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TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GABINETE DE DESEMBARGADOR
DECISÃO:
legislativo. Aduz, ainda, que a concessão da cautelar geraria “dano irreparável inverso
contra a coletividade” (evento 16).
Posteriormente, a Câmara Municipal atravessa petição no evento 19, com
o objetivo de retificar informação por ela trazida no evento 16 e requerer prazo para
juntada de documento que entende importante.
No evento 20, a União dos Vereadores do Estado do Tocantins – UVET
vem aos autos para requerer sua admissão no feito na qualidade de amicus curiae.
Em sua petição, a UVET se apresenta como “órgão máximo de
representação dos Vereadores do Estado do Tocantins, que tem como objetivo a
defesa dos interesses da classe dos Vereadores de todos os municípios do Estado”, o
que lhe confere, segundo sua opinião, legitimidade para atuar nestes autos na
condição de amigo da corte.
No que pertine à pretensão autoral, anota a improcedência dessa
representação de inconstitucionalidade, apontando a ausência de interesse de agir
quanto à impugnação da Lei 359/92, pois esta teria sido revogada pela Lei
Complementar 468/94.
Em relação ao inciso XXXVI do art. 71 da Lei Orgânica do Município de
Palmas, sustenta sua constitucionalidade, repelindo ofensa à Lei 6.766/79. Argumenta
que a “competência para aprovação de loteamentos e desmembramentos é única e
exclusiva do Prefeito Municipal, o ato formal de aprovação é que se dará através de
lei”.
Afirma que o dispositivo em questão não promoveu a “transferência
expressa ou tácita da competência para aprovação de loteamentos do Executivo para o
Legislativo da Capital”, pois “em momento algum o Prefeito Municipal necessita de
autorização prévia da Câmara para aprovar loteamentos e, menos ainda, possui o
Legislativo da Capital competência para aprovar loteamento ou desmembramento”.
Por fim, pugna pelo indeferimento do pleito liminar.
É o breve relato.
Passo a decidir.
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Art. 48. Compete privativamente ao Tribunal de Justiça:
§ 1º. Compete ao Tribunal de Justiça, além de outras atribuições previstas nesta Constituição, processar e julgar, originariamente:
* I - a ação direta de inconstitucionalidade de Lei ou ato normativo estadual ou municipal, em face da Constituição do Estado,
legitimados para sua propositura as partes indicadas no art. 103 da Constituição Federal e seus equivalentes nos municípios, e
ações cautelares de qualquer natureza contra atos das autoridades que originariamente são jurisdicionadas ao Tribunal de Justiça;
2
Art. 7º. O Tribunal Pleno não tem área de especialização, competindo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente:
a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou municipal em face da Constituição do Estado;
3
Art. 57. O Conselho Seccional exerce e observa, no respectivo território, as competências, vedações e funções atribuídas ao
Conselho Federal, no que couber e no âmbito de sua competência material e territorial, e as normas gerais estabelecidas nesta lei,
no regulamento geral, no Código de Ética e Disciplina, e nos Provimentos.
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BIANCHI, Paolo. "Un'Amicizia Interessata: L'amicus curiae Davanti Alla Corte Suprema Degli Stati Uniti", in "Giurisprudenza
Costituzionale", Fasc. 6, nov/dez de 1995, Ano XI, Giuffré.
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Norma de repetição obrigatória da norma contida no art. 2º da Constituição Federal: “Art. 2º São Poderes da União,
independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”
6
BARROSO, Luis Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional
transformadora. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
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único poder, o poder estatal, de modo que seria mais apropriado falar-se em princípio
da separação das funções estatais.
Após Aristóteles identificar o exercício de três funções estatais distintas
exercidas por uma única pessoa, Montesquieu, principal sistematizador da teoria em
estudo, afirmou que essas funções distintas deveriam ser exercidas por órgãos
também diversos, autônomos e independentes. Cada função correspondendo a um
órgão específico, o que fragilizaria a base do absolutismo então reinante.
Formulou-se, pois, a teoria segundo a qual cada órgão estatal, ou Poder,
“exercia uma função típica, inerente à sua natureza, atuando independente e
autonomamente”7.
Embora a realidade do exercício das parcelas do poder estatal tenha
conduzido a um abrandamento da rigidez da teoria idealizada por Montesquieu, com a
previsão de exercício de duas funções atípicas – além da típica – por cada um dos
“poderes estatais”, certo é que o princípio da separação dos poderes ainda estabelece
uma divisão de competências que deve ser observada, a qual, na experiência
brasileira, encontra-se constitucionalmente estabelecida.
Como funções típicas do Poder Legislativo brasileiro, tem-se a de legislar
e a de exercer a fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial do Poder
Executivo. Já as funções típicas do Poder Executivo são o exercício de atos de chefia
de Estado, de chefia de governo e a prática de atos de administração. O Judiciário, por
sua vez, atua tipicamente ao exercer sua função jurisdicional, ou seja, ao julgar,
aplicando o direito ao caso concreto.
Como decorrência lógica da separação das funções e da expressa divisão
e atribuição de competências contida na Lei Maior se tem o princípio da
indelegabilidade das funções, que é a vedação à delegação de função de um órgão
(Poder) a outro, como forma de garantia da independência.
Sem dúvida, há exceções a essa indelegabilidade, como o exercício das
funções atípicas, notadamente a edição de lei delegada. Todavia, tal delegação deve
estar expressamente prevista na lei, de modo que, tão só por sua vontade, um órgão
7
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 11. ed. São Paulo: Editora Método, 2007. p. 324.
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não pode delegar sua função a outro, tampouco pode exercer aquela que foi confiada
constitucionalmente a outro.
Vistas essas linhas superficiais sobre o princípio da separação dos
poderes, passo a me debruçar sobre as normas impugnadas.
A primeira norma questionada é a Lei Ordinária Municipal nº 359 de 16 de
setembro de 1992.
Transcrevo a seguir o teor desse diploma legal, a fim de permitir uma
melhor compreensão sobre a questão, in verbis:
Código de Postura Municipal, que deverá ser promovida através de lei, consoante a
parte final do dispositivo.
Aliás, uma análise cronológica do advento dessas leis corrobora esse
entendimento.
Ora, a Lei nº 359 foi aprovada em 16 de setembro de 1992, aludindo à
necessidade de uma lei que instituísse o Código de Postura do Município, a qual
adveio logo após, em 04 de novembro daquele mesmo ano (Lei nº 371).
Por tais razões, não tenho como relevante a tese de inconstitucionalidade
da Lei 359/92, bem como não vislumbro risco da manutenção de sua eficácia, na
medida em que, a meu sentir, s.m.j., não é ela que submete o ato do Executivo ao crivo
posterior da Câmara Municipal.
Passo, agora, ao exame da segunda norma impugnada, qual seja o inciso
XXXVI do art. 71 da Lei Orgânica do Município de Palmas, acrescido pela Emenda nº
58/2011, pedindo vênia para transcrevê-lo a seguir:
8
Art. 100. Caberá ao Estado e aos Municípios formular e executar a política urbana, conforme diretrizes fixadas em lei, atendendo
ao pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade, assim como à garantia e ao bem-estar de seus habitantes.
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Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei,
tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.
§ 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento
básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.
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Art. 104. O plano diretor, instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana, é obrigatório para as cidades
com mais de vinte mil habitantes, submetido à apreciação e aprovação da Câmara Municipal.
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MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 6ª ed.. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 518.
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Como se sabe, a Prefeitura (sede do Poder Executivo Municipal) e a Câmara (sede do Poder Legislativo do Município) são
órgãos despersonalizados do Município, isto é, não têm personalidade jurídica, que é do Município. (CASTRO, José Nilo de.
Direito Municipal Positivo. 2ª ed.. Belo Horizonte: Del Rey, 1992)
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Municipal, o que acarretaria uma indevida ingerência do Poder Legislativo numa função
privativa do Poder Executivo.
Assim, por todas essas razões, penso que, de fato, a imposição da
exigência de edição de lei para aprovação de loteamentos e zoneamentos urbanos
implica ofensa ao princípio da separação dos poderes, pois condiciona o exercício de
uma função típica do Poder Executivo à chancela do Poder Legislativo, sem justificativa
para tanto, s.m.j.
Em caso em que se discutia a indevida ingerência do Poder Legislativo no
nas atribuições administrativas do Poder Executivo, o Supremo Tribunal Federal
assentou: