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Índice
1. Caracterização das lesões
1.1. Lesões contundentes
1.1.1. Abrasões ou escoriações
1.1.2. Contusões
1.1.3. Lacerações
1.2. Feridas cortantes ou incisas
1.3. Lesões penetrantes e/ou perfurantes
1.4. Lesões mistas
1.4.1. Lesões corto-penetrantes ou corto-perfurantes
1.4.2. Lesões perfuro-contundentes
1.4.3. Lesões corto-contundentes
2. Descrição das lesões
3. Referências bibliográficas
das lesões genitais, tendem a evoluir muito rapidamente), seja no cadáver (as
lesões modificam-se e acabam até por desaparecer em resultado da
decomposição cadavérica).
Importa, por isso, que o perito médico seja capaz de corretamente caracterizar
as lesões, tendo em conta as suas diversas tipologias e mecanismos de produção,
estando também apto para, com rigor, fazer a sua descrição e fotodocumentação
para, posteriormente, as interpretar à luz da informação que tiver sido obtida,
estabelecendo o adequado diagnóstico diferencial quanto à sua
etiologia/mecanismo de produção.
Este diagnóstico diferencial deverá ser feito com base nos seguintes elementos:
a) História relatada (ou não) como explicação para o mecanismo da produção
das lesões;
b) Características das lesões (e.g. tipo, número, localização, dimensões,
padrão/forma, cor, trajeto/direção, tempo de evolução);
c) Resultados de exames complementares que possam ser realizados (e.g.
hemograma ou exame imagiológico).
Apresentar-se-á de seguida uma sistematização das lesões mais
frequentemente encontradas no âmbito forense, tendo em conta o tipo de
mecanismo associado, considerando-as de uma forma geral (no que se refere,
sobretudo, à superfície corporal):
a) Lesões contundentes (“blunt force injuries”): abrasões (“abrasions”, “scrape”
ou “graze”); contusões (“contusions” ou “bruises”); lacerações (“lacerations”);
fraturas (“fractures”);
fraturas.
1.1.2. Contusões
As contusões dividem-se em petéquias (“petechiae”), equimoses e hematomas
(“ecchymosis” e “hematoma”).
As petéquias são hemorragias puntiformes, devidas à rotura de pequenos
vasos sanguíneos, normalmente na pele ou membranas mucosas, causadas por
pressão, impacto ou sucção (Saukko & Knight, 2004). Num grande número de
casos, e designadamente na AS, resultam da rotura de vénulas e capilares,
quando o retorno venoso da cabeça está obstruído por compressão das veias
jugulares, enquanto o fluxo arterial, através das artérias carótidas, se mantém
(Dolinak e col, 2005) - o mecanismo mais frequente é a constrição externa do
pescoço (por mãos ou laços), aparecendo as petéquias mais frequentemente na
conjuntiva ocular e região retroauricular.
Uma equimose é uma área de hemorragia resultante da saída de sangue
devido à rotura de pequenos vasos sanguíneos (veias, capilares, arteríolas) na
pele ou mucosas, sem perda da integridade destas, na sequência de um
traumatismo de natureza contundente ou mista (Shkrum & Ramsay, 2007). A
coloração resultante observa-se através da pele intacta suprajacente.
Um hematoma consiste numa coleção de sangue extravasado numa cavidade
neoformada, resultante da rotura de vasos sanguíneos provocada por traumatismo
de natureza contundente (Shkrum & Ramsay, 2007).
dependem dos fatores acima referidos. Acresce que muitas vezes há também falta
de concordância entre as cores descritas pelos diversos clínicos (Munang e col,
2002; Bariciak e col. 2003).
Convém ainda realçar que pode haver um lapso de tempo, que pode chegar até
24 horas, entre a produção de uma contusão profunda e o seu aparecimento na
superfície do corpo, traduzido pela cor arroxeada da pele nessa zona, ou mesmo à
distância, uma vez que o sangue extravasado pode ter migrado através dos
planos anatómicos por ação da gravidade para áreas afastadas da zona
diretamente atingida pela ação traumática (e.g. equimoses palpebrais por
traumatismo na região frontal; equimose no pescoço por fratura da mandíbula). Se
se suspeitar de um possível atraso no aparecimento das equimoses/hematomas,
recomenda-se, nalguns casos, que a vítima possa ser novamente observada ao
fim de 24 horas, porque nessa altura podem-se revelar contusões inicialmente não
aparentes. A luz ultravioleta pode também revelar contusões que a simples
observação a olho nu não consegue identificar (Hughes e col, 2006).
Alguns tipos de equimoses em vítimas de AS podem revestir-se de particular
significado, a saber:
a) Equimoses associadas a lesões de mordida humana (“bite mark”): podem-
se apresentar como equimoses de forma oval ou circular, dispostas
segundo duas linhas em forma de "U", e correspondem às marcas dos
dentes superiores e inferiores, separadas por um espaço entre 25 a 40 mm
(Shkrum & Ramsay, 2007); no espaço central, definido por essas duas
linhas, podem aparecer hemorragias petequeais da pele, resultantes da
rotura vascular por um mecanismo de sucção simultâneo à mordida
(chupão - “hickey”) ou a rotura de pequenos vasos na sequência da pressão
exercida pelos dentes. Estas equimoses podem estar associadas a
escoriações ou lacerações da pele (Pretty e col, 2002). As mamas são os
locais mais comummente atingidos no género feminino e os braços no
masculino, ainda que nas crianças do género masculino se encontrem por
1.1.3. Lacerações
Uma laceração é uma lesão caracterizada pela rotura da pele em toda a sua
espessura devido a um mecanismo de estiramento e/ou esmagamento
(contundente) (Saukko & Knight, 2004; Shkrum & Ramsay, 2007). Nas lacerações
da superfície corporal os bordos da lesão apresentam-se contundidos,
esmagados, persistindo pontes tecidulares entre os mesmos (e.g. vasos e nervos).
Este tipo de lesões fornece pouca informação específica sobre o objeto causal. No
caso de se tratar de uma laceração de uma estrutura interna, traduz-se pela rotura
parcial ou total de um órgão (maciço ou oco) ou de outra estrutura interna (e.g.
vaso sanguíneo).
Para que uma laceração possa ocorrer, para além da intensidade da força
aplicada, é necessário que exista uma base firme contra a qual a pele e os tecidos
subjacentes possam ser comprimidos ou tracionados, ou que o agente traumático
tenha arestas proeminentes ou, ainda, que atue obliquamente na pele até
ultrapassar a sua resistência, acabando por a romper.
Se a força for aplicada tangencialmente à superfície corporal, um dos bordos da
lesão pode-se apresentar mais regular e não contundido e o outro mais irregular e
contundido (Saukko & Knight, 2004). Se a lesão se encontrar numa área coberta
com pelo ou cabelo, estes permanecerão intactos no interior da lesão (Saukko &
Knight, 2004; Shkrum & Ramsay, 2007).
integridade da pele (ou outro tecido) em toda a sua espessura e, como tal, não
aparecem pontes de tecido a unir as margens. No corpo da vítima observa-se um
ou vários orifícios na superfície corporal, designados por “orifício(s) ou lesão(ões)
de entrada” (“entrance wound”), geralmente arredondados ou ovalados e de
pequenas dimensões ou podem exibir uma lesão figurada (e.g. estrela de quatro
pontas como acontece nas chaves de parafuso Phillips); ao orifício de entrada
associa-se um “canal de penetração” (“wound track”), mais ou menos profundo,
com atingimento em profundidade dos diversos planos anatómicos, terminando
habitualmente em “fundo cego”, ainda que por vezes possa existir um “orifício de
saída” (“exit wound”), quando a lesão é transfixiva (perfurante) (Dolinak e col,
2005).
O tamanho e a forma das lesões penetrantes e/ou perfurantes dependem: (1)
da forma do instrumento; (2) do ângulo de incidência do golpe em relação à
superfície corporal; (3) do movimento do instrumento no corpo da vítima e/ou do
movimento da vítima enquanto o instrumento está a ser retirado, o que pode levar
ao aparecimento de lesões em forma de “Y” ou de “L”; (4) do estado de tensão ou
relaxamento da pele; (5) do atingimento das linhas de Langer (perpendicular ou
paralelo).
com grande interesse do ponto de vista médico-legal e forense, a saber (Di Maio,
1999): (1) “orifício de entrada” (propriamente dito); (2) “orla de contusão”; (3) “zona
de limpeza” (“anel de limpeza”, “zona de enxugo”); (4) “área de equimose”; (5)
“área de depósito de nuvem de resíduos” (depósito de negro de fumo, depósito de
partículas de pólvora - “tatuagem” ou “tatuagem pela pólvora” e depósito de outras
partículas orgânicas e não orgânicas não observáveis a olho nu); (6)
“queimadura”.
As lesões provocadas por armas de fogo de cano comprido (armas caçadeiras -
projéteis múltiplos) têm algumas características comuns às lesões produzidas por
armas de cano curto (e.g. “orifício/s de entrada”, “orla de contusão”, “zona de
limpeza”, “área de equimose”, “área de depósito de nuvem de resíduos,
“queimadura”) (Di Maio, 1999). Mas, os ferimentos resultantes dos disparos não
são sempre iguais e têm morfologias variadas, as quais estão diretamente
relacionadas com: (1) a distância a que é feito o disparo; (2) o tipo de munição
(tipo de bucha, tipo de pólvora, calibre dos chumbos); (3) o calibre da arma; (4) a
existência, ou não, de “choques” na extremidade do cano (artefactos utilizados
para alterar a dispersão da carga de chumbos); (5) a carga de chumbos ter
atravessado, ou não, um objeto intermediário (e.g. vidro, porta, vegetação). De
uma forma geral, pode dizer-se que, para uma mesma arma disparada nas
mesmas condições (tipo de munição, existência ou não de choque e do tipo de
choque) a dispersão é tanto maior quanto maior for a distância de disparo. O
“orifício de entrada” por disparo de arma com “cano encostado” ou “quase
encostado” é um orifício único de bordos mais ou menos regulares, sem sinais de
entrada isolada de chumbos (os chamados “orifícios satélite”) e toda a carga de
chumbos, também designada por “bagada”, penetra a superfície de impacto em
bloco como se constituísse um único projétil, daí a designação de alguns autores
de "chumbo embalado". Para distâncias com cano progressivamente afastado
(distâncias crescentes), para além de um orifício único, começa-se por constatar a
perda de regularidade dos bordos desse orifício, depois o aparecimento de um
orifício com os bordos festonados (mais irregulares), de seguida começam a
2011):
a) Tipo: deve ser utilizada uma terminologia correta para definir e descrever um
determinado tipo de lesão, de acordo com tudo o que atrás ficou exposto. Assim, se se
tratar de uma lesão de natureza contundente, por exemplo, deverá acrescentar-se o
tipo dessa lesão (e.g. contusão), caraterizando-a mais especificamente (e.g.
equimose);
b) Forma: a descrição da forma da lesão (e.g. linear, curvilínea, arredondada, ovalada,
irregular) é sempre importante, especialmente no caso de lesões figuradas ou
moduladas, sendo nestas últimas particularmente importante a fotodocumentação (pois
pode dar indicações muito aproximadas do objeto ou superfície de impacto); nestes
casos é ainda fundamental a comparação da lesão com o alegado objeto problema,
caso este seja encontrado;
c) Bordos: a descrição rigorosa dos bordos (e.g. bordos não contundidos, lineares,
serreados, irregulares, com pontes de tecido) é especialmente importante para
caraterizar o ferimento e o mecanismo da sua produção, podendo desde logo afastar
determinado tipo de objetos problema e orientar a investigação na procura de objetos
específicos;
d) Cor: ainda que este aspeto seja considerado particularmente importante na descrição
de equimoses, para orientação relativamente ao tempo decorrido após a sua produção
(com todas as reservas já assinaladas anteriormente), importa ainda assim descrever
exatamente a cor ou cores observadas em qualquer tipo de lesão. Importa, também,
descrever a uniformidade dessa mesma cor na lesão. Dado que pode haver
subjetividade na apreciação de determinadas cores, aconselha-se nos casos mais
relevantes, a utilização de escala com ColorChekers para assegurar maior fiabilidade
na avaliação; em alguns casos pode-se aconselhar também a fotografia de infra-
vermelhos ou a utilização de fontes de luz de comprimento de onda variável;
e) Localização: a sede de cada lesão deve descrever-se de acordo com a posição
anatómica, usando-se três referências anatómicas fixas, bem como a nómina
anatómica correta. Para descrever lesões do hímen ou na região anal, estas devem ser
referenciadas segundo o esquema do mostrador do relógio, ou seja, localizando as
lesões segundo o sentido horário, em números romanos (desde a I até às XII horas).
Deve usar-se, também, uma ficha de esquema corporal para facilitar o registo imediato
da localização das diversas lesões;
f) Número de lesões: sempre que possível, o número de lesões de cada tipo deve estar
referenciado no relatório pericial porque habitualmente a um maior o número de lesões
podem estar associados diversos aspetos, como por exemplo o grau de violência. A
utilização da expressão “múltiplas lesões” deve ser por regra evitada, mas em
determinados casos em que estas sejam múltiplas, pequenas e de difícil
contabilização, admite-se que se possa recorrer a uma expressão do tipo: “Múltiplas
lesões dispersas numa área de X por Y cm de maiores dimensões”;
g) Dimensões: a dimensão de cada lesão é importante para avaliar, entre outros, a
gravidade da lesão, bem como a relação causal entre esta e a sua produção por um
determinado instrumento suspeito. Assim, esta deve ser sempre determinada com
recurso a escala métrica, considerando-se, quando for caso disso, não apenas uma
mas as maiores dimensões da lesão: comprimento, largura e profundidade, se
adequados. Para garantir a fiabilidade desta avaliação, cada lesão deve ser
fotografada per si, sempre que possível com régua ABFO ou outro testemunho métrico;
h) Estruturas circundantes: importa descrever o estado do tecido circundante a cada
lesão (e.g. contundido, escoriado, edemaciado, ruborizado) para que melhor se
perceba o tipo de impacto, extensão e gravidade da lesão;
i) Direção/orientação: em determinados tipos de lesão, designadamente quando existe
um trajeto ou quando as lesões se distribuem no corpo segundo uma ou várias
orientações, importa descrever a direção de cada uma segundo três eixos,
considerando a posição anatómica: anterior-posterior; medial-lateral/direita-esquerda;
superior-inferior. Esta caracterização é fundamental para a interpretação sobre a forma
como a lesão foi produzida, designadamente a posição do objeto e/ou da pessoa que o
utilizou no momento em que se produziu a lesão;
j) Conteúdo: nalgumas lesões (e.g. lacerações) importa descrever a presença de material
estranho no interior da lesão, designadamente de vestígios físicos (e.g. terra, cabelos,
fibras, óleo, vidros). Esta descrição é fundamental pois permite confrontar os
resultados das análises laboratoriais destes vestígios com o alegado mecanismo de
produção da lesão.
3. REFERÊNCIAS
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