é
condição necessária para a expansão da demanda e oferta do transporte aéreo.

2.2.2. Considerações sobre o PIB

Uma percepção geral sobre o PIB de um país é que ele se constitui no chamado Produto
Interno Bruto. Apesar dessa percepção, o PIB de um país reflete o conjunto de bens e serviços
produzidos por um país em determinado período de tempo, geralmente medido em termos
anuais. No caso particular do Brasil, sua medição ocorre trimestralmente e é divulgado pelo
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas). Ele é um importante indicador para
medir a solidez econômica de um país2. Toda e qualquer sociedade enfrenta restrições
econômicas de toda ordem (alimentação, moradia, transporte, educação, saúde, cultura e etc).
No entanto, não existem recursos abundantes e disponíveis para satisfazer a todas elas! É
preciso mobilizar um conjunto de fatores de produção entre si (capital, trabalho, recursos
naturais e matérias primas) para viabilizar a produção dos bens e serviços necessários à
sociedade. Para “resolver” este dilema, as empresas e as famílias selam um pacto de
cooperação (ainda que muitas vezes de forma tensionada!) para produzir os bens e serviços.
As empresas contratam trabalhadores, mobilizados para produzirem bens e serviços, e as
famílias recebem uma renda "equivalente" àquilo que foi produzido. Essa identidade
macroeconômica básica nos permite compreender a composição do PIB. Se empresas
produzem 100 produtos e as famílias recebem 100 unidades monetárias de renda, e supondo
que o preço vendido do bem seja de 1 unidade monetária, teremos então apenas uma "troca
de favores" entre empresas e famílias. Aquelas trocam bens e serviços por dinheiro e estas
trocam dinheiro por bens e serviços. As empresas atendem ao seu objetivo de obter lucros e
as famílias o de obter bem-estar social. O esforço da empresa em produzir é recompensado

2
A teoria econômica estabelece que a condição de desenvolvimento econômico de um país somente é alcançada
quando, à capacidade de produzir riqueza, soma-se a conquista de melhores indicadores sociais (Índice de
Desenvolvimento Humano). Para todos os efeitos, salientamos a importância do PIB neste trabalho porque é ele o
principal indutor de tráfego de passageiro e carga.
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pelo pagamento das famílias; e o esforço das famílias é recompensado pela remuneração
recebida paga pelas empresas. 3

O objetivo da empresa, além de obter lucro, é expandir a produção para ampliar o próprio
lucro; e é objetivo das famílias obter a maior renda possível para ampliar o seu consumo. Estas
duas identidades compõem a formação do PIB, produto e renda. Assim, o PIB é a própria
produção das empresas, viabilizado pelos investimentos; e o Consumo é equivalente à renda
das famílias (PIB = Consumo). Interessa-nos saber a contribuição da aviação para o PIB, e vice e
versa.

2.2.3. A relação entre PIB e Aviação

A realização de um voo exige a combinação de enorme quantidade de fatores de produção.


Quando uma empresa aérea adquiri uma aeronave, da Embraer por exemplo, ela contribui
para o PIB pois ter a aeronave para venda exige a combinação antecipada de diversos fatores,
essencialmente trabalhadores, que produzirão a aeronave. Numa análise bem simplista e
intuitiva, o trabalho dispendido na produção da aeronave permitirá ao trabalhador a obtenção
de uma renda que será, posteriormente, trocada por passagem aérea para realização de uma
viagem a turismo, por exemplo. A contribuição para o PIB, neste caso, é dada em termos de
renda paga ao trabalhador ou da própria produção de uma aeronave, que permitirá a
produção de outros diversos voos. Ou seja, uma aeronave é um produto que multiplica riqueza
quando utilizada frequentemente na produção de mais voos. Este é o efeito multiplicador do
fator aeronave. É o próprio investimento! Quanto maior o investimento (aquisição de mais
aeronaves), maior o impacto positivo sobre o PIB. A Embraer produzirá mais e contratará mais
fatores de produção. E as aeronaves em voo gerarão mais renda ao transportar passageiros a
negócio e/ou turismo, que demandarão outros serviços que também impactarão
positivamente no PIB.

Para a aviação, a importância do PIB relaciona-se ao fato de que quanto maior o ritmo de
expansão da produção de bens e/ou serviços, maiores serão as necessidades de transporte de
passageiros e/ou carga aérea. A tabela abaixo apresenta um comparativo entre PIB, passageiro
transportado (RPK) e carga (ton.km) de 1970 a 2013 no Brasil. O indicador dado pela relação
entre RPK/PIB mostra o grau de relação entre demanda (RPK) e economia (PIB). Para o
segmento de passageiro, observa-se que, em 1970, para cada percentual de expansão do PIB,
o RPK expandiu-se 1,7%. Em 2013 este indicador foi de 4,0, mostrando que o nível de

3 Obviamente que esta interpretação é reducionista e desconsidera o caráter conflituoso das relações
capital/trabalho. De todo modo, o propósito é simplificar o raciocínio para facilitar a compreensão.
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sensibilidade do setor aéreo à expansão do PIB se ampliou fortemente. Na perspectiva de


longo prazo, esse grau de sensibilidade ficou em torno de 1,5. Ou seja, para cada ponto
percentual de expansão da atividade econômica do país, o volume de passageiros
transportados aumentou 1,5%. A mesma análise vale para o segmento de carga e correio. No
longo prazo, a expansão da atividade econômica em um ponto percentual gera um
crescimento da demanda por carga de 1,3%.

Passageiro Carga + Correio


PIB (bi R$) Preços Relação Ton.Km
Ano Var. % RPK (bi) Var. % Var. % Relação RPK/PIB
2013 RPK/PIB (mi)
1970 934 2,5 111,0
1980 2.136 129 8,0 220 1,7 481,0 333 195,0
1990 2.497 17 16,0 100 5,9 797,0 66 11,1
2000 3.193 28 22,5 41 1,5 1.522,0 91 62,4
2010 4.554 43 70,4 213 5,0 1.054,0 -31 (6,2)
2013 4.844 6 88,2 25 4,0
Variação Média Anual por Período 139% 204% 1,5 176% 1,3
Fonte: ANAC e EPE (2011)

Da mesma forma que as expansões do PIB acabam por contribuir mais que proporcionalmente
para o crescimento da aviação comercial, também é correto afirmar que reduções da atividade
econômica impactam negativamente no setor na mesma proporção. Uma evidência
econômica observada no setor aéreo em âmbito global nas últimas décadas tem sido a relação
direta do setor com o crescimento econômico. O desempenho econômico dos países tem
exercido um papel importante na expansão do setor. Por outro lado, os momentos de
desaquecimento econômico impõem fortes impactos negativos ao setor.

Podemos também observar como evoluiu o tráfego e o PIB no período de 1980 a 2013 no
gráfico abaixo. A partir dos anos 2000, percebe-se um forte “descolamento” da curva de
passageiro em relação a do PIB.

800

700

600

500

400

300

200

100

PIB Passageiro
0
1981

1985

1987

1991

1993

1995

1997

2001

2003

2007

2009

2013
1983

1989

1999

2005

2011

2015

Fonte: ANAC, 2016 – elaboração própria


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A dinâmica econômica do país determina - dentre outros fatores que serão discutidos adiante -
o ritmo de expansão do mercado aéreo. A geração de demanda de tráfego de passageiro e
carga pela dinâmica econômica leva as empresas aéreas a coordenarem um conjunto de
fatores de produção (tecnologias, recursos humanos, infraestrutura etc) para viabilizar a oferta
de voos em proporção adequada ao atendimento desta demanda, de forma eficiente e
rentável. O objetivo é garantir uma malha aérea que atenda ao mercado e, ao mesmo tempo,
agregue valor econômico ao negócio (melhore a rentabilidade) e também gere valor percebido
pelo cliente (satisfação do usuário).

Essa coordenação entre demanda de mercado e oferta empresarial produz efeitos


multiplicadores diretos e indiretos. Os diretos dizem respeito à geração de emprego, à
aquisição de insumos produtivos (matérias primas, aeronaves, componentes aeronáuticos,
recursos financeiros, recursos humanos) e os indiretos relacionam-se aos setores beneficiados
na cadeia de produção (agências de viagem, arrecadação de tributos, negócios gerados). Neste
ciclo, a própria aviação impacta positivamente na economia. Por outro lado, outra dimensão
da economia que afeta diretamente a indústria aérea relaciona-se aos próprios agregados
macroeconômicos (PIB, taxa de câmbio, tributação, inflação, dívida externa e políticas
econômicas conduzidas pelo governo). Os efeitos de cada um desses agregados serão
abordados mais adiante. Dependendo dos impactos sobre o setor, toda estratégia de malha
(oferta) e preço (rentabilidade) das empresas pode ficar comprometida, exigindo ajustes mais
drásticos por parte das empresas e impedindo a ampliação do número de voos, criando um
círculo vicioso "para o mal" que restringe o crescimento do próprio mercado aéreo. Assim,
uma condição sine qua non (essencial) é a estabilidade das regras do jogo (variações previsíveis
das condições de mercado) de forma a garantir previsibilidade e segurança aos planos de
negócios das empresas.

2.2.4. Inflação

O fenômeno da inflação é muito discutido entre os economistas e a mídia em geral. No


entanto, pouco sabemos sobre a forma como ela atua diretamente sobre o setor aéreo. A
inflação é definida como o aumento contínuo e persistente dos preços de uma economia em
determinado período de tempo. Se o preço dos bens e serviços se elevam em 10% e a renda
dos trabalhadores mantem-se inalterada, o poder de compra dessa renda diminuirá na mesma
proporção. Isso quer dizer que um trabalhador que ganhe $1.000,00, cujo gasto mensal é
também de $1.000,00, sofra com os impactos de uma inflação de 10%, tal renda passará a ter
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um poder real de compra de apenas $909,10 ($1000/1,10). Essa perda de poder de compra
pode diminuir a demanda por transporte aéreo na medida em que os consumidores redefinem
suas prioridades de gastos e postergam seus planos de viagens. Essa redução da capacidade de
consumo interfere no desempenho das receitas das empresas, que depende do grau de
gerenciamento dos preços e do próprio comportamento da demanda mediante aumentos de
preços indesejados.

2.2.5. Taxa de Câmbio: Efeitos Adversos sobre as Finanças do Setor Aéreo

A taxa de câmbio pode ser definida como "o preço da moeda estrangeira medida em termos
de moeda nacional". Em outras palavras, o quanto de unidade monetária é necessário para
compra de uma unidade de moeda estrangeira. A variação da taxa de câmbio exerce efeitos
diversos (positivos ou negativos) sobre a economia no geral e nas empresas aéreas em
particular. Para a economia, uma queda do preço do dólar pode ser positiva para os
importadores (empresas aéreas inclusive), que comprariam produtos do exterior a um preço
mais baixo em reais4. No caso particular da aviação, cujo setor é intensivo no uso de
tecnologias vindas do exterior, quanto menor for a taxa de câmbio, mais barato será o custo
de produção e, portanto, maiores tenderiam a ser os lucros. Mas se essa lógica vale para a taxa
de câmbio barata (valorização do Real) o mesmo vale para uma taxa de câmbio cara
(desvalorização do Real). Nesta situação, os custos de produção aumentariam e as chances de
aumento de preços seriam maiores, pois as empresas tenderiam a repassar esses custos
adicionais para o preço das passagens. Para os setores exportadores a situação já seria oposta:
quanto mais alta a taxa de câmbio, melhor; quanto mais baixa, pior. Isso porque preço do
dólar caro permite às empresas exportadoras obterem mais reais por unidade de dólar com a
venda de seus produtos ao exterior.

Observando os dados econômicas das empresas aéreas brasileiras, percebe-se que o


percentual dos custos das empresas expostos ao dólar representa aproximadamente 20% dos
custos (ANAC, 2002). O total de custos em 2013 foi de R$ 40 bilhões, sendo R$ 8 bilhões
expostos às variações cambiais. Isso implica dizer que uma variação positiva da taxa de câmbio
de 10% (taxa de câmbio de R$ 2,30 para R$ 2,53), por exemplo, impactaria negativamente em
R$ 800 milhões (8x0,10) no resultado financeiro das empresas. Não à toa, o resultado

4Neste trabalho utilizamos o preço do dólar como referência importante de taxa de câmbio, uma vez que o dólar é
a moeda mais comumente utilizada pelas empresas brasileiras. Mas importante frisar que a taxa de câmbio não é
apenas o preço do dólar, mas o preço de qualquer moeda estrangeira medida em reais.
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financeiro das empresas flutua fortemente de um período para o outro. O nível de exposição
dos custos à moeda nacional constitui uma eficiente “correia de transmissão” dos preços sobre
os custos. O câmbio pode acompanhar estes movimentos de preços e impactar na elevação
dos custos indexados ao dólar.

2.3. Características operacionais

2.3.1. Curva S

Nenhum produto pode ser vendido se não estiver na prateleira. Similarmente à aviação,
nenhum assento pode ser vendido se não estiver à disposição, de forma fácil e acessível, aos
consumidores. Essa condição básica é determinante para o domínio de mercado de uma
companhia aérea. Quanto maior o número de assentos oferecidos - supondo a existência de
demanda a determinada taxa de crescimento - maiores serão as chances de a empresa
absorver este tráfego em expansão. Sob a premissa de que há um crescimento vegetativo
natural dos mercados, é razoável admitir que as empresas, quando bem geridas, estão
"condenadas" a crescer. Isso permite às companhias ampliarem sua presença de mercado por
meio da ampliação da oferta de assentos. Para compreender melhor esta ideia, utilizamos o
conceito de Curva S. Dois elementos são importantes: o capacity share e o market share.
Ambos estão intimamente correlacionados. Ou seja, em condições normais de "temperatura e
pressão", quanto maior o capacity share de uma empresa, maiores são as chances de
ampliação do market share. O Capacity Share é o percentual de participação de uma empresa,
medida em termos de assento.quilometro, no total de assento.quilometro oferecido por todas
as empresas no mercado. Já o market share indica a participação percentual da empresa,
medida em passageiro.quilometro, no total de passageiro.quilometro transportado por todas
as empresas.

A Curva S sugere que, uma empresa que possui participação expressiva na capacidade, tem
maiores chances de absorver mais rapidamente parcelas maiores de mercado a partir de uma
participação superior a 50%. Assim, se uma empresa oferece 100 mil ASKs, e a indústria
oferece 200 mil ASKs, sua participação de 50% (100/200) será determinante para sua
participação no mercado de passageiro transportado. Ainda no exemplo acima, se a empresa
tiver transportado 80 mil pax.km de um total de 160 mil, então seu market share terá sido de
50%. É razoável admitir que, empresas que apresentam expressiva participação na capacidade
ofertada do mercado (ASK), terão participação na demanda de mercado (RPK) expressiva. Essa
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teoria encontra guarida se analisarmos os dados das empresas regulares no Brasil. A TAM, no
período janeiro-maio de 2015, respondeu por 36,1 do ASK ofertado e seu market foi de 36,7%;
a Gol respondeu por 37,2% do ASK ofertado e seu market foi de 36,4%; a Azul tinha 17,1% e
market de 17,0%. Percebe- se que a participação das empresas no mercado é muito similar à
presença na oferta de assentos, o que reforça a ideia de que - se o DNA de uma empresa é
crescer e dominar o mercado - a ampliação da oferta de assentos é crucial, exigindo um
planejamento estratégico bem focado e um plano de frota consistente de curto e longo prazos.
O gráfico abaixo demonstra conceitualmente a ralação entre capacity share e market share.

Figura 1: Conceito de Captura de Tráfego via Participação na Capacidade


100%
Curva S
+15 p.p

85%
Empresa X
70%
A
Capacity Share

45%
+15 p.p

Empresa Y
30%

B
Market Share

30% 40% 60% 80% 100%


+10 p.p +20 p.p

Fonte: elaboração própria

A área A apresenta conceitualmente uma situação na qual a empresa X tem um capacity share
de 70% (ordenada) e 60% (abscissa) de market share no ano 20X1. No ano 20X2 a empresa
amplia o número de voos e seu capacity passa para 85% e seu market share para 80%. Significa
dizer que um aumento de 15 pontos percentuais (85% - 70%) no capacity significou uma
ampliação na presença de mercado em 20 p.p. (80% - 60%). Em resumo, empresas que detém
mais da metade da oferta no mercado, ao aumentarem sua participação na capacidade em 1
ponto percentual, espera-se que sua participação no mercado aumente em proporção maior;
empresas que detém participação menor que 50% da capacidade do mercado, ao aumentarem
em 1 ponto percentual sua participação na capacidade, espera-se que sua participação de
mercado se eleve em proporção menor. Logicamente que este é um conceito geral que
procura apontar a importância para as empresas de adquirirem aviões, em um cenário de
crescimento da demanda, caso não queiram ver sua presença de mercado diminuir. E este é
um fundamento importante que levam as empresas a ampliarem suas frequências de voo e
frota para aumentar ou manter seu poder de mercado sobre os concorrentes.
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2.3.2. Matriz de O&D (Origem e Destino Verdadeiro do Passageiro)

A elaboração de malha aérea é um componente estratégico do plano de negócios das


companhias aéreas. Sua construção exige compreender a distribuição do tráfego. Ou seja, é
preciso saber qual a verdadeira cidade de origem e destino do passageiro. Isso pode parecer
óbvio, mas o senso comum questiona o porquê de determinadas empresas não oferecerem
ligações aéreas entre cidades com relativo grau de desenvolvimento. Ou então por que as
empresas concentram suas operações nas principais cidades e não distribuem seus voos mais
equanimemente utilizando outros aeroportos. Isso ocorre porque as empresas oferecem voos
entre as cidades com maior potencial de tráfego de passageiro e carga. A matriz de ODV
(Origem e Destino Verdadeiro do Passageiro), também conhecida como O&D (Origen and
Destination of Passanger), demonstra a quantidade de passageiros existentes de uma cidade à
outra. A título de exemplo, uma empresa que realiza um voo de Porto Alegre (POA) a Brasília
(BSB) via São Paulo (SAO) possivelmente tem dentro da aeronave passageiros que partem de
Porto Alegre com destino a, não apenas São Paulo e Brasília, mas também a várias outras
cidades, como por exemplo Rio de Janeiro (RIO), Belo Horizonte (BHZ), Salvador (SSA) via São
Paulo ou Brasília (conexão). Percebe-se assim que os passageiros de uma aeronave não são
apenas da cidade de origem e destino do voo, mas de uma infinidade de combinações de
cidades com diferentes quantidades de passageiros. Neste exemplo, os pares de origem-
destino do passageiro podem ser POA-SAO, POA-BSB e SAO-BSB. Veja que nas etapas POA-SAO
e SAO-BSB temos três diferentes ODVs. A Matriz de ODV torna-se estratégica na medida em
que demonstra o potencial de tráfego entre pares de cidade. E como os maiores ODVs se
concentram nas capitais, as empresas priorizam o atendimento destes mercados em
detrimento de ODVs com baixo volume de tráfego (p.e. São Paulo - Sinop, MT). Outra
implicação dos ODVs com elevada concentração é que as empresas acabam por priorizar a
aquisição de aeronaves maiores, que permitem realizar maior número de voo com menos
aeronaves e tripulantes, proporcionando importantes ganhos de escala e redução de custos. O
fator determinante para expansão do volume de trafego é o desempenho econômico das
cidades. Quanto maior for o ritmo de atividade econômica, maior será a quantidade de
passageiro e carga. A forte correlação existente entre ambiente econômico e aviação
comercial é importante indicador de potencial de geração de tráfego.

A tabela abaixo é uma Matriz de ODV. Ela relaciona as seis principais cidades brasileiras e as
possíveis combinações de origem e destino do passageiro. A coluna vertical mostra as cidades
de origem e a linha horizontal mostra as cidades de destino. A setas indicam o significado dos
números constantes de cada quadrante.
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cidade de origem

cidade de destino

Matriz O&D - Média Pax/Dia


A (SAO) B (RIO) C (SSA) D (BSB) E (BHZ) F (POA)

A (SAO) 6034 - 0336 - 01:00 2199 - 1451 - 02:30 2586 - 0855 - 01:10 2415 - 0495 - 01:00 2634 - 0865 - 01:40

B (RIO) 6022 - 0336 - 01:00 1228 - 1217 - 01:55 1594 - 0913 - 01:50 1056 - 0360 - 01:00 0816 - 1121 - 02:10

C (SSA) 2244 - 1451 - 02:30 1193 - 1217 - 01:55 0575 - 1083 - 01:50 0390 - 0959 - 01:30 0070 - 2313 - 02:45

D (BSB) 2525 - 0855 - 01:10 1589 - 0913 - 01:50 0573 - 1083 - 01:50 0820 - 0591 - 01:30 0395 - 1605 - 02:30

E (BHZ) 2089 - 0495 - 01:00 1036 - 0360 - 01:00 0394 - 0959 - 01:30 0870 - 0591 - 01:30 0026 - 1360 - 03:00

F (POA) 2637 - 0865 - 01:40 0832 - 1121 - 02:10 0077 - 2313 - 02:45 0400 - 1605 - 02:30 0031 - 1360 - 03:00

tempo de vôos em horas

distância em Km

nº pax embarcado por dia

No ODV SAO-RIO existem 12 mil passageiros que partem de SAO chegam ao RIO todos os dias.
No lado extremo, no ODV POA-BHZ, temos 26 passageiros/dia que partem de Porto Alegre
com destino a Belo Horizonte. No entanto, estes passageiros não viajam em voos diretos. Eles
embarcam em voos com destino a São Paulo (geralmente em voo com escala ou conexão em
Congonhas-SP ou Guarulhos-SP) e, na sequência, seguem para Belo Horizonte. Esse tipo de
operação, com escala e conexão, ocorre em detrimento do voo direto porque, para a empresa
aérea, não se justifica economicamente alocar uma aeronave de porte médio (145 assentos)
numa rota de baixa densidade de trafego (neste caso, a empresa teria uma taxa de ocupação
de 18%!). Mas, ao mesmo tempo, as empresas não marginalizam os ODVs de baixa densidade
de tráfego. Objetivamente, elas procuram identificar não apenas os passageiros que partem de
Porto Alegre para Belo Horizonte, mas todos os passageiros que partem de Porto Alegre para
todas as outras cidades. Isso implica, por exemplo, embarcar na aeronave de 145 lugares não
apenas os 26 passageiros de POA para BHZ, mas também os passageiros com destino a SSA
(77), BSB (400), SÃO (2.637) e RIO (832), que juntos somam um número de passageiros muito
maior que a configuração de 145, exigindo que a empresa aumente o número de frequências
para atender plenamente aos mercados. Em São Paulo, vários passageiros terão chegado de
outros voos com destino às mesmas cidades, permitindo a ela adensar as aeronaves que
partirão desta cidade. Assim, a elaboração da malha aérea (networking) obedece ao critério de
otimização de recursos (aeronaves, tripulantes e equipe/estrutura de solo), adensamento das
aeronaves, atendimento ao maior número de origens e destinos, viabilização economicamente
dos voos e garantia da satisfação plena dos passageiros.
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2.3.3. Índice de Qualidade de Serviço (QSI – Quality Service Index)

As empresas aéreas possuem cada qual sua estratégia de mercado para angariar mais clientes.
A elaboração de uma malha aérea é algo complexo que envolve diversas variáveis de análise:
disponibilidade de slot5 no aeroporto desejado, aeronave, manutenção, equipe técnica etc.

Mas existe um elemento crucial sem o qual todo esforço para elaboração da malha torna-se
inconsistente: a existência de tráfego. A análise da verdadeira origem e o verdadeiro destino
do passageiro é crucial para a criação de um voo. A título de exemplo, pensemos na rota Porto
Alegre (POA) - Belo Horizonte (BHZ). O número de passageiros que embarca diariamente em
POA com destino a BHZ gira em torno de 31 passageiros. É possível à empresa servir estes
passageiros com voos diários e diretos com aeronave de configuração média de 50
passageiros. Ou então com aeronave de 70 ou mais assentos em voos com escala. Neste caso,
as possibilidades de embarque em POA são ampliadas, pois não apenas passageiros com
destino a BHZ embarcarão, mas também passageiros com destino a outras cidades, mas
desembarcando todos em aeroporto intermediário para conexões. A primeira opção de voo
(direto) é mais desejável que a segunda opção (voo com escala). Os planejadores de malha
aérea, assim, levam em conta uma hierarquia de valores para a construção de uma malha. Essa
hierarquia reflete as preferências dos passageiros quando estes decidem comprar uma
passagem aérea ou quando pretendem contratar um serviço de carga, ainda que no caso de
carga em específico esta preferência seja menos explícita. A essa escala de preferência dá-se o
nome de Índice de Qualidade de Serviço (IQS) - ou QSI (Quality Service of Índex). O índice
consiste numa escala de valores atribuída pelo passageiro à qualidade de uma malha aérea. O
primeiro valor é o voo direto. Passageiros desejam chegar o quanto antes em seus destinos.
Assim, preferem sempre voos diretos a voos com escala. Por outro lado, voos com escalas são
preferíveis a voos com conexão; e voos com conexão são preferíveis a empresas que sequer
oferecem o destino. Sequencialmente, se todas as empresas do mercado oferecem o mesmo
tipo de voo (direto, com escala, conexão), o critério de "desempate" na preferência do
consumidor é a reputação da empresa no mercado (empresas com boa reputação são
preferíveis). Por último, empresas com reputações similares tornam-se competitivas quando
possuem boas aeronaves. Via de regra, passageiros não diferenciam uma aeronave de outra e,
portanto, não consideram isso um parâmetro relevante para escolha da empresa para viagem,

5 Intervalo de tempo concedido à empresa aérea pelo órgão regulador para operações de pouso e decolagem. Os
slots são ativos concedidos pelo regulador e, portanto, proibidos de serem comercializados pelas empresas. Os
slots, quando obtidos pela companhia aérea, permite a ela gerar maior volume de receita em função da
“exclusividade” da operação naquele aeroporto.
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exceto obviamente aqueles passageiros frequentes. Mas existe uma vantagem competitiva
que torna a empresa com melhor visibilidade: a existência de aeronaves modernas.

2.3.4. Indicadores de Desempenho

A medição do desempenho da companhia aérea não ocorre exclusivamente analisando-se


exclusivamente o lucro (diferença entre as Receitas e os Custos), ainda que este seja um
objetivo permanente e reflita a saúde financeira da empresa. Mas uma questão relevante é
por que os lucros ocorrem e de que forma a movimentação de receitas, custos e produção
interfere sobre ele. Torna-se necessário então entender alguns outros indicadores que,
conjugados, permitirão uma melhor compreensão sobre a dinâmica do lucro na aviação
comercial. Os indicadores mais importantes, além do ASK e RPK já apresentados
anteriormente, são a própria Receita de Voo, o Custo Total de Produção, a Receita por
passageiro quilometro voado (Yield), a Receita por assento quilometro produzido (Rask), o
Custo Total por assento quilometro produzido (cask) e o Load Factor de Equilíbrio (break-
even), que indica a taxa de ocupação mínima necessária para que a empresa comece a
apresentar lucros. Têm-se também a rentabilidade, que é derivada do próprio lucro (ou
resultado financeiro) e indica o percentual de ganho ou perda da empresa em relação às
receitas geradas. Discutamos cada um destes indicadores para uma melhor compreensão.

2.3.4.1. Oferta (ASK–Assento Quilometro Oferecido) e Demanda (RPK–Passageiro Quilometro Voado)

A teoria econômica determina que as empresas são unidades produtivas que produzem bens e
serviços desejados pela sociedade. A indústria aérea, por meio de suas empresas, oferece bens
e serviços aos clientes. No caso particular das empresas Aéreas comerciais, elas oferecem
assento de aeronaves àqueles dispostos a pagar determinado preço. No entanto, existe uma
particularidade neste raciocínio que devemos levar em conta: ao contrário daquelas empresas
que produzem bens que podem ser facilmente identificados em termos de quantidade, as
empresas aéreas oferecem um produto (assento) que voa! Essa particularidade faz com que o
custo de se oferecer um assento na ligação São Paulo - Rio de Janeiro seja diferente do custo
de se oferecer o mesmo assento na ligação São Paulo - Manaus. Isso ocorre porque o fator
quilometro é determinante como vetor de custo: voar distâncias maiores implica em custos
maiores. Assim, deve-se sempre considerar que a oferta na indústria aérea é dada pelo
número de assento oferecido na rota, multiplicado pela distância e pelo número de
frequências. Tem-se assim o ASK (Assento.Quilometro), ou Assento Quilometro Oferecido.
Para ilustrar melhor este conceito, consideremos uma empresa que opere a rota SAO-RIO, de
350 quilometros, 10 frequências por dia com uma aeronave de 150 assentos. Assim, podemos
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apurar que a oferta desta empresa, por dia, no mercado da Ponte Aérea, seria de 525.000
ASKs (350*10*150). Caso se deseje apurar a oferta total mensal, basta multiplicar este valor
por 30, supondo que a empresa opere as mesmas 10 frequências todos os dias do mês com a
mesma configuração de aeronave (525.000*30=15,75 milhões). Podemos afirmar ainda que a
oferta total de uma empresa aérea em determinado mês pode ser dada pela soma dos ASKs
produzidos por cada etapa de voo. Similarmente, a apuração de demanda de uma empresa
aérea, da mesma forma que a oferta, deve contemplar a distância voada por grupo de
passageiros: 100 passageiros voando 500 quilômetros têm valor econômico diferente quando
os comparamos com os mesmos 100 passageiros voando 1.000 quilômetros. A demanda na
indústria aérea, então, é dada pelo número de passageiro transportado multiplicado pelo
quilometro voado. No caso de uma rota de 500 quilômetros, a demanda efetiva seria então de
50.000 passageiro.quilômetro (500*100); e em uma rota de 1.000 quilômetros seria de
100.000 passageiro.quilômetro (1.000*100). A ideia subjacente ao conceito de demanda é a de
que cada passageiro, voando um quilometro, produz um indicador estatístico que servirá de
referência para o estabelecimento de políticas de preços e de malha aérea. A definição da
oferta e da demanda no transporte aéreo, ponderados pela distância voada, permite a
derivação de outros indicadores importantes, como por exemplo, a taxa de ocupação de voo,
que na aviação comercial pode ser entendido como taxa ou carga de ocupação,
aproveitamento ou load factor (essa terminologia é comumente utilizada no mercado
internacional). Também derivará conceitos como yield (receita unitária paga pelo passageiro),
rask (receita unitária gerada por cada assento.quilometro oferecido), cask (custo de cada
assento.quilometro oferecido) e belf (break-even load factor), taxa de ocupação teórica a
partir da qual a receita do voo se iguala ao custo de voo; ou seja, quando o resultado é zero
ou, ponto a partir do qual a empresa começa a apresentar lucro.

2.3.4.2 Receita Unitária (Yield)

A receita de voo de uma empresa aérea é constituída basicamente da venda de passagens


aéreas, cobrança de excesso de bagagem, fretamento e carga aérea. Suponhamos que a
empresa X venda 100 assentos a um preço médio unitário de $100,00, tendo uma receita de
voo de $ 10.000,00 (100 x $100,00). Suponhamos também que outra empresa (Y) venda 200
assentos ao mesmo preço médio unitário de $100,00, gerando uma receita de $20.000,00 (200
x $100,00). Em princípio poderíamos afirmar que a empresa Y é melhor porque tem uma
receita que é o dobro daquela da empresa X. Em termos absolutos isso é inquestionável, mas
em termos relativos não podemos afirmar categoricamente. É preciso analisar com mais
detalhe a operação das empresas. Vamos supor que a empresa X tenha voado uma distância
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de 500 quilômetros e a empresa Y 1.500 quilômetros. Em razão das diferenças nas distâncias
percorridas, a Receita absoluta das empresas não se altera, mas a receita unitária, que
considera os quilômetros percorridas, certamente será diferente. Vejamos. Se ambas as
empresas apresentarem uma taxa de ocupação máxima (100%), o passageiro quilometro
produzido pelas duas empresas seria, respectivamente, de 50.000 da empresa X (100
passageiros x 500 quilômetros) e 300.000 da empresa Y (200 passageiros x 1.500 quilômetros).
A Receita Unitária consiste em determinar o quanto cada passageiro paga por cada quilômetro
voado. Assim, podemos dividir o total de Receita de Voo das empresas ($10.000 e $20.000)
pelo total de passageiro quilometro de cada empresa (100.000 e 300.000). Assim, teríamos
que a Receita Unitária (Yield) das empresas seria, respectivamente, de $0,10 e $0,07. Ou seja,
apesar de a empresa X ter uma receita menor, sua receita unitária é maior; ao passo que a
receita da empresa Y é maior, mas sua receita unitária, menor, exatamente porque esta
empresa teria que “diluir” para mais assento quilometro a receita obtida com a venda de
passagem.

(1) nota: esses indicadores (cask, rask, resultado, Receita e Custo) serão tratados
posteriormente

Capítulo III – Estrutura de Custos da Aviação Comercial

3.1. Considerações sobre Custos na Indústria Aérea

A gestão de custos em qualquer segmento econômico é crucial. Trata-se de mecanismo de


sobrevivência empresarial na medida em que permite às empresas alcançarem maiores níveis
de competitividade. As preocupações em torno da gestão de custos começaram mais
fortemente no Brasil a partir do início dos anos 90, quando a economia brasileira passou a
estar mais exposta à competição a produtos estrangeiros. O choque de competitividade
ocorrido no período forçou muitas empresas de vários segmentos a buscarem melhorias
contínuas de seus processos produtivos com vistas a aprimorar a qualidade dos produtos e,
acima de tudo, viabilizar preços mais competitivos. Essa fórmula exigiu das empresas a gestão
focada nos esquemas de produção.

Para compreendermos a dinâmica do gerenciamento de custos, devemos dividi-los em dois


grandes grupos: diretos e indiretos. Os custos diretos são aqueles associados à produção.
Significa que quanto maior a quantidade produzida, maior será o custo. Contrariamente, os
custos indiretos são aqueles que não sofrem alteração quando ocorrem mudanças na
quantidade produzida. A dinâmica dos custos se associa ao tipo de indutor de custo. Podemos
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pensar que, no caso particular da aviação, toda vez que uma empresa aérea decola seus
aviões, custos são gerados automaticamente (combustível, tarifas aeronáuticas, serviço ao
passageiro etc); o mesmo não ocorre com o custo com a aeronave, pois independentemente
de a companhia realizar a decolagem, ela deverá arcar com os custos de uso e/ou aquisição
do equipamento. Façamos então uma descrição breve de como estes e outros custos podem
ser catalogados na aviação e qual a sua importância no contexto produtivo.

Os custos das companhias aéreas podem ser divididos basicamente em quatro níveis: aqueles
associados à existência do voo (decolou, custou!); os associados à existência da aeronave
(comprou, custou!) e os associados à existência da empresa (existiu, custou!). Os custos
associados ao voo são chamados de Custos de Primeira Margem (CPM); os associados à
aeronave são os Custos de Segunda Margem (CSM) e os associados à existência da empresa
são os de Terceira Margem (CTM). Existe ainda um quarto nível de custo que está associado às
transações financeiras (custo de capital, operações financeiras), e que não estão ligadas à
atividade fim da companhia aérea, que é o de transportar passageiros de forma rentável e
segura.

Os CPM são diretos e variáveis. Destacam-se os custos de combustível, taxa de pouso,


navegação, manutenção (associada ao ciclo de uso exceto os checks de manutenção), salário
variável dos tripulantes (associado às horas voadas), serviço ao passageiro (alimentação à
bordo, revistas, jornais) e serviços de rampa (limpeza interna da aeronave, abastecimento,
APU, carregamento do serviço de bordo).

(2) nota: custos de segunda, terceira e quarta serão tratados posteriormente

Quando uma empresa tem a totalidade da sua frota oriunda de contratos de arrendamento
mercantil cujo indexador é a taxa “libor” (juros internacionais) mais um “spread” (custo
adicional), uma elevada exposição à taxa de juros variável representa um grande risco ao
negócio, uma vez que instabilidades econômicas internacionais podem elevar os custos de
financiamento desses contratos e penalizar o esforço para obtenção de resultados positivos.
Em razão disso, i) limitam a obtenção de novos financiamentos, ii) comprometem o fluxo de
caixa e iii) impedem um planejamento consistente da frota no longo prazo.
Empresas que não possuem operações de hedge6 - que poderiam protegê-la de eventuais
elevações dos juros internacionais – podem agravar os custos operacionais. Adicionalmente, os

6
Operações de hedge são transações financeiras que consistem na negociação de preço de um ativo (combustível,
dólar ou juros) por parte da empresa aérea com uma instituição financeira. Para melhor compreensão, se supormos
que uma empresa consumo regularmente 1000 litros de combustível por dia, a um preço de R$ 1,00, e que este
consumo se repetirá para os próximos anos, então ela pode “comprar” de uma instituição financeira, hoje, o preço
de R$ 1,00 e pagar este valor no futuro. Trata-se obviamente de uma transferência de risco, então é a empresa
aérea paga um valor a título de custo de transação e transfere este risco para a instituição financeira. Podemos
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custos com manutenção e reparos por meio de peças sobressalentes constituem outra
importante fonte de pressões financeiras, agravadas quando a idade média da frota é
relativamente alta.

Os custos com combustível têm um peso expressivo na planilha de custos das empresas. A
participação média desse item de custo varia em torno de 35-40%. Dois efeitos atuam sobre o
preço pago pela companhia: a) o comportamento do câmbio e da inflação no mercado
doméstico e b) a evolução do preço do produto no mercado internacional. O comportamento
do preço doméstico está ligado diretamente ao preço do produto no exterior. Assim, choques
de oferta ocorridos no exterior refletem imediatamente nos preços do produto internamente.
A questão central é que, dependendo da dimensão da elevação dos custos, nem sempre é
possível recompor via ajustes de preços as perdas decorrentes destes aumentos, ora por causa
dos impactos na demanda, ora por causa da não autorização dos órgãos governamentais.

Dentre os principais componentes de custos do setor, o de combustível é o que têm sofrido os


maiores índices de reajuste, superiores até mesmo à variação da inflação da própria indústria e
da taxa de câmbio.

Num contexto de retomada do crescimento econômico, a tendência é que o preço do produto


seja pressionado, constituindo-se assim em novas pressões de custos caso não seja possível
viabilizar a recomposição de preço. Por outro lado, empresas que negociam grandes
quantidades do produto a preços mais competitivos obtém vantagens econômicas – ainda que
limitada - na ausência de políticas de hedge e na impossibilidade de recuperar margens via
aumento de preços.

3.2. A Curva de Custo

A indústria aérea tem uma particularidade quando se analisam os custos: o produto "assento"
se desloca de A para B. Isso tem implicações econômicas objetivas. Uma mesma aeronave que
voe duas rotas distintas, A e B, cujas distâncias são diferentes, produz custos unitários
diferentes. Isso porque em rotas curtas ocorre uma distribuição dos custos em menos
quilômetros voados, ao passo que em rotas longas os custos podem ser diluídos em mais
quilômetros. A título de exemplo, se considerarmos o custo de leasing no valor de $ 100
mil/mês de uma aeronave com 200 assentos, que opere uma rota de 500km e outra de

dizer que, caso o preço de mercado do combustível se eleve no futuro, a empresa ganhará; se o preço diminuir, a
empresa perderá.
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1500km, o custo de cada assento quilômetro (custo do leasing dividido pelo produto da
configuração vezes a distância da rota) será diferente para cada rota, apesar de se se tratar da
mesma aeronave com o mesmo número de assentos. Na primeira rota, o custo unitário será
de $ 1,00 ($100 mil / (500 * 200)); na segunda rota este custo se reduz consideravelmente
para $0,33, já que o mesmo custo é distribuído para mais assentos.quilometros ($100 mil /
(200 * 1500)). Este raciocínio nos remete a algumas conclusões interessantes. 1) avião é
construído para voar operacional e economicamente! 2) quanto mais horas voadas uma
aeronave gerar, menores tenderão a ser os custos unitários; 3) empresas buscam
continuamente reduzir seus custos fixos (reduzir o valor do leasing, por exemplo) e ampliar a
utilização horária da aeronave. O gráfico abaixo mostra conceitualmente o formato de uma
curva de custo aplicada à indústria aérea. O eixo X mostra os diferentes quilômetros de rotas e
o eixo Y o custo de se voar um quilômetro com determinada aeronave. Se a empresa
pretender operar um mercado o qual nunca havia operado antes, é possível estimar o custo da
operação multiplicando o custo/ask pela distância, em quilometro, da rota.

(y) custo/ask

(x) km

Assim, se uma empresa souber qual exatamente é a curva de custo de suas aeronaves, ela
poderá determinar o custo de operação de determinada rota, bastando multiplicar a distância
da rota pretendida pelo custo/assento.quilometro correspondente. Na verdade, a construção
da curva de custo incorpora todas as informações de custos fixos e variáveis, determinando o
custo unitário para cada distância voada. Assim, diante de uma série histórica gigantesca, as
empresas conseguem prever com relativa precisão os custos operacionais envolvidos em rotas
ainda não operadas, bastando para isso que se tenha uma curva de custo bem calibrada.

Capítulo IV – Fundamentos Operacionais na Aviação Comercial

4.1. Malhas Aéreas e seu Caráter Estratégico

Recorrentemente acessamos os sítios das companhias aéreas para pesquisar voos.


Percebemos que, no geral, todas elas apresentam o mesmo perfil de malha: seus voos partem
em maior quantidade em dias e horários relativamente semelhantes; os destinos para os quais
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as aeronaves das empresas voam têm distribuição similares; e o perfil da operação é


padronizado: contam com uma estrutura de atendimento aos passageiros relativamente
uniforme. Essas características não existem aleatoriamente. Elas obedecem a alguns
fundamentos da indústria aérea, como o da programação de voo, que devem seguir premissas
para se viabilizar o estudo, planejamento, execução e operação da malha aérea. A primeira
etapa se refere à existência de tráfego entre dois pontos, o chamado ODV (Origem Destino
Verdadeiro do Passageiro) ou O&D (Origen and Destination of Passenger). Esse é um passo
essencial para que se atraia o interesse do passageiro. As etapas que a empresa deve seguir
são: obtenção do Certificado de Homologação de Transporte Aéreo (CHETA), o HOTRAN
(Horário de Transporte) e o SLOT, estes últimos dois concedidos pelo órgão regulador.

(3) nota: Cheta, Hotran e Slot serão tratados posteriormente

4.2. Aeronaves e Planejamento de Frota

A indústria aérea exerce papel importante sobre a atividade econômica dos países, razão pela
qual muitos governos garantem incentivos fiscais aos agentes que dela fazem parte
(aeroportos e empresas aéreas) como forma de estimular seu desenvolvimento. O principal
insumo desta indústria são as aeronaves, cujos sucessivos avanços tecnológicos dos últimos
anos têm garantido à indústria em geral e às empresas aéreas em particular importantes
vantagens competitivas, como redução de custo e maior número de assentos oferecidos,
sustentando assim as expressivas taxas médias de crescimento da indústria na faixa dos 5% ao
ano.

Duas das maiores fabricantes de aeronaves no mundo, Boeing e Airbus, mantém entre si uma
acirrada competição para garantir o maior número de aeronaves vendidas. Atualmente, as
duas companhias dividem meio a meio a participação de mercado, o que contribui para acirrar
a disputa pela posição de liderança. Os detalhes dessa batalha são abordados no livro “Boeing
versus Airbus: por dentro da história da maior competição internacional de negócios”, do
autor John Newhouse, publicado pela editora Novo Século. Nesta obra, o autor descreve os
detalhes das estratégias adotas pelas duas companhias para manterem-se na liderança na
venda de aeroplanos às mais de 240 empresas aéreas regulares espalhadas pelo mundo. O
objetivo comum destas empresas é oferecer melhores condições aos seus clientes sob o risco
de perderem contratos milionários, o que torna o timing de negociação um variável-chave de
sucesso.
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O livro é dividido em nove capítulos e relata, além dos embates comerciais das duas
companhias, as fases de desenvolvimento de cada companhia. No caso particular da Boeing,
relata-se a experiência dessa empresa com seu modelo de avião à jato (B737), que
revolucionou a indústria aérea. Apresenta-se também os detalhes da compra de seu
concorrente direto no mercado americano, a McDonnell Douglas, como estratégia para
impedir o crescimento da concorrente Airbus. Descreve-se o domínio da Boeing com os aviões
de configuração média de 200-300 lugares e a estratégia da Airbus com seus modelos de
configuração média de 300-400 assentos. Um sinal claro das apostas distintas das duas
empresas num mercado altamente dinâmico.

O autor também trata das questões dos subsídios. Apesar de serem empresas de capital
aberto, ambas contam com tecnologias desenvolvidas pelas agências espaciais de seus
respectivos governos. Um exemplo são os subsídios indiretos do Pentágono à Boeing e a ajuda
dos governos europeus à Airbus, uma vez que fabricar aeronaves é algo que demanda vultosos
investimentos cujo tempo de desenvolvimento de um único modelo pode durar até 15 anos a
um custo de quase US$ 15 bilhões. Como aponta o autor, “ambos os lados calculam o custo de
desenvolvimento em US$ 14,5 bilhões a US$ 15 bilhões, com o fluxo negativo chegando a US$
22 bilhões, tudo em dólares de 1992”.

É relatado também o papel que as empresas de fuselagem (corpo do avião), asas e motores
desempenham no jogo comercial, descrevendo os detalhes das negociações das empresas
japonesas, das de motores (Prett, Rolls Royce e GE) e dos países europeu e americano. Por fim,
e não menos importante, o autor aborda o embate estratégico envolvendo a fabricação do
maior avião de todos os tempos pela Airbus – o A380 – cuja capacidade máxima é de 800
passageiros, e a aposta da Boeing com seu avião “menor” – o B787 – de capacidade para até
350 passageiros, indicando que o embate entre os dois gigantes está muito longe do fim.
Muito pelo contrário, está apenas começando.

A volatilidade da qual a aviação está exposta exige então uma gestão permanente dos recursos
produtivos (aeronaves e tripulação) para se obter os menores custos possíveis e as melhores
oportunidades de receita. Alguns desafios são colocados porque muitos dos eventos
econômicos e operacionais não dependem exclusivamente das empresas aéreas. A gestão de
frota, assim, consiste no planejamento das necessidades de aeronaves na frota de forma a
atender plenamente as oportunidades de tráfego, obtendo-se máxima ocupação possível dos
voos, sem perder oportunidade de tráfego e, ao mesmo tempo, operar com rentabilidade
aceitável e garantir a satisfação dos passageiros. Esse objetivo é desafiador! Um aumento da
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inflação conjugado com baixo crescimento da economia pode afastar a demanda, e os aviões
que já foram comprados não podem ser devolvidos rapidamente, expondo assim as empresas
a maiores riscos financeiros. De forma inversa, um cenário no qual a economia apresenta bom
desempenho e a empresa realiza um planejamento de frota mais conservador, corre o risco de
perder oportunidades de negócio frente aos seus concorrentes, já que o processo de aquisição
de aeronaves é complexo e demanda tempo. Rescisões contratuais implicam em elevados
custos financeiros que não compensam a devolução da aeronave. As empresas então utilizam
de dois instrumentos nas negociações de aeronaves: as modalidades firm e option. Opções
firms implicam que a empresa se compromete a adquirir a aeronave e assinar o contrato; já
nas opções options, a empresa apenas indica a intensão de adquirir a aeronave. Esses modelos
de cartas de entendimento permitem tanto ao lessor quanto à empresa terem mais
flexibilidade na gestão de suas frotas. As opções firms são garantidas e sinalizam para uma
situação na qual o comportamento do mercado é relativamente previsível; e as options
indicam incertezas quanto ao futuro e, portanto, uma atitude mais conservadora das empresas
frente ao futuro.

Capítulo V – Os Tipos de Rede Aérea

Se observarmos a malha aérea de qualquer companhia nacional ou internacional, é provável


que visualizemos uma característica similar entre elas: as empresas costumam iniciar seus voos
em algum aeroporto central, que pousa e decola seus voos de/para diversos destinos. É
relativamente raro observar malhas que tenham como característica apenas voos ponto a
ponto. A utilização de um aeroporto central ocorre em função de algumas necessidades sobre
as quais falaremos a seguir. A partir dos anos 30 a aviação mundial apresenta forte
crescimento. A sobra de aeronaves no pós-guerra permitiu sua utilização em operações civis
com o objetivo de explorar um importante setor econômico que é o da aviação. Como ainda
prevalecia um número elevado de aeronaves menores, e em função da sua baixa utilização,
elas tornaram-se relativamente baratas e assim permitiu-se às empresas adquiri-las a preços
competitivos. Esse processo se acentuou e o mundo, notadamente os Estados Unidos,
assistiram a um espetacular crescimento do setor. Predominou-se por um bom tempo (até o
final dos anos 80) a rede aérea (network) do tipo ponto a ponto (point to point), no qual as
operações se davam entre cidades com voos diretos e/ou com escalas em pontos
intermediários. A vantagem desse modelo é proporcionar um serviço melhor ao passageiro,
diminuindo o tempo da viagem e garantindo um maior número de frequências. As redes
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lineares ligam cidades primárias para primárias (entre grandes capitais), primárias e
secundárias (capitais e cidades de médio porte) e secundárias para secundárias (entre cidades
menores). Esta última também é conhecida como rede do tipo "hub by pass", pois
estabelecem-se ao largo dos principais aeroportos centrais (hubs). Esse tipo de rede tem
algumas outras vantagens, como permitir operações com aeronaves menores que geram
custos absolutos menores e são mais adequadas para mercados com densidade de tráfego
menor. Uma desvantagem econômica importante dessa rede é que ela impede que a gestão
da empresa obtenha maior eficiência na busca de economias de escala (produzir mais ASK com
a menor quantidade de fator de produção), pois toda vez que a empresa resolve ampliar o
número de cidades servidas, nem sempre é possível utilizar a mesma aeronave, exigindo que
se compre novas aeronaves e que se contrate mais tripulantes num cenário no qual o recursos
disponíveis (aeronave e tripulação) já são plenamente utilizados. As redes do tipo linear
predominaram no mundo até o final da década de 70, quando a partir deste período
mudanças regulatórias alteraram profundamente a forma de operação das empresas. Até os
anos 70, as empresas possuíam restrições de operarem livremente para onde quisessem e
também pouco flexibilidade para fixarem preços, o que limitava a competição via preço e
garantia às empresas relativa reserva de mercado. A partir do final dos anos 70 esse processo
regulatório começa a mudar, e os governos em todo mundo passam a flexibilizar as regras de
operação, permitindo que as empresas competissem entre si em preço e rota. O resultado
imediato foi o aumento da competição naqueles mercados mais maduros e desenvolvidos,
pois as empresas reduziram sua presença em mercados de baixo lucro e se concentraram em
mercados de alta densidade de tráfego. Adicionalmente, surgiram diversas novas empresas
para competir com as já existentes e assim surgiu a necessidade das empresas em concentrar
suas operações para tornarem-se mais competitivas. Inicia-se assim o desenvolvimento mais
acelerado das redes do tipo "Hub and Spoke".

As redes do tipo Hub and Spoke consiste em ligações aérea de/para um aeroporto central,
localizado estrategicamente em um ponto no qual as cidades estão em quadrantes opostos,
permitindo que a empresa amplie as possibilidades de número de destinos atendidos. As
malhas do tipo "hub" permitem às empresas maximizar o uso de aeronaves quando
concentram o tráfego oriundo de vários destinos em um único aeroporto, permitindo o
adensamento da aeronave que seguirá para pontos além, transportando passageiros de
diversas origens. Veja que esta característica se diferencia da rede linear, que teria de
disponibilizar mais aeronaves para atender a diferentes origens para o mesmo destino do
"hub". Assim, o "hub" garante taxas de ocupação maiores, maior utilização média diária das
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aeronaves e tripulantes, amplia o número de destinos e gera economias de densidade


(passageiros se concentram no aeroporto e seguem numa mesma aeronave). Por outro lado,
"hub's" podem se tornar caros quando subutilizados nos períodos fora do pico; exigem ações
coordenadas de diversos setores de operações e geram maiores níveis de estresse nas equipes
de terra. Também exigem maior complexidade de operações (podemos imaginar os serviços
de rampa associados a uma aeronave - abastecimento, limpeza, dejetos, serviço de bordo,
carga e descarga). As operações em "hub" também estão mais sujeitas a interferências de toda
ordem: meteorológicos, incidentes, eventos especiais (esporte, espetáculos, políticos etc). Os
tipos de redes aéreas são formas pelas quais a malha aérea de uma companhia é organizada.
Basicamente são de duas formas: hub and spoke e point to point. As malhas aéreas do tipo hub
tornam mais difícil o gerenciamento de rotas específicas pois eventuais alterações em suas
características (horário, equipamento ou frequência) podem implicar na inviabilidade de
outras rotas.

5.1. Lineares (ponto a ponto)

Sua característica básica é operar essencialmente voos diretos e/ou com escalas. Elas servem
mercados primários para primários (principais capitais); secundários para primários,
explorando as ligações entre os grandes centros e localidades menores (cidades de pequeno) e
secundários para secundários (cidades de menor porte). A figura 1mostra a estrutura básica de
uma rede do tipo linear. Percebe-se que a empresa que opera esse tipo de rede atende a seis
mercados (ab, bc, de, ef, gh, hi) e 9 cidades, cuja densidade de tráfego por dia justifica a
operação de voos. Outra característica importante é que existem limitações de destinos a
serem atendidos. Isso quer dizer que um passageiro que queira voar de a. para i. não poderá
fazê-lo senão por outro meio que não o aéreo.

Figura 1 : Modelo de Rede do Tipo Linear (point to point)

.a b
. c
.
.d e
. f
.
.g h
. i
.
5.2. Hub and Spoke
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As redes aéreas do tipo Hub and Spoke permitem às empresas ampliar o número de rotas
disponíveis aos passageiros e otimizar a utilização da frota. As condições favoráveis para a
criação de um hub são: grande volume de tráfego, centralidade geográfica e distribuição dos
destinos em quadrantes opostos. A figura 2 mostra as combinações possíveis de rotas que
uma empresa pode operar. A escolha de um aeroporto central para distribuição e chegada de
voos permite à empresa ampliar o número de mercado s a ser atendido. Se na Rede Linear
(figura 1) a empresa atenderia 6 mercados, na rede do tipo hub este número aumenta para 30
mercados. Se o número de ODVs possível na rede linear é de 9, no hub este número é 72! Veja
que ainda que o número de cidades seja o mesmo, o tipo de rede determina objetivamente o
número de mercados que pode ser atendido. Essa é uma razão essencial que explica por que
as empresas optam, via de regra, por este tipo de rede: amplia as possibilidades de
atendimento aos passageiros, amplia sua participação de mercado e permite melhorar a
utilização da frota, aumentando o número de voos sem necessariamente adquirir novas
aeronaves.

Figura 2 : Modelo de Rede do Tipo Hub and Spoke

As vantagens deste tipo de rede são a geração de economias de densidade (alto volume de
passageiros no aeroporto central); ampliação do número de destinos e otimização da
utilização da frota (mais voos com menos aeronaves). As desvantagens referem-se aos maiores
riscos nas operações; à baixa utilização fora dos horários de pico e às superestruturas, que
podem tornar-se mais caras se não utilizadas plenamente (ex. Confins até 2005).

Vale destacar um breve histórico dos tipos de rede e como eles evoluíram no decorrer do
século XX até os dias recentes. Sua evolução obedeceu a três estágios essenciais:

Estágio 1: 1940-1970 – predomínio de voos ponto a ponto em razão do reduzido volume de


tráfego entre as cidades e disponibilidade de aeronaves menores oriundas do pós-guerra.
período de forte regulação estatal, onde o governo definia as rotas que seriam operadas pelas
empresas e o preço que seria praticado por elas. A política de preço era previamente definida
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pelo governo com o objetivo de garantir a sustentabilidade econômica e expansão das


empresas.

Estágio 2: 1980-1990 – consolidaram-se em função da desregulamentação do mercado


americano, que a partir de 1978 (deregulation act) liberalizou rotas e preços e no qual as
empresas aéreas passaram a definir destinos de operação e os preços a ser praticados sem
interferência direta do governo. Esse processo se espraiou para o restando do mundo,
notadamente Europa e América Latina. A desregulamentação levou as empresas a operarem
mercados de alta densidade de tráfego e de yields (tarifa média) elevados, levando à
concentração do mercado. A liberalização de preço implicou na permissão às empresas
praticarem o preço das passagens de acordo com seus interesses, sem a regulamentação
governamental, ampliando assim a competição e ampliando a concentração de voos em
aeroportos centrais. O mercado americano possui atualmente mais de um hub dominado por
poucas empresas. Aproximadamente 70% do tráfego passa pelos hubs (~500 milhões de
passageiros).

Os hubs nos EUA são domésticos e internacionais, sendo uma empresa dominante em mais de
um aeroporto. Já no mercado europeu, predominam as redes do tipo hub e linear. As
distâncias relativamente curtas de até 500 km entre as cidades competem diretamente com o
modal aéreo (sistema ferroviário e rodoviário). Os hubs das empresas europeias são
essencialmente internacionais e as rotas domésticas essencialmente lineares. Em função dessa
característica as empresas acabam por demandar aeronaves de menor porte, o que explica a
Embraer vender mais aeronaves nesses mercados do que no Brasil, cuja estrutura de tráfego
(elevada concentração em poucas rotas) levam as empresas a optarem frequentemente por
aeronaves maiores.

Estágio 3: a partir de 1990 – Consolidação do processo de desregulamentação, levando as


empresas a integrarem suas redes aéreas por meio de parcerias estratégicas (codeshare ou
alianças internacionais). Os exemplos mais notáveis são a Star Alliance, One world e Skyteam.

Capítulo VI – Os Direitos de Tráfego ou Liberdade do Ar

No período do pós-guerra, a indústria aérea estava em gestação. O fim da guerra expor o


excessivo número de aeronaves que não mais serviria à guerra, razão pela qual a Convenção
de Chicago, de 1944, definiu as regras gerais de funcionamento da aviação comercial no
mundo. Dentre várias deliberações, uma das mais importantes foram as Liberdades do Ar, ou
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Direito de Tráfego Aéreo, que definiu as formas pelas quais as empresas aéreas poderiam
transportar passageiros e carga de um país para outros sem ferir a autonomia e soberania de
cada Estado. De forma simples, uma empresa aérea de um país A não pode transportar
passageiro e carga dentro do país B sem que para isso hajam acordos bilaterais entre os
países-sede das empresas. Os acordos bilaterais são firmados entre países e atendem aos
interesses de duas companhias aéreas que pretendem levar/trazer passageiros de seu país de
origem para um outro país. Alguns países podem permitir apenas sobrevoo em seu país,
enquanto outros podem permitir que empresas aéreas de outro país transportem passageiros
e cargas dentro do país (política de "céus abertos" - ou "open skies". Segundo a IATA, existem
atualmente no mundo mais de 3.000 acordos bilaterais, contra os quais a IATA se posiciona
porque entende que esses acordos impõem restrições ao livre fluxo de passageiro e carga,
além de gerar uma reserva de mercado que impossibilita a concorrência. Mas vejamos quais
são as Liberdades, o que elas têm em comum e quais são aquelas mais exercidas na aviação
comercial. A primeira liberdade, quando negociada entre dois países, permite que a empresa
do país A apenas sobrevoe o país B, sem direito de embarcar e desembarcar passageiro e carga
no país B. Esta é uma das liberdades mais negociadas e difundidas entre países e empresas. As
empresas procuram sempre gerenciar sua malha de forma a que o voo realize a etapa com o
menor custo de aeronavegabilidade. Nem sempre o voo em linha reta é o mais viável pois os
países sobre os quais a empresa voa cobram valores exorbitantes que acabam por inviabilizar
economicamente a rota. Este é o caso da Rússia, cujos voos de empresas internacionais que
sobrevoam seu território pagam taxas elevadas para chegar mais rapidamente ao Oriente.
(Colocar figura)

A segunda liberdade permite que uma empresa realize apenas pouso técnico em um
país intermediário, sem direito de embarcar e desembarcar passageiro/carga neste país. Esse
tipo de liberdade é adequado para empresas que apresentam restrições de aeronave, como
baixa autonomia de voo, e que pretendam voar distâncias longas entre dois países. Assim,
estas empresas pousam em país intermediário para abastecimento.

A terceira liberdade permite que uma empresa de um país A apenas desembarque


passageiro/carga no país B, sem direito de embarcar passageiro/carga no voo de volta. Esta
Liberdade pode ser exercida por empresas charters (aquelas que realizam voos esporádicos
para determinado destino). Por outro lado, a quarta liberdade permite então que a empresa
embarque passageiro/carga do país B para seu país de origem. A terceira e quarta liberdades,
assim como a primeira, são as mais difundidas na aviação comercial pois parte dos mais de 40
mil voos realizados diariamente que são internacionais exerce essas liberdades. Mercados já
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consolidados apresentam fluxo contínuo de tráfego de passageiro e carga e é natural que


empresas de dois países as exercem simultaneamente (empresa A capta tráfego do país B e
empresa B capta tráfego do país A, reciprocamente).

A quinta liberdade incorpora a presença de um terceiro país. Permite que uma empresa do
país A voe para um país C, com escala em B, podendo esta empresa embarcar (e
desembarcar!) passageiro e carga neste país intermediário (B). Podemos usar como exemplo
uma aérea do país A que voa a rota São Paulo (A)-Paris(B)-Zurique(C). Ela embarca
passageiros/carga em SP cujos destinos são Paris e Zurique. Ao pousar em Paris, alguns
passageiros/carga se mantém na aeronave, e outros desembarcam; simultaneamente outros
passageiros/carga embarcam em Paris rumo a Zurique no mesmo voo (essa possibilidade é
característica da quinta liberdade). No voo de volta, a regra se aplica da mesma forma: tráfego
embarcado em Zurique rumo a Paris e São Paulo; tráfego desembarcado em Paris e novo
tráfego embarcado para São Paulo. A concessão de quinta liberdade implica na autorização de
captação de tráfego tanto no voo de ida como no voo de volta. Muitas companhias utilizam
desta liberdade para otimizarem o uso de suas aeronaves. Como os voos internacionais
costumam exigir duas aeronaves, pois via de regra são noturnos, uma aeronave que chega em
Paris às 10:00 da manhã ficará estacionada na área remota por 12 horas, até assumir o voo da
volta às 22:00. Esse tempo então é aproveitado para a realização de uma segunda perna do
voo, desde que haja tráfego que justifique a rentabilidade na segunda etapa. Dessa forma,
otimiza-se o uso dos recursos produtivos (aeronave e tripulação), amplia-se a presença de
mercado e as margens financeiras. Novamente, essa possibilidade é recíproca. Significa que as
empresas dos países B (França) e C (Suíça) também poderão explorar a quinta liberdade no
Brasil. Ou seja, empresas chegam em São Paulo e decolam para outros países da América
Latina com direito de embarcar e desembarcar tráfego no Brasil de/para estes destinos. Como
exemplo, podemos citar a Lufthansa, que opera a rota Munique-Sao Paulo-Buenos Aires, cujo
direito de embarcar/desembarcar tráfego é concedido tanto no Brasil como na Argentina,
ainda que nem TAM, nem Aerolíneas Argentinas explorem um terceiro destino a partir de
Munique. Trata-se de reciprocidade não exercida.

A Sexta Liberdade permite à empresa de um país A voar de um país B para um país C tendo
que fazer obrigatoriamente uma para intermediária no pais de origem (país A) na forma de
escala ou conexão. Essa liberdade favorece aquelas empresas que não possuem tráfego local
suficiente que lhes permita viabilizar voos regularmente, necessitando buscar tráfego em
outros países para viabilizar economicamente suas operações. Dois exemplos de empresas que
exercem este tipo de liberdade: TAP e Emirates. Mais da metade de todo o tráfego da TAP tem
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o Brasil como destino. Como o mercado português tem reduzido potencial de tráfego a partir
daquele país, a TAP capta tráfego de vários países europeus, leva-o para Portugal e o distribui
para o Brasil, juntando-se ao tráfego local que também vem para o Brasil. Já a Emirates
concentra o tráfego captado do Oriente Médio em Doha, a partir do qual distribui para o
Ocidente. Essa estratégia é similar à da TAP e representa uma real possibilidade de otimizar
frota e tripulantes, adensando os voos a partir do hub.

A Sétima Liberdade refere-se ao transporte de passageiro e carga de um país B para um país C


pela empresa do país A. Esta Liberdade indica que a empresa não passa por seu país de
origem, mas realiza operações entre dois mercados distintos aos seus. Essas operações
justificam-se em mercados nos quais não há empresas aéreas capazes de operar voos e, por
isso, seus países permitem que outras empresas, de outros países, o façam.

Há uma recorrente discussão na aviação comercial em torno da chamada “cabotagem” (não


confundir a terminologia usada no modal hidroviário), ou “céus abertos”, em que uma
empresa estrangeira é autorizada a voar trechos domésticos de outro país.

(4) nota: As Liberdades de Cabotagem serão tratados posteriormente

Capítulo VII - Gestão de Preços na Indústria Aérea

Em linhas gerais, passageiros querem voar ligações diretas, ao menor tempo e custo possíveis.
Assim, as empresas têm o desafio de garantir preços competitivos numa conjuntura na qual os
custos sofrem muitas influências de fatores externos (dólar, combustíveis, PIB, etc). É neste
contexto que as empresas procuram compreender as especificidades de cada mercado
(passageiros mais ou menos sensíveis a preço) para definirem sua política de tarifas aéreas.
Mas antes de entendermos a dinâmica da formação de preços na aviação, importante
compreender o contexto no qual essas políticas passaram a ser implementadas. A partir dos
anos 70, inspirados pela experiência americana, os países passaram a flexibilizar suas regras de
mercado. Em outros termos, passaram a desregulamentar os mercados permitindo que as
empresas passassem a cobrar preços livremente (sem autorização prévia do governo) e a voar
para a destinos de seu interesse. Essa desregulamentação, de forma geral, promoveu uma
grande concentração das operações aéreas em aeroportos centrais, principalmente naqueles
cuja demanda e preço eram maiores. Cidades de menor porte deixaram de ser atendidas e isso
abriu um flanco de oportunidade para empresas de pequeno porte surgirem (este foi o
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contexto no qual surgiram as chamadas empresas "baixo preço, baixo custo" (Low Fare, Low
Cost), que se proliferaram a partir dos anos 80 nos Estados Unidos e, posteriormente, na
Europa. Apesar do alto número de nascimento e falência de muitas empresas, algumas
obtiveram êxito e operam até os dias de hoje, como SouthWest, Easyjet e Ryahnair. A forte
competição expôs as empresas a um cenário ao qual elas não estavam acostumadas. Assim,
aquelas que resistiram em se reestruturar, não reduzindo custos e nem melhorando a
eficiência operacional, sucumbiram e deram lugar a novas empresas (podemos citar o caso de
Panam, TWA, Eastern e Branif, no caso americano; e Varig, Vasp e Transbrasil no caso
brasileiro). No entanto, empresas tradicionais souberam lidar com este novo ambiente. A
Delta, por exemplo, passou a analisar mais cuidadosamente o comportamento do mercado
naquele ambiente caótico de competição. Ela percebeu que havia uma "gangorra do load
factor". Ou seja, voos lotados com tarifas muito baixas e voos vazios com tarifas muito altas. E
foi essa a razão essencial para que modelos matemáticos e estatísticos fossem desenvolvidos e
aplicados aos bilhões de dados de reservas mantidas pelas empresas aéreas para se
compreender melhor o comportamento dos passageiros. A Delta identificou que não era
necessário adotar a política do "matar ou morrer", mas era preciso entender que passageiros
têm necessidades distintas e estão dispostos a pagar tarifas distintas ao escolherem os
serviços de uma companhia aérea. Empresas com melhores serviços (voos diretos em horários
adequados e em mercados de alta densidade de tráfego)

7.1. Curva de Demanda na Aviação Comercial - sensibilidade da Demanda por Transporte


Aéreo às variações de preço e renda

Uma lei fundamental em economia é a lei da demanda, segundo a qual alterações no preço de
um bem interferem na disposição do consumidor em adquiri-lo. Essa lei estabelece que há
uma relação inversa entre preço e quantidade demandada. Se o preço de um bem sobe,
supondo que não haja alterações na renda e na preferência do consumidor, pode-se esperar
que sua disposição em comprar o bem diminua, da mesma forma que queda do preço o
estimulará a adquirir mais do bem. No entanto, essa relação não é linear para todos os bens,
pois cada consumidor se comporta de forma diferente mediante condições de preço diversas.
Por exemplo, podemos pensar que um passageiro esteja disposto a pagar um valor maior pela
passagem aérea caso necessite se deslocar por uma razão de urgência; já passageiros que
costumam planejar com antecedência sua viagem estão menos dispostos a pagar um valor
maior. Passageiros que não tem retendes viajar, mas que recebem uma oferta de passagem
muito barata, alteram sua disposição e compram a passagem. Essas situações diversas exigem
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da empresa o domínio de técnicas que consigam prever o comportamento do passageiro


mediante infinitas possibilidades de preço, de forma que a empresa possa vender a passagem
ao preço justo, satisfazendo tanto aqueles que pagaram barato quanto aqueles que pagaram
caro. A ciência econômica utiliza do conceito de elasticidade para identificar a melhor
combinação preço-demanda. A elasticidade-preço da demanda indica o grau de sensibilidade
da demanda às variações de preço e é sempre dada em número-índice. Esse número é
calculado por meio da divisão entre a variação percentual da demanda e a variação percentual
do preço. Para simplificar o conceito, tomemos como exemplo uma empresa aérea que eleve o
preço da passagem da Ponte Aérea, de R$ 500,00 para R$ 750,00, e que a demanda diminua
de 1.000 para 750 passageiros, temos então que a demanda apresentou queda de 25% (-
250/1.000) e o preço um aumento de 50% (250/500). O número índice da elasticidade será -
0,5 (-25% / 50%). Perceba que no numerador consta a variação percentual da quantidade
demandada, que caiu 25%, e no denominador a variação do preço, que subiu 50%. Percebe-se
então que a demanda variou menos que proporcionalmente à variação do preço, mostrando-
se pouco sensível ao preço. Nestas condições, supõem-se que a empresa obterá maiores
ganhos do que caso não tivesse aumentado o preço, pois sua Receita passou de R$ 500 mil
(1.000x$500) para R$ 562,5 mil (750x$750), um aumento de 12,5% (62,5/500).

Como já discutido anteriormente, a aviação comercial está muito vinculada à dinâmica da


economia. Se a atividade econômica se ampliar, com mais empresas investindo, produzindo e
contratando, isso cria um círculo virtuoso de expansão do consumo, produção, renda e mais
consumo. Essa dinâmica gera necessidades de tráfego de passageiro e carga. Mais passageiros
demandam o transporte aéreo para realizar suas viagens de negócios ou turismo; e mais
consumidores e empresas demandam serviços de transporte de carga. Então, a ampliação da
renda (o próprio crescimento do PIB) aumenta a demanda por transporte de passageiro e
carga. Há uma relação direta entre renda e demanda. A teoria econômica utiliza o conceito de
elasticidade-renda da demanda para identificar em que proporção a demanda por transporte
aéreo aumenta quando ocorre aumento da renda. Podemos exemplificar este conceito
considerando o próprio desempenho da renda e da demanda por transporte aéreo no Brasil.
De 2003 a 2015, o PIB aumentou 46%, elevando a renda do Brasil de 1,7 trilhão para 5,7
trilhões; neste mesmo período, a demanda elevou-se de 48 bi de RPKs para 120 bilhões. A
elasticidade renda consiste em determinar um índice que mede o grau de sensibilidade da
demanda às variações da renda. No nosso exemplo, este índice foi de 3,2 (136% / 42%),
indicando que, para cada ponto percentual de variação da renda (PIB), a demanda variou 3,2%.
Percebe-se uma relação direta entre renda (PIB) e demanda, permitindo-nos inclusive fazer
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projeções futuras de crescimento da demanda considerando determinadas taxas de


crescimento do PIB a um determinado nível de elasticidade. Podemos estender a análise
considerando também a elasticidade renda da demanda por carga aérea. É possível identificar
que a relação de sensibilidade é relativamente próxima a do transporte de passageiros.

(5) nota: Estruturas de Classes (nesting) e Técnicas de Maximização de Receita serão tratadas
posteriormente

7.2. A Gestão de Preço como Ferramenta Estratégica


A desregulamentação do mercado aéreo americano a partir de 1978 nos Estados Unidos
significou uma verdadeira “guerra” competitiva entre as empresas. Na mesma velocidade com
que surgiam empresas aéreas focadas no conceito “baixo custo, baixa tarifa”, empresas faliam
regularmente por não se adaptarem à concorrência. Tanto empresas pequenas, como a
PeopleExpress, como as tradicionais gigantes Panam, TWA, Braniff e Eastern sucumbiram ao
virulento ambiente de competição. A liberdade plena das empresas em definir para onde voar
(liberdade de rota) e qual preço praticar (liberdade tarifária) criou um ambiente de “corrida ao
ouro”. Muitas empresas se concentraram em aeroportos com grande intensidade de tráfego,
competindo com as empresas majors, e muitas se estabeleceram em aeroportos médios com a
estratégia de crescer gradativamente. Esse movimento forçou algumas empresas, como Delta
Airlines e American Airlines, a tentarem compreender a dinâmica do mercado para resolver
um dos grandes dilemas econômicos do setor à época: como evitar a “gangorra da taxa de
ocupação”: taxas elevadas de ocupação de algumas empresas “baixo custo, baixa tarifa”
acompanhadas de elevado prejuízo. Essa aparente contradição fez com que a Delta procurasse
compreender as razões desse fenômeno. A ideia central foi a de que a melhor estratégia não
era a de praticar preços baixos (ou os preços que as empresas achavam adequado para
garantir suas margens de lucro), mas praticar os preços que os consumidores estavam
dispostos a pagar. Essa conclusão não era trivial. Nascia ali o principal mecanismo de
precificação da história da aviação: a atribuição de valor às passagens aéreas de acordo com o
valor atribuído pelos passageiros ao produto oferecido pelas empresas; e não mais pelo
simples repasse de margens de ganho a partir de um nível de custo operacional.

Os passageiros reagem de forma diferente diante de um produto à venda. Intuitivamente, se o


preço de um bem aumenta, a demanda diminui; e se o preço aumenta, a demanda diminui. No
entanto, essa dinâmica não é linear. Para aqueles produtos dos quais somos mais
dependentes, a exemplo da demanda por um voo cujo destino significará o fechamento de um
contrato de alguns milhões de reais, a demanda torna-se menos sensível ao preço. Da mesma
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forma, um destino para o qual não damos prioridade, qualquer aumento ou queda de preço
impactará fortemente nas nossas decisões de consumo. Essa dinâmica logarítmica (nosso
comportamento é diferente para cada tipo de produto dependendo do seu grau de
essencialidade) permite-nos compreender em que circunstâncias os passageiros estão mais ou
menos dispostos a pagar pela passagem aérea. Se imaginarmos o mercado aéreo brasileiro,
que oferece uma média de 2.700 voos diários, nenhum sistema de informação rústico teria
condições de avaliar com precisão qual a quantidade de assentos que devem ser oferecida a
determinado preço. Em outros termos, a questão essencial é: mediante a necessidade de
atender a milhares de passageiros por dia, cujas prioridades de voos são muitos distintas, quais
os níveis de preços que as empresas devem praticar de forma a garantir o maior volume de
receita possível e, ao mesmo tempo, garantir a rentabilidade do voo e a satisfação dos
passageiros? Para resolver este dilema, a indústria debruçou-se sobre a construção de um
modelo estatístico capaz de armazenar enorme quantidade de dados e processá-lo em
segundos, realizando interpolações e construindo estruturas de preços e correspondentes
números de assentos que permitem vender “o produto certo, na hora certa, para o cliente
certo”. Para compreendermos melhor esse mecanismo, consideremos uma aeronave com 200
assentos, que opera a rota São Paulo-Salvador, todas às segundas-feiras, às 10h00; e
considerando ainda que os voos sejam regulares, temos uma média de 51 voos anuais. Se
hipoteticamente esta empresa opera a rota há 10 anos, a série histórica de dados é de 510
voos!

(6) nota: análise da otimização de receita e gestão de inventário serão tratadas posteriormente

Capítulo VIII – Perspectivas para a Aviação Comercial

8.1. Desafios da Aviação Comercial Brasileira

Há forte potencial de crescimento da aviação no Brasil e no mundo. Por décadas o Brasil


deixou de apresentar um programa de desenvolvimento de longo prazo para a aviação
comercial brasileira. Em 2010, a pedido do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social), a consultoria americana McKinsey produziu um estudo detalhado do
setor aéreo brasileiro, sobretudo para avaliar as condições do país em sediar a Copa do mundo
que ocorreria no ano de 2014. O estudo basicamente se concentrou em três grandes áreas:
competição, infraestrutura e governança. O propósito do estudo foi mapear os principais
problemas da aviação comercial brasileira e apontar alternativas de soluções. Trata-se de uma
revisão atualizada dos principais problemas do setor. No campo da competição, o estudo
apresenta uma análise sobre a evolução do setor aéreo brasileiro das últimas décadas,
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ressaltando a importância do processo de desregulamentação, que promoveu o surgimento de


novas companhias aéreas e estimulou a competição no setor, promovendo a queda
continuada dos preços e a busca permanente pelas empresas de competitividade. A análise
sobre infraestrutura versou sobre os principais desafios encontrados nos principais aeroportos
brasileiros. O estudo traça um diagnóstico detalhado dos principais problemas aeroportuários
dos principais aeroportos do país. Tal análise inspirou posteriormente os programas de
concessão para a iniciativa privada dos principais aeroportos em volume de passageiro
(Guarulhos, Galeão, Viracopos, Brasília, Belo Horizonte). Destaca-se neste estudo os diferentes
problemas de cada aeroporto. Enquanto que em alguns os problemas se concentram no lado
terra (terminal de passageiro, estacionamento e acessibilidade), em outros elas estão
concentrados no lado ar (pátio, pista e comunicação). Percebeu-se que, a despeito da crítica
generalizada de que o país não teria condições de sediar a Copa em função das restrições de
infraestrutura aeroportuária, as limitações dos aeroportos estavam distribuídas e pulverizados,
tendo cada qual problemas específicos. Os principais problemas se referiam a restrições de
pista de pouso, dimensão dos terminais de passageiro, vagas de estacionamento, esteiras de
bagagens, entre outros. O fato é que o evento Copa do Mundo ocorreu com relativa
tranquilidade e os aeroportos não apresentaram o colapso que se imaginava. É certo que a
aviação executiva acabou por sofrer maiores restrições operacionais e ter contribuído para
esse sucesso. Mas é inegável que, sob o ponto de vista do papel desempenhado pelas
autoridades aeronáuticas, empresas do semento aéreo e seus colaboradores, a aviação
brasileira prestou um serviço primoroso e garantiu sua qualidade e eficiência. Chama a
atenção o fato de que, aliado ao evento Copa do Mundo, a aviação brasileira nunca havia
registrado a marca recorde de passageiros transportados, tornando o desafio ainda maior.
Mas o que ocorreu é que houve uma substituição parcial do tráfego de turismo e negócio pelo
tráfego esportivo. A média de público que frequentou os estádios foi de 6 milhões, enquanto a
média de passageiros por dia nos aeroportos era de 8 milhões. Parte deste tráfego utilizou a
infraestrutura e parte relevante distanciou-se dos aeroportos para assistir aos jogos, o que
pressionou menos a capacidade instalada é garantido a relativa tranquilidade nos aeroportos.
Outro fator que contribui para este sucesso foi o alinhamento operacional entre regulador e
empresas aéreas, que reestruturou a malha aérea circunstancialmente para adequar-se ao
cenário de jogos.

A terceira dimensão importante deste estudo diz respeito aos modelos de governança,
incluindo o papel desempenhado pelos reguladores do sistema aéreo nacional.

8.2. O setor aéreo brasileiro e as perspectivas de crescimento


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Nos últimos anos, o setor aéreo brasileiro tem crescido fortemente e se consolidado como um
importante meio de transporte. De 2003 a 2010, o número de passageiros transportados no
mercado doméstico e internacional evoluiu de um total de 33,4 milhões para 77,2 milhões
(crescimento de 131%!), desempenho nunca verificado na história do setor. Essa expansão
tem sido impulsionada, essencialmente, por três razões: aumento da competição entre as
empresas aéreas, ascensão econômica das classes sociais de renda média (as chamadas classes
C e D) e a estabilidade econômica do país no período, que tem contribuído para tornar o Brasil
uma excelente oportunidade de investimentos, inclusive no segmento de infraestrutura, que
passou a ser o principal desafio de curto prazo para garantir a continuidade do crescimento do
setor. Como consequência desse processo, as empresas aéreas têm ampliado seus
investimentos na aquisição de novas aeronaves e contratado continuamente profissionais
especializados (pilotos, comissários, mecânicos, pessoal administrativo) para atender a maior
demanda. Essa maior demanda tem sido também impulsionada pela queda dos preços das
passagens aéreas, pela estratégia das empresas em disponibilizar pontos de vendas em locais
de grande circulação popular e pela recuperação da renda dos trabalhadores.

Uma preocupação recorrente da sociedade brasileira diz respeito às restrições de


infraestrutura aeroportuária no contexto de realização da Copa do Mundo de 2014 e as
Olimpíadas de 2016. O fato é que no cenário atual de crescimento do setor, o problema da
infraestrutura já é uma realidade. Isso explica o fato de o governo ter acelerado os programas
de concessão de aeroportos para empresas privadas, a exemplo do que aconteceu
recentemente com os aeroportos de Guarulhos, Viracopos em Campinas e Brasília, que
renderam R$ 25 bilhões ao governo. A decisão de concessão foi acertada na medida em que a
partir de agora os investimentos para a ampliação e reforma das pistas e dos terminais de
passageiros serão realizados mais aceleradamente, com melhorias dos serviços prestados aos
passageiros e com maior eficiência nas operações aéreas, permitindo que mais pessoas
passem a utilizar o modal aéreo e abrindo espaço para a continuidade do crescimento do
setor. Além dos benefícios diretos, tais investimentos mobilizarão outras cadeias produtivas
importantes, como o segmento turístico, o de construção civil e o de serviços.

O potencial de crescimento do setor aéreo brasileiro para os próximos anos é enorme. Ainda
que o Brasil possua 204 milhões de habitantes, menos da metade frequenta os aeroportos.
Apesar do forte crescimento dos últimos anos, estima-se que “apenas” 40 milhões de
passageiros realizam voos anualmente no Brasil. Como cada um desses brasileiros realiza em
média duas viagens por ano, 80 milhões (40 x 2) frequentaram os aeroportos do país em 2011.
Para um país que possui 204 milhões de habitantes, a utilização do modal aéreo ainda é
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reduzida, ao contrário dos Estados Unidos, que possui uma população de 310 milhões e
transporta anualmente quase 700 milhões de passageiros (2,3 viagens por habitante contra 0,6
do Brasil).

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