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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS

DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

O Outro na concepção Levinasiana de Deus

A filosofia da religião é um esforço reflexivo realizado com base na razão,


onde a religião, e as condições em que ela é possível, é seu objeto de pesquisa
(ZILLES, 1991, p. 5). Nesta aula nos propomos a apresentar os principais pontos do
discurso sobre Deus do filósofo Emmanuel Levinas.

Diante de uma realidade social cada vez mais plural e diversificada, muitas
vozes surgem evocando ser a verdade última e fundamental para compreender e
experimentar o mundo. Nesse clima de efervescência social os conflitos são
inevitáveis. Torna-se, portanto, imprescindível á construção de uma ética que
considere a subjetividade, ou seja, a particularidade de cada experiência vivida
nesta dupla dimensão de social: o sagrado e o secular.

Segundo Durkheim (DURKHEIM, 1989, p 67 e 68) as manifestações


religiosas, ordenam-se naturalmente em duas categorias fundamentais: as crenças e
os ritos. As crenças são estados da opinião, e se baseiam em representações e os
ritos são modos de ação determinados. Todas as crenças religiosas admitem uma
classificação das coisas, reais ou ideias, em dois gêneros antagônicos: o Sagrado e
o Profano, assim sendo, a divisão do mundo em dois domínios. Eliade (ELIADE,
1992, p 20) argumenta que o sagrado e o profano constituem duas modalidades de
Ser no mundo. São duas condições existenciais assumidas pelo homem ao longo de
sua jornada. Esses modos de ser dependem das diferentes condições que o homem
conquistou no cosmos e interessam não só ao filósofo, mas também a todo
investigador desejoso de conhecer as dimensões possíveis da existência humana.
O filósofo lituano-francês Emmanuel Levinas (1906-1995) como um dos mais
influentes pensadores da Ética do século XX desenvolveu uma filosofia baseada na
ideia de Alteridade. Segundo Levinas, quando o Outro é percebido como Alteridade
torna-se absolutamente Outro, incompreensível, transcendente e incontornável,
fonte das grandes experiências de vida e base legítima da ética.

O ponto principal da crítica de Levinas a tradição filosófica ocidental está no


fato dela não ter levado em consideração a questão do Outro, da alteridade, ou seja,
toda sua reflexão partia do Ser, do Ego, era centrada no sujeito. Para a mentalidade
ocidental o Outro é aceito apenas se convertido e reduzido ao “eu“: minha cultura,
religião, ideologia, filosofia ou visão de mundo. Segundo Levinas, essas são as
bases filosóficas do pensamento ocidental que constroem uma realidade apenas a
partir de si mesma. Todavia, para ele o Outro é alguém concreto, com experiências
e vivências reais. Segundo o filósofo o sentido ético da religião está no rosto do
Outro, sendo o Outro uma verdadeira epifania, uma manifestação de Deus enquanto
convite para amá-lo e respeitá-lo (CAMPOS, 2016, p. 259).

Para desenvolver sua argumentação Levinas utiliza termos como: Outro,


Infinito, Totalidade, Alteridade e Rosto. Esses termos conhecidos como categorias
levinasianas vão servir de base para a construção do seu argumento demonstrando
as falhas da filosofia ocidental e propor uma nova perspectiva ética.

O argumento propõe um romper com o olhar totalizante, um olhar que


interpreta o mundo a partir se si mesmo, negligenciando a alteridade, negando o fato
de que o Outro é diferente, todavia, com iguais direitos. Não se trata de negar a
totalidade, o que Levinas propõe é uma nova relação entre Totalidade e Alteridade,
uma relação que não seja excludente e destrutiva, mas sim, uma aceitação mútua.
Portanto, é preciso novo olhar para o Outro, não mais como alguém irrelevante,
invisível a minha sensibilidade, mas, um Outro existente, que tem opiniões,
emoções, que tem um Rosto.

Logo, se o sofrimento do Outro não me afeta, é porque ele está reduzido à


Totalidade, o que me impede de ver seu Rosto. Nesse caso é sempre estrangeiro
para mim, ainda que seja irmão, vizinho ou viajante, será sempre um inimigo em
potencial. Entretanto, quando o véu é removido dos olhos, o Rosto do outro aparece,
um Rosto nunca antes percebido e que rompe minha Totalidade. Deixamos de ficar
lado a lado, como numa competição e passamos a estar face a face, cooperando
para um existir pacífico.
Numa sociedade caracterizada por uma diversidade de crenças e atitudes
ceticistas em relação a elas, que geram constantes conflitos sociais, A ética
proposta por Levinas nos parece ser uma promissora proposta para solução dessas
crises na convivência.

Hélio Ricardo C. da Silva


Referências

 CAMPOS, Fabiano Victor de Oliveira. O Ser e o Outro: A questão de


Deus em Emmanuel Levinas. Juiz de Fora: Programa de Pós-
Graduação da UFJF, 2016.
 DURKHEIM, Émile. As Formas Elementares da Vida Religiosa. São
Paulo: Paullus, 1989.
 ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano. São Paulo: Martins Fontes,
1992.
 LEVINÁS, Emmanuel. Totalidade e Infinito. Tradução de José Pinto
Ribeiro. Lisboa: Edições Setenta, 1980.
 PAIVA, Márcio Antônio de. DIAS, Luiz Fernando Pires. O discurso
sobre Deus na filosofia de Emmanuel Levinas. Argumentos revista
de filosofia. ano 8, n. 15. Fortaleza: 2016.
 ZILLES, Urbano. Filosofia da Religião. São Paulo: Paullus, 1991.

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