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A ÁGUA DOS ALIMENTOS

O teor de água é de grande importância na produção de alimentos, pois têm influência direta no controle da taxa de
deterioração por microrganismos e reações enzimáticas e químicas que ocorrem durante a armazenagem
(FELLOWS, 2006).
A água é uma molécula com estrutura tetraédrica e com baixo peso molecular, considerada um ótimo solvente
devido as suas principais características, que inclui o volume reduzido que viabiliza a penetração das estruturas
cristalinas em moléculas grandes como os hidrocoloides, alto momento dipolar e elevado constante dielétrica que
facilita a participação desse componente em ligações covalentes, dipolo-dipolo e íons-dipolo (BOBBIO e
BOBBIO,2001).
A natureza polar da molécula e a habilidade de formar ligações de hidrogênio determinam as propriedades da água
como solvente. A formação de pontes de Hidrogênios acontece entre moléculas de H ou eletronegativas como F,
O, N. Tais ligações são facilmente rompidas quando estão sozinhas, porém em uma matriz alimentar, quando estão
ligadas a outros componentes como polissacarídeos ou proteínas, a remoção dessa água despende uma grande
energia (BOBBIO e BOBBIO,2001).
Teor de Umidade e atividade de água de alimentos
A umidade pode ser expressa em base úmida ou base seca, a determinação desse fator é de grande importância para
definir a estabilidade, qualidade e composição dos alimentos, podendo afetar a estocagem, a embalagem e o
processamento do alimento. O conteúdo de umidade varia de acordo com o alimento. A água pode estar no alimento
como água livre, água absorvida ou água de hidratação ou ligada. Ao realizar a análise de umidade, somente a água
livre é medida em todos os métodos, por isso é preciso sempre informar qual o método que utilizado, incluindo as
condições, tempo e temperatura, para que possamos ter certeza do foi analisado. (FELLOWS, 2006, CECCHI,
2007).

A tabela indica o teor de umidade e atividade de água de alimentos (Fonte: FELLOWS, 2006).

Deterioração de alimentos por microrganismo


A deterioração dos alimentos pode acontecer de forma rápida, devido as reações enzimáticas e químicas que
ocorrem durante o armazenamento e todos os alimentos contém água em menor ou maior proporção, independente
do método de industrialização no qual ele foi submetido. Destarte é importante saber qual o teor de água presente
no alimento (umidade), ele é um fator importante no controle da taxa de deterioração. (FELLOWS, 2006;
INSTITUTO ADOLFO LUTZ 2008).
Classificação da Umidade/Água nos alimentos:
 Água de Hidratação ou ligada: Fortemente ligada ao substrato e não é fácil de ser eliminada. Não é congelável
e não está disponível para os micro-organismos e nem como solvente em reações químicas e enzimáticas. Está
envolvida quimicamente com outras substâncias, dificilmente é determinada pelos métodos de umidade.
 Água livre: Também conhecida como umidade de superfície, geralmente está presente na superfície externa
do alimento e entre os espaços e poros do material, funciona como agente dispersante para substâncias coloidais e
como solvente em compostos cristalinos. Essa água é facilmente evaporada, é congelável, funciona como solvente
e está disponível para o crescimento dos micro-organismos. Ela é fracamente ligada aos substrato e entre si.
 Água absorvida ou capilar: Conhecida como umidade adsorvida, que é a água localizada no interior do
alimento, presente nas superfícies de macromoléculas, como amido, pectina, celulosa e proteína, ligadas por forças
de Van der Waals e pontes de hidrogênio e que não combina com outros elementos quimicamente. Também
funciona como solvente e influência no crescimento dos micro-organismos.
Valor de monocamada de BET (Brunauer-Emmett-Teller): O teor de umidade é chamado assim, quando todos
os pontos estão ocupados por água absorvida, ou seja uma proporção de água está ligada em pontos específicos
(grupo hidroxila de polissacarídeos, grupos carbonila, amino de proteínas e pontes de hidrogênio).
EX: gelatina (11%), amido (11%), lactose amorfa (6%) e leite integral seco em secador de spray (3%). Esse valor
representa o teor de umidade no qual o alimento apresenta estabilidade, ou seja existe maior taxa de oxidação de
gorduras, ou pode ocorrer em altos teores o escurecimento devido a reação de Maillard e atividades enzimáticas e
microbiológicas.
A água disponível afeta a atividade microbiológica, enzimática e química, determinando a vida de prateleira de um
alimento, e isso é representado pela atividade de água (αa) do alimento que também é conhecida como pressão de
vapor relativa (PVR). A pressão de vapor exercida pela água nos alimentos dependem alguns fatores intrínsecos(
umidade e composição) e extrínsecos do alimento (temperatura e umidade), (FELLOWS, 2006 ; INSTITUTO
ADOLFO LUTZ 2008).
Umidade de equilíbrio do alimento: Quando o alimento está em armazenado em uma determinada temperatura
que se apresenta constante, o teor de umidade do alimento será alterado até entrar em equilíbrio com o vapor d’água
que está presente no ambiente, dessa forma o alimento não irá ganhar ou perder peso, e isso é conhecido como Teor
de umidade de equilíbrio do alimento.
Teor de umidade nos alimentos
A umidade é corresponde ao peso perdido do alimento após o seu aquecimento, onde a água é removida. Outras
substâncias que volatilizam também são removidas em determinadas condições e o resíduo obtido do aquecimento
direto é conhecido como resíduo seco.

%umidade = Peso úmido – peso seco x 100


Peso úmido

Operações unitárias que reduzem a disponibilidade de água


De acordo com Fellows as operações unitárias que reduzem a disponibilidade de água em alimentos, incluem
aqueles que removem a água fisicamente:
 Desidratação;
 Evaporação;
 Liofilização;
 Concentração por congelamento;
E também aqueles que imobilizam a água no alimento:
 Uso de umectantes -
 Congelamento (Cristais de gelo) –

Umidade relativa de equilíbrio: É a umidade relativa da atmosfera de armazenagem.


A diferença entre Atividade de Água (Aw) e o Teor de Umidade nos alimentos
Quando falamos em segurança e qualidade de alimentos, existem duas medidas críticas que todos os fabricantes
devem conhecer:
 Teor de Umidade;
 Atividade de Água.
Ambas as medições podem parecer a mesma coisa, mas não são! Elas são medidas para dois propósitos diferentes,
e cada uma mostra conceitos próprios sobre rendimento, qualidade e segurança dos alimentos.
Meu objetivo aqui não é dar uma aula ou fazer uma revisão bibliográfica sobre o assunto, mas elucidar do ponto de
vista prático. Este post irá abordar as diferenças e a importância de cada medição:

TEOR DE UMIDADE
Após um processo padronizado de secagem do alimento, podemos definir:
Umidade (%) = [(Pi – Pf) / Pi] × 100
Onde:
 Pi = Peso inicial da amostra;
 Pf = Peso final da amostra.
O teor de umidade é a medida da quantidade total de água contida num alimento (água total), e é geralmente
expresso como uma porcentagem (%) do peso total. É uma das medidas analíticas mais importantes, sendo utilizada
no processamento e testes de produtos alimentícios, tendo importância direta para:
1. Processador e consumidor;
2. Qualidade do alimento;
3. Estabilidade do alimento;
4. Uniformidades de resultados;
5. Valor nutritivo e
6. Especificações de padrões de identidade e qualidade do produto.
Como o custo da matéria prima é baseado no peso, algumas vezes os fabricantes tentam usar água adicional para
obter lucros ilícitos. Quanto maior for o teor de umidade padrão do alimento, maior a chance de o produto ser
fraudado, isto é, temos fraude com adição de água no leite, mas não na farinha de trigo por exemplo.

ATIVIDADE DE ÁGUA (Aw)


Enquanto o teor de umidade simplesmente define a quantidade de água nos alimentos e ingredientes, a atividade
de água, em termos práticos, é a água do alimento que vai reagir com microrganismos (e também participar
de outras reações, como as enzimáticas). Quanto mais elevada for a atividade da água, mais rápido os
microrganismos (como bactérias, leveduras e bolores) serão capazes de crescer; logo a importância da Aw está na
sua relação com a conservação dos alimentos.
Primeiramente, preciso citar as três formas de apresentação da água nos alimentos propostas por Labuza (1970):
 Água livre (disponível ou não ligada);
 Água adsorvida (hidratada);
 Água ligada.
– Água livre – está presente nos espaços intergranulares e entre os poros do material. É eliminada com
facilidade. Atua como meio de dispersão e nutriente para o crescimento de microrganismos ou reações
químico-enzimáticas.
– Água adsorvida – uma parte da água que está adsorvida como uma camada muito fina nas superfícies internas e
externas dos coloides macromoleculares (amidos, pectinas, celuloses e proteínas) por meio de Força de Van der
Waals e formação de ligação hidrogênio.
– Água ligada – está combinada quimicamente com outras substâncias. Este tipo de água não é utilizada como
solvente, não permite o desenvolvimento de microrganismos e é difícil de ser eliminada.

Figura: Desenho esquemático dos tipos de água nos alimentos (Fonte: Google imagens)

Para melhorar a estabilidade dos alimentos, a água livre tem sido reduzida através
do congelamento, concentração, desidratação parcial ou adição de açúcar ou sal.
O crescimento e a atividade metabólica dos microrganismos precisam de água em forma disponível. A medida mais
comumente empregada para expressar a estabilidade de um produto é a determinação do nível de água em sua forma
livre, que em alimentos, denomina-se Índice de Atividade de Água, Aw, que é determinada pela fórmula: Aw =
P/P0. Define-se a Aw, portanto, como a relação existente entre a pressão de vapor de água de uma solução (ou de
um alimento) (P) e a pressão de vapor da água pura (P0) à mesma temperatura.
Nossa mente está condicionada a achar que um produto com elevada atividade de água terá elevado teor de umidade
ou o contrário (baixo/baixo). Isto muitas vezes ocorre, todavia é possível, por exemplo, um produto apresentar baixo
teor de umidade e alto ou médio valor de atividade de água, como é o caso do pão.
O teor de umidade (água total) do pão é baixo (40%), enquanto sua Aw (água livre) é alta (0,96). Quando
comparamos as atividades de água do pão com a da geleia, 0,96 e 0,86, respectivamente, nota-se que a
disponibilidade de água para crescimento microbiano no pão é maior.
Outra comparação interessante é entre a carne fresca e o pão. Embora o teor de umidade da carne fresca (70) seja
maior do que o teor no pão (40), ambas possuem um valor de Aw muito próximo (carne fresca = 0,985 vs pão =
0,96).
Valores de atividade de água entre 0 e 0,20 indicam que a água está fortemente ligada, enquanto valores de atividade
de água na faixa de 0,70 a 1,00 indicam que a maioria da água encontra-se livre, sendo esta passível de ser utilizada
em reações químicas, enzimáticas e para o desenvolvimento de microrganismos.
Medir a atividade de água nos alimentos é importante para:
1. Prever o desenvolvimento microbiano;
2. Avaliar as reações químicas e vida de prateleira;
3. Avaliar a estabilidade física;
4. Projetar a embalagem – proteção contra umidade ambiente;
5. Analisar a transferência de umidade entre ingredientes;
6. Considerar o intercâmbio de umidade com o meio ambiente;
7. Predizer a curva de isoterma – Umidade vs Aw.

Tratando-se de Segurança de Alimentos, é pertinente apresentar os valores mínimos de Aw para o crescimento e


produção de toxina de patógenos de importância alimentar, conforme tabela abaixo:
O comportamento microbiano frente à Aw quanto à disponibilidade de água livre é extremamente variável, sendo
as bactérias mais exigentes, em relação aos fungos e as leveduras. Os alimentos de baixa atividade de água (< 0,60)
são microbiologicamente estáveis.
Por tudo que vimos, a Aw é um dos fatores intrínsecos dos alimentos e é uma medida QUALITATIVA que permite
avaliar a disponibilidade de água livre que é susceptível a diversas reações, ao passo que o teor de umidade é uma
medida meramente QUANTITATIVA, medindo o percentual em peso, de toda água presente no alimento, tanto
livre quanto ligada.

Conclusão
A atividade de água pode ser utilizada como parâmetro de controle de qualidade, mostrando valores efetivos da
disponibilidade da água no alimento para participar de reações de deterioração oxidativa, enzimáticas e
microbiológicas, sendo que estes fatores podem afetar diretamente a qualidade sensorial (oxidação lipídica/ranço)
ou sanitária do alimento. Já o teor de umidade está mais associado ao rendimento e qualidade sensorial (ex:
crocância de um alimento).

Referências Bibliográficas:
CECCHI, H. M. Fundamentos teóricos e práticos em análise de alimentos. 2. ed. Campinas: editora da Unicamp, p. 2003. 207.
DAMODARAN, S.; PARKIN, K.L.; FENNEMA, O.R. Química de Alimentos de Fennema. 4ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2010.
FELLOWS, P. J. Tecnologia do Processamento de Alimentos: princípios e prática. 2 ed. Porto Alegre:Artmed, 2006. 602 p.
INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Normas Analíticas do instituto Adolfo Lutz. v. 1: Métodos químicos e físicos para análise de
alimentos, IV. ed. São Paulo: IMESP, p.98-99, 2005.
LABUZA, T. P.; TANNEMBAUM, S. R.; KAREL, M. Water content and stability of lowmoisture and intermediate-moisture
foods. Food Technology. p .543-550, 1970.

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