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social1
No texto O self , desenvolvido por George Herbet Mead, é possível compreender pontos
básicos a respeito do processo de formação da subjetividade. No mesmo caminho, por
meio da leitura do capítulo: Sobre múltiplas realidades de Alfred Schütz, nota-se uma
compreensão sobre a relação entre individuo e sociedade, ou seja, esse autor lança as
bases para compreensão da ação humana em coexistência à vida social. Logo, esta
resenha tem por intuito notar como a sociabilidade é pressuposto para o
desenvolvimento da subjetividade. Dessa forma, os autores defendem que a existência
do indivíduo é dependente da vida social. Portanto, como seres sociais os sujeitos são
construídos na medida em que interagem com seus semelhantes.
Nesse sentido, é possível indagar sobre a gênese desse processo por meio de uma série
de estímulos que os indivíduos são submetidos. Como por exemplo, no
desenvolvimento da consciência de si, ou nas brincadeiras durante a infância, por meio
da racionalidade e, sobretudo nos jogos da interação social. Como ele afirma:
“Racionalidade significa que o mesmo tipo de resposta que eliciamos nos outros deve
ser eliciado em nós, e que essa resposta, por sua vez, deve influir e determinar o que
iremos fazer e dizer” (MEAD, 2010, p.166). Assim, essa afirmação coaduna com a
percepção de que o self se constitui por um duplo, à medida que afeta um eu, alcança o
outro.
1
Resenha desenvolvida para a disciplina Teoria Social Clássica do Programa de Pós-Graduação em
Ciências Sociais.
2
Mestranda em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia.
O self pode ser objetificado na linguagem, na manifestação ritual, no jogo, na
brincadeira. Portanto viver em sociedade é colocado por meio das relações, por hábitos
gerais. E essa série de comportamentos são estruturados por convenções sociais, há uma
atitude que é convencional e por isso esperada, outras condenadas. Mead chega a
colocar a existência de um “outro” generalizado como responsável por tornar esses
comportamentos como padrões. Por isso afirma: “o self alcança seu pleno
desenvolvimento ao compor as atitudes individuais dos outros em atitudes grupais ou
sociais organizadas, tornando-se assim um reflexo individual do padrão sistemático
geral do comportamento social” (MEAD, 2010, p. 176). Assim, é importante notar que
para esse pensador a mente e processo cognitivo se desenvolve por meio da interação
social.
Isso é algo que se repete em Schütz, ao debater sobre as múltiplas realidades, ele
demonstra a potencialidade do mundo prático para condicionar os indivíduos. Como
compreender o mundo social, suas dinâmicas e contingências? Seria a temática
desenvolvida por ele. E pela leitura percebe-se que isso se deve a ordem social. Logo,
seria necessário pensar que na complexidade do texto ele demonstra como a
subjetividade é modelada por meio da objetividade do mundo. Nesse sentido apela para
o caráter prático do mundo social, há uma retomada de temas filosóficos desenvolvidos
pela fenomenologia, por exemplo, nas temáticas sartrianas e de Heidegger sobre o
tempo e espaço. Isso porque, no texto, Shcütz indaga sobre como é possível a
construção do mundo prático, ou seja, em como a realidade se constitui, ou melhor,
como as várias possibilidades do real emergem.
Há nas afirmações de Schüstz uma busca por entender a complexidade deste fenômeno,
já que a realidade não se opera apenas pelo seu caráter objetivante, ou único, mas
múltiplo. Pois, na verdade essa objetividade seria construída por meio das relações dos
indivíduos com o mundo prático, portanto teria também um aspecto subjetivo. Ou como
ele postula tem uma dinâmica intersubjetiva. É por isso se coloca: “o mundo é, desde o
início, não o mundo privado do indivíduo isolado, mas um mundo intersubjetivo,
comum a todos nós, no qual não temos um interesse teórico, mas eminentemente
prático” (SCHÜTZ, 2019, p.14). Assim, afirma o caráter pragmático do mundo: “pode-
se dizer corretamente que um motivo pragmático rege a nossa atitude natural em relação
ao mundo da vida cotidiana. O mundo, nesse sentido, é algo que temos que modificar
por nossas ações ou que modifica nossas ações” (SCHÜTZ, 2019, p.15).
Nesse sentido, é importante colocar que o autor prioriza o aspecto subjetivo por meio da
experiência:
Nosso problema, entretanto, não é o que ocorre ao homem como uma unidade
psicofisiológica ou a sua resposta a ele, mas a atitude que ele adota em relação a essas
ocorrências e o seu direcionamento a partir de suas chamadas respostas, - resumidamente,
o significado subjetivo que o homem confere a certas experiências de sua própria vida
espontânea. O que parece ao observador ser objetivamente o mesmo comportamento pode
ter, para o sujeito que o comporta, significados muito diferentes ou nenhum significado.
O significado, como foi mostrado em outros lugares, não é uma qualidade inerente a
certas experiências que emergem em nosso fluxo de consciência, mas o resultado de uma
interpretação de uma experiência passada vista a partir do presente; agora com uma
atitude reflexiva. Enquanto eu viver em meus atos, direcionados aos objetos desses atos,
os atos não terão nenhum significado. Elas se tornam significativas se as apreendo como
experiências bem circunscritas do passado e, portanto, em retrospecção. Apenas as
experiências que podem ser lembradas para além de sua atualidade e que podem ser
questionadas sobre a sua constituição, portanto, são subjetivamente significativas.
(SCHÜSTZ, 2019, p. 15).
Dessa maneira, os dois autores, Mead e Schüstz, buscam na investigação sobre o self
indagar sobre a gênese das interações, melhor dizendo em como esse self se objetifica.
Schüstz chega a mencionar o Mead e coloca:
Nós nos restringimos a apontar para a distinção que Mead faz entre a totalidade do self
atuante, que ele chama de "Eu", e os selfes parciais dos atos performados, os executores
de papéis, que ele chama de "Mim". A tese apresentada neste artigo converge com a
análise de Mead. E há, além disso, concordância com a afirmação de Mead de que o “Eu”
adquire experiência apenas depois de ter realizado o ato e, assim, aparecer
experiencialmente como uma parte do Mim, isto é, o Mim que aparece, em nossa
experiência, na memória (SCHÜSTZ, 2019, p.20).
Em face disso, descreve outras perspectivas como o mundo dos sonhos, ou o científico
algo que parece ser colocado por meio de uma noção de mundo teórico, que tem a
imaginação como parte constituinte, de acordo com ele essa seria a multiplicidade do
mundo, com dinâmicas que não se restringem ao mundo prático. Mas postula esse
último como agente e objetivador de relações, ou melhor, por ser intersubjetivo. Por
fim, na reflexão que emerge com a aproximação desses dois autores é possível entrever
como a constituição do self se dá por essa dimensão intersubjetiva, em que os sujeitos
são convidados a ação ao mesmo tempo em que suas expressões são condicionadas pelo
ambiente que os constituem. Não existiria um “eu” sem um “mim”, do mesmo modo
para essa relação do “eu” existir é necessário interagir com um “outro”.
Referências
MEAD, George Herbert. O self. Em: MORRIS, Charles W. (org.). Mente, Self e
Sociedade. 1a ed. Aparecida: Idéias & Letras, 2010. p. 151-246.