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1
Ver Alexandre Mansur Barata. Luzes e sombras: a ação da Maçonaria Brasileira (1870-1910).
Campinas: Editora da Unicamp, Centro de Memória-Unicamp, 1999, p. 29.
2
Ver Eliane Lucia Colussi. A Maçonaria gaúcha no século XIX. Passo Fundo: Ediupf, 1998, p. 34-35.
cidade que não possuísse sua loja 3”. Em Portugal, a ordem se instalou em 1728, quando
apareceu em Lisboa uma loja de protestantes ingleses, apelidada “Loja dos Hereges
Mercantes”. Cinco anos depois, católicos da Irlanda criaram a Casa Real dos Pedreiros
Livres da Lusitânia, que abria às quartas-feiras nos fundos de uma taverna. Ali,
debatiam sobre temas científicos, promoviam banquetes e ouviam música4.
Opinião diversa foi manifestada, meio século antes, por Carlos Rizzini, do
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), que em trabalho de 1946 assegurou
que o Areópago de Itambé “não seria porém uma loja, por lhe faltarem os ritos próprios,
3
Cf. Alexandre Mansur Barata. Luzes e sombras: a ação da Maçonaria Brasileira (1870-1910). Op. cit,
p. 31-32.
4
Idem, p. 56.
5
Ver Antônio do Carmo Ferreira. O Areópago de Itambé: A Maçonaria Revolucionária no Brasil.
Londrina: A Trolha, 2001, p. 11, 24, 29 e 39.
6
Idem, p. 29-30.
7
Ibidem, p. 24.
de resto evitados por portugueses e brasileiros temerosos da implacável perseguição do
[intendente Pina] Manique8”. Para Barata, “até o final do século XVIII não existia no
Brasil a Maçonaria, entendendo-se como tal uma organização institucionalizada e com
funcionamento regular nos mesmos moldes das outras organizações maçônicas
internacionais”. Conforme o autor, que se baseia no Manifesto de José Bonifácio, de
1831, a primeira loja brasileira, Reunião, surgiu em Niterói no ano de 18019.
A loja Reunião era filiada a uma Obediência francesa. Sobre isto, vale destacar
que os estudantes brasileiros deixaram registros, no Grande Oriente da França, de ter
criado duas lojas naquele país, uma em Montpellier, cuja Faculdade de Medicina era
“um dos focos maçônicos franceses”, e outra na cidade próxima de Perpignan. Quando
o Grande Oriente Lusitano soube da existência da loja Reunião, em 1804, tentou sem
êxito submetê-la à sua jurisdição, mas promoveu a fundação, no Rio de Janeiro, das
lojas Constância e Filantropia. Todas tiveram suas atividades suspensas quando o vice-
rei conde do Arcos empreendeu uma forte perseguição contra a Maçonaria, em 180610.
8
Apud Eliane Lucia Colussi. A Maçonaria gaúcha no século XIX. Op. cit., p. 85.
9
Ver Alexandre Mansur Barata. Luzes e sombras: a ação da Maçonaria Brasileira (1870-1910). Op. cit.,
p. 59.
10
Idem, p. 59/60.
11
Ibidem, p. 60-61.
evento, a atuação de setores mercantis liberais insatisfeitos com “a atuação arbitrária da
polícia contra homens de bem12”.
12
Ver Cecília Helena de Salles Oliveira. Sociedade e projetos políticos na província do Rio de Janeiro.
In: Independência: História e Historiografia/org. István Jancsó. São Paulo: Hucitec; Fapesp, 2005, p.
509-510.
13
Ver Arcy Tenório D’Albuquerque. A Maçonaria e a Independência do Brasil. Rio de Janeiro: Editora
Espiritualista, s/d., p. 137.
14
Cf. Eliane Lucia Colussi. A Maçonaria gaúcha no século XIX. Op. cit. p. 89.
sentimentos pela causa do Brasil e da sua Independência. Costumes em
geral- que amor à beneficência e adesão à amizade15”.
15
Ver Alexandre Mansur Barata. Sociabilidade maçônica e Independência do Brasil. In: Independência:
História e Historiografia/org. István Jancsó. São Paulo: Hucitec; Fapesp, 2005, p. 680-681.
16
Ver Eliane Lucia Colussi. A Maçonaria gaúcha no século XIX. Op. cit. p. 303.
17
Ver Alexandre Mansur Barata. Sociabilidade maçônica e Independência do Brasil. Op. cit., p. 687.
18
Ver Eliane Lucia Colussi. A Maçonaria gaúcha no século XIX. Op. cit. p. 91.
19
Ver Alexandre Mansur Barata. Sociabilidade maçônica e Independência do Brasil. Op. cit., p. 686-687.
Quando isto não ocorria, se uniam a mulheres de condição considerada ainda mais
baixa, como as “filhas de oficiais mecânicos, lavradores e capitães de navio 20”.
20
Apud Antonio Carlos Jucá de Sampaio. Famílias e negócios: a formação da comunidade mercantil
carioca na primeira metade do setecentos. In: Conquistadores e negociantes; Histórias de elites no Antigo
Regime nos trópicos, América lusa, Séculos XVI a XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007,
p. 250.
21
Ver João Fragoso. Nobreza principal da terra nas repúblicas de Antigo Regime nos trópicos de base
escravista e açucareira: Rio de Janeiro, séculos XVII a meados do século XVIII. In: O Brasil Colonial,
volume 3 (ca. 1720- ca. 1821). Rio de Janeiro; Civilização Brasileira, 2014, p. 173.
22
Ver Ilmar Rohloff de Mattos. O Tempo Saquarema: a formação do Estado imperial. São Paulo:
Hucitec, 1990, p. 50-51.
23
Cf. Marcos Alvisi. Magistrados e Negociantes na corte do Império do Brasil: o Tribunal do Comércio.
Rio de Janeiro: Jurídica do Rio de Janeiro: FAPERJ, 2008, p. 47.
24
Ver Tâmis Parron. A política da escravidão no Império do Brasil, 1826-1865. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2011, p. 47-48.
Segundo Pedro Campos, os negociantes da praça do Rio “se organizaram e se
aproximaram do aparelho de Estado mais ainda do que os mineiros”. Quando
decidiram estruturar um Corpo de Comércio e construir sua sede, foram beneficiados
com a doação de um terreno pelo próprio rei, que compareceu à inauguração do prédio,
em 1820. Por outro lado, em 1816, os sete principais membros do mencionado Corpo
ofertaram à Coroa capitais que deveriam ser investidos na área educacional. Isto
resultou na criação do Instituto Acadêmico e do Instituto de Belas Artes25.
25
Cf. Pedro Henrique Pedreira Campos. Nos caminhos da acumulação: Negócios e poder no
abastecimento de carnes verdes para a cidade do Rio de Janeiro (1808-1835). São Paulo: Alameda, 2010,
101-102.
26
Ver Manolo Florentino. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de
Janeiro; séculos XVIII e XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p. 183-184.
27
Ver Jaime Rodrigues. O infame comércio: propostas e experiências no final do tráfico de africanos
para o Brasil (1808-1850). Campinas: Editora da Unicamp, Cecult, 2000, p. 127.
28
Encontrada em Maria Elisabete Vieira. O envolvimento da Maçonaria Fluminense no processo de
emancipação do Reino do Brasil (1820-1822) (Dissertação de Mestrado). Porto Alegre: UFRGS, 2001,
Anexo 3. Disponível em http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/21840/000339269.pdf?...0.
29
Ver Manolo Florentino. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de
Janeiro; séculos XVIII e XIX. Op. cit., p. 254 a 256.
e Joaquim José de Siqueira. Velho, Barroso e Ribas integravam a loja Comércio e
Artes, Henriques pertencia à União e Tranquilidade e Siqueira à Esperança de Niterói.
Amaro Velho da Silva não deve ser confundido com o tio homônimo, também
traficante. Ambos, de acordo com a Gazeta do Rio de Janeiro de 18 de outubro de
1809, figuraram como doadores de elevadas quantias em uma Relação das pessoas que
têm concorrido efetivamente para socorro dos vassalos de Sua Alteza Real residentes
em Portugal, desde o 1º até 5 de outubro de 1808. Velho da Silva Sobrinho teria
ofertado um conto de réis, e seu tio oitocentos mil réis. Cerca de dois anos mais tarde,
em 16 de outubro de 1811, o mesmo periódico anunciou a venda em hasta pública de
metade do bergantim Nossa Senhora da Penha, embarcação pertencente ao “finado
Amaro Velho da Silva”. Ainda conforme a Gazeta, na edição de 8 de fevereiro de
1812, Manuel e Amaro Velho da Silva, “administradores da casa do finado Amaro
Velho da Silva”, se preparavam para vender outro bem do espólio, o navio Lusitânia.
30
Idem, p. 243 e 266-267.
do Brasil a Reino Unido 31. Bem antes da Independência, se mostrava politicamente
ativo, concorrendo com seus capitais para a construção da sede do Senado da Câmara da
Corte e para a organização de um “corpo de pretos” denominado Libertos D’El Rei 32.
Consta da edição número 9 do Boletim do Grande Oriente do Brasil 33, impressa em
setembro de 1875, a informação de que quando o “irmão Guatimozim” (D. Pedro I)
retornou de São Paulo para o Rio, após a proclamação da Independência, recebeu
felicitações de uma deputação maçônica, na qual esteve Amaro Velho da Silva. Este foi
acompanhado por João Martins Lourenço Viana, mencionado como “irmão”, que
também aparece na lista de Florentino.
João Militão Henriques, ao contrário dos anteriores, foi figura de menor projeção
nos negócios, e no tráfico em particular. Apurei, por diversos números da Gazeta, que
costumava trabalhar como mestre de navios. Segundo o registro de entradas no porto
do Rio publicado em 29 de novembro de 1821, ele retornava de uma viagem de sessenta
dias a Quelimane, no Índico, trazendo cativos consignados a Joaquim Pires Farinha. À
primeira vista, não alcançou posição eminente na Maçonaria, mas é possível confirmar,
pela consulta ao Boletim do Grande Oriente do Brasil de março de 1875, que pertenceu
aos quadros da loja União e Tranquilidade.
31
Ver Gazeta do Rio de Janeiro, 3 de abril de 1816.
32
Idem, edições de 13 de agosto de 1817 e 15 de outubro de 1817.
33
Acessível em http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=709441&pesq=Amaro%20Velho.
34
Ver João Fragoso. Homens de grossa aventura: acumulação e hierarquia na praça mercantil do Rio de
Janeiro (1790-1830). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998, p. 353.
35
Cf. Manolo Florentino. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de
Janeiro; séculos XVIII e XIX. Op. cit., p. 242-244.
36
Ver Diário do Rio de Janeiro, 21 de junho de 1824, p. 4.
brasileiras; especialmente, ao que tudo indica, no transporte de mercadorias do Rio
Grande do Sul para a Corte. Podemos vê-lo, por exemplo, recebendo trigo, couros e
sebo procedentes do porto de Rio Grande, como consta da seção comercial da Gazeta
do Rio de Janeiro de 26 de junho de 1819. O mesmo periódico, na edição publicada em
24 de junho de 1818, ratifica sua associação com o tráfico: naquela semana, o navio
Príncipe Real, vindo de Cabinda sob o comando do mestre Inácio Alves Marta,
desembarcara uma carga de escravos endereçada a João Rodrigues Ribas.
Constatei, por fim, que no período joanino Joaquim José de Siqueira era um
súdito ativo no comércio de cabotagem. Exemplares da Gazeta do Rio de Janeiro
mostram que recebia vários tipos de carga, na maioria das vezes “casca de mangue”,
mas também aguardente, açúcar, café, farinha, tabaco e milho, de portos como Santos,
Caravelas, Mangaratiba e Guaratiba. Segundo a edição de 13 de maio de 1812, recebeu
um escravo vindo de Caravelas. A julgar pelos dados disponíveis, não teve grande
vulto como traficante. Dispôs, porém, de projeção entre seus pares, e foi sem dúvida
homem de amplos recursos. Conforme a Gazeta de 17 de maio de 1817, contribuiu com
dois contos de réis para subscrições administradas por Fernando Carneiro Leão e Amaro
Velho da Silva. Segundo as edições de 13 de agosto e 15 de outubro daquele ano,
ofereceu ainda duzentos mil réis para a construção da nova casa do Senado da Corte, e a
mesma quantia para o corpo dos Libertos D’El Rei. Não há no site dos periódicos da
BN mais indícios de seus laços com a Maçonaria, mas um texto do escritor maçônico
José Castellani confirma Siqueira como membro da Loja Esperança de Niterói37.
37
Ver https://bibliot3ca.wordpress.com/historia-do-gob/, consultado em 19 de outubro de 2016.
Coutinho, falecido dois dias após sua posse nas Cortes de Lisboa 38, foi mencionado no
Boletim do Grande Oriente do Brasil de junho de 1873 como um dos “nomes ilustres
para abrilhantar a Maçonaria do Brasil”. Ele via, como outros homens da época, a
situação dos escravos como melhor do que a dos livres sem posses, e advogou, em
escritos do início do século XIX, pela continuidade das relações escravistas. Julgava
que apenas quando contasse com uma “população correspondente a seu território”, além
de condições econômicas mais favoráveis, o Brasil poderia abolir o tráfico negreiro 39.
38
Ver Octaciano Nogueira e João Sereno Firmo. Parlamentares do Império. Brasília: Centro Gráfico do
Senado Federal, 1973, p. 151-152.
39
Cf. Jaime Rodrigues. O infame comércio: propostas e experiências no final do tráfico de africanos para
o Brasil (1808-1850). Op. cit., p. 71-72.
40
Idem, p. 52-53.
41
Cf. Octaciano Nogueira e João Sereno Firmo. Parlamentares do Império. Op. cit., p. 332-333.
42
Maria Elisabete Vieira. O envolvimento da maçonaria fluminense no processo de emancipação do
reino do Brasil (1820-1822) (dissertação de mestrado). Op. cit., p. 104.
pirataria, e os cativos apreendidos constariam como libertos (não simplesmente livres),
o que para Tâmis Parron sugere o reconhecimento ideológico “das práticas de
escravização no continente africano43”. Ainda em 1826, se uniu a outros deputados,
como Vergueiro e Paula Sousa, representantes de São Paulo, que combateram o tratado
antitráfico negociado com a Inglaterra sob o pretexto de que, naquele tema, o Executivo
passara por cima do Legislativo. Clemente Pereira chegou a dizer que o tratado feria os
“interesses da nação, a sua honra e dignidade, soberania e independência 44”.
Considerações finais:
43
Cf. Ver Tâmis Parron. A política da escravidão no Império do Brasil, 1826-1865. Op. cit., p. 63.
44
Idem, p. 74 a 76.
45
Maria Elisabete Vieira. O envolvimento da maçonaria fluminense no processo de emancipação do
reino do Brasil (1820-1822) (dissertação de mestrado). Op. cit., p. 48-49.
46
Cf. Jaime Rodrigues. O infame comércio: propostas e experiências no final do tráfico de africanos para
o Brasil (1808-1850). Op. cit., p. 74-75.
47
Apud Jaime Rodrigues. O infame comércio: propostas e experiências no final do tráfico de africanos
para o Brasil (1808-1850). Op. cit., p. 45-46.
Os dados empíricos levantados ratificaram minha hipótese inicial. O ingresso na
Maçonaria era plenamente viável tanto para os principais protagonistas do tráfico
quanto para os participantes menos notórios daquele comércio, desde que
razoavelmente prósperos, pelo menos. Também no terreno das ideias não se verificava
contradição significativa entre o pertencimento aos quadros maçônicos e a defesa do
tráfico. Não obstante o reconhecimento de problemas humanitários relacionados às
condições de vida dos cativos, para diversos intelectuais maçons este tipo de discussão
poderia ser inconveniente na esfera pública, e, se inevitável, deveria sempre estar
subordinado aos interesses políticos e econômicos das classes dominantes.