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Bom dia!

O poema que me calhou foi O Padrão que se insere na obra Mensagem escrita por Fernando Pessoa e
que está dividida em 3 partes, sendo constituída por 44 poemas, geralmente curtos. Este poema está inserido
na 2º parte cujo nome é Mar Português que aborda no seu todo:
 Realização da Pátria;
 Apogeu dos Descobrimentos (ponto culminante);
 Ânsia do desconhecido e o desejo de desvendar o mar;
 Possessio Maris (Domínio do Mar).
Eu vou-vos passar a ler este poema e vocês vão começar a perceber que estes aspetos estão realmente
presentes.

PADRÃO

O esforço é grande e o homem é pequeno.


Eu, Diogo Cão, navegador, deixei
Este padrão ao pé do areal moreno
E para diante naveguei.

A alma é divina e a obra é imperfeita.


Este padrão sinala ao vento e aos céus
Que, da obra ousada, é minha a parte feita:
O por-fazer é só com Deus.

E ao imenso e possível oceano


Ensinam estas Quinas, que aqui vês,
Que o mar com fim será grego ou romano:
O mar sem fim é português.

E a Cruz ao alto diz que o que me há na alma


E faz a febre em mim de navegar
Só encontrará de Deus na eterna calma
O porto sempre por achar.
Fazendo uma análise externa do poema: este é constituído por 4 quadras em que os três primeiros
versos de cada estrofe são decassilábicos e o último octossilábico. Além do mais, possui rima cruzada.
Primeiramente, achei necessário dar-vos mais alguma informação sobre Diogo Cão.
 Era um navegador português do século XV;
 Realizou viagens de reconhecimento da costa ocidental africana;
 Trouxe ensinamento conveniente para atingir a África do Sul a navegar pelo largo, como fez Vasco
da Gama.
Podemos dividir este poema em 3 partes. A primeira parte limita-se à primeira estrofe onde ocorre a
identificação do sujeito poético e aquilo que fez: deixou um padrão "junto ao areal moreno" e seguiu a sua
navegação.
Mas afinal, o que é este padrão?
Como lido nos versos 2-3 ("Eu, Diogo Cão, navegador, deixei // Este padrão ao pé do areal moreno")
este monumento surge como um marco sinalizador da passagem de Diogo Cão, dando, assim, conhecimento
de que a parte da "obra ousada" que competia ao navegador cumprir foi feita. Até porque, em duas viagens,
Diogo Cão percorreu a costa ocidental de África, entre 1482 e 1486, tendo levantado padrões de pedra nos
vários locais onde aportava. Além do mais, o padrão servia também para testemunhar, pelas "Quinas"
gravadas no monumento, o domínio português das terras que iam sendo descobertas. É claro que, podemos
facilmente descortinar uma terceira função do padrão, sendo esta manifestar, através da "Cruz" que se
encontrava no topo do próprio, a fé cristã pelos vários cantos do mundo tornando-se, com efeito, a finalidade
principal dos Descobrimentos. Ainda nesta estrofe, no primeiro verso, temos uma antítese que evidencia
quer a pequenez do "homem" e, consequentemente, a imperfeição da sua obra quer a grandiosidade da
missão "divina" que lhe foi atribuída e que ele terá de tentar levar a cabo, ultrapassando as suas limitações
humanas. Existe também uma sinédoque em “areal moreno” para, então, referir a costa africana.
Já na segunda parte, ou seja, na segunda estrofe o sujeito poético reconhece que aquele padrão
assinala que a missão do navegador foi cumprida (“Este padrão sinala ao vento e aos céus/Que, da obra
ousada, é minha a parte feita”). Afirma também que o grande feito que alcançou, a conquista de novas terras,
marcadas como portuguesas através do padrão só terá sido possível a partir da conjugação de esforços de
dois agentes: o próprio navegador e Deus (“Que, da obra ousada, é minha a parte feita:/O por fazer é só com
Deus”). A 2ª quadra é também iniciada por uma antítese: «A alma é divina e a obra é imperfeita». A parte
«A alma é divina» é complemento da parte «O homem é pequeno»; assim, a pequenez do ser humano limita-
se à sua parte terrena e a alma divina que nele habita mostra a sua grandeza espiritual derivada da ligação
com Deus. A parte «A obra é imperfeita» é complemento da parte «O esforço é grande», isto é, apesar do
muito esforço, o ser humano tem limites que não consegue ultrapassar sozinho, razão pela qual precisa do
apoio divino e, assim, «O por-fazer é só com Deus».
Finalmente a terceira parte enquadra as duas últimas estrofes. É na terceira estrofe que o sujeito
poético mostra o significado das quinas. Para isto foi utilizada a dupla adjetivação — "...imenso e possível
oceano" - v. 9 — para enfatizar a ideia da coragem e da grandiosidade do feito dos nossos marinheiros ao
enfrentarem um oceano imenso, mas cujo domínio estava ao seu alcance e também uma a personificação das
mesmas ("Ensinam estas Quinas..."- v. 10) que denunciam o poder educacional / instrutivo e o intuito
evangelizador dos Portugueses. Podemos também observar que estes dois versos sofreram uma inversão
violenta na ordem dos elementos da frase, logo é utilizado o hipérbato, pois a ordem correta das palavras
seria: "E estas Quinas, que aqui vês, ensinam ao imenso e possível oceano que o mar ...".
Nos dois últimos versos desta quadra há a contraposição entre o "mar com fim", que é "grego ou
romano" e o "mar sem fim", que é "português", traduzindo um enaltecimento das viagens marítimas dos
Portugueses, afirmando a sua superioridade relativamente às dos povos da Antiguidade Clássica. Estes
últimos dominaram apenas o conhecido, o "mar com fim, o Mare Nostrum, enquanto os Portugueses se
apropriaram do desconhecido, do "mar sem fim", que foram desvendando, acentuando-se, assim, a sua
dimensão épico-heroica.
Finalmente, na última quadra, o sujeito poético demonstra o significado da Cruz que a partir da
personificação, mostra qual o principal objetivo da navegação: a procura do porto sempre por descobrir
(Céu), que só será encontrado “na eterna calma” (depois de morrer), e até lá, guiar-se-á pela vontade de
Deus, que o incentiva a navegar constantemente.
Para concluir, este poema possui um campo lexical predominante que é referente à navegação
("Diogo Cão", "navegador", "padrão", "areal", "naveguei", "vento", "céus", "oceano", "mar com fim", "mar
sem fim", "navegar", "calma", "porto [...] por achar") assumindo uma grande importância no texto, quer pela
quantidade e diversidade dos seus elementos, produzindo um discurso poético centrado no ato de navegar
(tornando-se como que um hino da viagem marítima e de exaltação da descoberta), quer por configurar uma
espécie de metáfora da demanda do transcendente (manifestação de algo sublime/excecional).
Muito obrigada pela vossa atenção!

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