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1.1 Introdução
O texto a seguir apresenta uma discussão sócio-histórico acerca dos principais
eixos de acumulação da economia brasileira, desde a colônia até a fase mais
intensa de industrialização e urbanização, a partir da qual se consolida uma
grande concentração especial no sudeste do país. Este capítulo inicial é
fundamental para o entendimento do módulo, pois oferece um rápido quadro
de transformação e evolução da economia brasileira.
Assim, hoje se considera que vivemos em uma era de signos, após termos
vivido o tempo dos deuses, o tempo do corpo e o tempo das máquinas. Essa
assertiva de Milton Santos (1993) nos serve como ponto de partida para
refletirmos sobre as mudanças na sociedade brasileira – particularmente no
modelo econômico hegemônico – e nos seus rebatimentos na política cultural
do país. Este fenômeno que poderia ser característica de grandes processos
históricos vividos pela humanidade, se rebate em sociedades nacionais com
impactos múltiplos e variados. Nestes momentos prodigiosos na criação de
metáforas temos constantes tentativas de explicar os fatos em função de suas
manifestações nas realidades locais.
Celso Furtado escreve a tese clássica desse período quando nos mostra que a
economia canavieira nordestina foi a responsável pela ocupação da área Saiba mais sobre a vida e a
obra do economista Celso
conhecida como Zona da Mata, e que esta atividade econômica gerou um
Furtado, no endereço
padrão de ocupação do território peculiar. Sinteticamente, temos o engenho eletrônico
com sua dinâmica própria, calcada no modelo “casa grande e senzala” que se
http://www.pensamentoec
mostrava praticamente auto-suficiente no atendimento de suas necessidades onomico.ecn.br/economist
as/celso_furtado.html
básicas de consumo.
Entretanto, essa hegemonia no que toca aos valores, convivia com uma lógica
econômica em que as regras eram ditadas pelo comércio internacional de
produtos. Havia de fato uma íntima articulação entre campo e cidade, que
fazia com que a existência de um garantia a existência e reprodução do outro,
ou seja, as primeiras vilas e povoados foram fundidos para facilitar as
atividades produtivas no mundo rural da colônia.
Você pode acessar o artigo
Essa situação impediria o aparecimento de novas atividades, sobretudo Brasil: As Raízes do Mundo do
urbanas, pois a cidade colonial era o posto avançado das manufaturas Trabalho
estrangeiras, o que pode ser uma das explicações plausíveis para a nossa de Mário Maestri , doutor pela
industrialização tardia. Nesse sentido, é importante insistir no fato de que a UCL, Bélgica, professor do Curso
de História e do Programa de
autorização para que as indústrias se instalassem no Brasil – dada pela Pós-Graduação em História da
UPF. No endereço eletrônico
Inglaterra, via Portugal – data de 1808, enquanto a liberação dos escravos e a
http://www.consciencia.net/20
criação de um mercado livre de trabalho é de 1888. 03/07/26/maestri1.html
Sem dúvida, a partir da colônia são lançadas as bases econômicas que irão
caracterizar a relação campo-cidade no Brasil, e que só irão sofrer um
processo de ruptura em sua lógica, já no século XX, quando a atividade
industrial apresenta-se como novo eixo da acumulação do capital na economia
e na sociedade brasileira.
o segundo é o de fazer com que seja aceito como consensual, não arbitrário, o
que é resultado de uma seleção de determinados bens e de uma convenção, a
atribuição a esses bens de determinados valores. Ou seja, ao mesmo tempo,
buscar o consenso e incorporar a diversidade.
Nesses casos fica mais complexo o papel político dos intelectuais que atuam
dentro do Estado como organizadores de uma demanda cultural ainda não
explicitada, no sentido de defender os interesses de grupos carentes de
organização própria.
2.1 Introdução
Este capítulo apresenta quatro núcleos interdependentes.
Nessa mesma direção, o sociólogo alemão Norbert Elias (1991) assevera que
a experiência dos Estados-nação modernos estão marcadas pela formação de
economias emocionais e afetivas, que o mesmo chama de processo de
nacionalização dos sentimentos e afetos.
Logo após a chegada de Dom João VI, foram criadas a Biblioteca Nacional, a
Escola de Medicina da Bahia, as Faculdades de Direito de Recife e São Paulo,
e, mais tarde, já durante o Império, a Escola Nacional de Belas Artes e o
Instituto Histórico Geográfico Brasileiro (IHGB). As duas últimas instituições
possuíam um caráter eminentemente cultural, que consistia em dotar o
recente Estado independente de uma nação, com cara e espírito próprio.
Quanto á Escola Nacional de Belas Artes, coube criar um acervo artístico que
atestasse a grandeza espiritual da nação brasileira. Muitos concursos de
poesia e artes plásticas foram incentivados pelo Império. A maioria tinha como
tema central a grandeza e a beleza natural do território brasileiro, assim como
o heroísmo dos portugueses, mas sobretudo, a honra e pureza do contingente
indígena, objeto das primeiras obras literárias do grande movimento estético-
artístico pós-independência:o romantismo brasileiro de matriz indígena.
Desde a formação das primeiras instituições de cunho cultural, como Escola Discutiremos mais sobre
a EMBRAFILME no tópico
Nacional de Belas Artes e o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro (IHGB), na 2.5 A ditadura militar e a
segunda metade do século XIX, passando pelas empresas públicas de cultura, EMBRAFILME.
como a EMBRAFILME, por exemplo, até a fundação do Ministério da Cultura,
em meados dos anos 1980 do século passado, os intelectuais e artistas
desempenharam um papel decisivo para a efetivação dos modelos de políticas
culturais no Brasil.
É importante ressaltar que nada disso faz parte de uma aptidão natural, mas
antes de um processo sistemático de incorporação e valorização de certos
atributos estéticos. Ainda segundo Bourdieu, o sistema de aprendizado e
internalização, que estrutura os esquemas de gostos, fazem parte de um
mecanismo de busca de distinção e prestígio entre os grupos e classes sociais.
Assim, a cultura popular (um conceito híbrido, que tem uma série de pontos de
discordância entre antropólogos e sociólogos) é vista como pertencente às
populações que guardam, relativamente intactas, suas tradições e seus
repertórios de identificação. Entre essas populações enquadram-se,
sobretudo, as comunidades rurais e ribeirinhas, que se mantiveram
relativamente distantes das transformações urbanas e industriais.
Por paradoxal que pareça, falar em especialistas leigos (pois como é possível
alguém ser especialista e leigo ao mesmo tempo?), o termo significa que, no
caso do circuito da cultura popular, os realizadores e produtores (chefes de
cerimônias, cantadores, repentistas, animadores em geral) não necessitam
ingressar em instituições formais de ensino (universidades, centros
acadêmicos, museus, institutos de música e demais instituições do circuito
erudito) a fim de apreender e incorporar os códigos estéticos que estruturam o
gosto erudito. Basta crescer, viver e nascer em certa comunidade.
Algo que ressoa hoje na construção das principais políticas públicas culturais,
notadamente, aquelas destinada ao registro dos bens de natureza imaterial,
como, por exemplo, o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial,
empreendido pelo Ministério da Cultura, cuja incumbência de execução está
sob orientação do Departamento de Patrimônio Imaterial do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
Acesse o site do IPHAN no endereço
Outro exemplo pode ser localizado a partir da intensa mobilização realizada, eletrônico
http://portal.iphan.gov.br/
sobretudo nos anos 40 e 50 do século passado, em torno da Campanha
Nacional de Defesa do Folclore Brasileiro e do movimento folclórico brasileiro
de um modo geral, cujo resultado, entre outros, fora a criação do Centro
Nacional de Folclore e Cultura Popular, também hoje sobre a alçada do
Departamento de Patrimônio Imaterial do IPHAN.
faltava ao Brasil uma raça pura e homogênea, por isso o país, que exibia traços
marcadamente mestiços, estaria destinado ao estatuto do atraso;
O fundador dos estudos folclóricos brasileiros, que trazia em sua atuação uma
marca decisiva do intelectual folclorista, ou seja, a militância e o ativismo
cultural jogou as sementes que mais tarde, nos anos 20 e 30 do século XX,
germinariam sob outra configuração político-cultural de poder, com grande
força e tenacidade.
Um bom exemplo a esse respeito pode ser ilustrado a seguir, a partir da figura
do ministro todo poderoso, Gustavo Capanema. Jovem intelectual mineiro, Na condição de modernista, jovem
Capanema é convidado para o Ministério da Educação e Saúde no início da era advogado destacado, simpatizante do
futurismo, amigo de Carlos
Vargas, de onde só sairia dez anos depois. A gestão de Capanema corresponde Drummond de Andrade, entre outros,
Gustavo Capanema se cercou de
ao período de maior força de atuação político-cultural do Ministério da muitos dos quadros da
Educação verificada até hoje. intelectualidade modernista.
Tomado pela sua intensa atividade de etnógrafo informal, de crítico de arte e, Etnografia:
como ele mesmo dizia, de turista aprendiz, Mário, além de lançar as bases
1. estudo descritivo das diversas
para instituições de preservação do patrimônio histórico-arquitetônico
etnias, de suas características
nacional (como o SPHAN), teceu as bases de um documento (hoje elevado ao antropológicas, sociais etc.
status de síntese legal para muitas das políticas públicas destinadas ao
2. registro descritivo da cultura
patrimônio imaterial, como o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial) que material de um determinado povo
reuniria os critérios necessários para a obtenção do registro de patrimônio
Houassis, 2005.
Intangível.
Mas esse não foi o único legado do poeta modernista. Segundo muitos
críticos, Mário de Andrade estava inteiramente à frente de seu tempo. No
anteprojeto que resultou na criação no SPHAN, entregue a Capanema, previa-
se a proteção e, também, o fomento a muito mais do que os chamados
patrimônios materiais (de pedra e cal, casas, palácios e igrejas) de perfil
arquitetônico barroco do período da colonização portuguesa, e sediados nos
principais centros econômicos da colonização, como: Bahia, Pernambuco,
Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Em Agosto de 2000, mais de 60 anos após o esboço inicial do projeto feito por
Mário de Andrade, o Ministério da Cultura baixou o decreto-lei que
regulamenta o registro dos bens de natureza imaterial. Dentro da mesma
sistemática, foi criado o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial com vistas
a registrar e amparar os eventos, manifestações, festejos, rituais, enfim,
fazeres e saberes que se adequam e obedecem aos critérios julgados
apropriados para conferir o título de patrimônio imaterial brasileiro.
Livro das celebrações: para festas, rituais e folguedos que marcam a vivência
coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e outras práticas da
vida social;
Ora, não é preciso ir longe para perceber que a compilação desse documento
foi inspirada nas propostas de Mário de Andrade nos anos 1930. Ademais, os
quatro livros mencionados contemplam as grades temáticas eleitas pelo
movimento folclórico ao longo de sua constituição, como a poesia popular, a
dança e os folguedos.
O Cinema Novo;
O Teatro de Arena;
A literatura regionalista;
Por outro lado, revela também que a concepção de cultura brasileira, ao longo
do período de estruturação do movimento folclorista brasileiro, se aproxima
bastante da noção cunhada pelo Romantismo e daquela incorporada pela
Antropologia Social contemporânea, ou seja, uma totalidade de práticas,
fazeres e saberes pertencentes a um determinado grupo social.
Em síntese, é possível dizer que os intelectuais-artistas modernos legitimaram,
a partir do interior do aparelho político-administrativo-legal do Estado
brasileiro, a cultura popular, tão combatida e perseguida durante as décadas
finais do século XIX e primeiras décadas do século XX. Um pequeno fragmento
de um de seus artigos a respeito pode ajudá-lo a compreender sua percepção
de cultura popular e a relação desta com o Estado no Brasil:
Como atesta o mesmo autor, alguns desses bens foram incluídos na lista da
Unesco de patrimônio cultural da humanidade: o sítio histórico de Ouro Preto e
o santuário de Bom Jesus do Matozinhos, em Congonhas, no Estado de Minas
Gerais; a cidade de Olinda, em Pernambuco; o centro Histórico de Salvador, na
Bahia; as ruínas de São Miguel das Missões, em Santo Ângelo, no Rio Grande
do Sul.
Na transição dos anos 1930 para os anos 1940 do século passado, os olhos
do governo Vargas, em termos de intervenção direta no setor cultural,
passaram a se dirigir para um novo circuito do campo cultural: o crescente
circuito da indústria cultural. Assentado sobretudo na indústria editorial, no
rádio e no cinema, o circuito da indústria cultural começava a dar seus
primeiros passos no Brasil.
Durante esse período, o promissor cinema nacional é baseado mais nas ações
individuas dos empresários do setor, que atuavam de maneira muito
fragmentada. Embora algumas tentativas de estímulo tenham sido feitas,
como no caso da proposta de alguns deputados federais de São Paulo, que
consistia em criar prêmios pela câmara Federal para incentivar a prática do
cinema, pouco de fato se fez em termos mais sistemáticos e coordenados. O
quadro, no entanto, muda a partir dos primeiros anos da Era Vargas.
Alguns críticos, como Paulo Emílio Sales Gomes, reputam que as primeiras
duas décadas do século XX correspondem a uma das mais férteis da trajetória
do cinema brasileiro, sobretudo, porque o cinema desse período se
regionalizou e manteve uma pauta voltada principalmente para a vida
cotidiana nacional.
Segundo Caldas e Montoro, entre 1923 e 1933, foram filmados cerca de 120
filmes, quase o dobro da década anterior. A freqüência do público aumentou
bastante, surgindo, nesse período, as grandes obras clássicas do cinema
mudo nacional. Também durante o mesmo período, o nascente cinema
brasileiro se regionalizou, constituindo focos importantes em Minas Gerais,
Pernambuco e interior de São Paulo.
Durante os anos 30 e 40, por exemplo, o rádio teve seu apogeu no Brasil.
Jogos de futebol, campanhas eleitorais, rádio novelas, acontecimentos do
cotidiano, batalhas e conflitos internacionais eram acompanhados por ouvidos
atentos.
No mesmo período foram criadas muitas estações de rádio nos principais
centros urbanos brasileiros, como a Rádio Nacional, por exemplo, de onde se
transmitia, para todo território brasileiro, a Voz do Brasil. Ao mesmo tempo,
muitas rádios privadas transmitiam seus sons para os mais ermos rincões dos
país.
Não é por outra razão que, ao final do primeiro período Vargas (1930-1945) e
no decurso dos anos 1950, o Estado incorporou o cinema ao conjunto de seu
modelo de política cultura, o que nos faz antever que o Estado corroborou
decisivamente no longo processo de formação da indústria cultural brasileira
e, por conseguinte, na instauração de um mercado ampliado de bens de
consumo simbólicos.
Nesse mesmo sentido, o modelo da política cultural da Era Vargas pode ser
sintetizado na seguinte assertiva: circunscrever um campo de atuação
específica para o Estado brasileiro no tocante a cultura. Para tanto, atuava em
duas frentes e dois setores distintos: por um lado regulamentava e
disciplinava, como fora o caso dos Decretos n. 22.240 e n. 22.928 e, por
outro, criava organismos e órgãos estatais, como o caso do (SPHAN) e do
Instituto Nacional do Cinema Educativo.
Muitos autores (Ortriz, 1989, Damatta, 1991, Miceli, 1988) atestam que o
Estado Novo e, seu respectivo populismo político, acolheu e legitimou boa
parte das tradições culturais populares, como o samba, o candomblé
(Umbanda) e o futebol.
Essa tendência permanece nos anos 1960 e 1970. Não obstante, ela se
complexifica e assume novas direções. No fim dos anos 1950 e durante toda a
década seguinte, o Brasil experimenta um dos maiores períodos de tensão
político-ideológica e agitação cultural.
Uma das medidas a esse respeito foi a criação, em 1966, do Instituto Nacional
de Cinema. O novo Instituto Nacional de Cinema – INC – (distinto do antigo
Instituto Nacional do Cinema Educativo) nasce após as intensas lutas políticas
do fim dos anos cinqüenta e metade dos 60. Segundo Ortiz Ramos, o INC
marcará o engajamento definitivo do Estado nas questões do cinema
brasileiro. Surgiu como uma autarquia subordinada ao Ministério da Cultura
(MEC), sendo um projeto criado pelo Grupo Executivo de Estudo da Indústria
Cinematográfica (GEICINE), sob a vigência do A-2 e valendo-se da autoridade
do decreto-lei.
Durante a referida gestão, fora criado o Plano de Ação Cultural (PAC), que
definia metas e uma racionalidade administrativa, buscando resultados mais
diretos na cultura. Segundo o sociólogo Sérgio Miceli, a criação do PAC ia
além das propostas de financiamento de áreas culturais desassistidas pelos
órgãos federias, era também uma tentativa de “degelo” com certos grupos
intelectuais envolvidos com o trabalho cultural.
Nos anos 1970, algumas medidas legais foram tomadas em direção a esfera
cultural, como, por exemplo, a Lei n. 6.533, de 24 de maio de 1978 (Governo
Geisel), cujo teor trazia como principal medida a regulamentação e a proteção
de algumas profissões culturais, como a de artista e técnico em programas,
espetáculos e produções, definindo seu conceito e características.
Fonte: Ministério da Cultura, in A Evolução do Cinema Brasileiro no Século XX, CALDAS & MONTORO (Coord.), Brasília 2006, Casa das
Musas.
Quadro 2- Nº de Espectadores dos Filmes Nacionais com (e sem)
Prod. da Embrafilme, Arrecadação dos Filmes Nacionais com
(e sem) a partic. da Embrafilme 71-79
Filmes Espectadores
Arrecadação Arrecadação
Nacionais filmes c/
Ano % total de fimes Filmes c/ Partic. %
(total partic.
nacionais Embrafilme
espectadores) Embrafilme
1971 28.082.358 2.837.093 10,1 53.368.910 6.554.378 12,28
1972 30.967.603 4.641.502 14,98 74.262.010 11.975.916 16,12
1973 30.815.445 2.637.724 8,55 81.271.005 8.904.383 10,95
1974 30.665.515 6.803.153 22,18 89.787.200 24.966.707 27,8
3.1 Introdução
O texto a seguir busca traçar, num primeiro momento, o movimento geral que
liga Economia e Cultura. Para tanto, analisa o papel do consumo da cultura na
dinamização entre economia e o mercado de bens simbólicos. A partir daí,
analisa o crescimento da indústria cultural no Brasil, suas mudanças e
atualizações.
Esse resultado revela uma dimensão que, habitualmente, não aparece nas
avaliações sobre a cultura, isto é, o seu impacto social e econômico,
mostrando claramente a potencialidade da área para o desenvolvimento
econômico.
Em 1994, por exemplo, havia 510 mil pessoas empregadas na produção
cultural brasileira, considerando-se todos os seus setores e áreas. Elas
distribuíam-se da seguinte forma:
Para que fique bem claro, é preciso ressaltar que, na contemporaneidade das
sociedades globais, a cultura não corresponde a um todo unificado e
homogêneo; antes, o contrário. Ao mesmo tempo, é importante ressaltar que a
função das atividades culturais (manifestações populares, festas religiosas,
filmes, CDs, livros, peças teatrais, entre muitos outros) não cumpre tão-
somente um efeito econômico, mas também simbólico-político.
Para se ter apenas uma breve idéia, o setor de serviços corresponde hoje no
Brasil a cerca de 50% do Produto Interno Bruto, no qual a cultura, definida
como uma área específica, desempenharia um papel importante. Dentro
daquilo que se concebe como economia de serviços, a cultura representa
cerca de 20% a 30% de seu potencial.
Como atesta Ortiz, a partir dos anos 1960 e 1970 a modernização cultural
brasileira se consolida e tem sua produção, distribuição e consumo
nacionalizados. No fim dos anos 60 o Brasil se associa ao Sistema
Internacional de Satélites (INTELSAT), dinamizando os fluxos comunicacionais
e informacionais com o mundo. Tem início, também nesse mesmo período, a
definição de uma política oficial de telecomunicações, com a criação do
Ministério das Telecomunicações.
Pode-se dizer que entre a segunda metade da década de 60 até o fim dos anos
70, a esfera cultural acompanhou de perto o crescimento econômico geral do
país. Assim, esse intervalo de tempo testemunha a consolidação de um
mercado cultural de massa.
Nos anos 1950, momento de fundação das primeiras redes e emissoras de TV,
como a TV Tupi, em São Paulo, as programações e as audiências locais,
concentradas nos dois principais centros urbanos nacionais, Rio e São Paulo.
Em meados dos anos 1980, havia no Brasil cerca de 2.000 estações de rádio e
140 de TV, sendo cerca de 56 milhões de aparelhos receptores de rádio e 26
milhões de TV. A rede de rádio, já aquela época, podia cobrir todos os
habitantes do país, enquanto a cobertura de TV alcançaria cerca de 80 milhões
de pessoas. No fim dos anos 1970, os números ermos são exatamente a
metade. O grande crescimento se verificou no setor de televisão, no qual o
número de receptores eram de 13 milhões (Gráfico 1 e 2).
Evolução no Nº de aparelhos P&B de 1955 1980
80
70
Ano
60
50
0 5000 10000 15000 20000
Nº de aparel hos P&B
Nº de Aparelhos (PB&C)
25000
20000 19602
15000
Nº de Aparelhos
(PB&C)
10000 10185
5000 4931
2202
0 2 170 760
1950 1955 1960 1965 1970 1975 1980
A partir dos anos 1950, muitos sociólogos brasileiros atestam essa mudança
(Lanni, 1971; Cardoso, 1969; e Fernandes,1962), o planejamento e o cálculo
administrativo sistemático ganham peso nas atividades estatais e privadas,
conferido às ações de ambos uma racionalidade antes ausente. A indústria
cultural não escapa à essa mudança; antes, o contrário: ela é uma das
primeiras a adotá-la.
Os contornos iniciais dessa mudança podem ser verificados logo após o fim da
Segunda Guerra Mundial, mas só se intensificam de fato a partir do advento
dos processos de massificação e de intensificação dos fluxos financeiros,
econômicos, simbólicos e comunicacionais que marcam o advento da
globalização.
Das transformações ora em curso, muitas foram vicejadas ainda no início dos
anos 80, momento inclusive de fundação e institucionalização do Ministério
da Cultura brasileiro, quando o Brasil passou a experimentar um maior
expansão do setor de serviços de sua economia, algo que só de fato se
acentuou no decurso dos anos 90.
Três pequenos exemplos podem bem ilustrar tal processo. Em uma publicação
recente, a Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista, Bahia, em parceria
com a Petrobrás, intitulada Série Cultura Conquistense, divulgou algumas de
suas ações destinadas à cultura popular. Junto a essa publicação, foram
distribuídos CDs e DVDs contendo imagens e sons concernentes às
manifestações artístico-folclóricas (ternos de reis, repentistas, procissões,
entre outras) da região e do município.
Em países como o Brasil, a economia da cultura não pode ser avaliada apenas
pelo circuito da indústria cultural, que cresceu no mundo todo a partir do fim
da Segunda Guerra Mundial, inclusive no Brasil, como vimos. Ela também pelo
crescimento do circuito erudito e da valorização recente, dos anos 80 para cá,
da cultura popular e de seu respectivo potencial econômico.
A UNESCO, através do sistema ONU, tem reconhecido tal fato e, junto com
entidades privadas e públicas, tem mapeado essa chamada “zona obscura”.
No entanto, como se mencionou no início dessa unidade, as debilidades ainda
são muitas, pois ainda há, sobretudo entre Estado e setor privado, uma falta
de sistematicidade e o reconhecimento definitivo de que a cultura popular é
geradora de recursos, divisas e ativos.
0
Comérci o Indústria Serviços Setor Adm . Demais
Soci ais Fi nancei ro Públ ica Servi ços
1960 1980 2000
Fica cada vez mais claro, portanto, a interface entre cultura popular (sua
criatividade cultural e simbólica) e os nichos de mercado e consumo de bens
simbólicos no mundo, que transitam no interior dos circuitos da indústria
cultural e erudita. Como se viu, e o exemplo do Brasil é muito elucidativo a
esse respeito, a relação entre cultura e economia não é nova.
Calçados de plástico 2
TOTAL 28,19
Fonte: IBGE - Pesquisa Industrial 2003. In: IPEA - Revista desafios do desenvolvimento. Fev. de 2006, ano 3, n. 19.
Quadro 7 - Número de trabalhadores em empresas e
organizações com atividades criativas – 2003
Confecção de artigos do vestuário e acessórios 590 mil
Publicidade 85 mil
Fonte: IBGE - Estatísticas de Cadastro Nacional de Empresas - 2003. In: IPEA - Revista desafios
do desenvolvimento. Fev. de 2006, ano 3, n. 19
Fonte: IBGE - Estatísticas de Cadastro Nacional de Empresas - 2003. In: IPEA - Revista desafios do
desenvolvimento.
Resumo do Capítulo 3
O Capítulo 3 traça uma discussão, baseada em diversos dados, a respeito da
inserção da produção cultural como uma fatia significativa da economia
brasileira moderna.
4.1 Introdução
O texto em questão busca apresentar a dinâmica do financiamento cultural
tanto no setor publico quanto privado. A partir de dados e relatórios de
pesquisa, muitos dos quais ainda de anos anteriores, apresentam um balanço
rápido das implicações das leis de incentivo a cultura, como também da
diversificação e composição do setor cultural como um todo. Essa unidade
está diretamente ligada a anterior, e se completam tanto em informações
quanto em desdobramentos que a análise pode oferecer na unidade seguinte.
Ministério ao longo dos últimos anos mostra que praticamente todas as suas
ações estratégicas estão, de alguma maneira, voltadas para a criação de um
“sistema” de financiamento da cultura. Isto se reflete, por exemplo, no
Programa Nacional de Apoio a Cultura PRONAC e, como tal, responsável pela
estruturação de inúmeras de suas atividades.
Com base nestes dados (ver Quadro 10) fica evidente a pequena participação
da “cultura” nas despesas da União, mostrando uma área de atuação do
Estado não prioritária face às demais, nas quais o Estado intervém (se em
valores absolutos, há aumentos importantes em valores relativos, e a situação
é estática).
Quadro 10 - Despesas, excluído o serviço da dívida e as inversões
financeiras (valores - base dezembro de 2000).
Em R$ milhões.
1995 1996 1997 1998 1999 2000
Fonte: Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAF). Ministério da Fazenda. In: Dória, Carlos Alberto.
Os Federais da Cultura. São Paulo, Biruta, 2003.
Ordinárias 86 69 72 64 72 84 74 76 84 80
Vinculados 0 26 27 29 26 13 19 18 13 15
Receitas Próprias 8 4 1 6 3 2 3 5 3 5
Convênios e Doações 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0
Créditos 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Diversos 7 0 0 0 0 0 3 1 0 0
Fonte: Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAF). Ministério da Fazenda. In: Dória, Carlos Alberto.
Os Federais da Cultura. São Paulo, Biruta, 2003.
Outro fator marcante nesse ano foi à clara definição de prioridade conferida
pela administração federal à área da Cultura, dobrando a alocação de
recursos. A partir de 1996, o nível de recursos alocados mantém-se no
patamar de nível de recursos alocados mantém-se no patamar de 1995,
porem levemente declinante até o final da década conforme expressa a figura
o Gráfico 4.
Evolução das Despesas Autorizadas e Realizadas do Ministério da Cultura 1991/ 2000.
Valo res em R$ m i l hõ es.
300.000
250.000
200.000 Lei Orçamentária
150.000 Realizado
100.000
50.000
0
1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
Ano
Fonte: Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAF). Ministério da Fazenda. In: Dória, Carlos Alberto. Os Federais
da Cultura. São Paulo, Biruta, 2003.
Fonte: Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAF). Ministério da Fazenda. In: Dória, Carlos Alberto. Os Federais da
Cultura. São Paulo, Biruta, 2003.
O Quadro 12 evidencia que a Fundação Casa Rui Barbosa (FCRB), a Biblioteca
Visite o site da Fundação Casa Rui
Nacional (BN), a FUNARTE e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Barbosa:
http://www.casaruibarbosa.gov.br
Nacional (IPHAN) executam praticamente a totalidade dos recursos /
orçamentários (cerca de 95% dos recursos alocados) em 2000, enquanto a
Fundação Palmares deixa de aplicar 44% dos recursos disponíveis e a
Fundação Nacional de Cultura aplica apenas 37% dos seus recursos no
mesmo período.
Fonte: Decretos 1760/95, 2116/96, 2554/98, 3189/99, 3377/2000. In: Dória, Carlos Alberto. Os Federais
da Cultura. São Paulo, Biruta, 2003.
A ampliação dos recursos advindos desses mecanismos tem sido uma meta
perseguida com afinco pelos dirigentes do MinC, seja através da reivindicação
da ampliação da margem de incentivos coincididas pelo fisco, seja através de
ações de sensibilização do empresariado para contribuir com a cultura,
objetivando ampliar a margem de realização do autorizado. Esta nova política
deve ser observada sob um duplo ângulo: das demandas que geraria e do
atendimento das mesmas.
Há, portanto, uma clara evidencia de injeção de recursos no MinC, por parte do
governo atual, se comparado aos anteriores, sobretudo se levarmos em conta
que a inflação está praticamente estabilizada ou decrescente no período
(Quadro 14)
.
Fund. Casa de
Rui Barbosa 6.284,40 8.073,90 8.322,60 9.787,60 10.635,20 12.385,10 12.589,20 16.167,60 15.018,00
Fund.
Biblioteca
Nacional 22.626,60 20.638,30 24.652,90 25.881,30 26.949,10 29.784,90 29.924,20 37.815,40 54.886,80
Fund. Cultural
Palmares 3.980,00 4.335,80 4.278,60 11.868,70 7.054,70 8.006,80 7.970,20 9.062,80 10.676,40
101.487,5 103.367,8
IPHAN 61.681,80 58.659,20 66.623,00 64.227,10 72.699,10 76.702,10 86.554,60 0 0
FUNARTE 26.418,30 23.936,80 23.391,30 23.937,20 28.883,10 29.181,60 29.337,20 31.464,40 32.065,30
Fundo
Nacional de 132.456,5
Cultura 24.370,90 20.947,30 19.134,00 46.630,40 64.387,70 43.631,60 46.968,80 85.613,30 0
(*) antes de 2004, a ANCINE não pertencia à estrutura do Min. Cultura
Fonte: Siafi/Banco de Dados GPS/DGE
Com efeito, entre 1985 e 1995, a despesa total com cultura do Estado
brasileiro, isto é, do Governo Federal,
Uma avaliação realista destes dados deve levar em conta que, enquanto no
caso do Governo Federal a capacidade de gastar cerca de 1/3 do total dos
dispêndios públicos está concentrada em uma única agência, isto é, o
Ministério da Cultura, e outros órgãos federais, no caso dos Estados e
municípios, os outros 2/3 de recursos dispendidos distribuem-se entre mais
de 50 agências, isto é, 27 Estados e 27 municípios de capital,
respectivamente.
Neste particular, chama a atenção o fato de que do total de gastos com cultura
feitos por municípios de capital, 88,83% do total correspondam a somente
oito capitais, a saber: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador,
Fortaleza, Recife, Curitiba e Porto Alegre.
Quadro 16 - Execução Orçamentária - Por Programa - 1995 a 2005 em R$ mil.
PROGRAMA 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
Desenvolvimento
da Educação 0 0 0 0 0 0 10,1 0 0 0 0
Especial
Educação e
profissionalização
0 0 0 0 0 10,1 0 0 0 0 0
do portador de
deficiência visual
Previdência de
inativos e
15.561,30 19.483,30 22.180,50 26.577,20 29.585,00 31.495,30 34.959,60 37.793,50 39.371,40 43.856,30 45.497,10
pensionistas da
união
Turismo cultural 0 0 0 0 0 4.346,80 0 0 0 0 0
Música e artes
9.003,10 17.499,60 19.408,80 21.156,10 18.947,20 20.391,30 9.340,90 9.495,20 3.643,70 0 0
cênicas
Música e artes
18.642,70 27.521,50 25.647,10 12.971,10 21.738,80 13.606,30 27.544,30 14.093,20 24.290,50 30.323,10 28.370,80
cênicas
Livro aberto 7.378,50 10.610,80 12.582,20 14.589,20 19.944,40 15.441,00 21.931,20 10.296,60 6.140,40 15.857,60 32.842,90
Cinema, som e
3.486,80 4.016,50 8.297,10 5.825,70 11.135,00 14.240,00 14.321,20 5.677,50 16.304,30 20.107,20 51.939,50
vídeo
Produção e
13.396,60 11.690,40 18.254,10 15.668,70 18.887,80 49.077,00 68.515,90 49.896,90 25.887,70 0 0
difusão cultural
Museu memória e
6.675,50 8.929,70 10.300,80 8.225,00 9.060,70 9.672,70 11.071,60 11.624,90 14.067,80 16.865,60 20.339,10
cidadania
Cultura afro-
1.912,20 868,2 2.056,70 2.176,20 1.736,60 8.856,90 3.864,10 4.850,50 7.161,50 8.132,40 9.385,50
brasileira
Gestão da política
101,3 1.334,60 1.672,00 1.662,90 1.061,80 1.669,20 2.111,20 2.756,00 2.952,10 15.000,10 53.540,20
de cultura
Gestão da
participação em
188,9 0 0 322 613,8 799,5 940,6 700,1 883,9 582,2 503,1
organismos
internacionais
Apoio
79.052,50 80.829,10 75.682,90 77.685,40 85.058,40 83.115,30 89.462,00 103.964,30 103.574,70 125.056,00 125.724,90
administrativo
Comunicação de
0 3,4 1.513,10 0 878 785,1 692,2 696,8 0 0 0
governo
Valorização do
7.992,60 8.455,70 8.922,20 8.909,70 9.088,90 9.531,80 9.982,20 10.630,90 11.567,10 0 0
servidor público
Monumenta 0 0 0 0 0 3.432,90 14.404,80 12.098,20 14.417,50 22.650,30 37.880,40
Operações
especiais:
cumprimento de 0 0 0 0 0 2.533,90 4.325,60 570,6 4.194,60 2.743,30 1.437,40
sentenças
judiciais
Operações
especiais: serviço
da dívida externa 0 0 0 0 0 757,8 2.498,60 2.221,70 1.272,90 932,7 2.336,80
(juros e
amortizações)
Ver cinema, ser
0 0 0 0 0 0 0 0 0 27.582,60 0
brasil
Cultura,
identidade e 0 0 0 0 0 0 0 0 0 4.073,70 53.822,40
cidadania
Engenho das
0 0 0 0 0 0 0 0 0 62.344,90 74.603,60
artes
Cultura e
tradições: 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2.601,10 0
memória viva
Identidade e
diversidade 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 4.411,50
cultural
Total 163.392,00 191.542,90 206.587,50 195.796,40 228.629,70 271.655,90 315.976,10 277.366,70 275.730,10 398.709,10 542.635,20
Ou seja, foi a partir de 1994 que os gastos com cultura das empresas privadas
começaram a ultrapassar aqueles efetuados pelas empresas do setor público.
Depois disso, com as mudanças na legislação de incentivo introduzidas pelo
governo FHC, a tendência de crescimento aumentou ainda mais. As empresas
públicas investidoras, embora sempre em número inferior ao de privadas,
suplantaram os gastos com cultura dessas últimas até 1993 (Veja as
motivações para investimento em cultura no Quadro 18).
As empresas públicas, por sua vez, mantiveram, até 1995, um baixo número
de projetos culturais incentivados, ou seja, 70 projetos ao ano, em média. A
partir de 1996, por decisão política do presidente Fernando Henrique Cardoso
e dos Ministérios da Cultura, Comunicações, Minas e Energia e outros, elas
apresentaram uma taxa de crescimento recorde de 226%. A partir daí até
1997, as empresas públicas patrocinaram 619 projetos, o que significa 59%
do total de projetos por elas patrocinados em todo o período analisado.
Com efeito, a despesa total com cultura do Estado brasileiro, isto é, Governo
Federal, Estados, Distrito Federal e capitais, atinge, de 1985 a 1995, a média
anual de R$ 725 milhões (Quadro 20), expressos a preços de dezembro de
1996. Deste total, o Governo Federal tem sido responsável, aproximadamente,
por 32%, enquanto os Estados e Capitais representam, respectivamente, 50%
e 17% do total geral (Gráfico 11). Os estados e municípios das capitais,
somados, realizaram, portanto, parcela significativa dos gastos com cultura no
Brasil, média de 68% no período 1985-1995.
Por outro lado, para o conjunto dos municípios das capitais e Estados
brasileiros, verificou-se que a política cultural é resultante de uma ação mais
centralizada de governo, comparativamente a outras esferas de Administração
Pública (federal e estadual), com a presença de menor número de órgãos de
Administração Indireta. São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, destacam-se,
por terem uma atividade cultural mais consolidada e, também, bastante mais
apoiada pelo poder público.
Ainda com relação ao PIB da cultura (Quadro 22), a pesquisa também mostrou
que, em 1980, as atividades da área representavam cerca de 1% do total,
contra 2,2% dos serviços de saúde e 3,1% dos serviços de educação. Por aí,
pode-se observar a magnitude que as atividades culturais representam para a
economia e a sociedade brasileira.
5.1 Introdução
A estrutura a seguir está organizada da seguinte maneira. O texto busca situar
o quadro histórico dos anos 80 e 90 para analisar o advento das principais leis
de incentivo a cultura, cuja sistemática consiste em conceder isenção fiscal às
pessoas jurídicas que estejam dispostas a investir em cultura. Os principais
marcos legais a esse respeito são a Lei Sarney, a Lei Rouanet e a Lei do
Audiovisual. A partir a contextualização histórica, o texto passa analisar e
apresentar dados sobre cada um desses três institutos jurídicos.
Esses três institutos jurídicos fundamentam toda a base legal das políticas
publicas de Cultura no Brasil a partir de meados dos anos 80. Com a
oficialização e institucionalização do Ministério de Estado da Cultura, a carta
constitucional, promulgada em 1988, incorpora um marco legal inédito na
relação Estado e cultura: o direito à cultura, e com isso introduz o que os
críticos e pesquisadores da aérea chamam de ‘paradoxo Darcy Ribeiro’.
É possível dizer que as leis de incentivo à cultura, assim como todo marco legal
que passou a vigorar a partir de meados dos anos 1980 (atos, decretos,
portarias, etc.) possuem um duplo caráter político-econômico. Por um lado, o
Estado deixa de ser o indutor direto, promotor e centralizador das atividades e
bens concernentes à cultura (como foi em certa medida durante os anos 1970,
como no caso da EMBRAFILME) e passa a atuar como incentivador, realizador
indireto.
Ele utiliza seu poder político-legal para organizar o arcabouço geral de normas
e procedimentos, mas não age no empreendimento direto, é como se o Estado
se tornasse um filtro. Sem ele, muito provavelmente não haveria como
sustentar um Plano Nacional de Cultura.
Digamos que assim, por razões políticas e econômicas, o Estado é o maior
planejador e fomentador de cultura, mas não é o único, e nem tampouco tem
como meta executar toda cadeia de realização e produção de um determinado
bem cultural, como um filme, uma música, uma peça teatral, ou uma
apresentação folclórica, entre outras.
Outra implicação direta da lei foi que ela criou uma burocracia privada e
estatal, isto é, profissionais especificamente incumbidos de transitar entre os
aspectos legais, contábeis, econômicos e administrativos da lei, isto é,
advogados, contadores, administradores e economistas envolvidos na
sistemática criada pela lei. Muitas empresas passaram a contratar esses
profissionais, de preferência aqueles que condensassem muitas dessas
habilidades.
O efeito direto na organização interna de muitas empresas foi à criação, dentro
do departamento de marketing, de setores que passaram a associar a marca
das empresas a algum tipo de atividade cultural, seja da cultura popular
(rituais, danças, festas, etc.) e/ou da indústria cultural, seja das
manifestações da chamada “cultura erudita”: artes plásticas, teatro, opera,
etc.
Uma das principais medidas da lei foi instituir o Programa Nacional de apoio à
cultura (Pronac). A diferença marcante em relação à lei anterior era o rigor
formal, pois a definição de mecanismos de controle e fiscalização não
permitia, como a Lei Sarney, um incentivo fiscal sem limites.
Se até os governos anteriores, a cultura poderia ser vista como algo acessório
e residual no computo geral dos setores mais representativos do produto
interno bruto brasileiro, a partir das gestões FHC, a institucionalização dos
mecanismos de renúncia tornam a atividade cultural economicamente
importante e ascendente.
De 1996 a 1999, houve um gasto direto de 372 milhões com a cultura, sendo
que os mecanismos de renúncia fiscal conseguiram obter 980 milhões,
chegando-se a um investimento da ordem de 1 bilhão e 353 milhões. O
exemplo do crescimento do público de cinema e do número de projeto
expressa o resultado expressivo da lei do audiovisual a partir de sua renúncia
fiscal específica. O público era de 271. 454, em 1994, passando para
3.150.000, em 1995, reduzindo-se um pouco para 2.388.888, em 1997,
subindo para 6 milhões, em 1999.
Fonte: SDI
TOTAL 33.585.757,31
TOTAL 34.837.096,34
O objetivo desse capítulo foi demonstrar a evolução dos gastos públicos com
cultura e o novo interesse do setor privado com a mesma. Também foi
evidenciado as principais empresas responsáveis pelo financiamento e os
mecanismos legais utilizados.
Referências
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