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Abstract: Among the different family arrangements, the multi-species family composed of
both humans and animals has increased in the social context. In these families, it appears that
many couples choose not to have children or postpone motherhood or fatherhood, taking care
of their pets as a family member. With this new family configuration and the growing bond
between humans and pets, there was an increase in demands in the judiciary involving these
animals as a central point in divorce proceedings. Then arises the need to think about the
responsibility of tutors in the custody and maintenance of their pets in case of divorce and
legal and civil impacts that this dynamic entails.
Introdução
o caso do teólogo inglês Humphry Primatt que, em 1776, já falava sobre o dever da compaixão
dos homens para com os animais, influenciando a maior parte do pensamento contemporâneo
sobre o tema. Segundo Primatt, a ética deveria sempre seguir o princípio da coerência,
mantendo um julgamento imparcial também para com os animais
Bentham (1789), assim como Primatt, defendia que o ser humano possui um dever
ético e moral em relação aos animais, uma vez que são seres vulneráveis e capazes de sofrer.
Para o filósofo, não é a racionalidade que define o dever moral de cuidado, mas sim,
o sofrimento, a senciência do ser, que é justamente o fio condutor da corrente utilitarista, que
fundamenta o ativismo em defesa dos animais, e segundo a qual a felicidade é o fator de
primordial da vida, sendo um direito de todo ser senciente e o bem-estar e os prazeres são os
instrumentos para se concretizar esse direito.
E é a busca por esse bem-estar que norteia a família multiespécies ela pode ser
definida por uma relação humano-animal no qual a felicidade e a saúde do pet norteiam suas
ações, sendo formados vínculos afetivos tão fortes que os humanos reconhecem os animais de
estimação como verdadeiros membros da família, até mesmo como filhos.
A Declaração Universal dos Direitos dos Animais, proclamada em 1978 pela
UNESCO, foi uma das primeiras iniciativas em âmbito internacional criadas para aumentar a
proteção dos animais, reconhecendo o direito destes à vida, ao respeito e ao amparo aos maus-
tratos, sendo que o seu 6o. artigo afirma que “cada animal que o homem escolher para
companheiro tem direito à uma duração de vida conforme a sua longevidade natural, e o
abandono de um animal é um ato cruel e degradante.”
Ou seja, de acordo com a Declaração, o animal doméstico deve ter um tratamento
digno e que valorize o seu bem-estar e a saúde, valores que também estão em evidência com
o crescimento das famílias multiespécies.
Segundo Fiuza1, a proteção dos animais tem como parâmetro geral o princípio da não
maleficência, ou, em outras palavras, são protegidos aqueles animais que não nos sejam
maléficos, embora o autor reforça que esse princípio é um parâmetro geral, uma vez que até
mesmo os animais que nos sejam perigosos podem receber proteção, como é o caso dos ratos,
cuja forma de eliminação não pode ser cruel a eles.
É possível então enquadrar os animais de estimação nessa lógica e considerá-los
como dignos de proteção, tal como ocorre com os animais criados soltos no meio ambiente e
1
FIUZA, Cesar. Direito Civil- Curso Completo. 5ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.
4
“(...) em relação à natureza jurídica dos animais, o senso comum jurídico tem vivido
um dilema, pois analisando o fato de que os animais não são considerados sujeitos
de direito, também não poderiam ser considerados objetos, uma vez que a lei dispõe
de direitos aos animais, porém, objetos não possuem direitos, logo, animais são
objetos, e sim, sujeitos de direitos. (FIUZA, 2014)”
No caso específico da ruptura das famílias multiespécies, ainda não existe nenhuma
lei disciplinando o tema no Brasil, porém, já é possível encontrar tal avanço em legislações
estrangeiras, como a Constituição Portuguesa, que estabelece que os animais são dotados de
sensibilidade e objeto de proteção jurídica,
Já na Espanha, no ano de 2010, um juiz da cidade de Badajoz, Luis Romualdo
Hernández concedeu a guarda alternada de um cão a um ex-casal, levando em consideração
os novos significados construídos pela sociedade urbana e os animais de estimação.
“(...) Seja como for, o cão continua a nos procurar, a vigiar nossos rebanhos e
propriedades, trabalhar em múltiplas tarefas, como detectar explosivos ou drogas,
auxilia-nos em operações de resgates, ajudam pessoas com deficiências, etc. E,
acima de tudo, talvez por causa dessa relação inata especial, o principal papel do
cão é nos fazer companhia. E dessa companhia, como consequência lógica, nascem
grandes e sinceros afetos. (HERNANDEZ, 2010)”
Corroborando com essa nova realidade e prática social, o Poder Judiciário brasileiro
também encontra precedentes, como é o caso de decisão proferida em primeira instância pelo
juiz Roberto hiroshi Morisugi2, da 2ª Vara de Família e Sucessões de Santo André, julgou
procedente o pedido do requerente de visitar o seu cachorro Luke, o qual ficou com a ex-
cônjuge após um divórcio beligerante em 2020.
2
Procedimento Comum Cível 1015140-49.2020.8.26.0554 - Consultado em 21/05/2022
5
“(...) O fim do relacionamento e da boca convivência entre as partes não pode ser
óbice à visitação ao animal. Outrossim, é fato incontroverso que a aquisição se deu
na constância do casamento e não foi comprovada a falta de vínculo afetivo com o
animal ou que este seria maltratado de alguma forma quando em companhia com o
requerido. Inclusive, as postagens de mídias sociais juntadas ao processo
comprovam que o requerido sente falta da convivência com o cão Luke. (Morisugi,
2020)”
Por fim, em sua decisão, Morisugi determina o direito à guarda compartilhada do cão
Luke entre o ex-casal, determinando inclusive regras para a entrega e devolução do animal, a
divisão de despesas e a obrigatória alternância dos feriados de final de ano.
2 - Conclusão
aplicação de respeito e igualdade para com todos os seres vivos, não os subjugando pelas suas
possíveis vulnerabilidades.
O tema em questão, ainda, é tratado com muita estranheza por parte dos juristas
defensores do tradicionalismo e patrimonialismo, amplamente difundido no Código Civil de
1916, entretanto a defesa dos direitos subjetivos do homem, elencados com afinco na
Constituição Federal de 1988, juntamente com o Código Civil de 2002, permitem aos juristas
modernos aplicar analogicamente as leis vigentes, a fim de garantir aos animais o amplo
acesso aos seus direitos básicos.
As demandas referentes à guarda de animais de estimação são fontes de provas de
que as vivências sociais são intrínsecas ao Ordenamento Jurídico e que, por mais que este
busque calar-se, torna-se necessária a criação de leis que discorram sobre a possibilidade da
aplicação de um sistema semelhante ao de guarda e visitas aos animais de estimação, já que a
família multiespécies vem se tornando recorrente, e como toda formação familiar, esta pode
dissolver-se. Enquanto o Poder Legislativo não acompanha as nuances da sociedade, o Poder
Judiciário acertadamente tem conseguido avançar e trazer soluções como a guarda
compartilhada aos divorciados e ex-companheiros que almejam continuar participando do
convívio com o animal.
2.1 - Bibliografia