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ANÁLISE DO DILEMA 58
Considerando outro aspecto dessa questão está a validade moral da ação da atendente.
Não é claro se aquilo que ela pensa fazer seria uma ação por dever, mas universalizar esta
ação traria alguns problemas de ordem relacional entre os humanos, visto que alguma
desconfiança de má conduta por parte de outrem pode virar justificativa para soluções
violentas de todas as pessoas. Ainda, mesmo que o homem esteja realizando uma ação imoral,
ele ainda possui a dignidade de um ser humano que precisa ser respeitada. Se levássemos esse
princípio da atendente até as últimas consequências, haveria uma forma de justiça que seria a
favor de lesar corporalmente os julgados, e em última análise, matá-los para impedir os
possíveis crimes que possam cometer. Porém, considerando o princípio da ação da moça, que
é um pensamento válido de resolver a questão, as respostas kantianas não são totalmente
conclusivas. Penso que num momento de desespero, tomada por uma determinada forte
emoção (que é um elemento chave no julgamento de ações), poderia atenuar-se a resolução
que a moça teve, onde a única forma que encontrou de impedir o ato foi ocasionar a alergia ao
homem.
A respeito daquilo que pode ser dito sobre o utilitarismo, vale a pena lembrar a
máxima desta teoria, a qual afirma que a ação deve trazer "a máxima felicidade dividida no
maior número de pessoas". Isso significa que qualquer ação, independente se for a do dilema
ou não, deve visão o maior bem-estar para o maior número de sujeitos. É isso que propõe a
ideia utilitarista. É importante ressaltar, também, que no começo do utilitarismo, com
Bentham, não havia muita preocupação quanto à qualidade dos prazeres proporcionados por
determinada escolha, mas sim pela quantidade; o teor qualitativo surge com a teoria de Mill.
Destarte, a lógica utilitarista busca sempre fazer um cálculo utilitário, visando fazer
uma previsão dos resultados a serem obtidos a partir de determinada ação. Tal cálculo seria
utilizado de forma a dar preferência sempre a maximizar o prazer e minimizar a dor, de forma
tanto qualitativa quanto quantitativa. Em relação ao dilema aqui analisado, se buscaria fazer
um cálculo das diversas possibilidades de escolhas da mulher, em busca de escolher a que
mais trouxesse bem-estar.
No final do dilema, surge uma discussão a respeito do que seria justo de ser feito. A
questão da justiça também é tematizada no pensamento utilitarista. Por um lado, há a noção de
utilitarismo de atos, onde a justiça é compatível com a utilidade, por outro, há a noção de
utilitarismo de regras, onde a justiça tem um teor mais formal, uma vez que está mais baseada
nos direitos, nas regras. No primeiro caso, a saber, no utilitarismo de atos, uma ação válida
seria a de colocar a comida no prato com amendoim, evitando que a doença do homem se
espalhe. No segundo caso, isto é, no utilitarismo de regras, talvez a ação mais viável fosse que
a atendente avisasse a polícia (ou alguma força competente que o valha), buscando evitar a
ação do homem.
Fazendo uma breve recapitulação, a fim de concluir, vale enfatizar que a teoria
utilitarista faria antes um cálculo de utilidade, visando o maior número de prazer a um maior
número de pessoas possível. Isso significa que a teoria utilitarista agiria no sentido de, ou
colocar o aperitivo no prato de amendoim, ou de ligar para a polícia. Em todos os casos, o
utilitarismo visaria tentar impedir as ações do homem com HIV, pois obstruir as ações deste
levaria uma maior felicidade a um maior número de sujeitos.
Bibliografia
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 1. ed. São Paulo: Abril Cultural (Coleção Os
Pensadores), 1973.
BENTHAN, J.; MILL, J. S. Os Pensadores. 1. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979.
COHEN, M. 101 dilemas éticos. [S.l.]: Alianza Editorial, 2003.
KANT, I. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Edições 70, 2019.