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Resumo
O presente artigo tem como proposta elucidar alguns pontos sobre o uso excessivo e o
impacto de jogos eletrônicos e da internet em jovens de 10 a 15 anos, além de elucidar o
impacto que tal problemática causa em dois processos psicológicos básicos que serão
aprofundados posteriormente, a aprendizagem e a emoção. Foi feita a entrevista com dois
profissionais, sendo uma professora e a outra uma psicóloga escolar. Após as pesquisas,
notou-se que o que delineia até que ponto o uso dos eletrônicos é nocivo, é justamente o
quanto e para que esse uso está sendo destinado, cabendo aos responsáveis estabelecer tais
limites e transformar em uma ação enriquecedora que traz consequências benéficas para o
usuário que está em seu processo de formação. Entretanto, não tendo um uso responsável,
chegou-se à conclusão de que pode trazer efeitos nefastos, dentre eles dificuldade de
socialização devido ao afastamento do presente e a aprendizagem que é deteriorada
principalmente na transição da fase infantil para a pré-adolescência.
Introdução
Este trabalho foi desenvolvido segundo proposta da disciplina de Prática Integrativa II
do curso de Psicologia da Universidade de Fortaleza (UNIFOR), que tem como objetivo fazer
modelos de investigação em Psicologia (entrevista e observação), a integração dos Processos
Psicológicos Básicos (PPB’s). Assim, essa disciplina é considerada um pré-estágio em
Psicologia, que propõe um levantamento de situações-problema sobre PPB e proposição de
soluções com base na integração dos conhecimentos teóricos e práticos.
O tema escolhido é o impacto dos jogos eletrônicos e internet na vivência social e
estudantil de crianças de 10 a 15 anos. Como a geração do início do século XXI está em meio
à tecnologia é bastante relevante e presente esse assunto, tanto pelos benefícios quanto pelos
malefícios. (SILVA; SILVA, 2017). Isso pode ser relacionado com a aprendizagem, pois podem
ser afetadas ou não com o uso. Assim, este trabalho busca por analisar e aprofundar os
impactos positivos e negativos com foco na aprendizagem e na emoção sob a visão da
Psicologia Escolar, essa área escolhida atua em colégios com o objetivo de nortear os alunos
em sua vida acadêmica e lhes dar todo o suporte necessário para uma boa experiência escolar,
além de desenvolver projetos que viabilizem a aprendizagem e também o emocional, pois não
auxiliando nesse quesito, pode acarretar sérios problemas no desenvolvimento estudantil.
(ANDRADA, 2005)
Há várias pesquisas sobre a constante e crescente utilização da internet pelos jovens.
A segunda PPB que será aprofundada no presente artigo é a emoção e como ela pode
sofrer influência diante de tal processo, que é o impacto negativo do uso da tecnologia. Desde
o nascimento estamos imersos nesse emaranhado de emoções, é o que explica David Myers
em seu livro:
Estamos sempre expostos a mistos de emoções que refletem em
nosso corpo físico, elas existem não para nos proporcionar experiências
importantes, mas para permitir a nossa sobrevivência. Quando enfrentamos
desafios, as emoções põem nossa atenção em foco e energizam nossas
ações. O coração acelera. Apressamos o passo. Todos os nossos sentidos
entram em alerta. “Ao receber boas notícias inesperadamente, nossos olhos
podem se encher de lágrimas.” (MYERS, David. Pág.220.,2012).
Metodologia
O percurso metodológico construído para desenvolver esse trabalho partiu de uma
pesquisa bibliográfica e qualitativa. O emprego da pesquisa qualitativa serve para ter uma
análise crítica e compreensiva a respeito do mundo, da vida dos respondentes. Este é o ponto
de entrada para o cientista social. O objetivo real da pesquisa qualitativa não é atingir metas
objetivadas em números ou diferentes opiniões, mas explorar o espectro de opiniões e as
diferentes representações sobre o assunto em questão. Sejam quais forem as minuciosidades
de tal, o objetivo é potencializar as diferentes perspectivas dos diferentes membros do
organismo social (BAUER; GASKELL, 2002, p.68).
A técnica utilizada foi a entrevista semiestruturada ou por pautas, a qual é um tipo de
entrevista com certo grau de estruturação, já que se guia por uma relação de pontos de
interesse que o entrevistador vai explorando ao longo de seu curso. As pautas devem ser
ordenadas e guardar certa relação entre si. O entrevistador faz poucas perguntas diretas e
deixa o entrevistado falar livremente, à medida que reporta às pautas assinaladas (BRITO, JR.;
JÚNIOR, 2011). Há o roteiro prévio que contém perguntas para esmiuçar como é a práticas das
profissionais, seus desafios e como os processos psicológicos básicos são afetados.
Contamos com a ajuda de duas participantes, que é uma profissional da psicologia
escolar e uma professora (ensino fundamental II). Essas profissionais foram escolhidas devido
ser a de maior contato com esses jovens que tem um uso exagerado e indevidos da tecnologia.
As entrevistas com essas profissionais foram gravadas e transcritas conforme o real, e para
preservar as entrevistadas por uma questão ética elas vão ser indicadas como E1 e E2
respectivamente a psicóloga escolar e a professora. A análise dos dados será feita por meio de
comparações convergentes e divergentes entre as falas das entrevistadas juntamente com a
literatura. A supervisão é feita pelo professor de práticas II e monitora da mesma disciplina. A
identidade dos profissionais entrevistados está resguardada e suas falas serão usadas
somente para o meio acadêmico.
Resultados e Discussão
O impacto dos jogos eletrônicos e da internet é algo que deve ser discutido, já que
quase a totalidade da população está nessa era tecnológica do século XXI e, devemos saber
quando o uso passa de saudável para algo que atrapalha no desenvolvimento cognitivo e
acadêmico do jovem. O uso demasiado desses meios acaba provocando o distanciamento dos
jovens que naturalmente ocorre devido às transições enfrentadas, mas que é acentuada pelo
uso dos eletrônicos. (SILVA, T.O; SILVA, L.T.G. 2017) De acordo com a Dora Goes, uma
psicóloga de transtornos do impulso na USP, o abuso do celular pode se tornar um vício,
conhecido como nomofobia, que consiste no medo de ficar longe do aparelho e esse distúrbio
se dá não necessariamente pelo tempo, mas sim pelos estragos que o mau uso causa na vida
das pessoas. Portanto, a família é um elo bem importante quando o quesito é uso indevido, já
que os pais devem mostrar e instigar os filhos a saírem do celular e apreciar coisas além da
tela que não podemos deixar de citar que é bem divertida, mas é importante que tenha o
acompanhamento e a imposição de limites por parte dos responsáveis. Quando questionadas
pelo uso abusivo da tecnologia, a entrevistada 1 respondeu que:
No período até o sétimo, oitavo ano é onde eu vejo que tem mais repercussão
negativa, porque eu vejo isolamento pra ficar ali no celular, as relações são
enfraquecidas e tem a questão do afeto e do lúdico que é perdido e muito cedo.
(...) Isso acontece quando lá na base já tem o isolamento dessas crianças né,
pais que trabalham, que passam o dia fora, que chegam exaustos e aí a
criança fica ali sozinha e ela vai fazer o que? Vídeo game, celular e as vezes
só, não tem mais nada (Fala de E1,2019)
Aprendizagem e emoção:
Para uma boa compreensão sobre como a aprendizagem e emoção são afetadas, é
prudente que, primeiramente, conheçamos as definições de ambas. De acordo com Piaget
(1952, p. 7), a aprendizagem são os atos intelectuais entendidos como atos de organização e
de adaptação ao meio.
A emoção, segundo Goleman (1997) diz que a emoção se refere a um sentimento e aos
raciocínios aí derivados, estada psicológica e biológica, e o leque de propensões para a ação.
A função biológica da emoção para Damásio é que produz uma reação específica para a
situação indutora e a outra função é de homeostase, regulando o estado interno do organismo,
são comportamentos rápidos e eficazes para a sobrevivência.
A aprendizagem e a emoção estão intrinsecamente ligadas aos impactos negativos da
tecnologia, pois o uso exagerado e sem limites de redes sociais, sites de filmes, e jogos,
afetam tanto na vivência social, quanto na vivência estudantil. Em relação ao meio social esse
uso se vê prejudicial nas relações com a família, amigos desses jovens. Quando a criança e o
jovem estão usando a tecnologia sem rotina, acaba priorizando somente a tela do computador
e celular, fazendo com que se percam as relações presenciais. As pessoas ficam sem assunto,
preferem ficar em casa. Na vivência estudantil, atrapalha também, justamente, por esse uso
desregrado, quando o aluno não tem rotina, a consequência é não cumprir com todas as suas
obrigações. Durante a entrevista a E2 afirma isso:
A aprendizagem é afetada com certeza, se ele tem a liberdade de usar esses
aparelhos eletrônicos, seja um tablete, seja um celular, a hora que ele quiser,
como ele vai se organizar dentro da rotina escolar?! Não vai ter como se
organizar, e ele acaba negligenciando em atividades corriqueiras, que no caso
seria de responsabilidade deles. [...] (Fala da E2, 2019)
De acordo com a entrevistada 2, a aprendizagem e emoção são afetadas com esse uso
excessivo e ilimitado da tecnologia. No século atual, XXI, vemos as dificuldades de nos
concentrarmos em atividades, as pessoas usam a tecnologia como subterfúgio e a internet
para criar uma vida virtual, desfocando dos problemas e da vida real. Os diálogos presenciais
estão cada vez mais raros. Dessa forma, de acordo com a professora entrevistada, os jovens
estudantes, passam a não estudar, a não ter responsabilidade em cumprir com suas
obrigações, seja em casa ou na escola.
Temos um trabalho aqui na escola sobre a questão do sócio emocional. A nossa
supervisora ela fez estudos de uma técnica Mindfulness, que é a questão da
atenção plena, e na qual ela trabalha a questão do sócio emocional, para que
os jovens e crianças possam perceber que eles são protagonistas da própria
vida, como também ela procura trabalhar dentro da escola com os pais. Como
o pai lidar com as emoções do seu filho, como o pai lidar com a questão da
ansiedade que hoje é muito comum (Fala da E2, 2019).
O foco da psicologia escolar é auxiliar no desenvolvimento cognitivo e intelectual dos
alunos, para uma melhor eficácia nas diversas áreas da vida do sujeito e para orientar sobre
seu desenvolvimento, orientar sobre sua futura profissão. Segundo Carmem Silva, o psicólogo
escolar age com mudanças dentro da instituição-escola, onde funcionaria como um elemento
catalizador de reflexões, um conscientizador dos papéis representados pelos vários grupos que
compõem a instituição. O psicólogo escolar tem papel fundamental para diminuir dificuldades
que possam ocorrer entre alunos e escola, e sanar dúvidas.
Os desafios enfrentados são diversos, um exemplo é justamente essa falta de diálogo
entre pais e professores. Na entrevista com a psicóloga ela diz que:
Pais que trabalham e passam o dia fora, que chegam exaustos e aí a criança
fica ali, não tem. Todo mundo com muito medo né, hoje em dia você tem um,
dois filhos no máximo, deixa a criança ali sozinha e ela vai fazer o que? Vídeo
game, celular e às vezes só, não tem mais nada (risos) e isso é bastante
prejudicial, ah e eu tô falando a nível emocional e até a nível cognitivo. (Fala da
E1, 2019)
A E2 afirma que o grande segredo pra que essa criança, esse adolescente obtenha
sucesso na vida escolar, realmente, ter uma base familiar, e uma família que acompanhe os
anos finais do fundamental. Assim, é comum ver que quando os alunos vão para o fundamental
II, e para o ensino médio há um distanciamento dos pais na vida estudantil dos filhos, na
maioria das vezes por comodidade.
Assim, de fato, a tecnologia em geral tem a parte positiva e a parte negativa. A parte
positiva como foi citada é para meios de pesquisas e interações sociais. A parte negativa muito
prejudica isso pois os adolescentes passam a não ter uma rotina de estudo e não ter relações
presenciais. O que separa entre o lado prejudicial ou não é a rotina, os limites.
Realmente, quando o estudante não tem rotina e usam ilimitadamente o celular, internet e
jogos eletrônicos não conseguem conciliar as outras áreas da vida. O ponto em que melhora a
qualidade de vida, os estudos, as relações sociais são os limites, a organização e planejamento
de horários. Para isso, é extremamente necessário o intercâmbio entre pais e professores, ou
seja, é de extrema importância que os adultos que cuidam do desenvolvimento pessoal e
estudantil desses jovens tenham uma comunicação. Trilhar um caminho de conversa e ter o
conhecimento das situações que esses jovens passam em casa e na escola é importante para
a resolução de vários problemas que possam ser gerados nesse período da vida, como a não
interação com outras pessoas, baixo desenvolvimento estudantil, indisciplinas, depressão.
Considerações Finais
A partir dos resultados obtidos foi possível notar o modo que cada profissional vê a
problemática levantada e como ele atua diante disso para reduzir os impactos na emoção e na
aprendizagem, que afetados podem prejudicar a vida pessoal e escolar do indivíduo. Com as
entrevistas e pesquisas feitas ao logo do artigo, é possível concluir que o uso de forma
responsável não traz danos para o usuário, mas que ao ultrapassar determinado limite,
ocorrem danos sérios que prejudicam em vários âmbitos.
Foi enriquecedor estar em contato com o modo de cada profissional atuar, além de nos
nortear como se dá a profissão na prática. Um dos pontos levantados pela psicóloga é da
participação dos responsáveis em todo esse processo de estabelecer limites e o de oferecer
novas alternativas de entretenimentos para os jovens.
Toda essa discussão acerca desse assunto está tomando proporções maiores agora, visto
que estamos imersos nessa era tecnológica e que se feito sem responsabilidade, pode trazer
danos irreversíveis. Além disso, foi possível notar os diversos desafios enfrentados para
estabelecer um diálogo entre os responsáveis e o jovem, que de fato, está em uma fase
transicional delicada.
Todavia, mesmo diante de diversos dilemas, os profissionais defendem dos eletrônicos que
podem ser bastante enriquecedores, desde que o uso seja feito de forma regrada.
Referências
SILVA, T.O; SILVA, L.T.G. Os impactos sociais, cognitivos e afetivos sobre a geração de
adolescentes conectados às tecnologias digitais. Revista psicopedagogia, 2017. Disponível
em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-84862017000100009.
Acesso em: 08 de Novembro de 2019.
Apêndice
Como é a relação com os pais? De que modo eles podem contribuir ou atrapalhar?
Sim, é... Essa questão, a gente tem uma tendência em querer achar um culpado né, e
eu tenho muito cuidado quando eu vou conversar com os pais, porque os pais também estão
passando pelas dores deles e pelas dificuldades deles, então eu não posso dizer “ ah, você tá
errado, você está fazendo isso com seu filho porque você passa o dia todo trabalhando e
quando chega em casa não dá atenção porque você tá cansado né “ e aí eu vou demonizar
esse pai? Ele tá tentando fazer o que é melhor, pode não tá seguindo os melhores caminhos
né, mas eu sempre tento fazer essa abordagem de quais são outras possibilidades né pra
restringir o tempo, pra apresentar novas atividades, pra ter um tempo de qualidade em família
né, na medida do possível. Então... É aquela coisa né, a gente tem uma família, um filho e a
gente precisa se dedicar pra isso, é obvio que a gente não pode ser totalmente exigente e só
culpabilizar os pais, mas eu tento construir nesse sentido, tá, eu sei que é difícil e tudo mais,
mas essa situação ta acontecendo e ela vai virar uma bola de neve, então o que que é possível
a gente fazer agora? Vamos tentar restringir esse tempo, vamos tentar observar mais o que
que ele tá olhando, assistindo, jogando, com quem ele tá falando porque agora tem várias
redes sociais até mesmo nos jogos né. Então assim, tentar ter essa observância em relação ao
que tá sendo consumido alí na internet e trocar esse tempo, porque assim...” Ah, pois então
pronto, eu vou tirar o celular”, vai tirar o celular e o menino vai ficar olhando pra cima, então
como é que a gente pode substituir? Uma outra aula, um espaço que tenha pessoas pra ele
interagir e brincar na vida real, um momento de qualidade em família mesmo, então como é
que a gente pode fazer essa logística de que a vida também seja tão atraente quanto ficar no
celular ou nos jogos. É nesse sentido de apresentar a vida como interessante também, não tirar
como uma punição ou um castigo, a ideia não é essa.
De que modo as emoções podem ser afetadas pelo uso do celular na vida escolar e
familiar?
Pronto, nesse quesito acho que a gente fala bastante das redes sociais né, que foram
pontos que eu coloquei um pouco. Primeiro, filhos que estão sozinhos ou com irmãos, e as
vezes os irmãos também se separam, ficam cada um com o seu celular, vários e vários casos
nesse sentido né, que não tem esse diálogo e não precisa ter, eles nem chegam a querer...
tentar esse diálogo, porque tem ali o celular então todas as relações são travadas por ele né,
por meio do WhatsApp, do Instagram, do facebook, mas principalmente WhatsApp e Instagram,
tanto as conversas como a questão da vitrine da vida do outro né, porque é uma vitrine onde
tudo é colocado lindo, maravilhoso, e eu acho que é nesse sentido que as emoções são
afetadas tanto pra todo mundo e isso eu não falo nem de crianças e adolescentes, eu falo de
famílias, de adultos, quantas pessoas não tá ali rolando aquele feed “poxa, caramba, tá numa
viagem tal e eu aqui tendo que lavar louça” entende? E é... tem um livro que agora eu não vou
recordar o nome, mas que fala exatamente dessa sociedade do cansaço assim, que tudo tem
que ser um espetáculo entende? Tudo tem que ser maravilhoso e aí o limite da frustração fica
bem pequenininho, qualquer coisa, qualquer crítica ou qualquer tédio, nossa, é uma coisa
muito mortificante, que é inerente a vida humana, o ócio é inerente à vida humana, até criativo
né. Então assim, não há mais essa, não há mais não, mas é difícil acessar esses momentos e
de uma maneira tranquila né e vida que segue, vou lavar minhas roupas. (risos). O Renato
Russo que falava que o mal do século é a solidão né, tá todo mundo as vezes juntos, mas se
sentindo só, por quê? Porque não tem essa autenticidade, como você falou do Rogers, não tem
essa autenticidade, essa segurança de mostrar quem se é, nossa, quantos discursos de “eu
não sei o que ela vai pensar de mim” ou “ eu não quero falar porque eu não quero preocupar”
então assim, as pessoas estão cada vez mais se fechando e se fechando e aí...
Você gostaria de acrescentar mais alguma coisa?
Pronto, eu acho que é nesse sentido né, a gente tem que aceitar que a gente tá na era
da tecnologia, a era digital né e que isso não é por si só ruim, mas a gente tem que assumir a
posição de donos da tecnologia, não a tecnologia como algo que vai nos sujeitar, que é o que
tá acontecendo, é o que acontece com todos nós. Então é nesse sentido, é mais como uma
mudança de paradigma, esse pra mim é o maior desafio, que é uma mudança de paradigma do
ser humano mesmo enquanto é... eu sou alguém que eu vou utilizar a tecnologia pra algo que
vai me servir entende? Ou eu vou ser utilizada por ela, a maioria das coisas né, historicamente
a gente já passou por vários momentos nesse sentido de... isso aqui tem um potencial bom e
um potencial ruim, eu vou deixar o que acontecer? Eu vou fazer que tipo de escolha?
Você considera que o uso da tecnologia está atrapalhando? Se sim, como atrapalha no
desenvolvimento intelectual e na vida pessoal do jovem?
Em tese, sabe? Depende muito de como essa tecnologia é direcionada pelos adultos. Eu falei
sobre isso hoje numa sala de sexto ano. Estava entregando um TD de revisão, pois eles estão
próximo das provas, e tinha uma questão no TD de história que o professor pedia para fazer
uma pesquisa na internet. E aí o aluno me questionou: “Tia, e isso pode?” e eu disse: Pode. A
gente não tem que ver a internet como inimiga, ela é uma ferramenta positiva quando ela é
usada de forma que seja útil. Então assim, a questão da tecnologia atrapalhar ou não vai do
direcionamento dado a ela. Ela vem atrapalhar quando o uso dessa tecnologia ela não é
limitada. Limitada no sentido de que não tem em mente que as crianças estão sendo
bombardeadas o tempo inteiro por informações. E, a internet não vai filtrar essas informações
para seu filho, ela vai jogar. Cabe a você pai orientar essa criança com o uso dessa tecnologia
que tá ali ao alcance das mãos sim. Mas, muitas vezes, uma criança ela não tem discernimento
de filtrar as informações. Então, quando essas informações elas não são filtradas elas podem
vim sim a atrapalhar. Por que? Porque a criança em si é muito curiosa, então vai buscando
informações que não condiz com a idade dele. Por que? Porque tem liberdade para isso, ele
vai dormir duas três horas da manhã, pois não é limitado o uso daquele aparelho. Então, isso
pode vim sim a atrapalhar quando a criança não tem uma rotina, quando ele usa esse aparelho
de uma forma desmedida.
Como acontece o intercâmbio com os pais e como se dá? De que maneira eles podem
contribuir ou atrapalhar?
Como eu disse, a questão dos meios de tecnológicos, são positivos quando são usados de
uma forma, realmente, útil, aqui na coordenação nós utilizamos muito o WhatsApp, entramos
muito em contato com os pais por essa rede social. Até mesmo, por sabermos que a rotina dos
pais são bem movimentadas, corrida, como a nossa também, às vezes é mais prático que
mandamos uma mensagem para o pai seja digitando, ou por um áudio como o pai também,
então entra em contato com o pai via telefone, via WhatsApp e a gente vai tendo essa
comunicação diária, do mesmo jeito que nós vemos de forma positiva, nós também em
contrapartida vemos como uma forma negativa dentro da nossa realidade aqui da escola. O
que veríamos de forma negativa? Hoje, grupo de pais que se forma no WhatsApp, é, pra
debater coisas do dia a dia da escola, na qual eles poderiam resolver diretamente com a
coordenação, com a direção da escola e eles acabam gerando situações dentro desses grupos
que poderiam ser resolvidas facilmente. O grande segredo, vamos dizer, pra que o aluno tenha
sucesso dentro da vida escolar, é realmente a parceria pais e escola. O aluno, ele não vai ter
sucesso se não existir essa parceria, não adianta a escola cobrar como coordenadores e
professores, se dentro de casa esse aluno não receber também essa cobrança, que ele seja
um aluno, que faça as suas obrigações como aluno, então, nesse momento é necessário que
ele tenha uma rotina, que ele tenha responsabilidade, que se ocorrer algo dentro da escola,
que saia dos padrões cotidianos, seja deixar de fazer uma atividade, ou seja, o aluno ser
colocado pra fora de sala por questões disciplinares, que a família possa interferir diretamente
diante desse processo, e essa interferência é primordial. Se essa criança, esse adolescente
percebe que “se eu errei, eu vou ter sanções lá na frente” ele vai pensar duas vezes antes de
fazer, mas da mesma forma se ele percebe que ‘eu errei aqui na escola, eu estou recebendo as
minhas sanções, eu vou ter eu fazer um trabalho extra, ou eu vou ter que, eu não vou poder
correr na hora do intervalo, eu recebi alguma sanção, eu vou pensar duas vezes antes de fazer,
mas se na minha casa eu continuo com meu netflix, minha internet, meu tablet, meu celular, o
que é que vai me motivar a mudar? Então, é necessário que a família intervenha sim, de forma
positiva, na educação dessa criança, desse jovem, pois ela precisa ter rotina. Ela precisa
perceber que ela só estuda e que tem responsabilidades como aluna e dentro da escola.
De que modo a emoção dos jovens pode ser afetado na vida escolar e familiar?
Aqui na escola, particularmente, nós trabalhamos já faz algum tempo com a gestão das
emoções, a gente está num período que essas questões emocionais elas estão assim,
eclodindo de uma forma como nunca se viu. Eu acredito, particularmente, que isso seja reflexo
da falta de base familiar. Algum tempo atrás os pais ditavam as regras, hoje, infelizmente, os
filhos ditam as regras. Então, muito a gente ouve falar dessas questões de depressão,
ansiedade, em crianças em jovens. O que a gente pode perceber no nosso dia a dia, pelo
nosso cotidiano, esse tipo de situação, ela se dá, pois essas crianças e jovens não tiveram
bases familiares, tanto relacionado a ser preparada para o mundo, como também aquela
criança que é super protegida, aquela criança que não aprendeu a se decepcionar. Dentro da
casa dela, sempre foi feito tudo que ela quis, da maneira que ela quis, então no momento que
dentro de uma escola ela se frustra, ela não sabe lidar. Essa frustração é que vai acabar
refletindo no que a gente vê muito hoje, que é justamente, essa depressão cada vez mais cedo,
essa ansiedade cada vez mais cedo, crianças se mutilando, jovens sofrendo de anorexia, de
bulimia, e acredito que isso tudo seja reflexo, justamente, da questão de que as famílias hoje
não deixam as suas crianças e jovens se frustrarem. A frustração faz parte da formação do
caráter do ser humano, e quando isso não acontece, ai a gente vê, infelizmente, esses
resultados negativos. Nós temos um trabalho aqui na escola a questão do sócio emocional, a
nossa supervisora ela é formada, fez estudos de uma técnica Mindfuless, que é a questão da
atenção plena, e na qual ela trabalha a questão do sócio emocional, para que os jovens e
crianças possam perceber, que eles são protagonistas da própria vida, como também ela
procura trabalhar dentro da escola com os pais. Como o pai lidar com as emoções do seu filho,
como o pai lidar com a questão da ansiedade que hoje é muito comum. Temos um projeto
chamado “Líder em mim”, que hoje ele é até o quinto ano, mas pra 2020 ele vai abranger a
escola toda, e esse projeto é um projeto que ele procura colocar para as crianças elementos do
dia a dia. Como é a questão do ser proativo, a questão que na vida não é o ganha perde,
ganha ganha. São situações que a gente vai trabalhando diariamente, mas que é importante
que a gente tenha em mente que esse trabalho não tem como evoluir, como fluir sendo
trabalhado apenas pela escola. Então a gente procura diariamente essa parceria com os pais.
Quais os desafios enfrentados pelo uso excessivo dos eletrônicos?
O grande desafio é, realmente, quando a gente não tem a parceria da família, pois, eu poderia
te dar vários exemplos, uma coisa que aconteceu ontem: uma aluna que se negou a fazer uma
atividade de revisão em sala de aula que valia pontuação, e aí a gente entrou em contato com
a família, e a mãe diz o quê? “Eu não sei mais o que eu faço, eu tomei o celular, mas mesmo
assim ela foi dormir quatro horas da manhã”. Quer dizer, pra uma adolescente de treze anos
dormir quatro horas da manhã. Então, quando falta essa abordagem positiva da família em
relação a esse adolescente, o nosso trabalho é vão. Por que? Por que aqui nós passamos
quatro, cinco horas com o aluno, com o adolescente, nossa escola tem normas e regras como
qualquer outra, mas não adianta a gente trabalhar com esse aluno as nossas normas e as
nossas regras se em casa isso não é trabalhado com ele. Isso nos atrapalha, no nosso
cotidiano no sentido que não adianta eu falar pra ele que isso é prejudicial se dentro da casa
dele não é. Tem que ser uma via de mão dupla, família e escola, se isso não acontece tudo fica
mais complicado. Acredito que, realmente, o grande segredo de uma criança, seja do infantil,
do fundamental I ou II, ou médio. O grande segredo pra que essa criança, esse adolescente ele
obtenha sucesso na vida escolar, ele realmente ter uma base familiar, e uma família que
acompanhe os anos finais do fundamental. Quando eles vão chegando no oitavo, nono ano a
gente tem muita dificuldade, pois a medida que eles vão crescendo os familiares vão se
distanciando da escola. Isso podemos ver em vários momentos, uma festinha, por exemplo,
quando são crianças da educação infantil a escola lota, se é reunião da educação infantil a
escola lota, se é do fundamental I a escola fica cheia, mas quando a gente vai tratar de
fundamental II e ensino médio a gente já tem metade do público. Infelizmente, a família acaba
deixando pra lá, a medida que eles vão crescendo, eles próprios vão colocando para os pais:
“Eu não sou mais criança, não precisa mais ver minha agenda pra assinar”. E alguns pais por
comodidade acabam se deixando levar por essas situações e aí só procuram a escola quando
vai chegando o final do ano, que aí tem que passar, que também vai a questão financeira, e aí
a gente começa a perceber o quanto faz falta esse acompanhamento.