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Caroline Müller Bitencourt

Janriê Rodrigues Reck

Direito
CONSTITUCIONAL

Teoria

e Prática
EDIÇÃO
Revista, ampliada
e atualizada

2022
1
NOÇÕES GERAIS DE PROCESSO E
DA ESTRUTURA DE PEÇAS DA OAB

1.1 DoCumENToS JurÍDiCoS


Exige-se do candidato à aprovação no certame da OAB conhe-
cimento sobre a Ciência jurídica, suas técnicas, categorias e princi-
palmente corpo de normas do ordenamento. Todo o conhecimen-
to do candidato vai estar plasmado em um documento jurídico, e
esta será a exigência na elaboração da prova prático-processual,
ao lado das questões de Direito Constitucional. Este documento ju-
rídico pode ser um parecer ou uma petição. O primeiro documento
(parecer) serve para que o advogado esclareça situações jurídicas a
um interessado. Ele estará em forma de consulta, sendo que o advo-
gado em nada pedirá ao juiz ou decidirá, resumindo-se a responder,
de forma fundamentada, o que lhe fora perguntado. Para além dos
pareceres, o advogado elaborará também petições, sendo estas a
sua atividade principal.
Há dois tipos de petições:

a. As petições não judiciais, direcionadas à Administração Pú-


blica em geral, ao Poder Legislativo e até mesmo ao próprio
Poder Judiciário, porém fora de um contexto de uma deman-
da judicial (SILVA, 2020). Trata-se, aqui, de exercício do direi-
to fundamental de petição previsto no art. 5º, XXXIV – “são
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a todos assegurados, independentemente do pagamento de


taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa
de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder”. Estas
petições serão elaboradas nos termos da lei geral do proces-
so administrativo, Lei 9.784:
Art. 6º O requerimento inicial do interessado, salvo casos em que
for admitida solicitação oral, deve ser formulado por escrito e
conter os seguintes dados:
I – órgão ou autoridade administrativa a que se dirige;
II – identificação do interessado ou de quem o represente;
III – domicílio do requerente ou local para recebimento de co-
municações;
IV – formulação do pedido, com exposição dos fatos e de seus
fundamentos;
V – data e assinatura do requerente ou de seu representante.
Parágrafo único. É vedada à Administração a recusa imotivada
de recebimento de documentos, devendo o servidor orientar o
interessado quanto ao suprimento de eventuais falhas.

Note-se, assim, que o direito de petição serve para qualquer


situação que não seja um processo judicial, como por exemplo re-
querimento para que determinada autoridade lhe ouça presencial-
mente, ou que tome determinada providência, como reparar equi-
pamentos públicos, tais como uma rua.
b. O advogado elaborará também petições judiciais, as quais
são direcionadas aos magistrados. As petições direcionadas
aos magistrados serão anexadas ao processo, e servem tan-
to para que o processo seja impulsionado como também de
resposta aos pedidos da outra parte ou determinações judi-
ciais (MITIDIERO; SARLET; MARINONI, 2018). De petição em
petição o processo acaba sendo montado e, finalmente, fina-
lizado, com uma sentença ou acórdão. As petições judiciais
podem ser: 1) de mero prosseguimento, quando o advogado
impulsiona o processo sem postular, como por exemplo ar-
rolando testemunhas, manifestando-se sobre a perícia, etc.;
2) petições iniciais; 3) petições de recurso (MITIDIERO; MARI-
NONI; ARENHART, 2017).

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1 NOÇÕES GERAIS DE PROCESSO E DA ESTRUTURA DE PEÇAS DA OAB

As petições de prosseguimento dificilmente serão objeto de


avaliação na prova da OAB, uma vez que exigem pouco conheci-
mento técnico. Tanto a lógica como a experiência com provas an-
teriores demonstram que a banca avaliadora buscará testar o co-
nhecimento do candidato com petições complexas, que exijam co-
nhecimento do Direito Constitucional e/ou Processual. Deste modo,
parece claro que serão exigidas na prova em Direito Constitucional
petições que exijam conhecimento técnico, como são as petições
iniciais e os recursos. Conclui-se que dificilmente será objeto de
avaliação petições de prosseguimento, de modo que este livro tem
ênfase nas petições iniciais e nas petições de recurso.
Ainda, dado o fato de que se trata de uma segunda fase em
Direito Constitucional, pode-se dizer também, com altíssimo grau
de probabilidade, que o conteúdo da petição exigida versará sobre
matéria constitucional. Isto faz com que sejam excluídas, como im-
prováveis, várias petições, tais como Recurso Especial (matéria de
Direito infraconstitucional) e agravo de instrumento.
A seguir são elencadas as petições com maior probabilidade de
serem exigidas, no entender dos autores deste livro.
No campo do controle concentrado, há probabilidade de serem
exigidas as seguintes petições iniciais: Ação Direta de Inconstitucio-
nalidade (ADI), Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão
(ADO), Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) e Arguição
de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).
Na dimensão dos remédios constitucionais, são possíveis de se-
rem exigidas: Habeas Data (HD), Mandado de Segurança (MS), Man-
dado de Injunção (MI), Ação Popular (AP) e Ação Civil Pública (ACP).
A reclamação sempre tem uma grande chance de ser a peça
escolhida para fins de OAB.
Em sede de recursos as maiores probabilidades recaem sobre o
Recurso Ordinário (RO) e o Recurso Extraordinário (RE).
É evidente que se trata de probabilidades. Em potencial, todas
as ações previstas neste livro podem ser exigidas, de modo que um
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estudo sobre elas se faz necessário para se ter a segurança neces-


sária para o enfrentamento da prova da OAB. Este livro, assim, traz
praticamente todas as petições possíveis no campo do processo
constitucional.

1.2 ESQUEMA DE ESTRUTURA DO PODER JUDICIÁRIO E


SUAS FUNÇÕES
As petições e recursos são exemplos de postulação. Eles ser-
vem para serem julgados e, portanto, são direcionados a magistra-
dos. Entretanto, não é possível que as petições sejam direcionadas
a qualquer juiz ou magistrado. A justiça brasileira está organizada
em diferentes ramos, especializados em diferentes tipos de maté-
rias e autoridades. Além disto, há de se notar a hierarquia dos juízes
e tribunais, já que os tribunais existem para revisar as decisões dos
juízes e, portanto, são relevantes para o entendimento do sistema
judiciário do Brasil.

A pergunta sobre quem irá julgar é a pergunta sobre a compe-


tência. A CRFB/88 distribui competências, isto é, distribui compe-
tências para julgamento de determinadas matérias. A competência
para julgamento, assim como a estrutura básica da Justiça brasilei-
ra é questão para a Constituição dispor, o que ela faz a partir do art.
92 em diante. É de suma importância entender qual tribunal ou qual
juiz irá julgar determinada matéria – ou seja, a competência – já
que isto determinará o endereçamento. A petição deve ser endere-
çada, direcionada, a quem vai julgar, isto é, a quem é competente
para julgar a causa ou recurso.

A competência que está na CRFB/88 é do tipo absoluta, geran-


do nulidade absoluta qualquer julgamento em outro órgão que não
o indicado na Constituição, e sendo um tipo de competência indis-
ponível para as partes.

A partir do art. 92 é possível entender a estrutura básica do Po-


der Judiciário Brasileiro.
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1 NOÇÕES GERAIS DE PROCESSO E DA ESTRUTURA DE PEÇAS DA OAB

O candidato deve dominar a competência de cada um dos tri-


bunais e de cada uma das justiças especializadas. O foco maior,
contudo, é no STF, STJ, Justiça Federal e Justiça Estadual. Não que
não seja possível a exigência de peças nas demais justiças, mas por
uma questão de tradição dos gabaritos anteriores, combinado com
a lógica, tem-se a maior probabilidade nestes órgãos aí indicados.

Como forma de entender a competência, sugere-se iniciar um


raciocínio que inicia pelos tribunais superiores (STF e STJ), passa pe-
las justiças especializadas, depois pela Justiça Federal e finalmente
termina na Justiça Estadual.

O STF possui sua competência determinada no art. 102 da Cons-


tituição Federal. Este artigo 102 é composto pelo inciso I, o qual
contém as competências originárias (processos que iniciam no STF),
inciso II, que é a previsão de recurso ordinário e finalmente inciso
III, recurso extraordinário. Se a situação que está narrada na ques-
tão não se amolda a nenhum dos incisos do art. 102, então é o caso
de se analisar a competência do STJ.

A competência do STJ está no art. 105 da Constituição. Este arti-


go tem uma estrutura parecida com aquela do art. 102. Há também
um inciso I, o qual contém as competências originárias (processos
que iniciam no STJ), o inciso II, que é a previsão também de recurso
ordinário, assim como o inciso III, o qual traz o recurso especial. Se
o que está contido no enunciado não se amoldar ao 102 e ao 105,
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2
REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS

Os remédios constitucionais estão dispostos no art. 5º da Cons-


tituição Federal (CF) como forma de proteção e tutela dos direitos
fundamentais (exceto a ação civil pública, mas esta também é inter-
pretada nesse sentido).

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2.1 
HABEAS DATA

2.1.1 Fundamento legal
Previsão no art. 5º, LXXII, da Constituição Federal, com a seguin-
te redação:

Art. 5º, LXXII: conceder-se-á habeas-data:


a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à
pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de da-
dos de entidades governamentais ou de caráter público;
b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por
processo sigiloso, judicial ou administrativo.

Lei n. 9.507/97 – regula o writ e disciplina seu rito processual.

Art. 7° da Lei 9507/97: Conceder-se-á habeas data:


I – para assegurar o conhecimento de informações relativas à
pessoa do impetrante, constantes de registro ou banco de dados
de entidades governamentais ou de caráter público;
II – para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por
processo sigiloso, judicial ou administrativo;
III – para a anotação nos assentamentos do interessado, de con-
testação ou explicação sobre dado verdadeiro mas justificável e
que esteja sob pendência judicial ou amigável.

2.1.2 Conceito
O habeas data é uma novidade entre os writs e é uma tutela es-
pecífica dos direitos e garantias fundamentais que visa a assegurar
ao cidadão interessado a exibição de informações constantes nos
registros públicos ou privados, nos quais estejam incluídos seus da-
dos pessoais, para que tome conhecimento e, se for o caso, retifique
ou complemente eventuais erros.
É remédio constitucional, de natureza civil, submetido a rito su-
mário, que se destina a garantir, em favor da pessoa interessada, o
exercício de pretensão jurídica discernível em seu tríplice aspecto:
banco de dados de caráter público, recusa ou transcurso de prazo

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2 REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS

sem prestar à informação após requerido na via administrativa e


caráter personalíssimo da informação!
Ainda, o instrumento deve ser lido à luz dos demais princípios
constitucionais, como art. 5, X, XII, XXXIII, XXXIV da CF:
Destaque ao acesso à informação:
XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado
o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos infor-
mações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou
geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de respon-
sabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à
segurança da sociedade e do Estado;

 Destaque:
Se for órgão ou instituição privada que detenha banco de DADOS DE CARÁ-
TER PÚBLICO, estará sujeito a impetração de habeas data.

Art. 1º da Lei 9507/97 (VETADO)


Parágrafo único. Considera-se de caráter público todo registro ou
banco de dados contendo informações que sejam ou que possam
ser transmitidas a terceiros ou que não sejam de uso privativo
do órgão ou entidade produtora ou depositária das informações.

2.1.3 Cabimento
Na linha de especialização dos instrumentos de defesa de direi-
tos individuais, a Constituição de 1988 tratou o habeas data como
instituto destinado a assegurar o conhecimento de informações re-
lativas à pessoa do impetrante constantes de registros ou bancos de
dados de entidades governamentais ou de caráter público e para
permitir a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo de
modo sigiloso.
Art. 1º (VETADO) da Lei 9.507
Parágrafo único. Considera-se de caráter público todo registro ou
banco de dados contendo informações que sejam ou que possam
ser transmitidas a terceiros ou que não sejam de uso privativo
do órgão ou entidade produtora ou depositária das informações.

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Em busca de mais transparência nos três poderes (Executivo,


Legislativo e Judiciário), os brasileiros passaram a ter acesso a infor-
mações públicas de qualquer órgão público. A Lei de Acesso a Infor-
mações Públicas – LAI (Lei nº 12.527/2011), aprovada em novembro
de 2011, foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff no dia 16 de
maio de 2012, e passou a valer para todo o país. Contudo, nem todas
as solicitações de informações são liberadas dentro do prazo.

 Muito importante!
Para o fim de impetrar habeas data, é imprescindível que tenha havido o
requerimento administrativo e a negativa pela autoridade administrativa de
atendê-lo, devendo tal negativa ou omissão da autoridade administrativa vir
comprovada na petição inicial (art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 9.507/97). O
silêncio da autoridade no prazo de 10 dias é suficiente!
Aspecto importante do cabimento do Habeas Data diz respeito à exigên-
cia legal de que a ação somente poderá ser impetrada em Juízo diante da
prévia negativa da autoridade administrativa de fornecimento (ou de re-
tificação ou de anotação da contestação ou explicação) das informações
solicitadas. Trata-se de uma das exceções constitucionais ao princípio do
controle jurisdicional imediato (art. 5º, XXXV), configurando hipótese de ins-
tância administrativa de curso forçado (a outra hipótese de curso forçado
está prevista pelo art. 217, par. 1º da CF).

2.1.4 Espécies. Habeas data e acesso à informação. Habeas


data e direito de petição
Em busca de mais transparência nos três poderes (Executivo,
Legislativo e Judiciário), os brasileiros passaram a ter acesso a infor-
mações públicas de qualquer órgão público. A Lei de Acesso a Infor-
mações Públicas – LAI (Lei nº 12.527/2011), aprovada em novembro
de 2011, foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff no dia 16 de
maio de 2012, e passou a valer para todo o país. Contudo, nem todas
as solicitações de informações são liberadas dentro do prazo.
Essa garantia do Habeas Data não se confunde com o direito
de obter certidões (art. 5º, XXXIV, b, CF) ou informações de interesse
particular, coletivo ou geral (art. 5º, XXXIII). Havendo recusa no for-
necimento de certidões (para a defesa de direitos ou esclarecimento

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2 REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS

de situações de interesse pessoal, próprio ou de terceiros), ou infor-


mações de terceiros, o remédio apropriado é o mandado de segu-
rança, e não o habeas data. Se o pedido for para conhecimento de
informações relativas à pessoa do impetrante, como visto, o remé-
dio será o habeas data.
É importante que se lembre que o habeas data como remédio
constitucional destinado a assegurar o acesso à informação deve
também ser lido à luz da Lei de Acesso à Informação e suas possibi-
lidades de restrições. Daí toda a atenção quando se falar em sigilo
imprescindível à segurança do estado. Contudo, é oportuno lem-
brar que o sigilo é exceção, logo, se a informação da pessoa por si
só não tem como representar risco à segurança, não há justificativa
para não conceder o acesso.
Vide os artigos mais importantes da Lei de Acesso à Informação
– LAI nesse sentido:
Art. 21 da Lei 12.527/11: Não poderá ser negado acesso à infor-
mação necessária à tutela judicial ou administrativa de direitos
fundamentais.
Parágrafo único. As informações ou documentos que versem so-
bre condutas que impliquem violação dos direitos humanos pra-
ticada por agentes públicos ou a mando de autoridades públicas
não poderão ser objeto de restrição de acesso.
Art. 22 da Lei 12.527/11: O disposto nesta Lei não exclui as de-
mais hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hi-
póteses de segredo industrial decorrentes da exploração direta
de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou en-
tidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.

Classificação da Informação quanto ao Grau e Prazos de Sigilo:

Art. 23 da Lei 12527/11: São consideradas imprescindíveis à se-


gurança da sociedade ou do Estado e, portanto, passíveis de
classificação as informações cuja divulgação ou acesso irrestrito
possam:
I – pôr em risco a defesa e a soberania nacionais ou a integridade
do território nacional;

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II – prejudicar ou pôr em risco a condução de negociações ou as


relações internacionais do País, ou as que tenham sido forneci-
das em caráter sigiloso por outros Estados e organismos interna-
cionais;
III – pôr em risco a vida, a segurança ou a saúde da população;
IV – oferecer elevado risco à estabilidade financeira, econômica
ou monetária do País;
V – prejudicar ou causar risco a planos ou operações estratégicos
das Forças Armadas;
VI – prejudicar ou causar risco a projetos de pesquisa e desenvol-
vimento científico ou tecnológico, assim como a sistemas, bens,
instalações ou áreas de interesse estratégico nacional;
VII – pôr em risco a segurança de instituições ou de altas autori-
dades nacionais ou estrangeiras e seus familiares; ou
VIII – comprometer atividades de inteligência, bem como de in-
vestigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a
prevenção ou repressão de infrações.
Art. 24 da Lei 12527/11: A informação em poder dos órgãos e en-
tidades públicas, observado o seu teor e em razão de sua impres-
cindibilidade à segurança da sociedade ou do Estado, poderá ser
classificada como ultrassecreta, secreta ou reservada.
§ 1º Os prazos máximos de restrição de acesso à informação, con-
forme a classificação prevista no caput, vigoram a partir da data
de sua produção e são os seguintes:
I – ultrassecreta: 25 (vinte e cinco) anos;
II – secreta: 15 (quinze) anos; e
III – reservada: 5 (cinco) anos.

2.1.5 Titularidade: legitimidade ativa e passiva


O habeas data só é cabível se a informação for da pessoa do
impetrante.

• Legitimado ativo: impetrante. Brasileiro ou estrangeiro, resi-


dente ou não residente, pessoa física ou jurídica.
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2 REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS

• Legitimado passivo: impetrado ou autoridade coatora. Pes-


soa jurídica ou física, pública ou privada, detentora do banco
de dados de acesso público.

 LEGITIMIDADE ATIVA  LEGITIMIDADE PASSIVA

O HD poderá ser ajuizado por qualquer No polo passivo, podem figurar entida-
pessoa física, brasileira ou estrangeira, des governamentais, da Administração
bem como por pessoa jurídica, entes Pública Direta (União, Estados, DF e
despersonalizados (massa falida, he- Municípios) e Indireta (as autarquias, as
rança jacente, espólio, sociedade de Fundações instituídas e mantidas pelo
fato, condomínio). Poder Público, as Empresas Públicas e
Saliente-se, porém, que a ação é perso- as Sociedades de Economia Mista), bem
nalíssima, vale dizer, somente poderá como as instituições, entidades e pes-
ser impetrada pelo titular das informa- soas jurídicas privadas detentoras de
ções. banco de dados contendo informações
STF já se manifestou que estrangeiro que sejam ou possam ser transmitidas a
não residente também poderá adentrar terceiros ou que não sejam de uso pri-
com habeas data. vativo do órgão ou entidade produtora
ou depositária das informações (ex: as
entidades de proteção ao crédito, como
o SPC, o SERASA, entre outras).
Privada. O aspecto que determinará
o cabimento da ação será o fato de o
banco de dados ser de caráter público,
a exemplo do SPC.

2.1.6 Competência
Previsão de algumas autoridades pela CF/88:
STF – Art. 102, I, d, da CF
a) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referi-
das nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o habeas
data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câ-
mara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas
da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supre-
mo Tribunal Federal;
STJ – Art. 105, I, b, da CF

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2 REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS

2.1.10 Caso hipotético e modelo OAB

ƒ EXAME DE ORDEM UNIFICADO 2010.3


PEÇA PRÁTICO-PROFISSIONAL
ENUNCIADO
Tício, brasileiro, casado, engenheiro, na década de setenta, participou de
movimentos políticos que faziam oposição ao Governo então instituído.
Por força de tais atividades, foi vigiado pelos agentes estatais e, em di-
versas ocasiões, preso para averiguações. Seus movimentos foram moni-
torados pelos órgãos de inteligência vinculados aos órgãos de Segurança
do Estado, organizados por agentes federais. Após longos anos, no ano de
2010, Tício requereu acesso à sua ficha de informações pessoais, tendo
o seu pedido indeferido, em todas as instâncias administrativas. Esse foi
o último ato praticado pelo Ministro de Estado da Defesa, que lastreou
seu ato decisório, na necessidade de preservação do sigilo das atividades
do Estado, uma vez que os arquivos públicos do período desejado estão
indisponíveis para todos os cidadãos. Tício, inconformado, procura acon-
selhamentos com seu sobrinho Caio, advogado, que propõe apresentar
ação judicial para acessar os dados do seu tio.
Na qualidade de advogado contratado por Tício, redija a peça cabível ao
tema, observando: a) competência do Juízo; b) legitimidade ativa e pas-
siva; c) fundamentos de mérito constitucionais e legais vinculados; d) os
requisitos formais da peça inaugural.
ğ Segue modelo de estruturação da peça de Habeas Data cobrada no
EXAME DE ORDEM UNIFICADO 2010.3:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR MINISTRO PRESIDENTE DO SUPE-


RIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
TÍCIO, brasileiro, casado, engenheiro, portador do RG n°..., inscrito no CPF
sob o n° ..., endereço eletrônico..., residente e domiciliado Rua..., n°..., Bairro...,
DO EXAME DA OAB

Cidade..., Estado..., CEP..., vem, por seu procurador signatário, inscrito na OAB
n°..., procuração em anexo, conforme previsão no artigo 287 do Código de
Processo Civil, endereço eletrônico..., com escritório profissional na Rua..., n°...,
Bairro..., Cidade..., Estado..., CEP..., local onde recebe suas intimações, impetrar
HABEAS DATA, com base no artigo 5º, inciso LXXII, alínea “a”, da Constituição
Federal, e artigo 7°, inciso I, da Lei nº 9.507/97, contra MINISTRO DE ESTADO
DA DEFESA, nacionalidade..., estado civil..., profissão..., portador do RG n°...,
EXERCÍCIOS

inscrito no CPF sob o n° ..., endereço eletrônico..., residente e domiciliado na


Rua..., n°..., Bairro..., Cidade..., Estado..., CEP..., pelos fatos e fundamentos a se-
guir expostos:

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1) DOS FATOS
Tício solicitou informações de cunho pessoal junto ao Ministério da Defe-
sa, todavia teve seu pedido indeferido, sob a alegação preservação do sigilo
das atividades do Estado, estando os arquivos públicos inacessíveis para to-
dos os cidadãos.

2) DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS


2.1) Da Competência
O Superior Tribunal de Justiça é competente para processar e julgar ha-
beas data contra ato de autoridade federal, conforme artigo 105, inciso I,
alínea “b”, da Constituição Federal, e artigo 20, inciso I, alínea “b”, da Lei nº
9.507/97.

2.2) Da Legitimidade
O impetrante Tício é legitimado ativo para propor Ação de Habeas Data,
pois teve seu direito personalíssimo ao acesso à informação negado, confor-
me artigo 7º, inciso I, da Lei nº 9.507/97.
Ministro da Defesa do Estado é legitimado passivo, em razão de ter sido
ele a autoridade que negou acesso as informações solicitadas administrativa-
mente pelo impetrante, conforme artigo 105, inciso I, alínea “b”, da Constitui-
ção Federal, e artigo 20, inciso I, alínea “b”, da Lei nº 9.507/97.

2.3) Do Cabimento
Cabe Habeas Data para assegurar informações relativas à pessoa do im-
petrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governa-
mentais ou de caráter público, conforme artigo 5º, inciso LXXII, alínea “a”, da
Constituição Federal e artigo 7°, inciso I, da Lei nº 9.507/97.

2.4) DIREITO
2.4.1) Da violação ao direito fundamental à informação
O instrumento deve ser lido à luz dos princípios constitucionais de invio-
labilidade da intimidade vida privada, honra e imagem, conforme artigo 5°,
inciso X, da Constituição Federal, bem como de acordo com a inviolabilidade
DO EXAME DA OAB

do sigilo da correspondência e comunicações, consoante artigo 5°, inciso XII,


da Constituição Federal.

2.4.2) Do acesso à informação


A Constituição Federal garante ao cidadão o direito de receber dos ór-
gãos públicos informações de interesse pessoal, que deverão ser serão pres-
EXERCÍCIOS

tadas no prazo da lei, sob pena de responsabilização, salvo as de cunho sigi-


loso sejam imprescindíveis à segurança da sociedade e do Estado, conforme
artigo 5°, inciso XXXIII, da Constituição Federal.

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2 REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS

O artigo 5°, inciso XXXIV, da Constituição Federal, em suas alíneas “a” e


“b”, também assegura ao cidadão, independentemente do pagamento de ta-
xas, o direito de peticionar perante os Poderes Públicos em defesa de direitos,
contra ilegalidade e abuso de poder, bem como da obtenção de certidões em
repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações
de interesse pessoal.
A Lei nº 12.527/11, que trata sobre o Acesso à Informação, em seu artigo
21, também aduz que não poderá ser negado acesso à informação na via
judicial ou administrativa de direitos fundamentais.
Autoridade X informou o impetrante que os dados solicitados estavam
inacessíveis por tempo indeterminado. Todavia, a Lei nº 12.527/11 prevê, em
seu artigo 24, parágrafo 1°, o prazo máximo de 25 (vinte e cinco) anos para
restrição ao acesso à informação, sobre assuntos que representem risco ao
Estado, o que não é o caso.
Não há que se falar em sigilo imprescindível à segurança do estado, pois
sigilo é exceção, logo, se a informação é da pessoa, por si só não tem como re-
presentar risco à segurança, não há justificativa para não conceder o acesso.
É importante salientar que o habeas data, como remédio constitucional
destinado a assegurar o acesso à informação, deve também ser lido à luz
da Lei de Acesso à Informação e suas possibilidades de restrições. Daí não
há que se falar em sigilo imprescindível à segurança do estado, pois sigilo é
exceção, logo, se a informação da pessoa por si só não tem como representar
risco à segurança, não há justificativa para não conceder o acesso.
Ademais, o caso concreto não está previsto no rol de restrições do artigo
23, da Lei nº 12.527/11.

2.4.3) Da Comprovação do pedido na via administrativa


O impetrante fez pedido de informações administrativamente junto ao
Ministério da Defesa do Estado, mas teve seu pedido negado, conforme có-
pias anexas, atendendo, assim, ao requisito do artigo 8°, parágrafo único, da
Lei nº 9.507/97.

3) DOS PEDIDOS
a) O recebimento da inicial, em duas vias, nos termos do artigo 8º, da Lei nº
DO EXAME DA OAB

9.507/97;
b) A juntada da documentação essencial que comprove o indeferimento do
pedido na via administrativa, conforme artigo 8º, parágrafo único, da Lei
nº 9.507/97;
c) A notificação da Autoridade, entregando-lhe a segunda via da inicial,
conforme artigo 9º, da Lei nº 9.507/97, a fim de que, no prazo de 10 (dez)
EXERCÍCIOS

dias, preste as informações que julgar necessárias;

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d) Oitiva do Ministério Público conforme artigo 12, da Lei nº 9.507/97, no


prazo de 5 (cinco) dias;
e) O julgamento de mérito da ordem, com a procedência do Habeas Data
para determinar à autoridade coatora que apresente ao Impetrante as
informações requeridas administrativamente e negadas, conforme restou
demonstrado com a juntada de documento comprovatório, constantes de
registros ou bancos de dados.

Valor da causa R$..., para efeitos meramente procedimentais, já que trata-


-se de uma ação gratuita, nos termos dos artigos 291 e 319, inciso V, do Códi-
go de Processo Civil, combinado com artigo 5º, inciso LXXVII, da Constituição
Federal.
Local..., data...
Advogado...OAB...

2.1.11 Teste seu conhecimento

ƒ EXAME DE ORDEM XX PORTO VELHO/RO


QUESTÃO 2
Joaquim Silva, português equiparado em direitos civis e políticos, preo-
cupado com a probidade na República, impetrou habeas data contra ato
do Presidente da Assembleia Legislativa de seu Estado, pois este não res-
pondera a pedido de expedição de certidão que comprovaria a suposta
participação de deputados estaduais em fraudes a licitações de obras pú-
blicas. Aduziu que o Presidente da Casa Legislativa já havia se negado a
expedir a certidão e que ela seria fundamental para as investigações que
vinham sendo realizadas pelo Ministério Público.
Em resposta ao writ, o Presidente da Assembleia Legislativa requer que a
ação não seja conhecida, sob a alegação de que todo e qualquer remédio
DO EXAME DA OAB

constitucional é garantia concedida pela Constituição da República Fede-


rativa do Brasil apenas a brasileiros natos.
Considerando a situação hipotética apresentada, responda, de forma fun-
damentada, aos itens a seguir.
a) Ser cidadão brasileiro nato é condição para a impetração do habeas
EXERCÍCIOS

data? (Valor: 0,60)


b) É cabível a impetração do habeas data na hipótese? (Valor: 0,65)
68
3
AÇÕES DO CONTROLE CONCENTRADO
DE CONSTITUCIONALIDADE
3.1 CoNCEiToS imPorTANTES À mATÉriA Do CoNTro-
LE DE CoNSTiTuCioNALiDADE
Algumas formas de diferenciar violações à Constituição, pro-
posta por André Ramos Tavares, no Curso de direito constitucional.

a) a violação das normas constitucionais para fins de recurso


extraordinário: a Constituição, nesse caso, refere-se a “con-
trariar dispositivo desta Constituição” (art. 102, III, a) e não à
“inconstitucionalidade”;
b) a violação da Constituição para fins de cabimento da ação di-
reta de intervenção: o Texto Magno traz, por ocasião do tra-
tamento da representação interventiva, a noção de “não ob-
servância” dos princípios constitucionais sensíveis, no sentido
inverso da expressão do art. 34.: “A União não intervirá nos
Estados nem no Distrito Federal, exceto para: [...] VII – assegu-
rar a observância dos seguintes princípios constitucionais[...]”.
c) a violação da Constituição para fins de cabimento das ações
do controle abstrato: a Constituição brasileira refere-se à
inconstitucionalidade1 apenas quando trata da ação dire-

1. Em nosso ordenamento jurídico, não se admite a figura da constitucionalidade su-


perveniente. Mais relevante do que a atualidade do parâmetro de controle é a

143

DIREITO CONSTITUCIONAL • TEORIA E PRÁTICA Caroline Müller Bitencourt e Janriê Rodrigues Reck

ta genérica, da ação direta por omissão e da ação declarató-


ria. É por isso que a inconstitucionalidade tem sido associada
aos atos normativos ou omissões, como os únicos comporta-
mentos capazes de desencadeá-la.
d) a violação da Constituição para fins de cabimento de ADPF:
a Constituição (combinada com a Lei de Regência) alude a
descumprimento de preceito fundamental por ato do Poder
Público.

Conceitualmente: Trata-se da verificação de constitucionalida-


de de todo ato estatal, normativo ou concreto e, também, dos atos
jurídicos emanados da sociedade, em conformidade com a Consti-
tuição vigente. Logo, é uma tarefa atribuída ao órgão controlador,
no sentido de impedir ou corrigir quaisquer máculas produzida con-
tra aquelas normas que são consideradas as principais do ordena-
mento jurídico.
Logo, está presumida a ideia de:

→ Sistema piramidal;
→ Aspectos formal e material da Constituição;
→ Filtro de constitucionalidade.

constatação de que a inconstitucionalidade persiste e é atual, ainda que se refira a


dispositivos da CF que não se encontram mais em vigor. Caso contrário, ficaria sensi-
velmente enfraquecida a própria regra que proíbe a convalidação. A jurisdição cons-
titucional brasileira não deve deixar às instâncias ordinárias a solução de problemas
que podem, de maneira mais eficiente, eficaz e segura, ser resolvidos em sede de
controle concentrado de normas. A Lei estadual 12.398/1998, que criou a contribuição
dos inativos no Estado do Paraná, por ser inconstitucional ao tempo de sua edição,
não poderia ser convalidada pela EC 41/2003. E, se a norma não foi convalidada, isso
significa que a sua inconstitucionalidade persiste e é atual, ainda que se refira a dis-
positivos da CF que não se encontram mais em vigor, alterados que foram pela EC
41/2003. Superada a preliminar de prejudicialidade da ação, fixando o entendimento
de, analisada a situação concreta, não se assentar o prejuízo das ações em curso,
para evitar situações em que uma lei que nasceu claramente inconstitucional volte a
produzir, em tese, seus efeitos, uma vez revogada as medidas cautelares concedidas
já há dez anos. [ADI 2.158 e ADI 2.189, rel. min. Dias Toffoli, j. 15-9-2010, P, DJE de 16-
12-2010.]

144
3 AÇÕES DO CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE

“O reconhecimento da Supremacia Constituição e de sua força


vinculante em relação aos Poderes Públicos torna inevitável a
discussão sobre formas e modos de defesa da Constituição e so-
bre a necessidade de controle de constitucionalidade dos atos
do Poder Público, especialmente das leis e atos normativos.”
(MENDES, 2011)

Rigidez porque o processo de alteração constitucional é mais


complexo que a alteração das demais espécies normativas, ou seja,
somente se altera mediante as emendas constitucionais, que são a
forma mais complexa de votação constitucional.

“Pela sua própria localização, na base da pirâmide normativa, é a


Constituição a instância de transformação da normatividade, pu-
ramente hipotética, da norma fundamental, em normatividade
concreta, dos preceitos de direito positivo – comandos postos em
vigor – cuja forma e conteúdo, por isso mesmo, subordinam-se
aos ditames constitucionais. Daí se falar em supremacia constitu-
cional formal e material, no sentido de que qualquer ato jurídico
– seja ele normativo ou de efeito concreto –, para ingressar ou
permanecer, validamente, no ordenamento, há que se mostrar
conforme os preceitos da Constituição”. (MENDES)

( Você sabe o que é bloco de constitucionalidade?


Bloco de constitucionalidade é o conjunto de normas constitu-
cionais, tratados internacionais e princípios que fundamentam as
normas constitucionais, além da própria interpretação do STF sobre
o conteúdo da Constituição, que servem de parâmetro para o con-
trole de constitucionalidade de todas as normas do ordenamento.

145

DIREITO CONSTITUCIONAL • TEORIA E PRÁTICA Caroline Müller Bitencourt e Janriê Rodrigues Reck

Ou seja, com a adoção do bloco, permite-se ao intérprete ampliar


o conceito de normas constitucionais para além daquelas previstas
expressamente na Constituição, não se restringindo mais àquelas
prescritas no ordenamento jurídico.

( Quanto ao momento

O controle pode-se efetivar preventiva ou repressivamente.


Via de regra, o controle judicial de constitucionalidade ocorre de
maneira repressiva, caso em que o ato normativo confrontado com
Texto Maior já se encontra formalmente perfectibilizado, isto é, já
ingressou no ordenamento jurídico e, por isso, irradia seus efeitos às
relações intersubjetivas públicas e privadas havidas no mundo dos
fatos, de modo que se trata de efetivo controle de constitucionali-
dade de leis ou emendas à Constituição. Por outro lado, o controle
preventivo de constitucionalidade realiza-se em momento anterior
à completa formação do ato normativo controlado, ou seja, antes
de sua entrada em vigor, ainda em âmbito de deliberação. Não é
por outra razão que se fala em controle de constitucionalidade de
projetos de lei e propostas de emendas à Constituição. Desta for-
ma, verifica-se que a índole repressiva ou preventiva do controle de
constitucionalidade funda-se no caráter do próprio ato controlado.
Enquanto que o primeiro visa a expurgar a ordem jurídica das nor-
mas inconstitucionais, subversoras do sistema hierárquico-norma-
tivo, o segundo tenciona proteger ou prevenir a ordem jurídica de
proposições normativas inconstitucionais, as quais poderão adqui-
rir efetiva vigência e ingressarem no sistema jurídico, possibilitando
a subsunção.
146
3 AÇÕES DO CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE

Dito isso, pode-se observar que jaz no direito brasileiro a tese


da presunção de constitucionalidade, haja vista existir um controle
preventivo, fazendo com que as normas do direito brasileiro gozem
dessa presunção iuris tantum. Por esse motivo, o controle repres-
sivo terá, na realidade, a função de tornar uma presunção que até
então é relativa em uma presunção absoluta. Eis a verdadeira com-
binação do sistema de controle de constitucionalidade.
Controle Preventivo: A função do controle preventivo é impedir
que uma norma inconstitucional ingresse no ordenamento jurídi-
co, portanto, trata-se do processo de elaboração legislativa. Assim,
esse controle acontece em dois momentos distintos e fora da via
judiciária:

1) Comissão de Constituição e Justiça – cuja função é analisar


os aspectos constitucionais do projeto de lei ou de emenda
constitucional no seu aspecto formal e material. Mas o que é
uma Comissão de Constituição e Justiça? Entre as comissões
existentes em ambas as Casas Legislativas do Congresso Na-
cional, destacam-se, na Câmara dos Deputados, a Comissão
de Constituição, Justiça e Redação – Regimento Interno, art.
32, inciso III –, e, no Senado Federal, a Comissão de Consti-
tuição, Justiça e Cidadania – Regimento Interno, art. 101 –, as
quais têm a função precípua de verificar a (in)constituciona-
lidade de proposições legislativas postas a deliberação, para
que, só então, possam (ou não) ser submetidas à votação
parlamentar. Ressalva-se que às Comissões de Constituição
e Justiça não compete adentrar no mérito da proposta discu-
tida, ou seja, se é oportuna ou conveniente, porquanto será
enfrentado pelas comissões temáticas e, também, em Plená-
rio. É formada por integrantes do próprio poder legislativo
(nos âmbitos federal, estadual e municipal), devendo sempre
privilegiar a formação plural em sua composição. (BULOS e
TAVARES).
2) Veto do presidente da república – poderá vetar projeto por
entendê-lo inconstitucional, mas, em relação à emenda, não
há participação do executivo. Quanto ao veto, este poderá
147

DIREITO CONSTITUCIONAL • TEORIA E PRÁTICA Caroline Müller Bitencourt e Janriê Rodrigues Reck

ser por questões de conveniência política ou por razões ju-


rídicas, sendo que, nesse caso nos interessa a veto em que
as razões jurídicas versam sobre a possível inconstituciona-
lidade da norma. O veto, contudo, seja ele jurídico ou políti-
co, não é absoluto, de maneira que retornará ao Congresso
Nacional para apreciação no prazo de trinta dias, sendo que
poderá ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos De-
putados e Senadores, em escrutínio secreto (inteligência do
art. 66, § 4º, da Constituição). Rejeitado o veto presidencial,
prevalecerá a manifestação do Poder Legislativo, seguindo
o projeto de lei à promulgação (art. 66, § 5º, da Constituição),
ato a partir do qual tornar-se-á lei.

( É possível haver controle de constitucionalidade pela via judi-


cial ainda durante o processo legislativo?
Quando for controle do processo formal legislativo, ou seja,
verificado que não se respeitou o trâmite determinado na Consti-
tuição para edição normativa. Ex: uma lei complementar em emi-
nência de ser votada por maioria simples (o que corresponde a uma
lei ordinária ou uma emenda à Constituição que não é votada em
duas casas).
A outra possibilidade reconhecida na doutrina é do controle
jurisdicional de constitucionalidade do processo legislativo de pro-
postas de emendas constitucionais tendentes a abolir as cláusulas
de garantia da constituição (artigo 60, § 4º, da Constituição Federal).
Qual o instrumento?
Pode-se provocar o controle de constitucionalidade durante o
processo de edição normativa através de Mandado de Segurança
impetrado por parlamentar.

Decisão do STF: O Mandado de Segurança nº 20.257-DF, impetra-


do pelos então senadores da República Itamar Augusto Cautiero
Franco e Antônio Mendes Canale, dirigia-se contra ato da Mesa do
Congresso Nacional que admitiu a deliberação de propostas de
emendas constitucionais que, segundo alegado na impetração,

148
3 AÇÕES DO CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE

seriam tendentes à abolição da República, contrariando o dis-


posto no art. 47, § 1º, da então vigente Constituição Federal de
1967/69, in verbis: "não será objeto de deliberação a proposta de
emenda tendente a abolir a Federação e a República". Tenciona-
vam os ilustres parlamentares, através da impetração do man-
damus, fosse impedida a tramitação das propostas de emendas
constitucionais nº 51 e 52, ambas de 1980, bem como da emenda
nº 03 às referidas propostas. Tais proposições legislativas, por vi-
sarem à prorrogação dos mandatos de prefeitos, vice-prefeitos e
vereadores de dois para quatro anos, caso aprovadas, segundo
entendiam os impetrantes, ocasionariam a abolição da Repú-
blica, razão por que inconstitucional sua deliberação legislativa
(STF, MS 20.257-DF, Rel. Min. Décio Miranda, Rel. p/ Acórdão Min.
Moreira Alves, j. 08.10.1980). (TRINDADE, 2014)

( Controle Repressivo
Este será exercido por via jurisdicional ante o papel de guar-
dião da Constituição. Essa espécie de controle se dará pela via difu-
sa ou pela via do controle concentrado.

Poderá o controle repressivo ser exercido pela via do legislati-


vo? Ou seja, depois que a norma já está surtindo efeitos? Dois casos:

Art. 49, V – que trata da competência do Congresso Nacional sus-


tar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do po-
der regulamentar ou dos limites de delegação legislativa.

149

DIREITO CONSTITUCIONAL • TEORIA E PRÁTICA Caroline Müller Bitencourt e Janriê Rodrigues Reck

Medida provisória (art. 62) que poderá ser editada com força de
lei, em caso de relevância, mas deve ser submetida ao Congresso
Nacional.
Sendo assim, o controle político e repressivo de constituciona-
lidade no direito brasileiro ocorre nas excepcionais hipóteses do
artigo 49, inciso V, e do artigo 62, ambos da Constituição Federal de
1988 (BULOS, 2012, p. 200), quando o Poder Legislativo realiza juízo
de conformidade constitucional de atos normativos já consolidados
e vigentes.
Você sabe qual a diferença entre atos concretos e atos norma-
tivos ??

Exemplos e atos NORMATIVOS: Art. 59 da CF, o processo legis-


lativo compreende a elaboração de:

I – emendas à Constituição;
II – leis complementares;
III – leis ordinárias;
IV – leis delegadas;
V – medidas provisórias;
VI – decretos legislativos;
VII – resoluções.

150
3 AÇÕES DO CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE

Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração,


redação, alteração e consolidação das leis.

( Espécies de vício de inconstitucionalidade


1) Formais: (art. 5º, II e arts. 59 a 69 da CF) A inconstitucionalida-
de formal pode dar-se: (a) pelo descumprimento de norma consti-
tucional sobre o processo legislativo próprio e adequado à espécie;
(b) pela desobediência a circunstância impeditiva de atuação do
órgão legislativo, como no caso de emenda constitucional aprova-
da durante o estado de sítio (CF, art. 60, § 1º). Por sua vez, a incons-
titucionalidade formal pelo descumprimento de norma constitucio-
nal sobre o processo legislativo próprio e adequado ocorre em três
situações: (a) quando são desobedecidas normas constitucionais
relativas à competência para iniciar o processo legislativo; (B) pela
contrariedade a normas constitucionais concernentes à competên-
cia para elaborar o ato normativo, hipótese também chamada por
parte da doutrina como inconstitucionalidade orgânica; ou (C) pelo
desacato a normas constitucionais referentes às formalidades ou à
tramitação do processo legislativo no órgão competente. (ROCHA,
2003).
Podem ser:

• Subjetivos: relacionam-se com a iniciativa do processo le-


gislativo, ou seja, com a conduta dos seus agentes constitu-
cionalmente responsáveis pela propositura. Art. 61, parag.
1º, II, c)
• Objetivos: relacionados com as demais fases do processo le-
gislativo, que será determinado pela Constituição para cada
espécie de ato normativo.
2) Materiais: voltados à ação do legislador, bem como rela-
cionados aos seus valores, que são denominados aspectos
materiais, ou seja, os interesses e direitos eleitos pela socie-
dade, bem como os aspectos relativos à distribuição de po-
deres e estrutura do Estado Democrático de Direito.

151

DIREITO CONSTITUCIONAL • TEORIA E PRÁTICA Caroline Müller Bitencourt e Janriê Rodrigues Reck

Pode ser decorrente de vício de constitucionalidade expresso.


Outro seria o excesso de poder legislativo, violador do princípio
constitucional implícito da proporcionalidade /razoabilidade.
Assim, lei materialmente inconstitucional é a que possui con-
teúdo incompatível com o sistema constitucional utilizado como
respectivo parâmetro de validade.

( Formas de inconstitucionalidades

• Ação/Comissão: edição de um ato estatal que não se coadu-


na com a Carta Magna.
• Omissão: ocorre quando o agente responsável pela integra-
ção concretizadora dos interesses, valores e direitos inscri-
tos nas normas constitucionais mantém-se inerte. Atentar
que a omissão pode ser legislativa ou administrativa.

Duas formas de atacar as omissões:

152
3 AÇÕES DO CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE

( Inconstitucionalidade por omissão e constituição dirigente


“A Constituição brasileira se integra ao modelo do dirigismo
constitucional, cujas origens remontam ao constitucionalismo
social, que promoveu a integração dos direitos sociais aos textos
constitucionais e obrigou explicitamente uma constituição eco-
nômica determinante da intervenção do Estado sobre a ordem
econômica, fundando-se no princípio da dignidade da pessoa hu-
mana, da isonomia material e da solidariedade”. (DANTAS, 2014).

O dirigismo estatal refere-se à Constituição como uma Lei


Maior, que obriga e vincula todos os poderes à sua concretização,
impondo-se um dever/agir estatal, do contrário, os direitos funda-
mentais restariam letras mortas na Constituição de 1988.

“Uma lei fundamental não reduzida a um simples instrumento


de governo, ou seja, um texto constitucional limitado à indivi-
dualização dos órgãos e à definição de competências e proce-
dimentos da ação dos poderes públicos. A ideia de “programa”
associava-se ao caráter dirigente da Constituição. A Constituição
comandaria a ação do Estado e imporia aos órgãos competentes
a realização das metas programáticas nela estabelecidas”. (J.J
CANOTILHO, 2003)

Quanto à declaração de inconstitucionalidade, esta pode ser, O


QUE PODEMOS TER ENQUANTO DECISÃO??

• Total: declaração de inconstitucionalidade de todo o diplo-


ma legal questionado.
• Parcial: nesta hipótese em que somente os dispositivos in-
constitucionais serão declarados nulos e não a totalidade
da lei. Observação: No entanto, caso as normas subsisten-
tes não possam existir de forma autônoma, ou caso elas não
correspondam à vontade do legislador, não será possível a
manutenção dessa lei no ordenamento.

Declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto:


Técnica realizada através da Interpretação conforme a Consti-
tuição ou da nulidade parcial sem redução de texto (ambas téc-
nicas de hermenêutica). O Tribunal poderá, portanto, considerar

153

DIREITO CONSTITUCIONAL • TEORIA E PRÁTICA Caroline Müller Bitencourt e Janriê Rodrigues Reck

inconstitucional uma hipótese de aplicação da lei, sem que haja


alteração alguma no texto normativo. Na Interpretação conforme a
constituição, por sua vez, o juiz ou Tribunal, no caso de haver duas
interpretações possíveis de uma lei, deverá optar por aquela que se
mostre compatível com a constituição. Portanto, o Tribunal decla-
rará a legitimidade do ato questionado desde que interpretado em
conformidade com o texto constitucional. Interpretação conforme
a Constituição:

“Destina-se ela à preservação da validade de determinadas nor-


mas, suspeitas de inconstitucionalidades, assim como à atribui-
ção de sentido às normas infraconstitucionais. Como se depreen-
de da assertiva precedente, o princípio abriga, simultaneamente,
uma técnica de interpretação e um mecanismo de controle de
constitucionalidade”. (BARROSO, 2019).

Também poderá ocorrer outra técnica que chamamos de nuli-


dade parcial sem redução de texto:

“A nulidade parcial sem redução de texto seria uma “exclusão


expressa de algum sentido eventualmente atribuível a determi-
nada palavra ou expressão contida na norma cuja constituciona-
lidade ou compatibilidade com o texto da norma fundamental
encontra-se em apreço pela Corte”. (LEAL, 2014)

Quando há uma declaração de inconstitucionalidade ou o re-


conhecimento de uma inconstitucionalidade tanto em abstrato
quanto em concreto, quais os possíveis efeitos?

Essa previsão está no art. 27 da Lei 9.868/99 e no art. 11 da Lei


9.882/99, mas o STF entendeu que esses efeitos podem também ser
aplicados ao controle difuso de constitucionalidade.

Chamado de possibilidade de modulação temporal de efeitos


– aspecto temporal –, o artigo 27 da Lei de nº 9.868/99 valerá tanto
para o controle difuso quanto concentrado.
O Supremo Tribunal Federal terá a opção de declarar a incons-
titucionalidade apenas a partir do trânsito em julgado da decisão
(declaração de Inconstitucionalidade ex nunc).

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