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UTFPR Compatibilidade Eletromagnética 2021-S1

Aula 11
Linhas de transmissão e integridade de sinal
Solução no domínio do tempo

A solução no domínio do tempo das equações da linha de transmissão refere-se à


solução completa dessas equações, sem levar em consideração a forma de onda temporal
da excitação da linha. A solução no domínio do tempo é muitas vezes conhecida como a
“solução transitória”, que é um equívoco, uma vez que a solução no domínio do tempo
fornece a solução total - transitória mais estado estacionário.
Primeiro, investigaremos um método gráfico para esboçar as tensões nos terminais
da linha versus tempo. Isso fornece uma visão sobre a integridade do sinal em relação a
sobreposição das formas de onda.
Este material foi retirado das fontes bibliográficas de Paul (2006) e Sadiku (2004).

1. Solução gráfica

Vamos investigar o método gráfico para esboçar as tensões nos terminais da linha
no domínio temporal. Considerando que as equações que descrevem a propagação da
onda eletromagnética nas linhas de transmissão são dadas por:
𝜕 2 𝑉(𝑧, 𝑡) 𝜕 2 𝑉(𝑧, 𝑡)
= 𝑙𝑐 (11.1)
𝜕𝑧 2 𝜕𝑡 2
𝜕 2 𝐼(𝑧, 𝑡) 𝜕 2 𝐼(𝑧, 𝑡)
= 𝑙𝑐 (11.2)
𝜕𝑧 2 𝜕𝑡 2
e que as soluções de onda de tensão e de onda de corrente são descritas por:
𝑧 𝑧
𝑉(𝑧, 𝑡) = 𝑉 + (𝑡 − ) + 𝑉 − (𝑡 + ) (11.3𝑎)
𝑣 𝑣
1 + 𝑧 1 𝑧
𝐼(𝑧, 𝑡) = 𝑉 (𝑡 − ) + 𝑉 − (𝑡 + ) (11.3𝑏)
𝑍𝐶 𝑣 𝑍𝐶 𝑣
sendo 𝑍𝐶 a impedância característica da linha, 𝑣 a velocidade de propagação e os sobre
índices (+) e (-) indicam as ondas progressiva e regressiva, respectivamente, as quais
mostram que o tempo e a posição devem estar relacionados como 𝑡 − 𝑧/𝑣 e 𝑡 + 𝑧/𝑣.
A função 𝑉 + representa uma onda que se propaga na direção positiva de 𝑧. Isso fica
claro, já que com o aumento do tempo, 𝑧 também deve aumentar para manter constante o
argumento da função; isto é, para rastrear o movimento de um ponto na onda.

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Similarmente, a função 𝑉 − representa uma onda que se propaga no sentido negativo de


𝑧. Assim, a solução total consiste na soma das ondas de deslocamento para frente e para
trás. A corrente de cada onda está relacionada com a tensão dessa onda pela impedância
característica:
𝑧 1 + 𝑧
𝐼 + (𝑡 − ) = 𝑉 (𝑡 − ) (11.4𝑎)
𝑣 𝑍𝐶 𝑣
𝑧 1 − 𝑧
𝐼 − (𝑡 + ) = 𝑉 (𝑡 + ) (11.4𝑏)
𝑣 𝑍𝐶 𝑣
Consideraremos linhas de comprimento total ℒ. As ondas de deslocamento
progressivo e regressivo estão relacionadas na carga, 𝑧 = ℒ, pelo coeficiente de reflexão
da carga como:
𝑉 − (𝑡 + ℒ/𝑣) 𝑅𝐿 − 𝑍𝐶
Γ𝐿 = = (11.5)
𝑉 + (𝑡 − ℒ/𝑣) 𝑅𝐿 + 𝑍𝐶
Portanto, a forma de onda refletida na carga pode ser encontrada a partir da onda
incidente usando o coeficiente de reflexão:
ℒ ℒ
𝑉 − (𝑡 + ) = Γ𝐿 𝑉 + (𝑡 − ) (11.6)
𝑣 𝑣
O coeficiente de reflexão dado em (11.5) aplica-se apenas às tensões. Um
coeficiente de reflexão de corrente pode ser encontrado substituindo (11.5) por (11.4), de
modo que:
ℒ ℒ
𝐼 − (𝑡 + ) = −Γ𝐿 𝐼 + (𝑡 − ) (11.7)
𝑣 𝑣
Observe que o coeficiente de reflexão de corrente é o negativo do coeficiente de
reflexão da tensão.
Essa reflexão de ondas na descontinuidade de carga é ilustrada na Figura 11.1. O
processo de reflexão pode ser visto como um espelho que produz, como um 𝑉 − refletido,
uma réplica de 𝑉 + que é “invertida” e todos os pontos na forma de onda 𝑉 − são os pontos
correspondentes na forma de onda 𝑉 + multiplicada por Γ𝐿 . Observe que a tensão total na
carga, 𝑉(ℒ, 𝑡), é a soma das ondas individuais presentes na carga em um determinado
momento, conforme mostrado em (11.3).

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Figura 11.1 – Reflexão das ondas em uma terminação.

Agora, vamos considerar a linha conectada à fonte em 𝑧 = 0, conforme mostrada


na Figura 11.2. Neste caso assumimos que somente uma onda de deslocamento
progressivo irá se propagar pela linha durante um intervalo de tempo 𝑇𝐷 = ℒ/𝑣, pois a
onda incidente não terá chegado na carga para produzir uma onda refletida. A parte da
onda incidente que é refletida na carga necessitará de um tempo adicional 𝑇𝐷 para voltar
para a fonte em 𝑧 = 0. Portanto, para 0 ≤ 𝑡 ≤ 2ℒ/𝑣, nenhuma onda regressiva aparecerá
em 𝑧 = 0, e para qualquer tempo menor que 2𝑇𝐷 a tensão e corrente totais em 𝑧 = 0 serão
constituídas apenas pelas ondas progressivas, 𝑉 + e 𝐼 + .

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Figura 11.2 – Circuito equivalente na entrada da linha antes que uma reflexão ocorra.

Portanto,
0
𝑉(0, 𝑡) = 𝑉 + (𝑡 − ) (11.8𝑎)
𝑣
+ (𝑡
0 𝑉 − 0/𝑣) 2ℒ
𝐼(0, 𝑡) = 𝐼 + (𝑡 − ) = 𝑝𝑎𝑟𝑎 0 ≤ 𝑡 ≤ (11.8𝑏)
𝑣 𝑍𝐶 𝑣
Já que a relação entre a tensão total e a corrente total na linha é 𝑍𝐶 para 0 ≤ 𝑡 ≤
2ℒ/𝑣, como mostrado em (11.8), a linha parece ter uma resistência de entrada de 𝑍𝐶
durante este intervalo de tempo, como mostrado na Figura 11.2b. Assim, as ondas
progressivas de tensão e corrente que são inicialmente lançadas estão relacionadas à
tensão da fonte (use o divisor de tensão):
𝑍𝐶
𝑉(0, 𝑡) = 𝑉 (𝑡) (11.9𝑎)
𝑅𝑆 + 𝑍𝐶 𝑆
𝑉𝑆 (𝑡)
𝐼(0, 𝑡) = (11.9𝑏)
𝑅𝑆 + 𝑍𝐶
e possuem a mesma forma de onda que a tensão da fonte.
A onda incidente se desloca em direção à carga, exigindo um tempo 𝑇𝐷 = ℒ/𝑣 para
a borda principal do pulso atingir a carga. Quando o pulso atinge a carga, um pulso
refletido é iniciado, como mostrado na Figura 11.1. Esse pulso refletido requer um tempo

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adicional 𝑇𝐷 = ℒ/𝑣 para que sua borda atinja a fonte. Na fonte podemos obter um
coeficiente de reflexão de tensão:
𝑅𝑆 − 𝑍𝐶
Γ𝑆 = (11.10)
𝑅𝑆 + 𝑍𝐶
como sendo a razão entre a onda incidente de entrada (que é a onda refletida na carga) e
a porção refletida dessa onda de entrada (que é enviada de volta para a carga). Uma onda
progressiva é, portanto, iniciada na fonte da mesma maneira que na carga. Esta onda
progressiva tem a mesma forma que a onda regressiva (que é o pulso original enviado
pela fonte e refletido na carga), mas a magnitude é reduzida por Γ𝑆 .
Este processo de sucessivas reflexões continua entre a fonte e a carga. A qualquer
momento, a tensão total (ou corrente) em qualquer ponto da linha é a soma de todas as
ondas de tensão (ou corrente) individuais existentes na linha naquele ponto e instante de
tempo, como é mostrado em (11.3).

2. Interconexões digitais de alta velocidade e integridade de sinal

As velocidades de clock em sistemas digitais estão aumentando em uma taxa


constante. Os clocks dos PCs são da ordem de 3 GHz. Além disso, as taxas de
transferência de dados digitais estão aumentando de maneira semelhante. Ambos os sinais
são transferidos de um ponto a outro nos condutores da PCI. Obviamente, o atraso de
tempo de propagação nos condutores está se tornando um fator crítico no projeto de
temporização do sistema, com os atrasos ficando na ordem dos tempos de subida/descida
do pulso.
Existem vários problemas associados ao tempo de atraso, um deles é a distorção do
clock. Suponha que um clock seja alimentado para dois módulos, conforme mostrado na
Figura 11.3. Observe na Figura 11.3a, que o atraso de tempo total para o módulo 1 é
𝑇𝐷1 + 𝑇𝐷2. O atraso de tempo total para o módulo 2 é 𝑇𝐷1 + 𝑇𝐷2 + 𝑇𝐷3, o qual, por
causa das conexões mais longas, é maior do que o atraso para o módulo 1. Portanto, cada
módulo “vê” o clock deslocado no tempo em relação ao outro. Isso é conhecido como
distorção do clock. Por outro lado, se o caminho dos condutores for tal como mostrado
na Figura 11.3b, o atraso de tempo total para cada módulo é o mesmo, 𝑇𝐷1 + 𝑇𝐷2 +
𝑇𝐷3.

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Figura 11.3 – Ilustração de uma distorção do clock devido a caminhos de condutores diferentes. (a)
módulos 1 e 2 com caminhos diferentes. (b) módulos com caminhos iguais.

Além disso, há outros aspectos talvez mais críticos causados pelas crescentes
velocidades de propagação do sinal digital. Os pulsos de clock e de dados são pulsos com
formato trapezoidal com transição, por exemplo, entre 0 e 5 V. Os fabricantes de portas
digitais e outros dispositivos fornecem níveis em que um pulso é garantido para ser
interpretado como uma lógica 1 ou 0. Se o nível do pulso recebido encontra-se
indevidamente entre os níveis lógicos, os dados podem ser interpretados incorretamente.
O termo “integridade do sinal” refere-se em garantir que um pulso digital, quando
enviado pela linha, chegue ao receptor com o nível e a forma de onda desejados. Vimos
que linhas descasadas podem causar um sinal distorcido resultante de reflexões na carga.
Além disso, sempre que as dimensões da seção transversal da linha de transmissão
mudarem, a impedância característica da linha mudará e, portanto, teremos reflexões
nessa descontinuidade. Esses condutores geralmente mudam de uma camada para outra
por meio de vias. As vias são conexões perfuradas de uma camada para outra na PCI e
são usadas para conectar dois condutores que estão em camadas opostas. Claramente, um
sinal que passa de uma camada para outra ao longo de uma via terá encontrado uma
descontinuidade e, portanto, uma mudança na impedância característica.

3. Esquemas de casamento para integridade de sinal

Conforme vimos, os descasamentos na fonte e/ou na carga de uma linha de


transmissão podem fazer com que a forma de onda de tensão recebida difira drasticamente
do que foi enviado, afetando a integridade do sinal. Para diminuir esse efeito alguns

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esquemas de casamento de impedância podem ser utilizados. O esquema mais comum é


o casamento em série mostrado na Figura 11.4a.

Figura 11.4 – Casamento em série de impedância de linha de transmissão. (a) implementação do


casamento em série. (b) demonstração de funcionamento.

Para fontes, cujas resistências de saída são menores que as impedâncias


características das linhas da PCI, como, por exemplo, as portas CMOS, um resistor 𝑅 é
adicionado à entrada da linha (ou saída da porta de acionamento) de forma que:
𝑅𝑆 + 𝑅 = 𝑍𝐶 (11.11)
ocasionando um casamento entre a linha e a fonte. A onda de tensão terá um nível igual
a metade do nível de tensão da fonte (𝑉0 /2). Normalmente, a carga é um circuito aberto
ou aproximadamente, portanto, o coeficiente de reflexão da carga é Γ𝐿 = +1. Neste caso,
a onda incidente é completamente refletida na carga, dando um total de 𝑉0 /2 + 𝑉0 /2 =
𝑉0. Portanto, a tensão de carga sobe para 𝑉0, fornecendo, imediatamente, perfeita
integridade de sinal. Outra vantagem de um casamento em série é que, para uma carga de

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circuito aberto, nenhuma corrente flui na linha e no resistor 𝑅 e, portanto, o resistor não
dissipa energia.
Um segundo esquema para casamento de impedância é o “casamento paralelo”
mostrado na Figura 11.5a, em que um resistor 𝑅 é colocado em paralelo com a carga. A
escolha de 𝑅 deve ser tal que a linha esteja casada na carga:
𝑅𝑅𝐿
𝑅 ∥ 𝑅𝐿 = = 𝑍𝐶 (11.12)
𝑅 + 𝑅𝐿

Figura 11.5 – Casamento em paralelo de impedância de linha de transmissão. (a) implementação do


casamento em paralelo. (b) demonstração de funcionamento.

A tensão de carga está ilustrada na Figura 11.5b. Note que a tensão inicialmente
enviada tem um nível de:
𝑍𝐶
𝑉𝑖𝑛𝑖𝑐𝑖𝑎𝑙 = 𝑉 (11.13)
𝑅𝑆 + 𝑍𝐶 0
esta onda que se propaga para a carga é totalmente absorvida e não há onda refletida.
Existem duas desvantagens para o casamento paralelo. Primeiro, a tensão de carga é
sempre menor que o nível 𝑉0 da fonte. Por exemplo, suponha que 𝑅𝑆 = 25 Ω, 𝑍𝐶 = 50
Ω e 𝑉0 = 5 V. O nível de tensão de carga será 3,33 V. No caso de casamento paralelo,
não temos onda refletida para elevar a tensão de carga até o nível de tensão da fonte.

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Segundo, mesmo para uma carga de circuito aberto, a linha atrairá corrente quando a fonte
estiver no estado alto. Portanto, o resistor de casamento 𝑅 consumirá energia.

4. Quando desconsiderar um casamento de impedâncias

O casamento da linha nem sempre é necessário para que a tensão na saída da linha
tenha o nível e a forma de onda desejados. Quando não é necessário casar uma linha? Um
caso óbvio é onde a linha é muito “curta”. Um critério para verificar isso é examinar os
limites do espectro do pulso trapezoidal. A largura de banda do pulso, ou seja, as
componentes espectrais significativas do pulso, são obtidas como:
1
𝐵𝑊 = (11.14)
𝜏𝑟
onde 𝜏𝑟 é o tempo de subida do pulso. Para que os efeitos de parâmetros distribuídos da
linha sejam insignificantes, a linha deve ser eletricamente curta na frequência mais alta
significativa:
1 𝑣
ℒ< (11.15)
10 𝑓𝑚𝑎𝑥
onde 𝑣 é a velocidade de propagação na linha. Considerando que a frequência máxima
está relacionada com o tempo de subida do pulso por 𝑓𝑚𝑎𝑥 = 1/𝜏𝑟 tem-se que:
ℒ 1
𝑇𝐷 = < 𝜏 (11.16a)
𝑣 10 𝑟
ou
𝜏𝑟 > 10𝑇𝐷 (11.16𝑏)
Portanto, se o tempo de subida do pulso for maior do que 10 atrasos unidirecionais
da linha, esta e quaisquer descasamentos não devem degradar significativamente a forma
de onda da saída.

5. Referências Bibliográficas

PAUL, Clayton R. Eletromagnetismo para engenheiros: com aplicações a sistemas


digitais e interferência eletromagnética. Rio de Janeiro, RJ: LTC, 2006. Xiv, 379 p.

SADIKU, Matthew N. O. Elementos de eletromagnetismo. 3. ed. Porto Alegre: Bookman,


2004. viii, 687 p.

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