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O ensino exploratório

O ensino exploratório no âmbito da disciplina de matemática tem


sido apresentado como uma alternativa ao ensino diretivo ou expositivo
(associado à metáfora da transmissão de informação/conhecimento
matemático do professor para o aluno), em que se procura que os alunos
sejam trazidos para o centro da atividade matemática da sala de aula, por
meio da realização de tarefas matemáticas significativas (PONTE, 2005;
CANAVARRO, 2011). Esse tipo de ensino pode enquadrar-se em uma
perspectiva mais ampla de inquiry based teaching, ou seja, um ensino
baseado na inquirição (OLIVEIRA; CYRINO, 2013).
A ideia de inquirição está presente há muitas décadas no contexto da
educação, nomeadamente a partir das perspectivas de Dewey (2007) sobre
a aprendizagem, que têm uma forte expressão nas ideias reformistas do
currículo preconizadas pelo National Council of Teachers of Mathematics
(NCTM). Encontramos essa ideia de inquirição em diversos autores,
associada a um ensino de caráter investigativo, centrado no aluno, orientado
por questões, em que a comunicação, reflexão e colaboração têm um papel
muito importante (CHAPMAN; HEATER, 2010).
Na construção dos casos multimídia brasileiros, a exemplo dos
casos elaborados no contexto português, adotamos a designação de ensino
exploratório para abarcar uma perspectiva alargada de inquirição, que não
se restringe à realização de tarefas investigativas, e na qual aspectos ligados
à comunicação e interação social, entre professores e alunos, e entre alunos,
assumem especial relevância (OLIVEIRA; MENEZES; CANAVARRO,
2013). Para tal, apoiamo-nos na perspectiva teórica de Wells (2004),
que considera que o conhecimento é construído e reconstruído pelos
participantes em situações específicas, usando os recursos culturais ao seu
dispor, na medida em que trabalham para o cumprimento de objetivos
colaborativos que emergem do decurso da sua atividade. Trata-se de
uma perspectiva situada e dialógica do conhecimento que integra a ação
em cooperação com outros e a reflexão sobre o que foi aprendido nesse
processo. Wells (2004) deriva várias implicações para o ensino, das quais
destacamos: 1) o conhecimento deve ser construído a partir de problemas

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e questões que sejam significativos para os alunos, favorecendo a sua
compreensão; 2) é importante o desenvolvimento da autonomia individual
e capacidade para a ação, assim como estimular a interdependência e o
valor da colaboração; 3) o modo de conhecer apenas pode ser construído
a partir de experiências anteriores, ao lidar com problemas que surgem no
decurso de atividades práticas específicas; 4) a linguagem tem um papel
central, uma vez que medeia o conhecimento, encarado como um processo
de atribuição de significado, e é o principal meio da atividade de ensino e
aprendizagem.
Sistematizando, Wells (2004) considera que o processo de ensino e
aprendizagem deve ser encarado como um processo de inquirição que é
construído conjuntamente pelo professor e alunos de forma dialógica. O
ensino deve assim colocar a ênfase no aluno e nas condições que favoreçam
participar na atividade de inquirição, colaborativa e individualmente.
Nessa perspectiva, aquilo que aprendemos é o que fazemos, portanto, o que
fazemos depende das práticas que estão disponíveis nas comunidades em
que participamos. Consequentemente, as aprendizagens matemáticas dos
alunos são fortemente influenciadas pelas práticas de ensino, no contexto
em que ocorrem.
Um dos pontos destacados do ensino exploratório é a escolha de
tarefas que envolvam os alunos em atividade matemática significativa
e favoreçam o seu raciocínio e a compreensão dos conceitos e processos
matemáticos. As tarefas matemáticas propostas assumem particular
relevância, dado que é a partir delas que a atividade matemática do aluno se
desenvolve. Estas devem permitir “raciocinar matematicamente sobre ideias
importantes e atribuir sentido ao conhecimento matemático que surge a
partir da discussão coletiva dessas tarefas” (CANAVARRO; OLIVEIRA;
MENEZES, 2012, p. 256). As tarefas podem ser problemas, investigações ou
explorações (PONTE, 2005), mas apresentam diversos traços comuns: são
desafiadoras e partem de uma situação concreta; permitem que os alunos
se apoiem na sua experiência para realizá-las e, portanto, supõem o uso de
estratégias variadas, com diferentes níveis de sofisticação matemática; estão
ancoradas no currículo e visam à compreensão aprofundada de conceitos

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matemáticos que têm forte ligação com o conhecimento que os alunos vêm
a construir nas aulas.
O ensino exploratório exige, para além de tarefas matemáticas
adequadas, uma prática do professor que seja compatível com os aspectos
referidos sobre o processo de inquirição. No âmbito do projeto P3M, em
Portugal, foi construído um quadro sobre a prática de ensino exploratório
com base na literatura e na análise das práticas de professores portugueses
(CANAVARRO; OLIVEIRA; MENEZES, 2012), que tem subjacente
uma estrutura de aula em quatro fases (introdução da tarefa, realização
da tarefa, discussão da tarefa e sistematização das aprendizagens), nas
quais se identificam ações específicas do professor com dois objetivos
principais distintos, mas interrelacionados: (1) promover as aprendizagens
matemáticas dos alunos e (2) gerir os alunos, a turma e o funcionamento
da aula.
Sintetizando alguns aspectos importantes do papel do professor
nesse tipo de aula (CANAVARRO; OLIVEIRA; MENEZES, 2012), há a
destacar, relativo à fase de Introdução da tarefa, que o professor tem de
garantir a apropriação da tarefa pelos alunos e promover sua adesão, de
modo que a sua atividade matemática venha a se desenvolver, tendo ainda
de organizar a turma, fornecendo os recursos necessários para a realização
da tarefa. Na fase seguinte, em que os alunos realizam a tarefa em pequenos
grupos ou em pares, o professor tem de garantir o desenvolvimento da
tarefa, mas sem comprometer a autonomia dos alunos e sem diminuir o
desafio cognitivo da mesma (STEIN; SMITH, 1998). O professor precisa
dar também uma atenção particular à qualidade da interação entre os
alunos, assim como garantir que estes elaborem materiais adequados para
apresentação à turma. Nessa fase, é necessário ter uma boa percepção do
trabalho realizado pelos diferentes grupos, de modo a escolher e sequenciar
as resoluções a serem apresentadas em grande grupo, de acordo com
critérios que podem ser antecipadamente definidos. Seguidamente, ocorre
a discussão da tarefa em grande grupo, sendo apresentadas pelos alunos
as resoluções previamente selecionadas, e que é reconhecida na literatura
como um momento em que a gestão da aula é particularmente exigente
para o professor quando os alunos realizam tarefas desafiantes (CENGIZ;

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KLINE; GRANT, 2011; SCHERRER; STEIN, 2013). Torna-se necessário
criar e manter um ambiente apropriado à apresentação e discussão das
ideias matemáticas dos alunos, o que envolve paralelamente a promoção e
a gestão da sua participação, fazendo-os ouvir e intervir de forma adequada
e produtiva para o desenvolvimento do discurso matemático. A promoção
da qualidade matemática das apresentações dos alunos é fundamental para
que os objetivos da aula sejam atingidos, contribuindo para aumentar a
sua compreensão matemática. Finalmente, identifica-se o momento de
sistematização das principais aprendizagens que ocorreram no decurso
da atividade com a tarefa – em especial as que emergem da discussão das
resoluções dos alunos. Nesse momento, mais centrado no professor, podem
surgir novos conceitos, ou serem sintetizados e revistos outros conceitos
e procedimentos conhecidos, estabelecidas conexões com outros tópicos,
assim como com processos matemáticos transversais (CANAVARRO;
OLIVEIRA; MENEZES, 2012). Essa é uma fase fundamental para que a
atividade de construção do conhecimento dê lugar à compreensão das ideias
matemáticas, no sentido atribuído por Wells (2004).
O professor assume, nesse quadro de ensino exploratório, um papel
exigente e importante na promoção da aprendizagem do aluno, desde
logo na escolha e seleção das tarefas a propor, na estruturação da aula e
no apoio à atividade matemática dos alunos. O ensino exploratório, tal
como o concebemos, não implica a participação do aluno na construção
do currículo, criando as suas próprias questões matemáticas a serem
investigadas, mas assenta em uma perspectiva dialógica de aprendizagem,
em que o conhecimento é construído ativamente pelos alunos, em ambientes
criados e sustentados com forte intencionalidade por parte do professor.

Casos multimídia na formação de professores que


ensinam matemática

Trabalhar com casos multimídia na formação de professores que


ensinam matemática nos permite assumir essa formação como um campo

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