Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Sebenta de Direito
Constitucional
PRIMEIRAS AULAS
A 1º Constituição conhecida em Portugal foi a constituição de 1822, que teve como grande
influência a Revolução francesa de 1789.
O Direito Constitucional tem como objeto imediato a Constituição, e o seu estudo alicerça-se em 3
pilares:
O ordenamento jurídico interno divide-se: direito público e direito privado - distinção através de 3
critérios:
• Critério dos interesses: interesse coletivo, no caso do direto público, e interesse privado, no
caso do direito privado
• Critério da posição do sujeito na relação jurídica - no caso do direito público, os sujeitos
encontram-se em posições diferentes (existe uma hierarquia), logo existem desigualdades.
No caso do direito privado, os sujeitos encontram-se todos no mesmo plano.
• Critério da qualidade do sujeito – no caso do direito público, o sujeito apresenta-se dotado
de poder de autoridade. Sendo que não existe este poder no direito privado.
Notas: o estado não é apenas uma organização. O estado somos todos nós, é uma comunidade de homens; o
interesse público primário é encontrado na constituição; a constituição é o projeto político da comunidade,
dotado de força normativa.
O direito constitucional influencia e subordina tanto o ramo do direito privado como o do direito
público.
CONSTITUCIONALISMO MULTINÍVEL
No caso de Portugal, o Direito está subordinado não só à constituição portuguesa, mas também a
outros níveis constitucionais, ou seja, não nos reduzimos ao constitucionalismo interno.
Nota: a UE não possui constituição, mas sim tratados e normas “constitucionais” que devem ser
respeitadas.
A CONSTITUIÇÃO
A Constituição é a lei fundamental e todo o direito interno português obedece à constituição. Por
isso, a constituição possui superioridade hierárquica normativa, ou seja, as normas constitucionais
são hierarquicamente superiores.
Constituição real – uma verdadeira constituição, segundo Lassale (?), não era uma constituição
escrita, mas sim aquela que estava plasmada na realidade constitucional. Este autor afirmava que a
“constituição escrita não era mais do que uma mera folha de papal”. Por isso, para este autor, a
constituição era a realidade, e caso esta não correspondesse à realidade não era sequer uma
constituição.
Contrariamente, haviam outros autores que defendiam o contrário da ideia a cima referida.
Afirmavam que a constituição não correspondia à realidade e que era uma constituição escrita.
O conceito de constituição material nasceu do ponto de vista de Motati – conjunto de valores vivos
numa determinada comunidade e que são representados pelos representantes das forças sociais,
económicas e políticas. Estes valores estão plasmados numa constituição escrita. Por isso, esta ideia
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
conjuga tanto a ideia de uma constituição escrita como a ideia que a constituição está representada
na sociedade, ou seja, na vida real.
A Constituição britânica tem uma constituição consuetudinária, cuja a fonte de direito é o costume.
Esta constituição não é uma constituição escrita, ou seja, não está representada num só documento.
Para além disso, é uma constituição flexível, uma vez que as normas constituintes podem ser
alteradas a qualquer altura e sem qualquer restrição.
Hoje em dia, é mais correto falarmos numa constituição semirrígida, uma vez que constituições
rígidas (Constituições que nunca podem ser alteradas), já não existem. No entanto, caso existissem
era apenas uma constituição de fachada.
O COSTUME
AS FUNÇÕES DA CONSTITUIÇÃO
CARACTERISTICAS DA CONSTITUIÇÃO
Quando falamos de uma constituição estamos desde logo a falar de uma lei fundamental que tem
um caracter hierárquico superior.
• Autoprimazia – a constituição é a lei superior e por isso dica a dever a sua validade a si
própria. Ela prevalece sobre todas as outras normas jurídicas, não tendo então nenhuma
norma em cima dela. Da autoprimazia resulta o princípio da hierarquia das normas e o
princípio da constitucionalidade.
Princípio da hierarquia – nenhuma norma de hierarquia inferior pode estar em contradição com
outra de dignidade superior.
• Fonte primária de produção jurídica - significa que a constituição é a norma das normas, ou
seja, ela é fonte para a produção de normas inferiores.
• Força hetero-determinante – as normas superiores, neste caso a constituição, constituem
determinantes positivas e negativas das normas inferiores. Como determinantes negativas,
as normas constitucionais limitam as normas de hierarquia inferior. Como determinantes
positivas, as normas constitucionais regulam parcialmente o próprio conteúdo das normas
inferiores, nascendo então uma ideia de conformidade (as normas infraconstitucionais têm
de conformar o seu próprio conteúdo às normas constitucionais)
• Natureza supra-ordenamental – a constituição vai definir os componentes do ordenamento
jurídico. Enquanto norma das normas, irá dar corpo ao ordenamento jurídico estadual, em
sentido amplo, mas também vai vincular outros ordenamentos jurídicos. Dentro do
ordenamento estadual em sentido amplo, destaca-se o ordenamento estadual em sentido
restrito, os ordenamentos autónomos (constituídos pelo conjunto de normas criadas pelas
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Uma constituição em sentido material é uma lei fundamental, que tende de possuir um conteúdo
específico. Uma Constituição que não consagre o princípio da igualdade, da separação dos poderes
não é uma constituição fundamental. Para uma constituição ser em sentido material e normativo é
necessário que tenha determinados princípios que têm de ser buscados num determinado
movimento constitucional. O artigo 16 da declaração dos direitos do homem e do cidadão,
estabelece que um estado onde não seja respeitado um catálogo dos direitos e deveres
fundamentais e não tenha um princípio da separação dos poderes, não tem uma constituição.
São os movimentos constitucionais que vem dar fundamento ao conteúdo de uma constituição. A
constituição de 1976 tem um certo conteúdo constitucional, e esse conteúdo vem dos movimentos
constitucionais, do constitucionalismo. Por outras palavras, os movimentos constitucionais geraram
a constituição em sentido moderno. E que movimentos foram estes? O constitucionalismo
americano, o constitucionalismo inglês e o constitucionalismo francês.
Estes movimentos, apesar de terem ocorrido em espaços e tempos diferentes, são em algumas
matérias bastantes próximos uns dos outros.
Quando falamos em constitucionalismo moderno estamos a falar dos movimentos que apareceram
em finais do seculo XVIII.
NOTA DESENVOLVIDA MAIS À FRENTE - Tudo isto esta intersetado com outra questão que tem haver
com o poder constituinte – poder de fazer uma convenção. O poder constituinte foi em grande parte
determinada pelos movimentos constitucionais.
--- Para termos uma constituição, e para que esta seja aprovada, é necessário um poder que a
aprove. O que é o poder constituinte? Quem tem? Como se exerce? E até onde pode ir o poder
constituinte? ---
Constitucionalismo- é uma teoria que tem como centro uma ideia de governo limitado e ao mesmo
tempo uma ideia de garantia dos direitos dos indivíduos. Limitando o poder, a constituição vai
salvaguardar os direitos particulares. (Página 51)
Quando falamos em constitucionalismo moderno, situamo-nos no final do sec XVIII, cujas traves
fundamentais devem estar presentes em todas as constituições - limite ao poder político e garantia
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
dos direitos individuais – podemos dizer que é um conceito mais restrito do que aquilo que se
designa na doutrina por constitucionalismo antigo.
CONSTITUCIONALISMO ANTIGO
Uma teoria que afirma uma ideia de organização fundamental da comunidade política. Esteja essa
organização fundamentalmente consagrada num documento escrito ou plasmada em normas
consuetudinárias (não escritas). Toda e qualquer comunidade politicamente organizada teve uma
constituição.
CONSTITUCIONALISMO MODERNO
Ordenação racional e sistemática da comunidade política plasmada num documento escrito, mas
onde se estabelecem as regras de limitação do poder e onde estão contemplados um catálogo de
direitos e liberdade fundamentais. É esta constituição em sentindo moderno que se opõe à
constituição em sentido histórico. É este conceito moderno que corresponde ao conceito de
constituição ocidental.
MOVIMENTOS CONSTITUCIONAIS
É um movimento que vai recuar até 1215, a chamada Magna Carta, assinada por João Sem Terra e
foi o primeiro que surgiu cronologicamente.
Em 1215, data em que foi emanada a Magna Charta Libertatem, vivia-se um período monárquico,
marcado pela vasta autoridade régia.
No séc. XVII, inicia-se o período aristocrático, marcado pela conquista de direitos, mormente através
da Revolução Puritana e da chamada Glorious Revolution. Tais direitos passam a ser enunciados em
vários documentos, como a Petition of Rights (1628), a Act for the Abolition of the Court of Star
Chamber (1641); a Habeas Corpus Act (1679) e a Bill of Rights (1689). Nesta fase, os poderes
encontravam-se centralizados na câmara alta do Parlamento: a Câmara dos Lordes.
• A magna carta, 1215 – pacto celebrado entre o rei e os varões ingleses. Cedência do poder
do rei perante a nobreza. Há uma ideia de uma limitação dos poderes. É o 1º instrumento
escrito que vai estar na base do modelo do constitucionalismo inglês.
• A petição de direito, 1628 – mais uma tentativa de limitar os poderes do rei. Carlos I assina a
petição dos direitos. Com isto, o rei não pode lançar impostos sem consentimento do povo.
No entanto, não cumpriu a sua obrigação e por isso foi condenado à morte.
• Declaração de direitos, 1689 – Guilherme de Orange; passamos a ter um governo limitado. -
Limitação do poder, Constituição Mista, liberdade pessoal dos ingleses, segurança de
propriedade, habeas corpus, due process.
A evolução destes momentos constitucionais, desde a Magna Carta, de 1215, da Petition of Rights,
de 1628, do Habeas Corpus Act, de 1679, ao Bill of Rights, de 1689, conduzirá à sedimentação de
algumas dimensões estruturantes da constituição moderna.
O modelo inglês preservava a tradição. Para além disso, o constitucionalismo inglês foi um
constitucionalismo moderado, uma vez que os ingleses não romperam totalmente com a política
anterior.
Alguns pontos:
• Para garantir a liberdade e a segurança criaram o due process of law (processo justo
regulado por lei), onde se estabelecessem as regras disciplinadoras da privação da liberdade
e da propriedade.
• Laws of the land - As “laws of the land”, reguladoras da tutela das liberdades, são
interpretadas e reveladas pelo juiz, que é quem cria o direito comum (“common law”).
• Tem como principal fonte o costume.
• Representação e soberania parlamentar - Inicialmente, o Rei era o governante supremo.
Progressivamente, com a Revolução Inglesa, o órgão supremo passa a ser o Parlamento e
nele reside todo o poder. Este era composto pela Coroa, pela Câmara dos Lordes e pela
Câmara dos Comuns. O Governo era responsável perante o Parlamento.
• A existência de uma constituição mista - é aquela em que o poder não está concentrado nas
mãos de um monarca, em vez disso é partilhado por ele e por outros órgãos do governo (rei
e Parlamento).
• É uma constituição não-escrita (constituída por vários documentos que se conhecem por
“conventions of the constitution”) e flexível.
• Rule of Law (surge como estado de Direito no contexto da constituição inglesa) - Inclui
quatro dimensões fundamentais:
o A obrigatoriedade do cumprimento de um processo justo regulado por lei, no
momento de julgar e punir os cidadãos (“due process of law”).
o A lei do Parlamento como exercício do poder supremo. É ela que deve proteger os
indivíduos contra o exercício arbitrário do poder real.
o Sujeição de todos os atos do poder executivo ao Parlamento.
o Igualdade de acesso aos tribunais por parte dos cidadãos.
Forma-se a partir de 1789, com a Revolução Francesa, que pretende romper com o Ancien Régime,
contra os privilégios ou direitos estamentais, contra o poder absoluto e o monarca.
Pretende criar-se uma nova ordem assente nos direitos naturais dos indivíduos: todos os homens
nascem livres e iguais em direitos e não naturalmente desiguais por integração em determinado
estamento.
Esta nova ordem surge através de um contrato social (J. J. Rousseau), assente nas vontades
individuais, por via do qual os indivíduos deixam o “Estado de natureza” e passam a integrar o
“Estado civil”. Torna-se, então, necessária a criação de uma lei escrita, de uma constituição que
afirme os direitos naturais individuais e a nova ordem política.
O poder constituinte (E. Sieyés) é o poder de criar uma constituição, i.e. uma nova ordem social e
política. O seu titular é a Nação (o Terceiro Estado), sendo esta quem legitima o poder constituinte
originário. Trata-se de um poder originário, autónomo e omnipotente
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Esta nova ordem surge através da ideia contratualista de Rosseau, assente nas vontades individuais.
O poder político vai passar para as mãos do Terceiro estado, ou seja, vai presidir na Nação.
Alguns pontos:
o Como o surgimento da ideia de lei como expressão da vontade geral formada por
assembleias soberanas, começa a entender-se que a mesma não poderia ser
controlada pelos tribunais.
o A isto junta-se um certo entendimento da separação dos poderes: dado que o poder
legislativo estabelece a vontade geral, permitir aos juízes apreciar a validade da lei
será permitir-lhes substituir a vontade geral pela sua própria vontade. Os juízes
tornam-se “a mera boca que pronuncia as palavras da lei” (Montesquieu).
o Ao poder judicial cabe apenas aplicar a lei e não interpretá-la. Caso o juiz tivesse
dúvidas no momento de aplicar a mesma, devia suspender o caso em julgamento
até que o Parlamento desse a conhecer a sua interpretação (“referé legislatif”)
• L’ État Legal (“Estado de Legalidade”)
o Teoricamente, no constitucionalismo francês, a ideia de Estado de Direito impõe a
seguinte pirâmide hierárquica:
▪ D. D. H. C. (1789)
▪ Constituição
▪ Lei
▪ Atos de aplicação / execução da lei
o Contudo, devido ao princípio da primazia da lei, aquele Estado Constitucional
transforma-se num Estado de Legalidade (“L’ État Legal”). Neste Estado:
▪ Os cidadãos têm a garantia de que a lei só pode ser criada pelo órgão
legislativo, o órgão que representa a vontade geral.
▪ Todas as medidas adotadas pelo poder executivo para execução da lei
devem respeitar a própria lei (princípio da legalidade da administração).
▪ A lei tem de ser geral (princípio da igualdade) e não apenas para alguns.
O movimento constitucional americano não queria verdadeiramente criar uma constituição, apenas
queriam quebrar os laços com a metrópole, a Inglaterra. E a necessidade de cortar relações com a
metrópole estava relacionada com a grande desconfiança dos americanos para com o parlamento
inglês, uma vez que estes lançavam impostos, sem lhes assegurar a sua representação no
parlamento. Foram as chamadas “taxation without representation”. Pretende-se uma Constituição,
uma lei superior, que garanta os cidadãos contra as leis do legislador parlamentar soberano.
Alguns pontos:
• Esta constituição é uma Constituição como “Higher Law” - Pretendia-se que o povo fixasse
num texto escrito as regras que disciplinassem e domesticassem o poder. É o povo que toma
as decisões (“We the People of the United States”). A Constituição seria, assim, uma lei
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
PODER CONSTITUINTE
Poder constituinte derivado – poder de alterar, modificar ou rever uma constituição já existente.
Definição do livro – o poder constituinte se revela sempre como uma questão de poder, de força ou
de autoridade política que está em condições de, numa determinada altura, criar, garantir ou
eliminar uma Constituição entendida como lei fundamenta da comunidade política.
O poder constituinte teve um contributo dos 3 modelos constitucionais, no entanto, ambos viram o
poder constituinte de uma forma diferente.
Nota das aulas: A teoria do poder constituinte também colheu contributos dos 3 constitucionalismos
(americano, inglês e francês). Quando falamos da relação dos contributos de cada um destes movimentos
constitucionais, falamos de 3 palavras que caracterizam estes movimentos: constitucionalismo inglês – ideia
de constituição mista, a palavra é revelação. O constitucionalismo inglês permitiu a revelação de um direito
constitucional; constituição francesa – é exatamente o oposto do constitucionalismo inglês, porque este
modelo alicerça-se numa rutura, a palavra chave é criar. Rompe com o passado e vai criar uma nova ordem;
constitucionalismo americano – proclamar ao movimento constitucional americano com a independência dos
estados unidos. A palavra chave é proclamar. O grande objetivo do povo era estabelecer numa lei fundamental
certos limites ao poder constituído da colonia. (página 69)
Constitucionalismo Inglês
Para os ingleses era estranho a projeção de uma nova ordem política criada por um povo, ou seja,
era estranha a ideia de poder constituinte. Estes não queria criar uma nova ordem e muito menos
realizar um corte com estruturas políticas tradicionais. É por isso que se pode afirmar que ao
constitucionalismo histórico repugna a ideia de um poder constituinte com força e competência
para, por si mesmo, desenhar e plenificar o modelo político de um povo. A Constituição inglesa foi
sendo formada com base no costume, nas tradições, nas convicções religiosas. É a
sedimentação/confirmação histórica dos direitos adquiridos pelos ingleses.
Constitucionalismo Norte-Americano
• Os americanos dizem num texto escrito, produzido por um poder constituinte “the fundamental and
paramount law of the nation”
Ao contrário do que acontecia com o modelo historicista inglês, foi com o constitucionalismo Norte-
Americano que se pode dizer que nasceu verdadeiramente a ideia do poder constituinte, como um
poder de criar uma constituição, a qual está plasmada na fórmula “We, the People” consagrada no
início da Constituição dos EUA de 1787. A constituição, no ponto de vista dos americanos, era uma
forma de garantir direitos e limitar os poderes.
Constitucionalismo francês
Para os franceses o poder constituinte estava centrado nas mãos da Nação. Mas aqui a Nação não se
confunde com a ideia do constitucionalismo inglês, pelo contrário, a Nação passa a ter nas suas
mãos o poder constituinte para criar uma nova ordem política e social e romper com o Antigo
Regime.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
De acordo com Sieyès, o poder constituinte era um poder originário (não existe nenhum poder
anterior a ele), autónomo (não depende de nenhum outro poder) e omnipotente (não tem limites).
• o poder constituinte em sentido formal - o poder de fazer uma constituição ou uma nova
constituição
• o poder constituinte em sentido material - vai mais longe. É o poder de fazer uma
constituição, mas com um determinado conteúdo.
Notas das aulas: Quando falamos de poder constituinte como poder primário, a questão é: será o poder
constituinte um poder fático? Ou terá já uma natureza jurídica?
Quando falamos de um poder constituinte em poder fático, falamos de uma constituição que nasce de uma
revolução social. No entanto, não basta a Constituição ser reconhecida como um poder fático, tem de ser
reconhecida também como poder jurídico. E o poder constituinte já é um poder jurídico, porque está limitado
do ponto de vista material.
Hoje o titular do poder constituinte é o povo. Só que o povo é entendido como uma grandeza
pluralística, formada por indivíduos, associações, grupos, igrejas, comunidades, personalidades,
defensores de interesses, ideias, crenças e valores que podem ser convergentes ou conflituantes.
Poder constituinte significa, assim, poder constituinte do povo.
O povo é visto como um povo em sentido político, isto é, grupo de pessoas que agem segundo
ideias e interesses de natureza política. Não o povo caraterizado pela sua origem, língua ou cultural
comum (povo em sentido rácico, naturalista ou étnico).
É um povo plurissubjetivo: ele encontra-se naqueles grupos de pessoas, naquelas forças. É um povo
que se diferencia do povo maioritário, porque dele também fazem parte as minorias que votaram
contra ou se abstiveram.
Notas das aulas: O poder constituinte durante o se XIX, não teve apenas um titular do poder constituinte,
ainda se relacionava com o poder do monarca. A carta constitucional – o monarca fazia a constituição,
outorgava, e dava ao seu povo.
Hoje é o povo, político, leal e pluralista. Significa que estamos a falar de uma perspetiva democrática. Já não é
um povo visto como uma nação, como foi o caso do constitucionalismo francês. É neste povo que vai residir a
legitimidade da constituição, ele é o titular do poder constituinte em poder formal e material.
No entanto, nem sempre foi assim. Mesmo depois de iniciar o constitucionalismo moderno (pós-revolução
francesa) e de implantar o conceito de soberania popular, houve algumas manifestações do poder constituinte
que não era exclusivamente democrático, no sec.XIX. Para além das constituições liberais, que eram
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
constituições democráticas (constituição de 1822, 1911, …) haviam outras constituições. Quais eram?
Constituições pactuas (resultam de um pacto entre um rei e o povo, entre um princípio do rei e um princípio
do povo) ou constituições outorgadas (estão assentes no princípio monárquico, no entanto isto não significa
que não tenha relações com o princípio popular. Um exemplo é a carta constitucional de 1826. Esta carta vai
vigorar até 5 de outubro de 1910).
A constituição de 1911, 1933 e 1976 também foram uma constituição democrática. A carta constitucional até
1910 foi sendo alterada. Ela foi sendo cada vez mais democratizada. (3 revisões)
Decisões constituintes: procedimento constituinte propriamente dito - pós a tomada das decisões
pré-constituintes, realizam-se os momentos procedimentais: iniciativa, discussão, votação,
promulgação, ratificação, publicação. Estes conduzem à adoção da nova Constituição. São decisões
materiais.
O poder constituinte, hoje, é essencialmente democrático. Mas temos de saber uma distinção:
o Com Assembleia Não Soberana - À Assembleia (eleita, pelo povo, através de sufrágio)
cabe apenas elaborar e discutir o projeto da Constituição ou os projetos, competindo,
depois, ao povo aprovar, através de referendo, esse mesmo projeto. Verifica-se uma
clara influência da teoria da soberania popular de J. J. Rousseau: só o povo pode
deliberar e aprovar.
o Através de Convenções do Povo - A Constituição é elaborada por uma Assembleia
Constituinte, sendo, depois, ratificada pelo povo através de convenções reunidas para
esse efeito (Constituição dos EUA de 1787).
Para Sieyès, o poder constituinte era originário e autónomo, não havia qualquer limite.
No entanto, a doutrina atual rejeita a compreensão deste autor, ou seja, hoje o poder constituinte
tem limites.
Primeiro, a constituição tem princípios de justiça que são compreendidos como limites da
liberdade e omnipotência do poder constituinte.
Segundo, o sistema jurídico interno, não se pode separar da comunidade internacional, e por isso
encontra-se vinculado a princípios de direito internacional (princípio da independência, princípio da
autodeterminação, …)
O REFERENTE DA CONSTITUIÇÃO
Ora como podemos ver, aqui não se fala num Estado, mas sim numa sociedade (“Toda a
sociedade...”). Afirma que a sociedade tem uma constituição. Ora o que é que isto significa?
Significa que em primeiro lugar, o referente da constituição começou por ser a sociedade.
Nos esquemas políticos oitocentistas, a constituição aspirava ser um “corpo jurídico” de regras
aplicáveis ao “corpo social”.
Daqui vai nascer a expressão de Constituição da República, que exprime a ideia de que a
constituição não se refere apenas ao Estado, mas à própria comunidade política, isto é, à res publica.
Mas então como se explica que a constituição, no início do século XIX, passe a ter como referente
o Estado e não a sociedade? E como é que passamos de uma constituição da República para uma
constituição de Estado? Através de 3 razões:
Então, a Constituição é uma estrutura conformadora com o Estado, mas isto é uma constituição em
sentido moderno, porque em sentido histórico toda a comunidade antes de ser um estado já tinha a
sua constituição (ex: politeia grega). O estado passa, então, a ser o referente da Constituição.
Resumidamente:
• Numa constituição em sentido histórico, toda a sociedade sempre teve uma constituição. Então
podemos dizer que a constituição antecede o estado.
• Numa constituição em sentido moderno, já é o estado que antecede a constituição. É a chamada
constituição do estado
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
O Estado surge nos finais do sec. XV e implementa-se nos fins do sec. XVII. Em meados do sec. XVII
assistimos à paz de Westfália, em 1648, que põe termo à guerra dos 30 anos. É com isto que vai
surgir o estado em sentido moderno, o estado soberano – cuja a nota principal passa a ser a
soberania. Aqui surge-nos a ideia que um Estado só é Estado quando conter 3 elementos
fundamentais: o povo, o território e a soberania. - Teoria dos três elementos de Jellinek
A soberania de um Estado traduz-se, desde logo, num poder supremo no plano interno e num
independente no plano externo. O estado impõe o seu poder aos cidadãos nacionais, que se
encontram reunidos num determinado território. Por outras palavras, afirma que todos os poderes
existentes dentro do estado passam a ser subordinados pelo poder soberano, pois este é um poder
supremo, e que no plano externo, o estado era sempre independente, porque não há nenhum poder
externo que se sobrepunha ao poder do estado. Surgem, então, os estados independentes.
NOTA - No entanto isto não era o que se verificava no passado. Antes do surgimento do
estado, tínhamos outra forma de organização da sociedade, chamava-se sociedade medieval - em
que o poder não estava concentrado numa só entidade. Uma das alterações que se viu do seculo
XV para o XVII é a concentração dos poderes numa só entidade.
Também vamos encontrar o caracter originário da soberania, pois o estado não precisa de recolher
o fundamento das duas normas noutras normas jurídicas.
Ordem cronológica dos modelos de Estado: Sociedade estamental – estado absoluto – estado de
polícia – estado polícia – estado moderno
1. Estado absoluto
Não estava subordinado ao direito, não tinha limitações jurídicas. Não existia uma constituição em
sentido moderno. É este estado absoluto, que a partir do seculo XIV, assume outra qualificação: o
estado de polícia.
2. Estado de polícia
(exemplo: estado do marquês de pombal; Luís XIV em França)
O estado de polícia, ou também conhecido por estado iluminista, tem como características:
No entanto, a teoria do fisco não foi suficiente para alicerçar um verdadeiro estado de direito. Só
tivemos a verdadeira mudança no paradigma estadual quando apareceram as ideias de liberdade
individual e livre desenvolvimento económico (ideias jusnaturalista e jusracionalistas). A tarefa de
polícia deixa de ser uma tarefa totalizante do Estado e passa a ter a missão de garantir a ordem e a
segurança dos súbditos. Nasce aqui, então, o Estado Polícia.
3. Estado polícia
Então, nos finais do seculo XIV encontramo-nos com um Estado de Polícia, mas nos fins do século
XVIII vais nos aparecer o Estado polícia - aqui a polícia tem uma função administrativa típica de
prevenção de perigos e de manutenção da ordem e da segurança.
O ESTADO CONSTITUCIONAL
Hoje, o Estado só se concebe como Estado Constitucional. Com constitucionalismo já se sabe que o
Estado está submetido ao direito.
• Estado de direito
• Estado democrático
Um estado constitucional não se confunde com um estado de direito, ele é mais do que isso. Não
abasta afirmar que o poder está subordinado ao direito, temos também de afirmar que é um estado
democrático (que é o fundamento do poder).
1. Estado de direito
A concretização do estado constitucional de direito faz-se de vários modos. Vamos identificar vários
conceitos como o Rechtsstaat, Rule of Law, État légal, que apesar de serem diferentes todos
procuram alicerçar a juridicidade estatal.
→ Igualdade de acesso aos tribunais por parte dos cidadãos, a fim de defenderem os seus
direitos segundo os princípios de direito comum dos ingleses (Common Law) e perante
qualquer entidade (indivíduos ou poderes públicos)
2. Estado democrático
O estado constitucional não é nem deve ser apenas um estado de direito. O estado constitucional
moderno não se limita apenas um estado de direito. Ele estrutura-se como estado de direito
democrático, isto é, como uma ordem de domínio legitimada pelo povo. Então:
Então, o Estado constitucional é mais do que Estado de direto, é também um Estado democrático.
O elemento democrático não foi apenas introduzido para travar o poder, serve também para
legitimar esse poder (legitimação democrática do poder).
Para além de se limitar o poder político (estado de direito), é necessário saber quem é o titular desse
poder, que é o povo. Temos então aqui presente o princípio da soberania popular, segundo o qual
todo o poder vem do povo. É este princípio que assegura e garante o direito à igual participação na
formação democrática da vontade popular. Pode-se admitir que o princípio da soberania popular
serve de união entre o Estado de Direito e o Estado democrático, possibilitado, assim, a
compreensão da moderna fórmula Estado de direito democrático.
CONSTITUIÇÃO DE 1922
de 1820. Uma das razões da ocorrência desta revolução foi a partida da família Real para o Brasil
em 1807, devido às invasões francesas. Os revolucionários queriam, então, o regresso de monarca
D. João VI a Portugal, para que este reassumisse o poder. Pretendiam que o rei partilhasse os seus
poderes com o Parlamento e exercesse apenas os poderes que a constituição lhe atribuísse. Era uma
verdadeira Constituição Liberal. (Esta revolução teve um caracter burguês)
Teve dois períodos de vigência: 1822-1823 (acaba com a Vila-Francada); (revolução de setembro)
1836-1838
Esta constituição foi elaborada e aprovada pelas Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da
Nação Portuguesa e o monarca teve de aceitar e jurar o texto constitucional. Trata-se de um
procedimento constituinte representativo com assembleia soberana - A elaboração, discussão e
aprovação da Constituição é feita pela Assembleia Constituinte (eleita, pelo povo, através de
sufrágio), não havendo qualquer intervenção do povo através de referendo ou de plebiscito.
(matéria dada anteriormente).
• O princípio democrático, uma vez que a soberania reside essencialmente na Nação. Para
além disso a autoridade do rei provém da Nação;
• O princípio representativo, uma vez que os representantes eram eleitos para exercer a
soberania.
• O princípio da separação dos poderes
• O princípio da igualdade jurídica
• O princípio do respeito pelos direitos pessoais
Nesta constituição encontrava-se, logo no Título I, o catálogo dos direitos e deveres fundamentais.
Quanto ao poder legislativo, ele residia nas cortes, com dependência da sanção do rei.
Quanto às estruturas eleitorais, era uma Assembleia unicameral, ou seja, só tinha uma camara, e
era eleita bienalmente (de dois em dois anos). A eleição dos deputados era indireta e a capacidade
de votação era apenas dados a certos cidadãos, excluindo-se, desde logo, as mulheres, os menores
de 25 anos, os escravos, entre outros.
Quanto ao rei, ele possuía desde logo o direito ao veto (caso ele não concordasse com uma decisão
da Corte ele podia veta-la, mas isto não significa que a eliminava! O direito de veto era apenas um
veto de suspensão de uma decisão, que ia a segunda votação nas Cortes. Quase as cortes continuem
a concordar com a decisão, o rei tem obrigação de aceitar.).
Para além disso o rei viu a sua monarquia a ficar limitada, devido à soberania popular e à separação
dos poderes. Para além disso não podia interferir no poder legislativo, nem nos Tribunais.
Apesar de D. João VI ter jurado a Constituição de 1822, quer a sua mulher (D. Carlota Joaquina), quer
o seu filho (D. Miguel), não ficaram conformados com a limitação do poder soberano do rei. Assim,
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Apesar deste não ter sido bem-sucedido, a Constituição de 1822 foi revogada. Ainda em 1823, D.
João VI promete a elaboração de uma Carta Constitucional, no entanto, devido à sua morte foi D.
Pedro IV, seu sucessor, quem, antes de abdicar do trono à sua filha, elaborou e assinou a Carta
Constitucional. Esta abdicação do trono à sua filha estava condicionada com o casamento desta com
o seu tio, D. Miguel.
Foi elaborada e assinada pelo monarca que, depois, a outorgou à Nação. É uma Carta Constitucional
criada por um procedimento constituinte monárquico.
Princípios norteadores:
Quanto ao monarca, ainda é limitado pela existência de vários órgãos, no entanto tem o direito de
iniciativa e de sanção. Possui o direito moderador e o direito de veto, mas este já permitia a
eliminação de uma decisão. A monarquia continua a ser limitada pelo facto de ser uma monarquia
representativa.
No que respeita à organização do poder político, a Carta introduz o poder moderador (Benjamin
Constant), competindo certas funções típicas do mesmo ao Chefe de Estado. O poder político era
partilhado, dividindo-se as Cortes em duas câmaras – Câmara dos Deputados, eletiva e temporária;
Câmara dos Pares, composta por membros vitalícios e hereditários, sem número fixo
(Bicameralismo).
CONSTITUIÇÃO DE 1838
Ainda que tenha jurado a Carta Constitucional por duas vezes, D. Miguel mantinha muitas reservas
face ao documento, acabando por restaurar o poder absoluto e conduzindo a uma guerra civil (1828-
1834). A vitória, na Revolução de setembro, da fação radical do liberalismo (vintistas) aboliu a Carta
Constitucional e repôs a Constituição de 1822. Contudo, da simples revisão desta surgiu a nova
constituição: a Constituição de 1838.
Esta constituição é uma constituição pactuada entre as cortes e o rei. Para além disso foi uma
constituição compromisso entre os defensores da soberania nacional (vintistas) e os defensores da
monarquia constitucional (cartistas).
Uma constituição pactuada é um pacto entre o rei e a representação nacional. Este tipo de
constituição marcava a transição de uma monarquia hereditária para uma monarquia
representativa e pronunciava a morte de legitimidade dinástica.
Nasceu então a constituição de 1838. Mas vendo bem, será uma constituição pactuada ou
estaremos apenas perante um procedimento constituinte representativo com Assembleia
Constituinte soberano?
• Se se atribui valor constitutivo aos atos praticados pela rainha, estamos perante um
procedimento constituinte misto representativo-monárquico: constituição pactuada.
• Se, pelo contrário, se entender que os atos da rainha foram meramente formais, como os
atos de D. João VI quanto à Constituição de 1822, estamos perante um procedimento
constituinte representativo com Assembleia Constituinte soberana.
À semelhança da constituição de 1822, o catálogo dos direitos fundamentais passou a estar presente
logo no início da constituição.
Nesta constituição consagrou-se a independência dos poderes políticos. Para além disso, o poder
moderador do monarca, presente na Carta, foi eliminado, mas continuo a ter direito da sanção das
leis e a ser reconhecido como Chefe do Executivo. O monarca também viu os seus poderes a ficarem
reduzidos relativamente a outros poderes.
Quanto à estrutura da assembleia, continua a ter duas camaras, mas a diferença é que os
representantes da camara alta passam a ser eleitos, e não nomeados pelo rei, e passam a exercer o
cargo de forma temporária, e não vitalícia.
Quanto ao poder judicial, o rei passa a ter poderes mais restritos do que a Carta.
A eleição de deputados e de senadores passa a ser feita por sufrágio direto e mantem-se o sufrágio
censitário. Quanto aos senadores, a capacidade eleitoral passa a ser mais restrita.
1 período de vigência - 1838-1842 (até ao golpe de Estado de Costa Cabral). Com o golpe de estado
Cabral inicia-se o terceiro período de vigência da carta constitucional.
CONSTITUIÇÃO DE 1911
Princípios norteadores:
− A Républica é uma república laica, uma vez que assentava na divisão da Igreja e do Estado, na
liberdade de culto, entre outros.
− Para além disso, a Républica também era descentralizada (descentralização administrativa).
Quanto à declaração dos direitos, a constituição de 1911 garantiu as liberdades publicas dos
cidadãos mais importantes - página 169 para ver alguns exemplos.
Quanto aos órgãos legislativos, apareceu o Congresso que era o parlamento da 1ª República e que
era composto por duas camaras: A Câmara dos Deputados e o Senado. Eram ambas eleitas for
sufrágio direto e tinham ambos o poder legislativo.
Quanto ao congresso, que se reunia durante 4 meses ao ano, competia-lhe: funções legislativas,
financeiras, eleitorais, entre outras.
Quando ao presidente da Républica, era eleito de forma indireta (eleito pelas Câmaras) e tinha um
mandato de 4 anos. Nunca foi afirmado expressamente que ele era o chefe do executivo. Aqui
avistamos o “apagamento” do Presidente da Républica.
CONSTITUIÇÃO DE 1933
A Revolução de 28 de maio de 1926 deu origem a um período de ditadura militar que durou até
1933. Durante esse período, vigorou a Constituição de 1911, pois só em 1931 se decidiu fazer uma
nova Constituição.
Em 1931, foi criado o Conselho Político Nacional, ao qual caberia apreciar os projetos de
Constituição. Esse Conselho incidiu a sua atenção apenas no projeto de Oliveira Salazar, tendo o
mesmo sido submetido a consulta popular. Estamos ante um procedimento constituinte direto
plebiscitário.
Princípios norteadores: (1) instauração de uma República corporativa; (2) Estado forte e
presidencialismo do Primeiro-Ministro (Marcello Caetano); (3) antiliberalismo político; (4) ideia
supraindividualista de Nação; (5) antiliberalismo económico; (6) ideia de economia dirigida.
CONSTITUIÇÃO DE 1976 – Apenas o que se encontra no material de apoio dado pelo Dr. Eduardo
Figueiredo
Na sua base esteve a Revolução de 25 de abril de 1974, levada a cabo pelo MFA, que,
posteriormente, entrega o poder a uma Junta de Salvação Nacional. Pretendia-se, assim, a rutura
com o regime autoritário e corporativo anterior e a consequente instauração de um regime
democrático.
Foi eleita pelo povo uma assembleia constituinte com poderes para elaborar e aprovar o projeto de
constituição. Trata-se de um procedimento constituinte representativo ou indireto com assembleia
constituinte soberana.
Princípios norteadores: (1) Princípio Republicano, (2) Princípio do Estado de Direito; (3) Princípio
Democrático; (4) Princípio da Soberania Popular; (5) Princípio da Separação de Poderes; (6) Princípio
da Autonomia Regional. Extenso catálogo de direitos fundamentais, sendo o seu princípio basilar a
dignidade da pessoa humana, que é simultaneamente limite e fundamento do poder político.
DESCONTINUIDADES
Descontinuidade constitucional – ocorre quando uma nova ordem constitucional implica uma
rutura com a ordem constitucional anterior.
Descontinuidade formal - quando uma nova Constituição adquire efetividade e validade num
determinado espaço jurídico sem que para tal se tenham observado os preceitos reguladores de
alteração ou revisão da Constituição vigente que, deixa de ser, por sua vez, válida e efetiva no
mesmo espaço jurídico.
As descontinuidades constitucionais não podem ser apenas formais, são também descontinuidades
materiais.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
No primeiro caso temos o exemplo da Constituição de 1822, que resultou do exercício do poder
constituinte democrático, materialmente distinto do poder constituinte monárquico.
No segundo caso, quando existe a tal rutura, temos o exemplo da Constituição de 1976, que é
totalmente diferente da Constituição de 1933.
Nota das aulas: A descontinuidade material tem haver com a alteração dos princípios, dos valores, da
dimensão axiológica que dá legitimidade ao poder.
CONTINUIDADES
Verifica-se ainda que a maioria das constituições portuguesas surgem no decorrer de atos
revolucionários, com exceção da Carta Constitucional (a qual não surge na sequência de um ato
revolucionário, já que a Vila-Francada é considerada um movimento contrário ao
constitucionalismo).
Embora o texto constitucional de 1976 apresente soluções inovadoras e diferentes das constituições
estrangeiras, a verdade é que também recebeu algumas influências estrangeiras que são vivíveis em
certas matérias.
Por exemplo:
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
• A lei fundamental de Bona de 1949 (constituição alemã) que influencia o catálogo dos
direitos, liberdades e garantias
• A constituição italiana de 1948 que influenciou alguns direitos fundamentais, princípios
estruturantes e os estatutos das Regiões Autónomas.
• O modelo francês de organização do poder político.
• Constituições socialistas dos países ex-comunistas que influenciaram o catálogo de direitos
económicos, sociais e culturais.
Hoje vivemos num quadro constitucional estável. Mas o procedimento constitucional da constituição
de 1976 (está a referir ao poder constituinte originário) não foi pacifico em Portugal. Uma vez que
ele emerge de uma revolução.
Ora, mas o processo constituinte não foi perfeito, principalmente em dois pontos:
NOTAS DAS AULAS: O Verão quente de 75 traduziu-se numa agitação social e política.
Na primeira etapa ocorreu com uma certa tranquilidade. Mas ocorreram algumas incapacidades civis, por
exemplo haviam cidadãos que não tinham capacidade eleitoral por terem preenchido cargos no estado
anterior, logo estas incapacidades são injustas.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Conselho da revolução - poder de fiscalização, legislativos. Era o órgão que tinha assento a ação das Forças
Armadas.
Na segunda e terceira etapa foram quase imposições de ordem substancial - imposições que vem a traduzir
numa certa falta de liberdade da assembleia.
O instrumento normativo – pacto MFA- partidos --- fez limitações no procedimento do poder constituinte.
MOMENTOS CONSTITUCIONAIS
Notas das aulas: ESTADO DE EMERGENCIA – ARTIGO 19 DA CONSTITUIÇÃO PORTUGUESA. O estado sítio é
mais grave ainda. O direito constitucional está em contacto direito com a nossa vida quotidiana.
• É uma constituição unitextual - está num único texto; não há documentos com valor
constitucional e não existem leis de revisão fora da constituição. As alterações resultantes
das leis constitucionais de revisão “serão inseridas no lugar próprio mediante substituições,
supressões e aditamentos necessários” (art.287/1 da CRP); exceção relevante - disposição
transitória que diz respeito à vigência de uma lei anterior à constituição. O art.290 afirma
que só são leis constitucionais com valor constitucional aquelas que não constarem nas
disposições finais e transitórias, todas essas que não constam nas disposições são
originárias. A lei que continua a ter valor formal é a lei que visa incriminar os agentes
irresponsáveis da PIDE-DGS – ART. 292 - é uma lei constitucional.
• É uma constituição rígida ou semi-rígida – A rigidez atribui ás normas constitucionais uma
capacidade de resistência à derrogação superior à de qualquer lei ordinária. É uma
constituição que pode ser alterada, mas que para ser alterada tem de seguir um
procedimento de revisão específico e dentro de certos limites (formais, circunstanciais e
materiais) – Título II da Parte 4 (art. 284 e sg) é um procedimento específico que respeita á
revisão da constituição. A nossa constituição é rígida porque tem um processo específico
que ela própria contempla para poder ser alterada; todas as outras normas não têm
capacidade derrogatória relativamente às normas constitucionais. E caso estas estejam em
desconformidade com a constituição vão ser chamadas de normas inconstitucionais e vão
sofrer consequências jurídicas - princípio da constitucionalidade.
• É uma constituição longa – com a 7º revisão constitucional passamos a ter 296 artigos.
Opõem-se ao conceito de constituição breve. (contrariamente, a carta de 1826, a
constituição de 1836 e a constituição de 1911 foram constituições breves).
• É uma constituição programática - no sentido em que as normas-fim e normas-tarefa que
são definidas ao estado – o legislador constituinte impõe ao estado a realização de
determinados objetivos - impõem tarefas que o estado tem de realizar - Artº. 9 (tarefas
gerais) que nos remete para o Artº.80 e o Artº. 81 (define os princípios do artº.80 - ele
fundamenta concretamente as funções do estado no domínio económico); é uma
constituição programática porque contem normas-fim e normas-tarefa que são definidoras
de programas de ação e de linhas de orientação dirigidas ao Estado. A constituição comanda
a ação do Estado e impõe aos órgãos competentes a realização das metas programáticas
nela estabelecidas; inconstitucionalidade por omissão (quando o estado não cumpre as
tarefas consagradas na constituição) - Artº.283- a consequência é apenas uma “chamada de
atenção” ao órgão legislativo; inconstitucionalidade por ação.;
• É uma constituição compromissória/ aberta – Esta abertura constitucional traduz uma ideia
de compromisso entre forças políticas e sociais. Compromisso entre um estado unitário e as
autarquias; compromisso entre o princípio liberal de direitos individuais e o princípio
socialista de direitos económicos e sociais; a forma de governo parlamentar e presidencial; o
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
7 Revisões:
Evolução no texto da constituição e sua mutação em sentido material. - ver gráfico do Pwp do Dr.
Eduardo Figueiredo
O poder de revisão (poder constituinte derivado) encontra-se limitado (não podemos esquecer que
ele é um poder constituído, ou seja, encontra-se disposto na própria constituição - artº.284 e289)
A constituição é do tipo rígido, uma vez que exige um processo agravado em relação ao processo de
formação das leis ordinárias. É este processo agravado de revisão que impede a livre modificação da
lei fundamental pelo legislador ordinário, sendo então uma garantia da Constituição, porque este
limite absoluto ao poder de revisão assegura uma certa estabilidade à Constituição. No entanto, isto
não quer dizer que ela não possa ser alterada! Ela pode ser alterada, mas apenas seguindo e
cumprindo certo limites:
Entre nós, a revisão ou modificação da Constituição é feita pelo órgão legislativo ordinário: a
Assembleia da República. A apresentação de projetos de revisão cabe, apenas, aos deputados (art.
285.º/1 CRP; 161.º/a CRP). - Respeito pelo princípio democrático representativo.
Entre nós, está afastada a possibilidade de se recorrer a referendos como meio de revisão
constitucional ou de ratificação das leis de revisão (art. 115.º/4/a CRP).
2. Limites temporais
Estes limites justificam-se pela necessidade de assegurar uma certa estabilidade às instituições
constitucionais.
A AR pode rever a Constituição decorridos 5 anos sobre a data da publicação da última lei de
revisão ordinária – revisão ordinária (art. 284.º/1 CRP). Assim, nenhuma AR poderá, assim, efetuar
mais do que uma revisão ordinária.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
A AR pode rever a Constituição em qualquer momento, desde que observe o requisito previsto no
art. 284.º/2 CRP – revisão extraordinária.
Nas revisões ordinárias, as alterações à Constituição têm de ser aprovadas por maioria de 2/3 dos
deputados em efetividade de funções (art. 286.º/1 CRP).
Nas revisões extraordinárias, aplica-se um processo agravado: exigência de uma maioria de 4/5 dos
deputados em efetividade de funções para que a AR possa assumir poderes de revisão; as
alterações devem, depois, ser aprovadas por uma maioria de 2/3 dos deputados em efetividade de
funções (art. 284.º/2 e 286.º/1 CRP)
4. Limites circunstanciais
Proíbe-se que a revisão da Constituição seja feita em situações de anormalidade constitucional. Ex:
estado de guerra ou estado de emergência (art. 289.º CRP). Uma vez que nestas circunstâncias
podem constituir ocasiões favoráveis à imposição de alterações constitucionais. Desta forma, estes
limites impedem que isto aconteça.
→ A revisão deve ser feita de modo expresso (proibição das revisões tácitas).
→ Forma: Lei Constitucional (art. 161.º/a e 166.º/1 CRP)
→ Promulgação: o Presidente da República não pode recusar a promulgação da lei de revisão (art.
286.º/3 CRP).
→ Publicação: Quer se trate de supressão de normas, quer se trate de uma substituição do texto
constitucional, quer de aditamentos, todas estas alterações devem ser inseridas no lugar
próprio da Constituição, publicando-se conjuntamente a Constituição, no seu novo texto, e a lei
de revisão constitucional (art. 287.º CRP).
Emendas constitucionais - Novos documentos, paralelos ao texto constitucional e com idêntico valor
em relação a este, que podem consubstanciar um aditamento, uma supressão ou uma alteração,
tornando este modelo de revisão constitucional mais complexo no momento de interpretar a
Constituição em vigor. É o caso da Constituição norte-americana.
No que respeita aos limites inferiores, coloca-se a questão de saber se uma lei de revisão poderá
inserir na Constituição qualquer matéria. A resposta parece ser positiva, inexistindo uma qualquer
“reserva de matéria constitucional”
No que respeita aos limites superiores, coloca-se a questão de saber se há normas da Constituição
que não podem ser objeto de revisão. A resposta parece ser positiva, remetendo-nos para a
temática dos limites expressos e tácitos.
Os limites expressos são aqueles limites ao poder de revisão que estão expressamente consagrados
no próprio texto constitucional (Art. 288.º CRP). As Constituições selecionam um leque de matérias,
consideradas como o cerne material da ordem constitucional, e impedem que estas matérias
possam ser alteradas pelo poder de revisão. Correspondem ao núcleo essencial da Constituição.
Também designados de limites imanentes de revisão.
Os limites tácitos são aqueles que não estão expressamente consagrados na Constituição. Alguns
podem deduzir-se do próprio texto constitucional (limites textuais implícitos) e outros são
imanentes a uma ordem de valores não positivados (limites tácitos propriamente ditos)
Limites heterónomos - limites tácitos propriamente ditos - são aferidos por uma ordem
jusnaturalista ou ordem social justa + limites heterónomos expressos - submissão do poder
constituinte derivado a convenções internacionais.
E será que podemos dizer que os limites ao poder de revisão são para sempre? Será que os
mesmos vinculam o próprio poder constituinte derivado?
Limites absolutos são aqueles limites que não podem ser superados pelo exercício do poder de
revisão.
Limites relativos são aqueles limites que visam apenas condicionar o poder de revisão, mas que não
impedem a modificação das normas constitucionais, desde que se cumpram as condições agravadas
estabelecidas por esses limites.
Contraste da Escola de Coimbra com a Escola de Lisboa (temos de escolher um caminho e justifica-lo)
Segundo o curso, terão os limites expressos uma natureza absoluta? Sim, são “normas
supraconstitucionais” colocadas no texto pelo poder constituinte originário.
Rejeição da dupla revisão - A existência de limites absolutos é muito contestada por alguns autores,
que defendem que o o legislador de revisão pode ser ultrapassar estes limites através da técnica de
dupla revisão - em primeiro lugar, a revisão incidiria sobre as próprias normas de revisão,
eliminando ou alterando esses limites; em segundo lugar, a revisão far-se-ia de acordo com as leis
constitucionais que alteraram as normas de revisão. Desta forma todos os limites absolutos podiam
ser alteráveis e ultrapassados pelo legislador de revisão, como são os casos dos limites presentes no
art.286º da CRP.
A doutrina tem, porém, entendido que tal conduz a uma verdadeira situação de fraude
constitucional. Além disso, as normas constitucionais que estabelecem os limites de revisão são
“supraconstitucionais”, já que resultam do exercício do poder constituinte originário, sendo com
base nelas que se controlam as alterações à Constituição, i.e. o poder constituinte derivado.
Mas o que é o direito? É simultaneamente uma medida material e uma medida formal:
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Medida material - conjunto de princípios materiais informados por uma certa ideia de justiça e que
funcionam como meio de ordenação racional e vinculativa de uma comunidade organizada.
Medida formal – para cumprir esta função ordenadora, o direito estabelece regras e medidas,
prescreve formas e procedimentos e cria instituições.
− Juridicidade
− Constitucionalidade
− Sistema de direitos fundamentais
− Divisão dos poderes
− Sustentabilidade ambiental
JURIDICIDADE
A ideia de ordenação através o direito implica a conexão de direito objetivo com direito subjetivo.
Direito subjetivo - regras de direito que garantem uma distanciação e uma diferenciação do
individuo perante os poderes públicos. Estes direitos asseguram ao individuo um estatuto subjetivo
que é constituído pelo catálogo de direito, liberdades e garantias pessoais.
Michael Kloepfer referia-se, neste sentido, a um “Estado de Distância”, o qual garante ao indivíduo
uma esfera de liberdade, autonomia e privacidade – marcada pela diferença e pela individualidade –
subtraída à ingerência ou intervenção do poder político.
A juridicidade sempre implica a proteção dos indivíduos, não só contra o Estado, mas também
contra os outros indivíduos.
O poder estadual está sujeito a parâmetros de justiça. O estado não pode ser intrometido, ao ponto de
eliminar a autonomia das pessoas.
CONSTITUCIONALIDADE
− Para além disso, as leis só são validas se o seu conteúdo estiver conforme com a constituição.
Por outras palavras, as leis têm de estar em conformidade com a Constituição.
− Também se proíbe as leis de alteração constitucional, salvo as leis de revisão elaboradas pela
própria Constituição
Aqui vamos encontrar o princípio da conformidade dos atos do estado com a constituição.
Em primeiro lugar, todos os atos dos poderes público, incluindo os atos políticos, têm de estar em
conformidade com a Constituição.
O princípio da constitucionalidade não é apenas uma exigência de que os atos dos poderes públicos
não violem as normas constitucionais. Também a omissão inconstitucional, por falta de
cumprimento de deveres jurídicos de legislar contidos em normas constitucionais, constitui uma
violação do princípio da constitucionalidade (art. 283º)
A supremacia da Constituição, assim concretizada, revela a sua força normativa. Esta é uma força
que impede que a sua supremacia seja anulada por interesses políticos ou de natureza económica,
por exemplo sendo neutralizada pelo legislador ordinário.
Em suma, sempre que uma determinada matéria for regulada pela Constituição, tal disciplina
jurídica não pode ser revogada livremente.
O Estado de Direito assenta numa jusfundamentalidade, i.e. numa base antropológica que preserva
e protege o Homem em todas as suas manifestações juridicamente relevantes – como pessoa,
cidadão, trabalhador, administrado, arguido ou contribuinte.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
DIVISÃO DE PODERES
• Dimensão negativa – a separação é vista como divisão, controlo e limite do poder. -- ligado
à ideia de divisão dos poderes.
• Dimensão positiva – a separação é vista como constitucionalização, ordenação e
organização do poder do estado de forma a que se logre uma justa e adequada ordenação
das suas funções. -- ligado à ideia de separação dos poderes.
O princípio da divisão dos poderes é uma forma de limitar o poder, evitar a concentração dos
poderes e de proteger a liberdade individual contra os abusos de poder.
O princípio da separação dos poderes assegura a ordenação das funções do estado e intervém como
esquema relacional de competências, tarefas e funções dos órgãos constitucionais de soberania.
Atribuição dos poderes a diferentes órgãos --- Estado de poder limitado e moderado
A função legislativa, a função administrativa e a função de julgar devem ser atribuídas, cada uma
delas, principalmente, a um determinado órgão.
Este princípio não implica uma rigorosa separação orgânica dos poderes. Por exemplo, o Governo
também exerce a função legislativa. Basta, portanto, que estas partilhas de poder não ponham em
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
causa o núcleo essencial da ordenação de poderes feita pela Constituição. Neste sentido, ele é um
princípio normativo-autónomo.
A distribuição das diferentes funções pelos diferentes órgãos tem de ser feita com base em critérios.
Cada função deve ser atribuída ao órgão que pela sua estrutura, titularidade e modo de trabalho,
possa exercer de forma mais eficaz uma determinada função. O exercício de cada função deve ser
funcionalmente adequado.
Para que o poder seja limitado e moderado, não basta que haja uma distribuição de cada um deles
por diferentes órgãos (arts. 2.º e 111.º CRP). O próprio poder tem de se controlar reciprocamente.
(checks and balances).
• Garantia da autonomia político-regional dos Açores e da Madeira (art. 6.º, 225.º e 288.º/o)
da CRP)
• Garantia da administração autónoma local (art. 6.º/1, 235.º e 288.º/n) da CRP) --
Descentralização administrativa, através da criação de vários níveis de autarquias locais: (1)
regiões administrativas; (2) municípios; (3) freguesias. Cada uma delas tem os seus próprios
órgãos legislativos (Assembleia Municipal e Assembleia de Freguesias) e executivos (Câmara
Municipal e Junta de Freguesia). Consequências:
o Maior participação democrática;
o Controlo recíproco do exercício do poder entre autarquias locais e o Estado Central.
SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL
Existência de um Estado cujas políticas sociais, económicas e jurídicas viabilizem uma situação de
sustentabilidade, procurando alcançar harmonia entre a exploração dos recursos naturais, o
respeito pela dignidade humana e a preservação do meio ambiente, ao mesmo tempo que evita
qualquer tipo de ecofundamentalismos.
Sustentabilidade em sentido amplo capta três pilares distintos: (1) sustentabilidade ecológica; (2)
sustentabilidade económica; (3) sustentabilidade social.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Sustentabilidade em sentido estrito ou em sentido ecológico aponta para a proteção dos recursos a
longo prazo por via do planeamento, economização e imposição de obrigações de conduta e de
resultado.
Hans Jonas: “Age de tal maneira que os efeitos da tua ação sejam compatíveis com a preservação da
vida humana genuína” (princípio ético de responsabilidade)
1º FASE:
Surge com as Revoluções Liberais, iniciadas nos finais do séc. XVIII, à medida que o Estado se vai
subordinando ao Direito: pretendem-se regras que defendam os cidadãos da Administração.
− Princípio do primado da lei - durante a época liberal, a Administração não poderia praticar
qualquer ato que desrespeitasse o que a lei votada no Parlamento estabelecia. A lei surgia, pois,
como limite da atividade administrativa.
− Princípio da reversa da lei - estabelece que, em determinados domínios (como a
propriedade e a liberdade), só o Parlamento poderia intervir de forma inovadora. A
Administração só desempenhava aqui uma função executiva.
2º FASE:
Com a passagem da época liberal para a época do Estado de Direito Social (transição do séc. XIX
para o séc. XX), altera-se o conceito de lei. Agora, para além de se protegerem os cidadãos, também
se visa a prossecução do interesse público.
Como são muitos os domínios onde o Estado passa a intervir, a Administração está não só
subordinada à lei, mas a todo o Direito (Constituição, Direito Internacional, etc.) -- Fala-se de um
princípio de juridicidade (art. 266.º/2 da CRP).
Existem ainda: Matérias de competência concorrente (art. 198.º/1/a da CRP); Matérias da exclusiva
competência legislativa do Governo (art. 198.º/2 da CRP)
Estes dois princípios andam estreitamente associados, levando alguns autores a afirmarem que eles
formam um único subprincípio. A segurança e a proteção da confiança exigem, no fundo, uma
transparência dos atos do poder, de forma a que o cidadão veja garantida a segurança nas suas
disposições pessoais e nos efeitos jurídicos dos próprios atos. No fundo, cada um de nós há-de saber
qual o quadro legal em que nos inserimos para planificar as nossas vidas. Protege-se, pois, a
confiança que os cidadãos depositam na continuidade do quadro legal existente.
• Atos normativos
• Atos jurisdicionais
• Atos da administração
Quanto aos atos normativos, ele vai ser dividir em três princípios:
As normas legais devem ser claras e suficientemente densas, para que os cidadãos possam perceber
quais são os seus direitos e deveres, para que a administração possa aplicar a norma e para que essa
mesma norma possa ser fiscalizada.
Nota: uma norma deve ser densa, porque um ato legislativo que não contêm uma disciplina suficientemente
densa/determinada, não oferece uma medida jurídica capaz de, p.e, alicerçar posições juridicamente
protegidas dos cidadãos. Para além disso, a norma não pode ser obscura, mas sim clara, de forma a que seja
possível utiliza-la para resolver um problema concreto. Concluindo, a norma tem de ser clara para que um
cidadão MÉDIO a possa compreender.
Os atos legislativos e outros atos normativos não podem produzir quaisquer efeitos jurídicos quando
não estejam ainda em vigor nos termos constitucional e legalmente prescritos. (cf. art. 119.º CRP)
Nota: uma lei não pode produzir efeitos antes da sua publicação ou do período de vacatio legis, ou seja, caso a
lei for publicada hoje não pode produzir os seus efeitos nesse mesmo dia (penso que tem de esperar, pelo
menos, até as 00h do dia seguinte)
Leis prospetivas - são as que pretendem vigorar para o futuro (eficácia ex nunc). Em geral, estas leis
respeitam o princípio geral da segurança jurídica.
Retroatividade autêntica - verifica-se quando a norma pretende vigorar e produzir efeitos jurídicos a
partir de uma data anterior à data da sua entrada em vigor. A norma pretende vigorar para o
passado (eficácia ex tunc).
Nos demais casos, uma lei só será inconstitucional se violar de forma ostensiva/excessiva certas
normas ou princípios jurídico-constitucionais, mormente o princípio geral da segurança jurídica. -
Princípio da proporcionalidade em sentido amplo – temos de ver se a norma é adequada,
necessitária e proporcional)
Retrospetividade ou retroatividade inautêntica - quando uma norma jurídica incide sobre situações
ou relações jurídicas já existentes embora a nova disciplina jurídica pretenda ter efeitos para o
futuro. Aqui a lei pretende vigorar para o passado, mas acaba por tocar em direitos ou relações
jurídicas desenvolvidas no passado, mas ainda existentes.
Nota: a retrospetividade é diferente de retroatividade autêntica, uma vez que nesta lei pretende vigorar e
produzir efeitos para o passado.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Neste caso, os interesses da segurança jurídica e da proteção da confiança perdem peso. Proibir este
tipo de leis seria impedir que o legislador exercesse o seu poder, satisfizesse o interesse público, pois
a maioria das leis que vigoram para o futuro acabam por tocar em situações presentes que se
constituíram no passado. Assim sendo, estas leis só serão inconstitucionais se violarem
ostensivamente/excessivamente o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança. E
quando é que tal acontece? Princípio da proporcinalidade em sentido amplo.
1.º - Há que verificar se houve uma afetação das legítimas expetativas dos cidadãos. A mesma
existirá quando estivermos ante uma alteração na ordem jurídica com que razoavelmente os
destinatários da nova norma não podiam contar (não basta uma mera convicção psicológica).
A segurança jurídica no âmbito dos atos jurisdicionais aponta para o caso julgado. - Assenta na
estabilidade definitiva das decisões judiciais, quer por ser excluída a possibilidade de recurso ou a
reapreciação de questões já decididas (caso julgado formal), quer porque a relação material
convertida é decidida em termos definitivos e irretratáveis, impondo-se a todos os tribunais e a
todas as autoridades (caso julgado material) Este princípio não está expressamente consagrado na
CRP, mas decorre de vários preceitos do texto constitucional (art. 29.º/4 e 282.º/3 CRP).
Relativamente aos atos da administração, o princípio geral da segurança jurídica aponta para a ideia
de força de caso decidido dos atos administrativos. O ato administrativo goza uma tendencial
imutabilidade traduzida na auto-vinculação da administração na qualidade de autora do ato e como
consequência da obrigatoriedade do ato, e na tendencial irrevogabilidade do ato administrativo a
fim de salvaguardar os interesses dos particulares destinatários do ato.
Apesar disso, na atual sociedade de risco (U. Beck), cresce a necessidade de se tomarem atos
provisórios e atos precários para que a administração possa reagir à alteração de situações fáticas,
prosseguindo o interesse público e salvaguardando outros princípios constitucionais.
O princípio da conformidade impõe que a medida adotada para a realização do interesse público
tem de ser apropriada à continuação do fim ou dos fins que estão da base da sua adoção.
Consequentemente, a exigência de conformidade pressupõe a investigação e a prova de que o ato
do poder público é apto para e conforme aos fins justificativos da sua adoção. Trata-se, pois, de
controlar a relação de adequação medida-fim.
Nota: Verificar se a norma é adequada, ou seja, se está apta para atingir o seu fim.
Este princípio afirma que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível, ou seja, a medida
adotada tem sempre de ser a menos onerosa ou restritiva para o cidadão.
Desdobra-se em 4 elementos:
Apenas se respeitará este princípio se se concluir que o legislador ou a administração não podiam
ter adotado outro meio igualmente eficaz e menos desvantajoso para os cidadãos. Caso este não
adote a medida menos desvantajosa então ela não vai ser posta em prática.
Nota: verificar se a medida adotada é mesmo uma medida necessária.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Um exemplo: Um Estado quer construir um estádio para receber um torneio de futebol. Para
construir esse estádio de futebol adota uma medida que expropria uma serie de propriedades para
criar o tal estádio. Será que esta medida é adequada à luz do princípio da proporcionalidade?
1º passo - princípio da conformidade – Ora é adequada, porque a medida é apta para atingir o seu
fim, que é construir o estádio de futebol.
(Mas caso fosse uma norma necessária - uma vez que as repostas variam de pessoa para pessoa) - 3º
passo- princípio da proporcionalidade em sentido restrito – Neste princípio o legislador, que tem
desde logo maior liberdade, vai verificar as vantagens e as desvantagens da norma. Caso verifique
que há mais vantagens, então a norma vai ser posta em prática e vão construir o estádio, caso
verifique que tem mais desvantagens, a norma não vai ser posta em prática.
Nota: Se uma norma for proporcional, mas não for necessária é logo excluída a ideia de a por em prática. Logo
não é preciso ir verificar o principio da proporcionalidade em sentido restrito.
Caso a gravidade do sacrifício (ou seja, o sacrifício da dignidade da pessoa humana) seja elevada,
então o legislador vai ter menos margem de livre apreciação e a intensidade do controlo do juiz vai
ser maior.
Existirá défice de proteção quando as entidades sobre quem recai um dever de proteção adotam
medidas insuficientes para o seu cumprimento (p.e. no âmbito dos direitos fundamentais).
A verificação de uma insuficiência de juridicidade estatal deverá atender à natureza das posições
jurídicas ameaçadas e à intensidade de possibilidade de lesão dos direitos fundamentais em causa.
Este princípio vale apenas na medida do possível, já que não pode eliminar totalmente a liberdade
de conformação do legislador.
O art. 20.º da CRP consagra ainda um princípio do acesso ao direito ou garantia da via judiciária:
• Abertura da via judiciária enquanto imposição diretamente dirigida ao legislador para dar
operatividade prática à defesa dos direitos;
• Controlo judicial enquanto “contra-peso” clássico em relação ao exercício dos poderes
executivo e legislativo;
• Garantia da tutela jurisdicional efetiva;
• Garantia do patrocínio judiciário (art. 20.º/2 e 208.º CRP)
• Responsabilidade do Estado e consequente dever de reparação dos prejuízos (arts. 2.º, 22.º
e 271.º da CRP);
• Indemnização dos sacrifícios especiais impostos a determinados cidadãos (art. 62.º/2 CRP).
PRÍNCIPIO DEMOCRÁTICO
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
São necessários procedimentos eleitorais legitimadores, mas também deslegitimadores, i.e. que
afastem os titulares dos cargos políticos, se e quando necessário. Por outras palavras, temos que
assegurar que os titulares do poder são representativos, no sentido em que eles são eleitos pelo
próprio povo, mas também é preciso saber que, se eles são eleitos pelo próprio povo, no momento
em que eles deixem de representar os seus interesses, o povo tem de ter mecanismos e meios para
os deslegitimar e, portanto, para afastar esses titulares dos cargos políticos.
Tipos de democracia:
• Democracia Direta: surgiu na Grécia, cabendo aos cidadãos fazer as leis. Todos governam e
todos são governados. Todos os cidadãos acabam por exercer de forma direta o poder
político.
• Democracia Participativa: surgiu na pós-modernidade e consiste no exercício da democracia
pelos cidadãos através de instituições cívicas. Neste caso, os cidadãos já não vão exercer o
poder político de forma direita, mas vão ter um intermediário institucional.
• Democracia Representativa: delegação do poder em representantes, por parte dos
cidadãos. Os órgãos representativos típicos são o Parlamento, o Governo e o Chefe de
Estado.
• Democracia Semidirecta: partilha algumas caraterísticas com a democracia representativa,
apesar de os cidadãos desempenharem um papel direto em certos aspetos da tomada de
decisão (p.e. por referendo, revocação popular ou iniciativa popular). --- art.115º
O princípio democrático é um princípio essencial da nossa Constituição. Olhando para os vários tipos
de democracia, verificamos que o principal modelo que está plasmado no texto da nossa
constituição é o modelo da democracia representativa. Essencialmente através do mecanismo de
sufrágio, isto é, através do exercício do direito de votar e do direito de ser eleito, mas também
através dos partidos políticos e ao regime que se aplicam a estes. No entanto, também encontramos
os outros tipos de democracia: a democracia direta (plenário dos cidadãos – art. 245.º/2 CRP),
participativa (art. 2.º, 109.º e 151.º CRP) e semidirecta (art. 115.º CRP – referendo).
Nota: de todos estes mecanismos, nós vamos nos focar na análise do referendo.
Desde logo, o poder político precisa de uma legitimação e essa legitimação provém do povo, que é
titular da soberania. Quando falamos aqui em povo, falamos de um povo igual, ou seja, um povo
formado por cidadãos iguais, livres e autónomos.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Os representantes vão exercer um conjunto de funções, sempre em nome do povo, através dos
órgãos de soberania.
Nota: o povo é, como já foi dito, titular de soberania. E ele vai repartir parte da sua soberania com os
representantes, para que estes a possa exercer em seu nome.
Quando os representantes violam os seus deveres ou violam os limites ao exercício dos seus
poderes, eles têm de responder (“prestar contas”) por tal ao próprio do povo.
1. REFERENDO
O referendo é uma consulta feita aos eleitores sobre uma questão ou sobre um texto através de um
procedimento formal regulado na lei (procedimento referendário). A iniciativa do referendo pode
pertencer aos órgãos do estado (governo, deputados) ou a um certo número de cidadãos (iniciativa
popular). Este foi acolhido em 1989 e está regulado na lei orgânica do referendo.
Nota: Este instrumento/mecanismo é o que vai ser estudado de forma mais desenvolvida.
2. INICIATIVA POPULAR
A iniciativa popular é um procedimento democrático que consiste em facultar aos cidadãos eleitorais
(+ de 18 anos e recenseados) a iniciativa de uma proposta tendente à adoção de uma norma
constitucional ou legislativa. Através da iniciativa popular, os cidadãos podem: ou pedir à assembleia
legislativa a edição de uma lei sobre determinada matéria, ou apresentar um projeto de lei
completamente redigido. A iniciativa popular também dirigir-se a uma decisão quanto a
determinada questão.
3. VETO
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
O veto é o instrumento político que permite aos cidadãos exigir que uma determinada lei seja
submetida a voto popular. Se esta votação conduzir à rejeição do ato legislativo este deverá ser
considerado como nunca tendo existido no ordenamento jurídico.
4. PLEBISCITO
O plebiscito é a pronuncia popular incidente sobre escolhas ou decisões políticas, como por exemplo
a confiança num chefe político, a opção por uma ou outra forma de governo. Quando a pronuncia
popular incide sobre um texto normativo o plebiscito aproxima-se do referendo.
Nota: ver a diferença entre o referendo e o plebiscito
5. REVOCAÇÃO POPULAR
Instrumento ao dispor de um conjunto de cidadãos eleitores e que lhes permite pedir a destituição
antecipada (antes do termo do mandato) de um representante, geralmente direto. Este mecanismo
está sujeito a algumas críticas:
O REFERENDO
-Definição em cima -
É o referendo incidente sobre questões de revelante interesse nacional e que devem ser decididas
pela Assembleia da Républica ou pelo Governo através do ato convencional de direito internacional
ou de ato legislativo. (art. 115.º/3 CRP).
O referendo tem eficácia vinculativa quando o número de votantes for superior a metade dos
eleitores inscritos no recenseamento (art.115º/11). A partir dai os órgãos competentes são
obrigados a praticar atos políticos incorporadores do conteúdo das respostas referendárias. –
Embora isso não impeça que, mais tarde, se aprovem ou revoguem as normas jurídicas a que o
referendo dizia respeito, tendo em conta que o mesmo não introduz nem retira automaticamente
normas jurídicas no ordenamento
A eficácia deste resultado mantém-se para sempre? Não, apenas enquanto durar a Assembleia ou o
Governo a quem coube a proposta do ato referendário.
Formulação das perguntas: devem ser relativas a uma só matéria; formuladas com objetividade,
clareza e precisão; para respostas de sim ou não; num número máximo de perguntas a fixar por lei –
3 questões (art. 115.º/6 CRP).
regiões autónomas e do poder local, bem como de Deputados do Parlamento Europeu (art. 115.º/7
CRP).
Limites circunstanciais: Não podem ser realizados referendo em estado de sítio ou estado de
emergência.
Quando ao universo eleitoral, para além de puderem votar os eleitores recenseados no território
nacional, em algumas matérias os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro também têm o
direito de votar. (art.115/12) (exclusivamente ≠ especificamente)
PROCEDIMENTO REFERENDÁRIO
REFERENDO REGIONAL
O referendo regional é aquele que incide sobre questões de interesse específico regional no âmbito
das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira (as que constam dos referidos estatutos político-
administrativos).
O art. 232.º/2 CRP dispõe que compete à Assembleia Legislativa Regional apresentar propostas de
referendo regional incidentes sobre questões de relevante interesse específico regional, as quais
devem ser submetidas a decisão do Presidente da República.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
REFERENDO LOCAL
O referendo local é aquele que incide sobre questões de interesse local. A iniciativa pertence às
autarquias locais previstas na Constituição (freguesias, municípios e regiões administrativas), em
matérias da competência dos seus órgãos (assembleia municipal, assembleia de freguesia e junta de
freguesia) ou aos cidadãos eleitores.
• O referendo
• O direito de sufrágio
• Os partidos políticos
• Os sistemas eleitorais
PRINCÍPIO DE SUFRÁGIO
O sufrágio deve ser universal, igual, direto, secreto e periódico (arts.10º/1, 49º/1, 113º/1 e 115º/7).
→ Princípio da universalidade
Este princípio aponta para a ideia de que todos os cidadãos são direitos de sufrágio, ou seja, todos
os cidadãos podem votar (direito de sufrágio ativo) e todos podem ser eleitos (direito de sufrágio
passivo). A constituição proíbe o sufrágio restrito – podem votar e ser eleitos todos os cidadãos de
cidadania portuguesa, mas também, em determinadas circunstâncias, os cidadãos da União
Europeia e os cidadãos da CPLP (art.15º).
Os únicos que não podem votar são os menores de 18 anos e aqueles que não têm capacidade de
agir no mundo dos negócios.
Com este princípio liga-se a obrigação do legislador assegurar a possibilidade real do exercício do
voto.
O voto direto significa que o voto tem de resultar imediatamente da manifestação da vontade do
eleitor, não existindo nenhum intermediário entre o titular da soberania e o eleitor. Com este
princípio pretende assegurar-se a fidedignidade do voto.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
O princípio da liberdade de voto significa garantir ao eleitor o exercício do direito de voto sem
qualquer coação física ou psicológica. Desde logo, proíbe-se o voto obrigatório, garantindo-se a
liberdade de votar ou não votar. Assim, o voto é visto como um dever cívico e não como um dever
jurídico.
Nota: caso o voto fosse um dever jurídico, quem não fosse votar iria sofrer sanções. Ex. Brasil
O princípio do voto secreto significa que o cidadão eleitor guarda para si a sua decisão de voto,
sendo então uma garantia da própria liberdade de voto. Este princípio pressupõe, então, a
pessoalidade do voto, mas não a sua presencialidade (sendo possível o voto por procuração ou por
correspondência), e a proibição de sinalização direta ou indireta do voto (não pode ser possível
identificar a escolha do eleitor – ex.: urnas diferentes para cada partido, boletins de voto de cores
diferentes).
→ Princípio da igualdade
O princípio da igualdade de voto exige que todos os votos tenham uma eficácia jurídica igual, ou
seja, o mesmo peso, e que tenham todos o mesmo valor de resultado. Então, este princípio tem
duas dimensões:
• Igualdade quanto ao peso de voto – cada cidadão têm um voto com o mesmo valor (que é
um), independentemente da condição da pessoa que vote. Proíbe-se então o voto plúrimo.
• Igualdade quanto ao valor do resultado – todos os votos devem contribuir da mesma forma
para o resultado final eleitoral, ou seja, os votos devem ter a mesma consideração para a
distribuição de mandatos. Isto verifica-se, desde logo, através da adoção do sistema
proporcional (art. 149.º CRP).
Da exigência de igual valor quanto ao resultado deriva também a proibição constitucional das
cláusulas de barreira (arts. 113.º/5 e 152.º/1 CRP) – As cláusulas-barreira impõem aos partidos
políticos a obtenção de uma determinada percentagem ou resultado eleitoral para que os mesmos
possam ter representação no Parlamento. (De acordo com as cláusulas-barreira, um partido, p.e,
para ter representação na AR é preciso que ele tenha tido um número mínimo ou uma percentagem
mínima de votos.) --- Isto não existe no nosso ordenamento jurídico.
Vantagens das cláusulas de barreira – passamos a ter uma menor quantidade de partidos no
Parlamento, o que garante uma maior estabilidade política. E exigimos que para o partido entrar no
partido ele já tem de ter uma representação relativamente significativa.
Desvantagens das cláusulas de barreira – os cidadãos que votaram no ou nos partidos que não
conseguiram alcançar a percentagem mínima em nada contribuíram, com o seu voto, para o
resultado eleitoral.
→ Princípio da periodicidade
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
O princípio democrático impõe o sufrágio periódico (art.113º/1) e a renovação periódica dos cargos
políticos (art.117º). - Princípio da periodicidade do sufrágio. Assim, impede-se a vitaliciedade dos
mandatos.
O princípio democrático relaciona-se aqui com o princípio do estado de direito, uma vez que a
duração do período do exercício dos cardos deve ser previamente fixada na Constituição,
proibindo-se a sua alteração a não ser nos casos previstos na própria Constituição (art. 113.º/1 CRP).
Além disso, o sufrágio deve ter lugar regularmente por períodos certos e determinados,
antecipadamente conhecidos e marcados pela Constituição.
Nota: ver a tabela dos pwp
Cada eleitor só vota uma vez. - Está ligado com o princípio da igualdade.
SISTEMA ELEITORAL
• Sistema maioritário
• Sistema proporcional
SISTEMA MAIORITÁRIO
Carateriza-se pelo espaço geográfico estar dividido em círculos uninominais (ou seja, cada um dos
círculos apenas apresenta um nome – p.e, nos estados unidos, cada partido apresenta um único
candidato para a presidência), sendo que cada círculo elege o vencedor (o candidato que obteve
mais votos).
Este sistema tem uma origem inglesa, sendo também conhecido por modelo de Westminster. Para
além disso está ligado ao tipo de democracia representativa.
• Governos mais estáveis e funcionais; (p.e, temos dois candidatos. Quem vai ganhar é aquele
que tem mais apoio. Isto vai trazer maior estabilidade.)
• Alternância do poder através do sistema bipartidário; (uma vez que o sistema maioritário
impossibilita os partidos pequenos. Temos o exemplo dos estados unidos, onde o partido
republicano e o partido democrática, estão em constante alternância)
• Robustecimento da oposição graças à separação clara entre esta e o Governo.
Desvantagens:
SISTEMA PROPORCIONAL
Caracteriza-se pelo facto de cada um dos círculos apresentar vários candidatos. Serão eleitos os
candidatos que tiveram um maior número de votos e recorre-se ao método de Hondt para perceber
quantos candidatos vão ser eleitos de cada um dos partidos.
Este sistema tem uma origem francófona e está ligado com a ideia de uma democracia participativa.
• Garante a igualdade material (voto igual quanto ao valor do resultado – todos os votos
contam o mesmo);
• Adequação ao pluripartidarismo, favorecendo a representação e o aparecimento de
pequenos partidos;
• Maior controlo e transparência do poder, porque estão apresentados todos os grupos
sociais.
Desvantagens:
Ora, a CRP opta expressamente pelo sistema eleitoral proporcional (art. 113.º/5 CRP). Sistema esse
que não pode ser alterado, uma vez que este sistema chega a constituir um dos limites materiais de
revisão (art. 288.º/h da CRP).
Relativamente às eleições para a AR, a constituição optou por uma das fórmulas de
proporcionalidade - método de Hondt
Nos demais casos de eleições colegiais, consagra-se o sistema proporcional, mas há liberdade de
escolha no que respeita à fórmula de proporcionalidade (arts. 113.º/5, 231.º/2 e 239.º/2 CRP).
SISTEMA PARTIDÁRIO
O pluralismo partidário é um elemento essencial do princípio democrático, decorrendo dos arts. 2.º,
10.º/2 e 51.º da CRP. O mesmo constitui um limite material de revisão (art. 288.º/i CRP).
Os partidos políticos são uma entidade especial, desde logo quanto à sua natureza.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Um partido é uma associação que agrupa um maior ou menos número de pessoas. Tem, desde logo,
uma estrutura organizatória consistente e permanente (cada partido tem a sua própria estrutura e
cada um tem a liberdade de determinar a sua estrutura). Patilha um projeto político comum (cada
partido tem um programa ou uma ideologia própria). Para além disso, o partido visa alcançar e
conservar o poder de forma legítima, desde logo através das eleições ou através da mobilização do
eleitorado.
• Associações públicas
• Associações privadas com funções constitucionais - é esta a posição do nosso curso.
Um partido político é uma associação privada, mas é uma associação privada distinta das outras,
uma vez que está relacionada com o princípio democrático e com a própria constituição.
Três funções essenciais dos partidos (estão apresentadas na lei dos partidos políticos):
Estas três funções permitem, desde logo, reconhecer uma qualidade jurídico-constitucional
diferenciadora das associações partidárias em relação às outras associações privadas.
Liberdade externa:
No entanto, há limites à fundação de partidos, designadamente por estrangeiros, porque estes não
são, em geral, titulares de direitos políticos. Assim sendo vigora o chamado princípio da cidadania
que afirma que os partidos políticos são integrados por cidadãos titulares de direitos políticos.
(Artigo 7.º - Princípio da cidadania. Lei dos partidos).
Como consequência à liberdade de atuação partidária, ninguém pode ser obrigado a fazer parte de
um partido ou ser coagido a pertencer nele. (art.46º/3).
Ainda dentro da liberdade externa encontramos os limites relativos à extinção e suspensão dos
partidos – De acordo com a Constituição tal função pertence ao Tribunal Constitucional.
Mariana Pombo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra 2020/2021
Liberdade interna:
Os partidos políticos têm, porém, de prestar contas quanto ao seu património. É o Tribunal
Constitucional que aprecia o cumprimento das obrigações constitucionais e legais dos partidos
políticos quanto à apresentação das suas contas. Nessa tarefa, é auxiliado pela chamada Entidade de
Contas e Financiamento dos Partidos Políticos.
DIREITO DE OPOSIÇÃO
O direito de oposição não se limita à oposição parlamentar, mas também extraparlamentar (desde
que exercido nos termos da Constituição – art. 10.º/2 CRP), p.e os debates nas televisões. A
oposição extraparlamentar relaciona-se com outros direitos fundamentais, como o direito de
reunião e manifestação (art. 45.º CRP) e com o princípio democrático. Releva, essencialmente,
quando a oposição parlamentar deixa de ter expressão significativa (p.e. “grandes coligações”).
O direito de oposição exerce-se não apenas face à maioria parlamentar, mas também ao Governo.
Existe um conjunto de direitos de oposição. São exemplos: Direito à informação regular e direta
sobre o andamento dos principais assuntos de interesse público (art. 114.º/3 CRP);Direito de
fiscalização e de crítica no âmbito da Assembleia da República (arts. 156.º, 180.º/2/c e 194.º CRP);
Direito de antena (art. 40.º/2 CRP); o Direito de consulta prévia sobre questões políticas importantes
(Lei n.º 24/98, art. 5.º)
DESOBEDIÊNCIA CIVIL
“É o direito de qualquer cidadão, individual ou coletivamente, de forma pública e não violenta, com
fundamento em imperativos ético-políticos, poder realizar os pressupostos de uma norma de
proibição, com a finalidade de protestar, de forma adequada e proporcional, contra uma grave
injustiça” (Dreier).
É um Direito à Indignação contra uma Lei, uma Política ou medidas de uma Política.
Não se confunde com o direito de resistência (recorrer muitas vezes à violência) porque não visa
combater globalmente um sistema político corrupto ou injusto.
PRINCÍPIO MAIORITÁRIO
• Limites externos – por vezes, a importância do assunto exige maiorias qualificadas, não só
por razões de justiça, mas também para a proteção das minorias.
• Limites internos – a maioria não pode assentar numa pretensão absoluta de verdade, já que
a solução maioritária nem sempre é a mais justa ou melhor.