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º ano
Quando Kant propõe (...), enquanto princípio fundamental da moral, a lei «Age de modo que a tua
regra de conduta possa ser adotada como lei por todos os seres racionais», reconhece virtualmente
que o interesse coletivo da humanidade, ou, pelo menos, o interesse indiscriminado da humanidade,
tem de estar na mente do agente quando este determina conscienciosamente a moralidade do ato.
Caso contrário, Kant estaria [a] usar palavras vazias, pois nem sequer se pode defender
plausivelmente que mesmo uma regra de absoluto egoísmo não poderia ser adotada por todos os
seres racionais, isto é, que a natureza das coisas coloca um obstáculo insuperável à sua adoção. Para
dar algum significado ao princípio de Kant, o sentido a atribuir-lhe tem de ser o de que devemos
moldar a nossa conduta segundo uma regra que todos os seres racionais possam adotar com
benefício para o seu interesse coletivo.
Stuart Mill, Utilitarismo, Porto, Porto Editora, 2005.
A. as circunstâncias da ação.
B. o interesse da humanidade.
C. o imperativo categórico.
D. um imperativo hipotético.
1.3. Stuart Mill defende que uma ação tem valor moral:
1.4. Para Kant, a lei «Age de modo que a tua regra de conduta possa ser adotada como lei
por todos os seres racionais» significa que:
A. os seres racionais estão submetidos a leis objetivas.
B. as ações morais são avaliadas segundo as leis vigentes.
O princípio da felicidade pode, sem dúvida, fornecer máximas, mas nunca aquelas que serviriam de
leis da vontade (...). Podem certamente dar-se regras gerais, mas nunca regras universais, isto é,
regras que, em média, são corretas na maior parte das vezes, mas não regras que devem ser sempre
e necessariamente válidas (...). Este princípio não prescreve, pois, a todos os seres racionais as
mesmas regras práticas, embora estejam compreendidas sob um título comum, a saber, o de
felicidade.
Kant, Crítica da Razão Prática, Lisboa, Edições 70, 1989.
A. as máximas da ação.
B. as leis da vontade.
D. o princípio da felicidade.
2.3. Diferentemente de Kant, Stuart Mill defende que a ação ética visa:
A. hedonista, porque a felicidade e a qualidade dos prazeres são o objetivo da vida boa.
B. hedonista, porque a intensidade e a duração do prazer são o objetivo da vida boa.
3.
A emoção dizia-nos: “A minoria branca é o nosso inimigo, nunca devemos falar com eles.” Mas a
cabeça dizia-nos: “Se não falares com eles, o país vai explodir em chamas.” Tivemos de reconciliar
esse conflito. Falarmos com o inimigo foi o resultado desse domínio da mente sobre a emoção.
Nelson Mandela, citado em editorial do Suplemento Especial do Público, em 6 de dezembro de 2013, p. VIII.
Estas palavras de Nelson Mandela exemplificam aquilo que Kant designou por:
A. entendimento.
B. autonomia.
C. heteronomia.
D. deliberação.
7. De acordo com a ética de Kant, o motivo moralmente válido para honrar compromissos é:
A. o interesse dos envolvidos.
B. o benefício social.
C. o dever de o fazer.
D. a simpatia pelos envolvidos.
9. Kant consideraria que uma pessoa que, motivada unicamente pelo sentimento de pena,
ajudasse uma criança perdida na praia a encontrar os seus pais:
A. praticaria uma ação com valor moral.
B. agiria em conformidade com o dever.
C. praticaria uma ação imoral.
D. agiria por dever.
11. Segundo Kant, a máxima de que devemos diminuir os outros para ver reconhecida a
nossa superioridade não está de acordo com o imperativo categórico, tal como é
apresentado na fórmula da lei universal, porque:
A. a sua adoção por todos os agentes teria consequências negativas.
B. não tem em conta o interesse próprio de todos os agentes.
C. a sua adoção universal anularia o nosso sentimento de igualdade.
D. não é possível universalizá-la sem que ela se anule a si mesma.
12. De acordo com Kant, uma pessoa que, motivada pela obediência a um mandamento da
religião que professa, dá assistência a quem vive numa situação de pobreza:
A. não tem, neste caso, uma vontade autónoma.
B. age, neste caso, por respeito à lei moral.
C. age, neste caso, apenas por dever.
D. é uma pessoa que, neste caso, se autodetermina.
13. De acordo com Mill, geralmente temos a obrigação de dizer a verdade, porque:
A. a consequência de mentirmos é sentirmo-nos infelizes.
B. a vítima da mentira pode deixar de contribuir para o bem-estar social.
C. dizer a verdade decorre do princípio de que devemos ser felizes.
D. dizer a verdade tende a produzir efeitos positivos no saldo global de felicidade.
C. a boa vontade.
D. a justiça.
17. De acordo com a ética de Kant, temos a obrigação de respeitar os princípios seguintes:
– Nunca se deve violar contratos.
– Nunca se deve quebrar promessas.
Suponha que alguém prometeu fazer algo, não se apercebendo de que isso implicava
violar um contrato.
Que problema levantaria este caso à ética de Kant?
A. O primeiro princípio deverá ser desrespeitado, pois tem menos força do que o segundo.
B. O segundo princípio deverá ser desrespeitado, pois tem menos força do que o primeiro.
C. Os dois princípios deixam de ter importância moral, pois mostram não ser universalizáveis.
Se a Dona Maria dispõe de 50 000 euros, deve usá-los para apoiar um programa de vacinação de
5000 crianças de um país pobre, em vez de pagar um curso de teatro em Londres à sua neta, que
deseja ser atriz.
B. nos obrigam a tratar os outros como meros meios, e não como fins em si, contrariando as
convicções morais comuns.
C. levam a fazer algo cujos resultados somos incapazes de prever.
20. Imagine que o Luís precisa urgentemente de medicamentos e que a única maneira de os
conseguir é pedir dinheiro emprestado a um amigo rico, sem ter a intenção de lho
pagar. Neste caso, o Luís decidiu adotar a máxima «faz promessas enganadoras quando
não há outra forma de resolver os teus problemas pessoais».
Esta máxima pode ser usada para fazer uma crítica à ética kantiana, dado ser razoável
argumentar que a máxima:
A. não é imoral, ainda que não seja racional querer universalizá-la.
D. são superiores os prazeres preferidos por quem tem competência para os apreciar.
22. Considere os seguintes enunciados sobre a comparação entre as teorias éticas de Kant
e de Stuart Mill.
As teorias:
1. apresentam critérios de moralidade distintos.
2. defendem que o valor moral da ação é relativo à situação ou às circunstâncias.
3. reconhecem que as regras da moral comum se devem subordinar a um princípio ético fundamental.
4. reconhecem que a felicidade é o fim último das ações humanas.
Outras questões
1. Alguém decide doar anonimamente toda a sua fortuna à UNICEF, porque encontra
grande alegria no alívio do sofrimento das crianças dos países pobres.
1.1. Enuncie o princípio que, do ponto de vista utilitarista, permite justificar a correção moral
da ação descrita.
Mostra compreensão do princípio fundamental do utilitarismo: uma ação é moralmente correta
se realiza algo que promove a maior felicidade do maior número de pessoas OU o valor moral
de uma ação depende das suas consequências.
1.2. De acordo com Kant, a ação dessa pessoa é moralmente boa? Justifique.
– Não, porque é uma ação cujo motivo determinante é a satisfação de uma inclinação
(a alegria no alívio do sofrimento das crianças) e não o cumprimento do dever.
– O valor moral da ação depende da intenção do agente. Uma ação é moralmente boa apenas
se o agente a praticou por dever, ou seja, tendo como única intenção a obrigação de
respeitar a lei moral.
É indiscutível que um ser cujas capacidades de prazer sejam baixas tem uma probabilidade maior de
as satisfazer completamente e que um ser amplamente dotado sentirá sempre que, da forma como o
mundo é constituído, qualquer felicidade que possa esperar será imperfeita.
(...)
Tenho de voltar a repetir o que os críticos do utilitarismo raramente têm a justiça de reconhecer: que a
felicidade que constitui o padrão utilitarista daquilo que está certo na conduta não é a felicidade do
próprio agente, mas a de todos os envolvidos.
(...)
O motivo é irrelevante para a moralidade da ação. Aquele que salva um semelhante de se afogar faz o
que está moralmente certo, seja o seu motivo o dever, seja a esperança de ser pago pelo seu
incómodo; aquele que trai um amigo que confia em si é culpado de um crime, mesmo que o seu
objetivo seja servir outro amigo relativamente ao qual tem maiores obrigações.
Stuart Mill, Utilitarismo, trad. port., Porto, Porto Editora, 2005, pp. 51-59 (adaptado).
Ficaria eu satisfeito de ver a minha máxima (de me tirar de apuros por meio de uma promessa não
verdadeira) tomar o valor de lei universal (tanto para mim como para os outros)? E poderia eu dizer a
mim mesmo: – Toda a gente pode fazer uma promessa mentirosa quando se acha numa dificuldade
de que não pode sair de outra maneira? Em breve, reconheço que posso em verdade querer a
mentira, mas que não posso querer uma lei universal de mentir; pois, segundo uma tal lei, não poderia
propriamente haver já promessa alguma (...). Por conseguinte, a minha máxima, uma vez arvorada em
lei universal, destruir-se-ia a si mesma necessariamente.
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Coimbra, Atlântida, 1960.
3.1. Explique, a partir do exemplo do texto, por que razão o ato de mentir nunca é moralmente
permissível, segundo Kant.
A resposta integra os seguintes aspetos, ou outros considerados relevantes e adequados:
– identificação das condições de moralidade de um ato, segundo Kant;
– articulação entre máxima, universalidade e lei moral;
– aplicação da lei moral kantiana ao exemplo do texto.
3.2. Compare o papel da intenção do agente na ética de Kant com o papel da intenção do
agente na ética de Stuart Mill.
A resposta integra os seguintes aspetos, ou outros considerados relevantes e adequados:
– distinção do critério de avaliação moral das ações em Kant – a intenção do agente – e em
Stuart Mill – as consequências das ações;
– clarificação do conceito de «dever» e/ou de «imperativo categórico» na ética kantiana e do
«princípio da maior felicidade» em Stuart Mill.
4.1. A partir do texto, mostre por que razão, para Kant, a ação com valor moral se fundamenta
no imperativo categórico e não em imperativos hipotéticos.
Na sua resposta, integre, de forma pertinente, informação do texto.
A resposta integra os seguintes aspetos, ou outros considerados relevantes e adequados.
– Caracterização da ação moral em Kant: as ações com valor moral são feitas por dever, ou
seja, nelas o cumprimento do dever é um fim em si mesmo.
– Distinção entre imperativo categórico e imperativo hipotético: o imperativo categórico
envolve uma obrigação absoluta ou incondicional e o imperativo hipotético é uma obrigação
condicional.
– Identificação do imperativo categórico como imperativo da moralidade: o imperativo
categórico exige que se cumpra o dever por dever (por simples respeito pela lei moral).
4.2. Será que há deveres morais absolutos?
Compare as respostas de Kant e de Stuart Mill a esta questão.
A resposta integra os seguintes aspetos, ou outros considerados relevantes e adequados.
– Caracterização do conceito de dever moral absoluto: os deveres morais absolutos são
obrigações que devem ser sempre cumpridas.
– Explicitação do imperativo categórico como obrigação moral absoluta, em Kant: o imperativo
categórico exige conformidade da máxima da ação com a universalidade da lei; não admite
situações em que seja aceitável violar a lei moral, impondo, portanto, deveres morais absolutos.
– Explicitação do princípio de utilidade, em Stuart Mill: o princípio de utilidade exige que das
nossas ações resulte a maior felicidade possível para o maior número possível de pessoas;
admite situações em que violar uma regra é aceitável, pelo que não há deveres morais
absolutos, exceto a própria procura da felicidade.
Não existe sistema moral algum no qual não ocorram casos inequívocos de obrigações em conflito.
Estas são as verdadeiras dificuldades, os momentos intrincados na teoria ética e na orientação
conscienciosa da conduta pessoal. São ultrapassados, na prática, com maior ou menor sucesso,
segundo o intelecto e a virtude dos indivíduos; mas dificilmente pode alegar-se que alguém está
menos qualificado para lidar com eles por possuir um padrão último para o qual podem ser remetidos
os direitos e os deveres em conflito. Se a utilidade é a fonte última das obrigações morais, pode ser
invocada para decidir entre elas quando as suas exigências são incompatíveis. Embora a aplicação do
padrão possa ser difícil, é melhor do que não ter padrão algum (...).
Stuart Mill, Utilitarismo, Lisboa, Gradiva, 2005 (adaptado).
5.1. Stuart Mill afirma que «a utilidade é a fonte última das obrigações morais».
Esclareça o conceito de «utilidade», integrando-o na ética de Stuart Mill.
Não existe sistema moral algum no qual não ocorram casos inequívocos de obrigações em conflito.
O valor moral da ação não reside, portanto, no efeito que dela se espera (...). Nada senão a
representação da lei em si mesma, que em verdade só no ser racional se realiza, enquanto é ela, e
não o esperado efeito, que determina a vontade, pode constituir o bem excelente a que chamamos
moral, o qual se encontra já presente na própria pessoa que age segundo esta lei, mas não se deve
esperar somente do efeito da ação.
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 1988, pp. 31-32 (adaptado).
Compare, a partir do texto, a perspetiva de Kant com a de Mill relativamente àquilo que
determina o valor moral da ação.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Comparação das perspetivas de Kant e de Mill:
– na perspetiva de Kant, as consequências são irrelevantes para determinar o valor moral da
ação; na perspetiva de Mill, as consequências determinam o valor moral da ação;
– na perspetiva de Kant, uma ação é boa dependendo da intenção do agente; na perspetiva
de Mill, uma ação é boa se é útil;
– na perspetiva de Kant, uma ação é boa quando é feita por respeito à lei moral; na perspetiva
de Mill, uma ação é boa se produz a maior felicidade para o maior número.
É, na verdade, conforme ao dever que o merceeiro não suba os preços ao comprador inexperiente, e,
quando o movimento do negócio é grande, o comerciante esperto também não faz semelhante coisa,
mas mantém um preço fixo geral para toda a gente, de forma que uma criança pode comprar no seu
estabelecimento tão bem como qualquer outra pessoa. É-se, pois, servido honradamente; mas isso
ainda não é bastante para acreditar que o comerciante assim proceda por dever e por princípios de
honradez; o seu interesse assim o exige (...).
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 1988, p. 27 (adaptado).
7.1. Distinga, partindo do exemplo dado por Kant, agir por dever de agir em conformidade
com o dever.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Distinção, recorrendo ao exemplo do texto, entre agir por dever e agir em conformidade com o
dever:
– a ação em conformidade com o dever pode ser motivada por inclinações, como o interesse
próprio / o comerciante agiria em conformidade com o dever se, ao fixar um preço igual para
todos, fosse motivado pelo seu interesse em manter a clientela;
– a ação realizada por dever é exclusivamente motivada pelo dever / o comerciante agiria por
dever se fosse motivado a fixar um preço igual para todos apenas pelo dever de ser
honesto;
– a ação em conformidade com o dever, apesar de não ser contrária ao dever, não tem valor
moral;
– a ação realizada por dever é a única moralmente boa.
7.2. Explique, de acordo com Kant, a relação entre autonomia e boa vontade.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Explicação da relação entre autonomia e boa vontade:
– a vontade é autónoma quando se autodetermina (racionalmente);
– a vontade é autodeterminada quando não depende de qualquer princípio que lhe seja
exterior / de inclinações, mas apenas (do uso incondicionado) da razão;
– só uma vontade autónoma pode ser boa.
É perfeitamente compatível com o princípio de utilidade reconhecer que alguns tipos de prazer são
mais desejáveis do que outros (...).
É melhor ser um ser humano insatisfeito do que um porco satisfeito; é melhor ser um Sócrates
insatisfeito do que um tolo satisfeito. E se o tolo ou o porco têm uma opinião diferente, é porque só
conhecem o seu próprio lado da questão. A outra parte da comparação conhece ambos os lados.
Stuart Mill, Utilitarismo, Lisboa, Gradiva, 2005, pp. 52-54 (adaptado).
Pelo que diz respeito ao dever necessário ou estrito para com os outros, aquele que tem a intenção de
fazer a outrem uma promessa mentirosa reconhecerá imediatamente que quer servir-se de outro
homem simplesmente como meio, sem que este último contenha, ao mesmo tempo, o fim em si. Pois
aquele que eu quero utilizar para os meus intuitos por meio de uma tal promessa não pode, de modo
algum, concordar com a minha maneira de proceder a seu respeito, não pode, portanto, conter em si
mesmo o fim desta ação.
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 2009, p. 74.
Justifique, a partir do texto, que fazer falsas promessas é imoral, segundo Kant.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Justificação da imoralidade das falsas promessas, segundo Kant:
– fazer uma promessa com a intenção de não a cumprir é servir-se do outro simplesmente
como um meio / tendo em vista apenas a satisfação dos interesses ou das inclinações do
agente;
– tratar os outros apenas como meios, não respeitando a sua qualidade de seres racionais, é
desrespeitar a sua dignidade como pessoas;
– quem faz uma falsa promessa viola o dever absoluto de respeitar a humanidade, tanto na
sua pessoa como na dos outros;
– quem faz uma falsa promessa segue uma máxima que não é universalizável.
10. Haverá alguma circunstância em que seja moralmente aceitável matar uma pessoa
inocente, sem o seu consentimento, para salvar a vida de outras cinco pessoas?
Apresente as respostas que Kant e que Mill dariam à questão anterior, comparando-as.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Comparação das respostas de Kant e de Mill:
– Kant diria que em nenhuma circunstância é moralmente aceitável matar uma pessoa
inocente, sem o seu consentimento, para salvar a vida de outras cinco pessoas, ao passo
que Mill diria que, numa circunstância excecional, é moralmente aceitável sacrificar a vida
de uma pessoa para salvar a vida de outras cinco pessoas;
– Kant apresentaria o imperativo categórico para justificar a sua opção, enquanto Mill
justificaria a opção contrária por meio do princípio de utilidade:
• de acordo com Kant, a máxima de matar alguém para salvar um maior número de
pessoas viola a fórmula da lei universal, pois não podemos querer que tal máxima se
torne uma lei universal (OU a fórmula da humanidade do imperativo categórico estabelece
o dever de nunca usar a humanidade, seja na sua pessoa ou na pessoa de qualquer
outro, apenas como meio, mas sempre como um fim em si mesma; por essa razão, matar
uma pessoa, sem o seu consentimento, seria usar essa pessoa apenas como meio, não
respeitando a sua dignidade de ser um fim em si mesma em todas as circunstâncias);
• o princípio de utilidade, defendido por Mill, estabelece o dever de maximizar a felicidade
geral; assim, havendo apenas a opção de matar uma pessoa para salvar outras cinco e a
opção de não matar uma pessoa deixando outras cinco morrerem, o princípio de utilidade
dita como moralmente certa a opção de matar uma pessoa para salvar cinco pessoas,
dado ser esta a opção que promove um total de felicidade maior.
Compete à ética dizer-nos quais são os nossos deveres, ou por meio de que teste podemos conhecê-
-los, mas nenhum sistema de ética exige que o único motivo do que fazemos seja o sentimento do
dever; pelo contrário, noventa e nove por cento de todas as nossas ações são realizadas por outros
motivos – e bem realizadas, se a regra do dever não as condenar. (...) O motivo, embora seja muito
relevante para o valor do agente, é irrelevante para a moralidade da ação. Aquele que salva um
semelhante de se afogar faz o que está moralmente certo, seja o seu motivo o dever, seja a
esperança de ser pago pelo incómodo; aquele que trai um amigo que confia em si é culpado de um
crime, mesmo que o seu objetivo seja servir outro amigo relativamente ao qual tem maiores
obrigações.
Stuart Mill, Utilitarismo, Porto, Porto Editora, 2005, pp. 58-59 (adaptado).
está moralmente certo, seja o seu motivo o dever, seja a esperança de ser pago pelo
incómodo») (ou «aquele que trai um amigo que confia em si é culpado de um crime, mesmo
que o seu objetivo seja servir outro amigo relativamente ao qual tem maiores obrigações»).
12.2. No texto, lê-se que «Compete à ética dizer-nos quais são os nossos deveres, ou por
meio de que teste podemos conhecê-los». Segundo Kant, esse teste é o do imperativo
categórico.
Explique como funciona o teste proposto por Kant. Na sua resposta, recorra a um
exemplo.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Explicação do funcionamento do teste:
– o imperativo categórico ordena «Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao
mesmo tempo querer que ela se torne lei universal»;
– segundo Kant, podemos derivar todos os nossos deveres deste imperativo;
– quando nos preparamos para agir, devemos perguntar a nós próprios qual é a máxima que
determina a nossa ação e se podemos querer sem contradição que essa máxima se
converta em lei universal (ou se podemos querer sem contradição que todos sejam
determinados por ela);
– se não podemos, a ação é contrária ao dever e devemos abster-nos de a realizar.
Apresentação de um exemplo:
– o João precisa de dinheiro e admite pedi-lo a um amigo, prometendo pagar-lho no mês
seguinte, embora saiba que não o fará; se o fizesse, o João estaria a seguir a máxima
segundo a qual se pode fazer uma promessa falsa para resolver problemas; o João não
pode querer que essa máxima se torne uma lei universal, pois uma tal lei destruiria a
possibilidade de haver promessas; consequentemente, se fizer uma promessa falsa, o João
age contra o dever.
Que outra coisa pode ser, pois, a liberdade da vontade senão autonomia, isto é, a propriedade da
vontade de ser lei para si mesma? (...) Vontade livre e vontade submetida a leis morais são uma e a
mesma coisa.
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 1988, p. 94 (adaptado).
Explique por que razão, segundo Kant, «vontade livre e vontade submetida a leis morais
são uma e a mesma coisa».
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Explicação, de acordo com Kant, da razão pela qual «vontade livre e vontade submetida a leis
morais são uma e a mesma coisa»:
– uma vontade livre é uma vontade autónoma, e a autonomia consiste em não se deixar
determinar por algo exterior a si, como os costumes, as leis (dos Estados), as religiões ou as
inclinações naturais (instintos, emoções, desejos ou interesses pessoais);
– a vontade de um ser racional só é livre ou autónoma se o princípio que a determina for, ele
próprio, racional, ou seja, se esse princípio for a lei moral;
– a liberdade da vontade consiste na submissão a leis morais que nós próprios, enquanto
seres racionais, estabelecemos.
14. Será que, de acordo com a ética utilitarista de Mill, quando calculamos as
consequências dos nossos atos, temos a obrigação de dar prioridade aos nossos
familiares, amigos e vizinhos mais próximos? Porquê?
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Apresentação da resposta:
– de acordo com a ética utilitarista de Mill, quando calculamos as consequências dos nossos
atos, não temos a obrigação de dar prioridade aos nossos familiares, amigos e vizinhos
mais próximos (mais do que isso: temos a obrigação de não dar prioridade aos nossos
familiares, amigos e vizinhos mais próximos).
Justificação da resposta:
– o cálculo das consequências dos nossos atos subordina-se ao princípio de utilidade, que
ordena a maximização da felicidade, ou seja, que obriga a agir de modo a obter o maior
saldo total de felicidade;
– no cálculo da felicidade, que deve ser imparcial, a felicidade de cada um dos envolvidos
conta o mesmo (OU como apenas importa o saldo global de felicidade decorrente da ação,
não é relevante se é a felicidade de uma pessoa que nos é próxima ou a de qualquer outra
pessoa afetada pela nossa ação que (mais) contribui para esse saldo).
Numa associação industrial cooperativa, será justo que o talento e a perícia deem direito a uma
remuneração superior? Os que respondem negativamente defendem que aqueles que fazem o melhor
que podem merecem ser pagos da mesma maneira, e que seria injusto colocá-los numa posição de
inferioridade por algo de que não têm culpa. (...) A favor da perspetiva contrária, alega-se que a
sociedade recebe mais do trabalhador mais eficiente, e que, como os seus serviços são mais úteis, a
sociedade lhe deve uma maior compensação. (...) Como escolher entre estes apelos a princípios de
justiça rivais? Neste caso, a justiça tem dois lados, sendo impossível harmonizá-los, e os dois
disputadores escolheram lados opostos – um olha para aquilo que é justo que o indivíduo receba; o
outro, para aquilo que é justo que a comunidade lhe dê. Cada uma destas posições é, do ponto de
vista de cada disputador, incontestável, e qualquer opção por uma delas (...) tem de ser
completamente arbitrária. Só a utilidade social pode decidir a prioridade.
Stuart Mill, Utilitarismo, Porto, Porto Editora, 2005, pp. 98-99 (adaptado).
15.1. Explique o princípio geral, indicado por Mill, que permite resolver de forma não arbitrária
conflitos entre princípios rivais, como o exemplificado no texto.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Explicação do princípio geral, indicado por Mill, que permite resolver de forma não arbitrária
conflitos entre princípios rivais, como o exemplificado no texto:
– só a «utilidade social» permite decidir qual dos princípios de justiça em conflito tem
prioridade (se o princípio segundo o qual «aqueles que fazem o melhor que podem
merecem ser pagos da mesma maneira», ou se o princípio segundo o qual ao «trabalhador
mais eficiente (...) a sociedade (...) deve uma maior compensação»);
– o princípio da utilidade determina que se deve promover sempre a maximização da
felicidade;
– de acordo com o princípio da utilidade, tem prioridade o princípio de justiça que, numa dada
circunstância, maximiza (de forma imparcial) a felicidade geral.
Ser caritativo quando se pode sê-lo é um dever, e há, além disso, muitas almas de disposição tão
compassiva que, mesmo sem nenhum outro motivo de vaidade ou interesse pessoal, acham íntimo
prazer em espalhar alegria à sua volta e se podem alegrar com o contentamento dos outros, enquanto
este é obra sua. Eu afirmo, porém, que, neste caso, uma ação deste tipo, ainda que seja conforme ao
dever, ainda que seja amável, não tem qualquer verdadeiro valor moral (...).
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 1988, p. 28 (adaptado).
Por que razão Kant afirma que o tipo de ação descrito no texto anterior não tem valor
moral?
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Apresentação da razão pela qual o tipo de ação descrito não tem valor moral:
– a ação caritativa descrita resulta de uma disposição compassiva (de um sentimento de
compaixão), e é motivada pelo prazer que dela retira quem a pratica, em virtude do
contentamento que proporciona aos outros;
– de modo a ter valor moral, a ação descrita teria de ser determinada pelo dever / a ação
descrita teria de ter como motivo o respeito pelo dever;
– o que distingue uma ação por dever de uma ação meramente conforme ao dever, como é o
caso desta ação (caritativa), é o motivo ou a intenção do agente;
– por resultar de uma disposição/inclinação, a ação caritativa descrita, ainda que seja
conforme ao dever, não foi feita por dever, o que a impede de ter valor moral.
Qual das duas programações referidas seria adotada por um defensor da ética de Mill?
Justifique.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros equivalentes.
Apresentação da solução que um defensor da ética de Mill adotaria:
– os automóveis autónomos devem ser programados para, em caso de acidente iminente,
darem prioridade à minimização do número total de vítimas.
Justificação da solução apresentada:
– o princípio ético defendido por Mill é o princípio da maior felicidade;
– de acordo com o princípio da maior felicidade, temos o dever de promover imparcialmente a
felicidade geral;
– no caso em questão, promover imparcialmente a felicidade geral implica optar pela solução
que minimiza o número total de vítimas, atribuindo igual importância aos passageiros do
automóvel autónomo e a todas as outras pessoas envolvidas no acidente.
O utilitarismo exige que o agente seja tão estritamente imparcial entre a sua própria felicidade e a dos
outros como um espectador desinteressado e benevolente.
Stuart Mill, Utilitarismo, Lisboa, Gradiva, 2005, pp. 63-64.
Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro,
sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio.
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 1988, p. 69.
Uma pessoa, por uma série de desgraças, chegou ao desespero (...). A sua máxima (...) é a seguinte:
Por amor de mim mesmo, admito como princípio que, se a vida, prolongando-se, me ameaça mais
com desgraças do que me promete alegrias, devo encurtá-la. (...) Vê-se então (...) que uma natureza
cuja lei fosse destruir a vida em virtude do mesmo sentimento cujo objetivo é suscitar a sua
conservação se contradiria a si mesma.
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 1986, p. 63.
21.1. Explique como Kant, recorrendo à fórmula da lei universal do imperativo categórico,
condena o suicídio.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Explicação do modo como Kant condena o suicídio recorrendo à fórmula da lei universal do
imperativo categórico:
‒ de acordo com o imperativo categórico, para uma ação ser moralmente boa, o agente tem
de poder querer que a máxima que a determina seja uma lei universal (da natureza);
‒ se a máxima que determina o agente, no caso considerado, fosse uma lei universal (da
natureza), haveria uma contradição na natureza, pois evitar o que é desagradável e nos
ameaça determinaria, simultaneamente, pôr fim à vida/«destruir a vida» e conservá-la;
‒ assim, a máxima que determina o suicídio não poderia ser uma lei universal (da natureza).
21.2. Segundo Kant, uma pessoa que, nas circunstâncias descritas no texto, optasse pelo
suicídio agiria de modo autónomo ou heterónomo? Justifique a sua resposta.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Identificação do modo de ação em causa:
‒ a pessoa agiria de modo heterónomo.
Justificação:
‒ a vontade da pessoa que optasse pelo suicídio seria determinada por uma inclinação («o
amor de si mesmo» / o desejo de se subtrair aos aspetos desagradáveis ou insuportáveis da
vida / o amor-próprio);
‒ por conseguinte, a sua vontade não seria determinada unicamente pela razão (que proíbe o
suicídio).
Aquele que diz uma mentira, por muito bem-intencionado que possa ser, tem de ser responsável pelas
suas consequências (...), ainda que estas possam ter sido imprevisíveis; pois a veracidade é um dever
que tem de ser entendido como a base de todos os deveres decorrentes de um contrato, cuja lei se
torna incerta e inútil caso se admita a menor exceção.
Por conseguinte, ser verídico (honesto) em todas as declarações é um mandamento sagrado da razão
(...).
Kant, «Sobre um Suposto Direito de Mentir por Amor à Humanidade», in A Paz Perpétua e Outros Opúsculos, Lisboa, Edições 70, 1989, pp. 175-
-176 (adaptado).
Todos os moralistas reconhecem que mesmo a regra de dizer a verdade, sagrada como é, admite a
possibilidade de exceções, verificando-se a principal quando ocultar um facto (por exemplo, ocultar
informação a um malfeitor ou más notícias a uma pessoa muito doente) iria salvar uma pessoa
(especialmente uma pessoa que não nós próprios) de um mal maior e imerecido, e quando só é
possível realizar a ocultação negando a verdade.
Stuart Mill, Utilitarismo, Porto, Porto Editora, 2005, p. 63 (adaptado).
Quando, por exemplo, dizemos «Não deves fazer promessas enganadoras», admitimos que a
necessidade desta abstenção não é (...) um conselho para evitar qualquer outro mal – como se
disséssemos «Não deves fazer promessas mentirosas para não perderes o crédito quando se
descobrir o teu procedimento» – mas que fazer promessas enganadoras é uma ação que tem de ser
considerada como má em si mesma (...).
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 2009, p. 59 (adaptado).
24. Talvez roubar se justifique em certas circunstâncias. Por exemplo, no caso de um país
devastado pela guerra, uma pessoa em condições de extrema necessidade pode ter de
se apropriar de alimentos ou de agasalhos que não lhe pertencem para ajudar os seus
filhos a sobreviverem.
Mostre como o exemplo dado representa um desafio para a moral kantiana.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Explicação do modo como o exemplo dado representa um desafio para a moral kantiana:
– a moral kantiana prescreve regras absolutas, como não matar, não roubar ou não mentir;
– porém, parece haver casos em que essas regras absolutas entram em conflito, sem que
seja possível decidir qual prevalece;
– no caso apresentado, a regra que manda ajudar os outros sempre que possível
(encontrando alimentos ou agasalhos que lhes permitam sobreviver) pode ser considerada
tão importante como a regra que proíbe o roubo.
A Maria sempre gostou muito de crianças e chegou a pensar em trabalhar como voluntária numa
associação de apoio a crianças doentes, mas acabou por concluir que seria muito difícil conciliar esse
trabalho com os estudos.
Entretanto, ela soube que o voluntariado era muito valorizado nas entrevistas de emprego. Por essa
razão, decidiu contactar uma conhecida associação de apoio a crianças doentes e conseguiu ser
admitida, passando a conciliar o trabalho de voluntariado com os estudos. Pela sua dedicação e pela
sua simpatia, a Maria destacou-se desde o primeiro momento como uma das voluntárias favoritas das
crianças e das famílias.
O apoio dado pela Maria às crianças doentes e às suas famílias tem valor moral?
Na sua resposta, deve:
‒ clarificar o problema filosófico inerente à questão formulada;
‒ apresentar inequivocamente a sua posição;
‒ argumentar a favor da sua posição.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Clarificação do problema:
– consideramos, geralmente, que os motivos são relevantes para o valor moral das ações,
mas também consideramos, geralmente, que as consequências das ações são relevantes
para o seu valor moral;
– daí decorre o problema de saber o que determina o valor moral das ações.
Apresentação inequívoca da posição defendida.
O José é um bom aluno, mas sente-se inseguro quando tem de utilizar fórmulas memorizadas. Ao ser
informado de que o enunciado do teste final de Física não iria incluir uma lista com as fórmulas,
decidiu levar uma pequena cábula com as fórmulas mais complexas, para o caso de se esquecer de
alguma.
Ainda assim, o José acabou por não usar a cábula, errando algumas fórmulas, pois teve receio de ser
apanhado a copiar.
Será que, de acordo com Kant, a decisão do José tem valor moral? Justifique a sua
resposta.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Indicação de que, de acordo com Kant, a decisão não tem valor moral:
‒ de acordo com Kant, a decisão do José não tem valor moral.
Justificação:
‒ ao levar a cábula para o teste final de Física, o José violou o dever de não levar cábulas
para testes (OU o dever de não tentar obter vantagens indevidas) OU o José agiu contra o
dever;
‒ é certo que o José acabou por não usar a cábula que levou para o teste; contudo, não foi o
dever (de não usar cábulas nos testes OU de não tentar obter vantagens indevidas) que o
motivou, mas o receio de ser apanhado a copiar OU contudo, tendo sido motivado pelo
receio (uma inclinação resultante do amor de si), o José agiu em conformidade com o dever,
e não por dever.
Um soldado encontra-se na frente de batalha. Sabe que, caso fuja, conseguirá salvar-se, mas porá em
causa a operação militar, destinada a proteger uma aldeia onde se abrigam centenas de civis
inocentes. Ainda assim, ele acabou por fugir.
Será que Kant e Mill divergiriam na avaliação moral do ato do soldado? Justifique.
Indicação do solicitado:
‒ Kant e Mill não divergiriam na avaliação moral do ato do soldado / ambos condenariam o ato
do soldado.
Justificação:
‒ de acordo com Kant, o ato do soldado constitui uma violação do dever (absoluto) de
proteger a vida de pessoas inocentes e, por isso, é imoral/condenável; o ato do soldado
resulta de uma cedência às inclinações, como o amor de si/o receio de perder a sua vida
(tratando-se o soldado a si mesmo, desse modo, apenas como meio);
‒ de acordo com Mill, o ato do soldado diminui o saldo de felicidade, que previsivelmente será
menor do que seria caso o soldado cumprisse a sua obrigação de colaborar na operação; o
ato do soldado resulta de, erradamente, ele atribuir mais importância à sua felicidade
pessoal do que à felicidade agregada.
Texto A
Conseguimos, portanto, mostrar, pelo menos, que, se o dever é um conceito que deve ter um
significado e conter uma verdadeira legislação para as nossas ações, esta legislação só se pode
exprimir em imperativos categóricos, mas de forma alguma em imperativos hipotéticos.
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Coimbra, Atlântida, 1960, pp. 61-62.
Texto B
O objeto da ética é dizer-nos quais são os nossos deveres, ou por que meios podemos conhecê-los;
mas nenhum sistema de ética exige que o único motivo de tudo o que façamos seja um sentimento de
dever. (...) O motivo nada tem a ver com a moralidade da ação, embora tenha muito a ver com o valor
do agente. Quem salva um semelhante de se afogar faz o que está moralmente correto, quer o seu
motivo seja o dever, ou a esperança de ser pago pelo seu incómodo.
Stuart Mill, Utilitarismo, Lisboa, Gradiva, 2005, p. 65.
A boa vontade não é boa por aquilo que promove ou realiza, pela aptidão para alcançar qualquer
finalidade proposta, mas tão-somente pelo querer, isto é, em si mesma, e, considerada em si mesma,
deve ser avaliada em grau muito mais alto do que tudo o que por seu intermédio possa ser alcançado
em proveito de qualquer inclinação, ou mesmo, se se quiser, da soma de todas as inclinações. [..] A
utilidade ou a inutilidade nada podem acrescentar ou tirar a este valor.
Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 1992, p. 23.
32. Leia o Texto 1 e considere-o nas suas respostas aos itens 32.1. e 32.2.
Texto 1
Temos a obrigação de ajudar alguém que seja pobre; mas, como o favor que fazemos implica que o
seu bem-estar dependa da nossa generosidade, e isso humilha a pessoa, é nosso dever
comportarmo-nos como se a nossa ajuda fosse (...) meramente o que lhe é devido (...), permitindo-lhe
manter o seu respeito por si própria (...), de modo a não diminuir o valor dessa pessoa enquanto ser
humano (...).
Kant, A Metafísica dos Costumes, Lisboa, FCG, 2017, pp. 390-392 (adaptado).
32.1. É possível inferir do Texto 1 que há atos de caridade que podem ser moralmente
censuráveis.
Concorda que há atos de caridade que podem ser moralmente censuráveis? Justifique a
sua perspetiva.
A resposta integra os aspetos seguintes ou outros igualmente relevantes.
Apresentação inequívoca da posição defendida.
Num país, metade das pessoas tem um rendimento mensal de 6000 €, que lhes permite adquirir bens
que elas próprias consideram dispensáveis, e a outra metade tem um rendimento mensal de 600 €,
que dificilmente chega para satisfazer as suas necessidades básicas. Foram apresentadas duas
propostas ao governo: na primeira, propõe-se que o rendimento disponível seja redistribuído,
transferindo 200 € das pessoas que têm um rendimento mensal de 6000 € para as que têm um
rendimento mensal de 600€; na segunda, propõe-se que não se faça qualquer redistribuição.
34. Leia o Texto 1 e considere-o nas suas respostas aos itens 34.1. e 34.2.
Texto 1
Todos já tivemos de lidar com pessoas que dizem que algo – por exemplo, a homossexualidade (...) –
é moralmente errado, mas que são incapazes de apontar quaisquer consequências más que daí
resultem. (...) Certas teorias morais, mesmo quando são motivadas por uma preocupação com o bem-
-estar humano, parecem consistir num conjunto de regras para serem seguidas, sejam quais forem as
consequências.
W. Kymlicka, Contemporary Political Philosophy – an introduction, Oxford, Oxford University Press, 2002, p. 11.
34.1. Será que o utilitarismo é uma das teorias morais que consistem apenas «num conjunto
de regras para serem seguidas»?
Justifique.
A resposta integra os aspetos seguintes ou outros igualmente relevantes.
Indicação do solicitado:
‒ não, o utilitarismo não é uma teoria moral que consista apenas «num conjunto de regras
para serem seguidas».
Justificação:
‒ para os utilitaristas, o facto de algo ser moralmente certo ou errado é determinado pelas
suas consequências OU o simples facto de uma regra ser considerada correta (ou ser
apresentada como correta) não é uma justificação aceitável da sua moralidade / de que
deva ser seguida;
‒ uma regra só adquire estatuto moral / só deve ser seguida se o teste da experiência mostrar
que, em geral, a sua aplicação tem consequências boas;
‒ em circunstâncias excecionais, se for previsível que a aplicação de uma regra não
maximizará o bem, então essa regra não deve ser seguida.
34.2. No Texto 1, refere-se que há teorias morais «motivadas por uma preocupação com o
bem-estar humano».
Explique o que entende Mill por bem-estar.
A resposta integra os aspetos seguintes ou outros igualmente relevantes.
Explicação da noção de bem-estar defendida por Mill:
‒ o bem-estar é o mesmo que a felicidade;
‒ a felicidade consiste no prazer e na ausência de dor OU a felicidade consiste em
experiências aprazíveis (e de ausência de dor).
Texto 1
Alguém bate à sua porta. Depara-se com um jovem que, claramente, necessita de ajuda. Está ferido e
a sangrar. Leva-o para dentro e ajuda-o, fazendo-o sentir-se confortável e seguro, e chama uma
ambulância. Não há dúvida de que esta ação é correta. Mas, se o ajudasse apenas por ter pena do
jovem, segundo Kant, isso já não seria uma ação moral.
N. Warburton, Uma Pequena História da Filosofia, Lisboa, Edições 70, 2012, p. 123.
35.1. De acordo com Kant, a ação descrita no texto, ainda que seja correta, pode não ser
«uma ação moral». Caso não seja uma ação moral, como a classificaria Kant? Explique.
A resposta integra os aspetos seguintes ou outros igualmente relevantes.
Classificação da ação:
‒ ação em conformidade com o dever OU ação em conformidade com a lei moral OU ação
motivada por uma inclinação.
Explicação:
‒ temos o dever de ajudar (quem necessita de socorro), e a ação descrita não é contrária a
esse dever;
‒ contudo, caso a ajuda dada dependa do sentimento de pena, a ação não é motivada pelo
dever (e, por isso, é meramente conforme ao dever).
35.2. Como poderá o caso apresentado no Texto 1 ser usado para criticar a teoria ética de
Kant?
A resposta integra os aspetos seguintes ou outros igualmente relevantes.
Explicação do modo como o caso apresentado pode ser usado para criticar a teoria ética de
Kant:
‒ independentemente dos motivos do agente – pena do jovem, respeito pela lei moral que
manda ajudar os outros ou vaidade pessoal –, o seu comportamento aumenta o saldo global
de felicidade;
‒ ora, se o comportamento aumenta o saldo global de felicidade, então tem consequências
boas para todos os envolvidos;
‒ aumentar o saldo global de felicidade é o propósito do comportamento moral OU o bem-
-estar é o propósito do comportamento moral.
OU
‒ o motivo do agente – pena de um jovem ferido – é um sentimento moral;
‒ os sentimentos morais motivam os agentes a considerar os interesses dos outros;
‒ a consideração (imparcial) dos interesses dos outros é o aspeto central da vida moral OU
tais sentimentos são nobres e resultam de um carácter moralmente educado/refletem uma
educação moral/não só não retiram valor moral às ações, como até lhes conferem valor
moral.
11. Rawls defende que, na posição original, a escolha dos princípios da justiça seguiria a
estratégia maximin.
Suponha que há 100 unidades de bem-estar para distribuir por três pessoas. Selecione a
opção que apresenta o modelo de distribuição que está mais de acordo com a estratégia
maximin.
Um indivíduo sofre de graves deficiências mentais, e um outro tem um grande talento matemático.
Estando satisfeitas as necessidades materiais de ambos, a sociedade dispõe de recursos adicionais
que permitem ajudar apenas um deles. Desse modo, ou o indivíduo com graves deficiências mentais
terá um apoio educativo suplementar, que não irá melhorar significativamente a sua vida, ou será
proporcionada uma educação superior ao indivíduo com talento matemático, que dela retirará a
grande satisfação de desenvolver todas as suas potencialidades nesse domínio.
Quem, contra Rawls, defender a opção de ajudar o indivíduo com talento matemático
estará a pôr em causa:
A. a existência de bens sociais primários.
B. o dever de imparcialidade.
C. o princípio da diferença.
D. o princípio da igualdade de oportunidades.
13. Suponha que uma pessoa rica tem de participar na escolha de princípios de justiça que
regulem a estrutura básica da sociedade em que vive. De acordo com Rawls, para que a
escolha seja razoável, essa pessoa terá de atender às restrições da posição original.
Por conseguinte, ela deve escolher princípios de justiça:
A. tendo em conta o rendimento dos mais desfavorecidos.
B. sem ter em conta que todos são livres e iguais.
14. Na teoria da justiça de Rawls, o princípio da liberdade igual tem prioridade sobre o
princípio da diferença.
Aceitar esta prioridade implica aceitar que:
A. as liberdades não podem ser negadas mesmo que impeçam a criação de riqueza que
beneficiaria os menos favorecidos.
B. os incentivos ao crescimento da riqueza envolvem sempre o risco de serem negadas
liberdades aos menos favorecidos.
C. as liberdades são indispensáveis à melhoria crescente do rendimento dos menos
favorecidos.
D. os incentivos ao crescimento da riqueza apenas limitam as liberdades dos menos
favorecidos.
E se (...) algumas pessoas preferissem apostar? E se vissem a vida como uma lotaria e quisessem
certificar-se de que haveria algumas posições muito atrativas para ocupar na sociedade? Em princípio,
os jogadores estão dispostos a correr o risco de ficarem pobres se, em contrapartida, tiverem a
hipótese de serem extremamente ricos. (...) Rawls acreditava que as pessoas sensatas não
desejariam apostar as suas vidas desta maneira. Talvez estivesse enganado a este respeito.
N. Warburton, Uma Pequena História da Filosofia, Lisboa, Edições 70, 2012, p. 228 (adaptado).
16. Suponha que os valores apresentados nas situações A e B indicam o acesso aos bens
primários dos indivíduos 1 e 2.
Indivíduo 1 Indivíduo 2
Situação A 4 4
Situação B 5 6
B. o princípio da liberdade.
C. a existência de direitos de titularidade.
B. os princípios de justiça que devem estruturar a sociedade não impõem um certo modo de
vida.
C. contém princípios de justiça que apenas especificam as diferentes liberdades.
D. a liberdade individual apenas pode ser anulada quando é incompatível com os desejos da
maioria.
C. as liberdades dos mais talentosos valerem menos do que o rendimento dos desfavorecidos.
Outras questões
1. De acordo com a teoria da justiça proposta por John Rawls, os princípios da justiça
devem ser escolhidos a coberto de um «véu de ignorância». Porquê?
– Os princípios da justiça devem ser escolhidos a partir da posição original, ou seja, a partir de
uma situação hipotética na qual ignorássemos a nossa posição atual na sociedade.
– Admite-se que, se ignorássemos a nossa posição atual, escolheríamos os princípios mais
equitativos. Deste modo, evitaríamos escolher os princípios que beneficiassem
exclusivamente a nossa situação atual, minimizando os riscos de termos uma vida
insatisfatória.
Para nos podermos queixar da conduta e das crenças de outros, temos de demonstrar que essas
ações nos ferem ou que as instituições que as permitem nos tratam de forma injusta. E isto significa
que temos de apelar para os princípios que escolheríamos na posição original. Contra estes princípios,
nem a intensidade do sentimento nem o facto de ele ser partilhado pela maioria têm qualquer
relevância.
John Rawls, Uma Teoria da Justiça, Lisboa, Editorial Presença, 2001.
Dadas as circunstâncias da posição original, [nomeadamente] a simetria das relações que entre todos
se estabelecem, esta situação inicial coloca os sujeitos, vistos como entidades morais, isto é, como
seres racionais com finalidades próprias e – parto desse princípio – capazes de um sentido de justiça,
numa situação equitativa.
John Rawls, Uma Teoria da Justiça, Lisboa, Editorial Presença, 2001, p. 34 (adaptado).
3.1. Explique, a partir do texto, por que razão Rawls considera que a posição original «coloca
os sujeitos (...) numa situação equitativa».
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Explicação da razão por que a posição original «coloca os sujeitos (...) numa situação
equitativa»:
– na posição original, que é uma situação hipotética, os sujeitos fazem as suas escolhas a
coberto do véu de ignorância, garantindo «a simetria das relações que entre todos se
estabelecem»;
– o véu de ignorância coloca os sujeitos numa situação de desconhecimento dos factos
particulares das suas vidas: capacidades, classe social, género, etc.;
– desconhecendo os factos particulares das suas vidas, ninguém se encontra numa situação
de vantagem na escolha dos princípios de justiça;
– na posição original, as escolhas ocorrem numa «situação equitativa».
3.2. Apresente uma objeção à teoria da justiça de Rawls.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Apresentação de uma objeção à teoria da justiça de Rawls:
– Objeção baseada no princípio da titularidade (de R. Nozick):
• para a justiça, é relevante o modo como se adquire e transmite a riqueza, e não o modo
como a riqueza está distribuída;
• se a aquisição e a transmissão da riqueza são legítimas, então a distribuição que daí
resultar também é justa;
• retirar parte da riqueza aos seus legítimos titulares, para a redistribuir, sem o seu
consentimento, é violar a sua autonomia.
– Objeção baseada na natureza das desigualdades (de R. Dworkin):
• há desigualdades que resultam de escolhas individuais;
• há desigualdades que resultam de contingências sociais e naturais, pelas quais os
indivíduos não são responsáveis;
• na teoria de Rawls, estas desigualdades são tratadas do mesmo modo, incentivando se
as escolhas individuais irresponsáveis.
4. Leia o texto.
Quando os dois princípios [da justiça] são cumpridos, as liberdades básicas de cada sujeito estão
garantidas e, de um modo definido pelo princípio da diferença, cada sujeito é beneficiado pela
cooperação social. Deste modo, é possível explicar a aceitação do sistema social e dos princípios que
ele cumpre através da lei psicológica segundo a qual as pessoas tendem a amar, proteger e apoiar
aquilo que defende o seu próprio bem. Dado que o bem de todos é defendido, todos estarão
inclinados a defender o sistema.
Quando o princípio de utilidade é cumprido, (...) não existe a garantia de que todos beneficiem. A
obediência ao sistema social pode obrigar a que alguns, em particular os menos favorecidos, devam
renunciar a benefícios para que um bem maior esteja à disposição do conjunto. Assim, o sistema não
será estável, a não ser que aqueles que sofrem os sacrifícios maiores se identifiquem com interesses
mais amplos do que os que lhes são próprios. Tal não é fácil de obter.
John Rawls, Uma Teoria da Justiça, Lisboa, Editorial Presença, 2001, p. 149 (adaptado).
No texto anterior, Rawls apresenta razões a favor dos dois princípios da justiça por si
defendidos e contra o princípio de utilidade.
Explicite as razões de Rawls.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Explicitação das razões de Rawls:
– numa sociedade organizada de acordo com os dois princípios da justiça, todos os cidadãos
são beneficiados em função do princípio da diferença (que estipula que as expectativas dos
menos favorecidos sejam maximizadas);
– (em contrapartida,) numa sociedade organizada de acordo com o princípio de utilidade,
alguns cidadãos poderão ser sacrificados em nome da felicidade geral ou de um bem maior
(pois o princípio de utilidade estipula a maximização do saldo global de felicidade, sem
atender à forma como a felicidade e os bens que a ela conduzem são distribuídos);
– quando todos são beneficiados, a aceitação do sistema social é mais elevada (e o sistema é
mais estável) do que quando alguns podem ser sacrificados em nome de um bem maior.
6. Para que uma sociedade seja justa, basta que todos tenham liberdades iguais?
Na sua resposta,
‒ apresente inequivocamente a sua posição;
‒ argumente a favor da sua posição.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Nota – Os aspetos constantes do cenário de resposta apresentado são apenas ilustrativos,
não esgotando o espectro de respostas possíveis.
Apresentação inequívoca da posição defendida.
Justificação da posição defendida:
No caso de o examinando considerar que, para uma sociedade ser justa, basta que
todos tenham liberdades iguais:
– (sim, ter as mesmas liberdades é suficiente para uma organização justa da sociedade;)
– as posições sociais de cada um são justas quando resultam de processos que são, eles
próprios, justos (quando resultam do esforço ou da aplicação de capacidades e de talentos
individuais, de negócios bem-sucedidos baseados num acordo livre e informado entre as
partes envolvidas, ou de heranças legítimas), ainda que se verifiquem desigualdades na
distribuição da riqueza ou nas oportunidades disponíveis;
– seria injusto forçar as pessoas a abdicarem dos bens que adquiriram por processos justos
com a finalidade de beneficiar os mais desfavorecidos (as pessoas com menores recursos
económicos);
– apesar de, em muitos casos, a pobreza (a escassez de recursos económicos) ou a falta de
oportunidades não dependerem de escolhas individuais nem da falta de mérito pessoal, não
é justo violar a autonomia de uns, interferindo ilegitimamente na sua vida pessoal, com o
objetivo de beneficiar outros, ainda que mais carenciados (não é justo instrumentalizar uns
para favorecer outros).
No caso de o examinando considerar que, para uma sociedade ser justa, não basta que
todos tenham liberdades iguais:
– (não, ter liberdades iguais é fundamental para uma organização justa da sociedade, mas
não é suficiente;)
– o facto de todos terem, à partida, as liberdades necessárias para alcançar funções e
carreiras abertas a todos não implica que, efetivamente, todos tenham iguais oportunidades
de as alcançarem;
– as expectativas das pessoas que têm as mesmas capacidades e aspirações devem ser
idênticas, independentemente da classe social a que pertencem, e isso exige que todos
tenham oportunidades iguais;
– assim, a igualdade de oportunidades de educação, por exemplo, é fundamental para que os
conhecimentos e as qualificações não dependam da classe social e contribui para que
pessoas com as mesmas capacidades e aspirações tenham expectativas idênticas;
OU
– (não, ter liberdades iguais é fundamental para uma organização justa da sociedade, mas
não é suficiente;)
Os princípios da justiça constituem também imperativos categóricos no sentido empregado por Kant.
Por imperativo categórico, Kant entende um princípio de conduta que se aplica a um sujeito em virtude
da sua natureza como ser racional, livre e igual.
John Rawls, Uma Teoria da Justiça, Lisboa, Editorial Presença, 2001, p. 204 (adaptado).
O objetivo da posição original é excluir aqueles princípios que seria racional tentar fazer aprovar (...)
em função do conhecimento de certos dados que são irrelevantes do ponto de vista da justiça.
John Rawls, Uma Teoria da Justiça, Lisboa, Editorial Presença, 2001, p. 38 (adaptado).
O valor da liberdade não é o mesmo para todos. Alguns gozam de maior poder e riqueza e dispõem,
portanto, de maiores meios para alcançar os seus fins. (...) Considerando os princípios da justiça em
conjunto, a estrutura básica deve ser disposta de modo a maximizar para os menos beneficiados o
valor do sistema completo de liberdades iguais que é partilhado por todos. É esta a definição do
objetivo da justiça social.
John Rawls, Uma Teoria da Justiça, Lisboa, Editorial Presença, 2001, p. 170 (adaptado).
10.1. Por que razão, de acordo com Rawls, é preciso maximizar o valor da liberdade para os
menos beneficiados?
Na sua resposta, mostre como se faria essa maximização aplicando os princípios da
justiça propostos por Rawls.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Apresentação da razão pela qual é preciso maximizar o valor da liberdade para os menos
beneficiados:
– ainda que todos tenham iguais liberdades (cumprindo-se o que é prescrito pelo princípio da
liberdade), o valor dessas liberdades será menor para os menos beneficiados se estes não
dispuserem dos meios que permitem exercê-las / o valor dessas liberdades pode ser maior
ou menor consoante se tenham ou não os meios que permitem exercê-las.
Explicitação do modo como se faria a maximização do valor da liberdade para os menos
beneficiados, aplicando os princípios da justiça propostos por Rawls:
– os menos beneficiados não podem exercer de facto as liberdades de que dispõem
(liberdades decorrentes do princípio da liberdade) se não tiverem iguais oportunidades de
acesso a todos os cargos ou posições sociais (como é exigido pelo princípio da igualdade
equitativa de oportunidades) ou se a distribuição da riqueza disponível não lhes proporcionar
as melhores expectativas (como é exigido pelo princípio da diferença);
– assim, só a aplicação conjunta dos princípios da liberdade igual, da igualdade equitativa de
oportunidades / da oportunidade justa e da diferença maximiza o valor da liberdade para os
menos beneficiados (permitindo a realização da justiça social).
10.2. Considere, a título de hipótese, que temos a liberdade de viver a vida que queremos e
que temos a liberdade de usar como entendermos os recursos que adquirimos em
resultado do exercício legítimo das nossas capacidades. Suponha, ainda, que estas
liberdades são direitos morais absolutos.
Teríamos, neste caso, a obrigação de contribuir para a realização da justiça social
defendida por Rawls? Porquê?
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Apresentação da implicação da hipótese dada:
– não teríamos a obrigação de contribuir para a realização da justiça social proposta por
Rawls (caso as liberdades referidas ‒ a liberdade de viver a vida que se quer e a liberdade
de usar como se entende os recursos legitimamente adquiridos ‒ fossem direitos morais
absolutos).
Justificação:
– se as liberdades referidas fossem direitos morais absolutos, então não deveriam ser
limitadas;
– as liberdades referidas seriam limitadas caso se transferissem recursos legitimamente
adquiridos pelos mais beneficiados para os menos beneficiados, sujeitando os mais
beneficiados à obrigação de ajudar os menos beneficiados;
– ora, a realização da justiça social proposta por Rawls implica a obrigação de ajudar os
menos beneficiados (de acordo com o princípio da diferença).
11. Rawls defendeu que, se fôssemos colocados na posição original para escolhermos o
tipo de sociedade em que iríamos viver, escolheríamos os princípios de justiça por ele
indicados.
Terá Rawls razão ao afirmar que essa seria a escolha que todos faríamos? Justifique a
sua opinião.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Apresentação de uma opinião.
Justificação da opinião apresentada:
Caso o examinando defenda que Rawls tem razão:
– (sim, Rawls tem razão ao afirmar que essa seria a escolha que todos faríamos;)
– na posição original, não conhecemos as condições particulares da nossa vida (talentos,
capacidades, saúde, situação de classe);
– de modo a minimizarmos os riscos, escolheríamos princípios que nos protegessem /
assegurassem o nosso acesso aos bens essenciais, caso não fôssemos favorecidos pela
lotaria social ou pela lotaria natural.
Caso o examinando defenda que Rawls não tem razão:
– (não, Rawls não tem razão ao afirmar que essa seria a escolha que todos faríamos;)
– de acordo com Rawls, na posição original escolheríamos princípios de acordo com os quais
as desigualdades económicas e sociais apenas são toleradas se trouxerem benefícios para
os mais desfavorecidos;
– muitas desigualdades económicas decorrem de escolhas individuais (por exemplo, alguém
pode escolher ter mais tempo livre e trabalhar menos), e não é justo que aqueles que fazem
certas escolhas (por exemplo, trabalhar mais e ter menos tempo livre) tenham de
compensar aqueles que fazem outras escolhas (por exemplo, trabalhar menos e ter mais
tempo livre).
12. Suponha que a sociedade dispõe de uma quantia destinada a financiar a preparação de
dois atletas para os jogos olímpicos. Os dois atletas têm o mesmo nível de talento e de
capacidades e a mesma motivação para as usar. De acordo com a teoria da justiça de
Rawls, estes atletas devem ter a mesma expetativa de sucesso, independentemente da
classe social de origem. Por isso, a quantia destinada a financiar a preparação de
ambos para os jogos olímpicos deve ser dividida pelos dois em partes iguais.
Identifique o princípio de justiça, proposto por Rawls, em nome do qual a solução
apresentada é a correta.
Identificação do princípio de justiça, proposto por Rawls, que determina a correção da solução
apresentada:
‒ (princípio da) igualdade (equitativa) de oportunidades OU (princípio da) oportunidade justa.
13. No texto seguinte, Rawls argumenta que o utilitarismo, ao dar prioridade à maximização
do bem, em vez de dar prioridade à justiça como equidade, não garante os direitos e as
liberdades individuais.
Admitamos que a maior parte da sociedade detesta certas práticas religiosas ou sexuais, encarando-
as como uma abominação. Este sentimento é tão intenso que não basta que tais práticas sejam
ocultadas do público; a simples ideia de que elas ocorrem é suficiente para suscitar na maioria
sentimentos de cólera e ódio. (...) Para defender a liberdade individual neste caso, o utilitarista tem de
demonstrar que, dadas as circunstâncias, o que verdadeiramente interessa do ponto de vista dos
benefícios, a longo prazo, é a manutenção da liberdade; mas este argumento pode não ser
convincente.
Na teoria da justiça como equidade, no entanto, este problema nunca se coloca. Desde logo, as
convicções intensas da maioria, se forem efetivamente meras preferências sem qualquer apoio nos
princípios da justiça anteriormente estabelecidos, não têm qualquer peso. A satisfação destes
sentimentos não tem qualquer valor que possa ser contraposto às exigências da igual liberdade para
todos.
John Rawls, Uma Teoria da Justiça, Lisboa, Editorial Presença, 2001, p. 344 (adaptado).
– seja como for, a experiência/o cálculo da utilidade tem mostrado que a liberdade individual
geralmente contribui para a maximização do bem (por esta razão, a maximização do bem
tem prioridade sobre a justiça como equidade).
14. Imagine que é uma das quatro pessoas referidas no quadro abaixo e que, sem saber
qual delas é, tem de escolher entre as duas sociedades apresentadas, A ou B. Os
valores indicados são a medida do grau de acesso aos bens primários, que vai de um
mínimo de 1 a um máximo de 10.
De acordo com a teoria da justiça de Rawls, qual das duas sociedades indicadas, A ou
B, iria escolher?
Porquê?
Indicação do solicitado:
‒ iria escolher a sociedade A.
Justificação:
‒ desconhecendo que posição teria como resultado da lotaria natural e da lotaria social, teria
de considerar a possibilidade de ser a pessoa mais desfavorecida;
‒ por conseguinte, escolheria a sociedade que maximizasse o acesso aos bens primários da
pessoa mais desfavorecida;
‒ o grau de acesso aos bens primários da pessoa mais desfavorecida é maior na sociedade A
do que na sociedade B.
A pessoa que escolhe trabalhar mais horas para obter um rendimento que ultrapassa aquilo de que
precisa para satisfazer as suas necessidades básicas prefere alguns bens ou serviços adicionais em
detrimento do lazer e das atividades que poderia realizar nessas horas; ao passo que a pessoa que
escolhe não trabalhar tantas horas prefere as atividades de lazer em detrimento dos bens ou serviços
adicionais que poderia adquirir trabalhando mais. Assim sendo, se seria ilegítimo um sistema fiscal
apropriar-se de uma parte do lazer de uma pessoa (impondo-lhe trabalho forçado) com o propósito de
servir os necessitados, como pode ser legítimo que um sistema fiscal se aproprie de uma parte dos
bens de uma pessoa com esse mesmo propósito?
Porque devemos tratar a pessoa cuja felicidade requer certos bens materiais ou serviços de modo
diferente da pessoa cujas preferências e desejos tornam esses bens desnecessários para a sua
felicidade? (...) Talvez não haja diferença quanto ao princípio.
R. Nozick, Anarquia, Estado e Utopia, Lisboa, Edições 70, 2009, pp. 214, 215.
‒ para isso, o sistema fiscal apropria-se de uma parte dos rendimentos de quem escolhe
trabalhar mais horas para adquirir «bens e serviços adicionais»;
‒ mas é tão ilegítimo o sistema fiscal apropriar-se de uma parte dos rendimentos de quem
escolhe trabalhar mais horas como seria ilegítimo apropriar-se de «uma parte do lazer de
uma pessoa»;
‒ por conseguinte, não havendo diferença entre os dois casos, é discutível que uma
sociedade justa seja aquela que se encontra organizada de modo que o rendimento obtido
pelos mais produtivos beneficie o mais possível os mais desfavorecidos.
Numa associação industrial cooperativa, será justo que o talento e a perícia deem direito a uma
remuneração superior? Os que respondem negativamente defendem que aqueles que fazem o melhor
que podem merecem ser pagos da mesma maneira, e que seria injusto colocá-los numa posição de
inferioridade por algo de que não têm culpa. (...) A favor da perspetiva contrária, alega-se que a
sociedade recebe mais do trabalhador mais eficiente, e que, como os seus serviços são mais úteis, a
sociedade lhe deve uma maior compensação. (...) Como escolher entre estes apelos a princípios de
justiça rivais? Neste caso, a justiça tem dois lados, sendo impossível harmonizá-los, e os dois
disputadores escolheram lados opostos – um olha para aquilo que é justo que o indivíduo receba; o
outro, para aquilo que é justo que a comunidade lhe dê. Cada uma destas posições é, do ponto de
vista de cada disputador, incontestável, e qualquer opção por uma delas (...) tem de ser
completamente arbitrária. Só a utilidade social pode decidir a prioridade.
Stuart Mill, Utilitarismo, Porto, Porto Editora, 2005, pp. 98-99 (adaptado).
16.1. Mostre que o princípio da diferença, defendido por Rawls, permite uma retribuição maior
para os mais talentosos.
A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
Apresentação das razões pelas quais o princípio da diferença permite uma retribuição maior
para os mais talentosos:
– o princípio da diferença permite distribuições desiguais de riqueza;
– as distribuições desiguais de riqueza justificam-se quando produzem os maiores benefícios
possíveis para os menos favorecidos (para aqueles que sofrem os efeitos negativos da
lotaria natural ou da lotaria social nas suas vidas);
– se, por exemplo, os incentivos aos mais talentosos aumentarem os recursos disponíveis
para distribuir pelos menos favorecidos, então (de acordo com o princípio da diferença)
justificar-se-á uma retribuição maior para os mais talentosos.