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O caso hipotético do “bonde desgovernado”, apresentado por Michael


Sandel em seu livro “Justiça - O que é fazer a coisa certa”, reflete diversos
dilemas morais, pois cada ação gera diversas consequências e nos faz refletir
sobre o que é “certo” e o que é “errado” em cada uma delas.
Em síntese, o caso traz a situação hipotética de um bonde que se
encontra fora de controle. No seu caminho, encontram-se cinco pessoas
trabalhando nos trilhos. Acontece que há outra opção: o condutor do bonde ao
apertar a alavanca, desvia deste caminho, salvando as cinco vidas, porém, no
caminho desviado, há também uma pessoa trabalhando, porém, somente uma
pessoa. Desta forma, surge o questionamento sobre o que seria o certo a
fazer, seguir no caminho das cinco pessoas ou desviar e atingir somente uma?
Assim, o autor traz outra situação hipotética a respeito dos dilemas
morais bastante interessante: o bonde desgovernado segue no trilho, e ainda
há cinco pessoas em seu caminho. Você estaria olhando a cena de cima de
uma ponte, quando percebe um homem gordo mais adiante, e se dá conta de
que ele poderia parar o bonde, se fosse atirado ponto abaixo, por causa de seu
peso. O autor pergunta o que você faria? Atiraria o homem ponte abaixo?
Percebemos assim que a história novamente se repete: sacrificar uma
pessoa para salvar cinco. A partir destes exemplos, percebemos que ambos os
casos envolvem uma escolha que será tomada exclusivamente pelo agente de
tirar uma vida inocente para salvar outras cinco vidas. Cabe somente ao agente
saber se, em suas convicções, há alguma diferença entre desviar o bonde para
a linha auxiliar ou empurrar uma pessoa para impedir a tragédia. Assim, abrem-
se dois tipos de raciocínios éticos, a saber, o consequencialista e o categórico.
O raciocínio moral consequencialista situa a moralidade nas
consequências de um ato no estado do mundo que resultará da ação praticada.
Assim, utilitarismo é uma forma de consequencialismo. Julga ações por suas
consequências. De acordo com David Hume e Jeremy Bentham, em outras
palavras, a ação do ser humano deve se reger de forma que promova o bem-
estar do maior número de pessoas possível. Ou seja, não importa o que você
faça, se sua ação trouxer consequências positivas para um número maior de
pessoas, você está no caminho certo. O certo a fazer depende da
consequência gerada. Esse raciocínio pode ser relacionado a atitude de
desviar o bonde para a linha auxiliar, visto que, neste caso, uma vida seria
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sacrificada para salvar cinco vidas, então o bem maior estaria preservado.
Aplicada ao Dilema do Bonde, é possível concluir que sacrificar uma pessoa
para salvar cinco é uma ação ética e tutelável pelo Direito. A ideia de uma
pessoa morta para salvar cinco parece mais aceitável pela sociedade.
Já o raciocínio moral categórico, de acordo com o filósofo Immanuel
Kant, o agir moralmente é agir em função de um dever, esse em consonância
com a lei moral, verdadeiro imperativo categórico que visa tratar as pessoas
como fins em si mesmas, pois somos dotados de escolhas, e não apenas seres
guiados pela natureza, visto que, categoricamente errado matar uma pessoa
inocente mesmo que em nome da salvação de cinco vidas.
Dito de outra forma, o ser humano não deveria ser usado jamais como
instrumento para um fim, objeto de uma vontade. O indivíduo, dotado de
dignidade pelo simples fato de existir, deve ser considerado um fim em si
mesmo e todos os atos devem ser praticados para que se atinja um benefício
distribuído comum entre todos. Nesse sentido, para identificar a eticidade de
um ato, seria necessário refletir se a sua universalização traria consequências
aceitáveis para o todo.
A aplicação da teoria de Kant ao dilema do bonde resultaria na inação e,
consequentemente, na morte de cinco pessoas. A partir do momento em que
se opta por salvá-las, a pessoa que morrerá estaria servindo como instrumento
para a salvação das demais. Dado que o ser humano não pode ser usado
como objeto para um fim, a escolha não seria ética e poderia ser combatida
pelo Direito.
Sob ambas as teorias, porém, nota-se que a informação sobre os fatos é
um componente essencial para a escolha. Seja qual for a decisão, a ética
estará ao lado daquele que decide baseado nas informações que dispõe.

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