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Giani de Cássia Santana

Linguagem, Mídia e Identidade


Linguagem, Mídia e Identidade - Luiz Rogério Ludwig Farinha

ASSOCIAÇÃO EDUCATIVA CAMPOS SALLES

CHANCELARIA COORDENAÇÃO DA COMISSÃO PRÓPRIA DE


AVALIAÇÃO - CPA
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Edson Fernandes
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COMUNICAÇÃO
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DIRETOR GERAL
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CAMPOS SALLES Internet e Relações Públicas: Lina Maria
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DIRETOR ACADÊMICO
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Primeiro ano Tecnológicos, Administração
e Ciências Contábeis: Jairo Gonçalves Duarte
(adjunto)

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Linguagem, Mídia e Identidade - Luiz Rogério Ludwig Farinha

LINGUAGEM, MÍDIA E IDENTIDADE.

APRESENTAÇÃO
Linguagem, Mídia e Identidade estão intimamente ligadas. A maneira como percebemos a variação
da língua ou concebemos a linguagem, por exemplo, e a forma como as informações chegam aos
sujeitos por meio de diferentes meios de comunicação (ou mídias) diz muito a respeito dos possíveis
modelos de identidade existentes em uma determinada sociedade.

Nesta disciplina abordaremos a linguagem enquanto forma de interação entre os sujeitos, consi-
derando sua conexão com a sociedade e as relações de poder que se estabelecem por meio da
mesma. Ademais discutiremos a respeito da mídia enquanto uma forma de linguagem que contribui
para propiciar e muitas vezes incentivar modos de pensar e agir sobre o mundo e sobre os aconte-
cimentos que nele se dão.

Objetivos Gerais
Compreender a vitalidade e variabilidade da linguagem, enquanto algo que constitui a sociedade e
ao mesmo tempo é constituída por ela.

O que você irá aprender?


•• Desmistificar concepções ingênuas sobre a linguagem e evidenciar sua relação direta com
a sociedade;
•• Fazer uma leitura crítica da Mídia enquanto veículo de comunicação que reflete valores e
interesses de pequenos grupos socialmente prestigiados;
•• Perceber a linguagem dos meios de comunicação como meios de acesso à valores e
ideologias que contribuem para a formação da identidade dos sujeitos;

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Linguagem, Mídia e Identidade.


A Vitalidade e Variabilidade da Língua e da linguagem e as relações de poder que nelas se estabe-
lecem.

Objetivos específicos
Desmistificar concepções ingênuas sobre língua e linguagem e evidenciar a relação direta das mes-
mas para com a sociedade.

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Temas abordados nesse módulo


APRESENTAÇÃO............................................................................................................................................................. 3

INTRODUÇÃO................................................................................................................................................................... 6

1. DA VITALIDADE E VARIABILIDADE DA LINGUAGEM: DESMISTIFICANDO CONCEPÇÕES


INGÊNUAS................................................................................................................................................................ 6

1. 1  Linguagem e relações de poder................................................................................................................... 9

1. 2  Linguagem e Mídia..........................................................................................................................................14

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................................................15

MAPA MENTAL................................................................................................................................................................16

3 REFERÊNCIAS.............................................................................................................................................................16

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INTRODUÇÃO
Muitos consideram a língua enquanto um organismo vivo, mas há controvérsias em relação á tal
ideia. O autor Ernesto d’Andrade, por exemplo, nos diz que a língua não pode ser comparada a um
organismo, como se fosse uma planta ou uma vegetação, uma vez que ela não é independente do
homem, não tendo vida própria.

Deste modo a língua deve ser considerada um ser organizado que não nasce, morre ou se modifica
por si mesma, mas que depende e tem intima relação com a sociedade que a constitui e pela qual
é constituída. Logo, a vitalidade e variabilidade da língua dependem das pessoas e da forma como
estas se organizam em determinados contextos, tempo e espaço.

A língua é ainda manifestada por meio de diferentes linguagens que podem ser verbais e não ver-
bais, tais como: a pintura, a música, a dança, dentre outras. E perceberemos que assim como a
língua a linguagem está atrelada à sociedade na qual ela se manifesta.

A linguagem não é, pois, algo apartado da “pólis”, ou, melhor dizendo, da sociedade, não é uma
coisa morta, mas sim algo dinâmico, variável e carregado de ideologias, sendo evidente seu cará-
ter social e as relações de poder que se manifestam nela ou se exercem por meio dela. Nas
sociedades divididas em classes, por exemplo, as relações de poder perpassam a linguagem e são
muitas vezes exercidas por meio dela, assim como por meio da cultura.

Na primeira parte temos o desenvolvimento de ideias a partir do Título “Da vitalidade e variabilidade
da linguagem: desmistificando concepções ingênuas”, que dará inicio aos nossos estudos partindo
da discussão acerca da concepção de linguagem na perspectiva de três diferentes grupos concei-
tuais, para, deste modo, podermos desmistificar algumas ideias equivocadas acerca da linguagem.

Na segunda parte que responde pelo título “Linguagem e relações de poder”, nos aprofundaremos
nos estudos da linguagem partindo de concepções tradicionais que a percebem enquanto um con-
junto de regras, para percepções mais modernas que a reconhecem enquanto algo vivo e que se
perpetua em contextos sociais onde se embrincam relações de poder.

Por fim, na última parte temos o título “Linguagem e Mídia”, que estabelece de maneira sucinta a
relação entre linguagem e mídia e proporciona a transição da primeiro parte para a segunda.

1. DA VITALIDADE E VARIABILIDADE DA LINGUAGEM:


DESMISTIFICANDO CONCEPÇÕES INGÊNUAS.
A vitalidade e variabilidade da linguagem nem sempre foi considerada em nossa sociedade e em
especial no campo da educação, no tocante ao Ensino de Língua Portuguesa. Por este motivo inicia-
remos esta disciplina abordando as concepções de linguagem mais comuns elaboradas ao longo
da história. Elas se organizam em três grupos. Quais sejam:

•• A concepção de linguagem como expressão do pensamento;


•• A concepção de linguagem como instrumento de comunicação;

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•• A concepção de linguagem como forma de interação.


No primeiro grupo de concepção acreditava-se que o homem representava o mundo através da lin-
guagem e esta era concebida como conjunto de signos utilizados para expressar o pensamento das
pessoas. Contudo, tal perspectiva apresentava alguns equívocos, na medida em que como nos diz
Geraldi, partindo desta, chegaríamos à ideia de que quem não se expressa bem, não pensa.

Aliás, expressar-se bem neste entendimento seria o mesmo que fazê-lo tal como os modelos da
literatura clássica, ou seja, acreditava-se que apenas aquelas pessoas que falavam e escreviam tal
qual grandes escritores da nossa literatura, escreviam e falavam bem.

Logo, bons falantes e escritores seriam aqueles que o fizessem do ponto de vista da gramática nor-
mativa. E por conta desta maneira de conceber a linguagem o ensino da mesma se dava por meio
de exercícios de reprodução de regras gramaticais e da linguagem de textos literários, sendo estes,
unicamente, considerados bons e corretos e os demais textos que circulavam em outras esferas que
não a literária eram simplesmente excluídos.

A estudiosa Kátia Bräkling em seu artigo: “Concepções de linguagem e suas implicações para a
prática pedagógica”, nos ensina que numa perspectiva de linguagem como esta seria inevitável
atribuir aos sujeitos que não escrevem, leem ou falam bem, sua própria incompetência, relegando
a estes um lugar de inferioridade diante daqueles que dominariam o bem falar, escrever ou ler da
linguagem clássica literária.

Atenção
“No primeiro grupo de concepções, acreditava-se que o homem repre-
sentava o mundo através da linguagem e esta era concebida como um
conjunto de signos utilizados para expressar o pensamento das pessoas.
Contudo, tal perspectiva apresentava alguns equívocos, na medida em que como nos diz Ge-
raldi, partindo desta, chegaríamos à ideia de que quem não se expressa bem, não pensa.”

O segundo grupo de concepções, entretanto tem muito em comum com o primeiro, mas na con-
cepção de linguagem como instrumento de comunicação uma das diferenças é que os textos não
literários não são excluídos da prática de ensino.

Tal concepção vê a linguagem como um jogo de combinações estruturais para formar frases e tex-
tos e a língua é percebida como um código que quando expresso por meio de textos veicula apenas
o sentido pretendido pelo seu autor e qualquer desvio na compreensão do mesmo não é aceito.

Esta concepção de linguagem exclui, portanto, o leitor - interlocutor do texto - do processo de pro-

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dução de sentidos deste e vê a linguagem como algo estático, não a percebendo como um processo
de interação entre interlocutores. Escrever e falar bem neste sentido são compreendidos como re-
produzir modelos ou combinar frases.

Por fim temos o terceiro grupo de concepções que percebe a linguagem como forma de interação
e não como um mero instrumento de transmissão de informações do emissor ao receptor. Nesta
perspectiva os sujeitos praticam ações que não seriam possíveis senão por meio da fala, rompen-
do-se com a ideia de que a linguagem é expressão do pensamento, instrumento de comunicação
ou representação da realidade. Linguagem, neste sentido, é vista como um processo de significação
do mundo, das pessoas e das coisas, ou seja, quando me expresso oralmente ou por escrito não
estou representando a realidade, mas minhas intenções enquanto produtora de um enunciado. Logo
se digo a uma criança: “Tchau querido, se obedecer à vovó, amanhã eu o levo ao parque” não estou
representando a realidade, mas uma promessa que pode ou não se concretizar.

Saiba mais
Interlocutores são as pessoas que participam da interação verbal, seja
ela uma conversa, palestra, leitura de um texto, etc. Os interlocutores
falam ou escrevem, ouvem ou leem aquilo que foi dito ou escrito.
Enunciado é o texto escrito ou a fala produzida por alguém.

A linguagem enquanto interação, deste modo, considera também os efeitos de sentido que meu enun-
ciado gerará sobre o interlocutor e o contexto de produção deste para sua significação, ou seja, não
basta ler ou ouvir palavras para que elas façam sentido, é necessário saber em que situação, quando
e onde elas foram proferidas para compreendê-las. Deste modo a frase: “Tchau querido, se obedecer
à vovó, amanhã eu o levo ao parque” não faria qualquer sentido em um ambiente de trabalho, sendo
uma conversa entre patrão e funcionário, ou seja, ela perderia todo o seu significado. Contudo, a frase
faria todo o sentido se imaginássemos esta conversa entre mãe e filho na casa da vó do menino.

Tais exemplos nos levam a compreender que o processo de produção de textos orais ou escritos não
se reduz ao encaixe de palavras ou frases, mas a um processo que se dá em contextos específicos
que determinarão os sentidos possíveis para o que for dito ou escrito, além disto, a linguagem é
uma construção sócia histórica elaborada por homens e sob a determinação de fatos que aconte-
cem na história das diferentes sociedades.

Nesta última perspectiva, porém, a linguagem é percebida como um sistema de comunicação que
usamos para interagir com outras pessoas. Logo esta se constitui em um sistema de signos de na-
tureza social que garante uma comunicação eficaz na medida em que suas regras são conhecidas
e compartilhadas por todos.

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Deste modo, conclui-se que a linguagem é toda forma de expressão humana mediada por signos e
neste sentido podemos expressar nossos pensamentos, ideias, opiniões e sentimentos, por meio de:
sinais, símbolos, sons, gestos, linguagem escrita ou audiovisual, dentre outras. As diferentes lingua-
gens são, contudo, uma resposta à necessidade humana de viver em sociedade e de possibilitar aos
sujeitos compartilhar e transmitir suas vivências e pensamentos com seus semelhantes.

Pense comigo
A linguagem falada pode ser considerada como uma tendência natural
humana, mas é apenas uma variante da língua, pois existem outras tipologias de signos que
também são convencionados socialmente e permitem a interação comunicativa.

Em suma, a experiência da linguagem unifica os homens, singulariza-os, distingue-os dos outros


seres vivos, fortalece laços no meio humano e transforma-se em patrimônio coletivo. Daí lembrar-
mos que língua e linguagem são fenômenos que fazem dos sujeitos seres de interação sociocultural.

1. 1  Linguagem e relações de poder.


Embora linguagem e poder não pareçam ter qualquer tipo de relação, muitas formas de exercício
do poder se dão por meio da linguagem e isso acontece das mais variadas formas, seja por meio
de um discurso pejorativo que ridiculariza ou neutraliza o outro ou por meio do domínio de um
discurso formal ou linguagem padronizada que se estabelece em nossa sociedade como algo que
se reduz a pequenos grupos de pessoas socialmente privilegiados.

No livro de Bagno: “Preconceito Linguístico”, por exemplo, discute-se a imposição (pela classe do-
minante brasileira que goza de maior prestígio social) de uma língua-padrão, considerada superior
e tida pela sociedade como norma absoluta e correta, além disso, critica-se a busca pela regulari-
zação estatal e escolar da norma padrão da língua portuguesa, a repressão das manifestações de
diferentes falares que não se adéquam a “língua culta” tida como modelo único a ser seguido e a
reprodução de relações sociais fundadas na dominação e na desigualdade, privilegiando-se uma
variedade de nossa língua em detrimento de outras tantas.

Nildo Viana em seu livro: “Linguagem, discurso e poder - ensaios sobre linguagem e sociedade”
afirma, contudo, que a consciência que temos do mundo é mediada pela linguagem e que esta
não é apenas um produto técnico desvinculado das relações sociais, pelo contrário a linguagem
tem inclusive uma formação semelhante a da sociedade existente, interferindo na consciência e na
constituição da mentalidade dos indivíduos. Ela é, pois, o meio pelo qual os indivíduos se comuni-
cam e manifestam sua consciência e neste caso tende a reproduzir a sociedade existente e reiterar
os discursos dominantes que em alguns casos reforçam concepções de invariabilidade da língua e

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do mundo.

De modo consequente podemos dizer que uso da linguagem no contexto social brasileiro, por
exemplo, nunca foi despretensioso, desde a época do descobrimento do Brasil a Língua Portuguesa
foi um instrumento de dominação cultural de colonizadores em detrimento dos colonizados. Ela
foi imposta aos que aqui já habitavam por meio da catequização dos índios pelos jesuítas, bem
como por meio da difusão de valores europeus, ou seja, com a prerrogativa de “instruir” os índios os
missionários portugueses usaram discursivamente seus conhecimentos estabelecendo sua língua e
costumes aos nativos brasileiros. O fato é que e isso interferiu na memória discursiva de tal povo e
provocou em sua maneira de falar reestruturações, apagamentos e identificações que possibilitaram
a instalação do discurso europeu e domínio do território nacional.

Logo, percebemos que no período colonial o uso da língua funcionou como instrumento de domi-
nação utilizado pela classe detentora do “bem falar”. Esse grupo de pessoas interagia de acordo
com interesses próprios e se comunicavam de maneira distinta dos demais, se agregava por seme-
lhanças socioculturais e gozava de maior prestígio social em detrimento de outros grupos.

A cultura dominante contribui para a integração real da classe dominante


(assegurando uma comunicação imediata entre todos os seus membros e
distinguindo-os das outras classes); para a integração fictícia da sociedade no seu
conjunto, portanto, à desmobilização (falsa consciência) das classes dominadas; para
a legitimação da ordem estabelecida por meio do estabelecimento das distinções
(hierarquias) e para a legitimação dessas distinções. Este efeito ideológico produ-lo
a cultura dominante dissimulando a função de divisão na função de comunicação:
a cultura que une (intermediário de comunicação) é também a cultura que
separa (instrumento de distinção) e que legitima as distinções compelindo todas
as culturas (designadas como subculturas) a definirem-se pela sua distância em
relação à cultura dominante. (BOURDIEU 1989, p.11)

Levando em consideração o contexto histórico da colonização brasileira, do qual falamos ante-


riormente e considerando as ideias do autor ora citado, podemos afirmar que a imposição da Lín-
gua Portuguesa e da cultura europeia aos nativos brasileiros contribuiu para a integração real da
classe dominante representada pela corte portuguesa e pelos jesuítas. Neste caso fica evidente
que a maneira de falar e agir dos colonizadores portugueses os distinguia da população indígena
e a “modesta” preocupação daquele grupo em ensinar o catolicismo aos índios e transmitir-lhes a
língua portuguesa e os costumes europeus contribuíram para a desmobilização dos índios e para
legitimação de hierarquias e classes sociais.

Contudo na atualidade a linguagem ainda nos serve como um instrumento de legitimação de hie-
rarquias e divisão da sociedade em classes. Voltando a Bagno temos o chamado “Preconceito Lin-
guístico” que é gerado pelas diferenças linguísticas existentes no interior de um mesmo idioma. Tal
fenômeno acontece por influencia de antigas concepções de linguagem abordadas no início dos
nossos estudos no título anterior denominado “Da vitalidade e variabilidade da linguagem: desmis-
tificando concepções ingênuas”. Ou seja, na perspectiva de linguagem que privilegia o “bem falar”
dos autores da literatura clássica brasileira ou da gramática normativa, por exemplo, qualquer outro

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falar era considerado inferior.

Algo muito parecido se dá com relação ao preconceito linguístico, uma vez que aqueles que o prati-
cam consideram a linguagem padrão da Língua Portuguesa como correta e desconsideram a vitali-
dade e variabilidade da mesma, esquecendo-se de que as diferentes maneiras de falar no contexto
social brasileiro se dão pelas disparidades regionais existentes neste contexto e que tais diferenças
evoluem ao longo do tempo e envolvem os aspectos históricos, sociais e culturais de determinado
grupo.

Vale salientar que o preconceito linguístico é uma questão preocupante na atualidade, pois ele se
dá com certa frequência e pode ser um propulsor da exclusão social. Bagno ratifica esta ideia afir-
mando que é notório tal preconceito no Brasil e que muitos indivíduos consideram sua maneira de
falar superior ao de outros grupos.

Não é raro encontrarmos, por exemplo, um sulista que considere sua maneira de falar superior à da-
queles que vivem no norte e nordeste do país, assim como também não é incomum vermos pessoas
que gozam de maior prestígio social e financeiro desdenharem do modo de falar de outras pessoas
mais pobres e humildes. Neste caso o preconceito linguístico acontece por meio de deboche e, em
alguns casos, pode gerar violência, seja ela física, verbal ou psicológica.

No caso da violência verbal esta se dá com o uso de palavras pejorativas e depreciativas que deter-
minam estereótipos associados às variedades linguísticas e intitulam aqueles que não se utilizam
da norma padrão, caipiras, baianos, nordestinos, roceiros, favelados, dentre outros.

O fato é que não existe uma forma “certa” ou “errada” de usar a língua, visto que ela é mutável e vai
se transformando ao longo do tempo, de acordo com o contexto em que é proferida, bem como de
acordo com a evolução social e histórica da humanidade.

Sendo assim não se devem desconsiderar as expressões populares e variações linguísticas, tais
como: as gírias, regionalismos, dialetos, dentre outros, mas deve-se, contudo considerar os con-
textos em que tais falares são proferidos e a adequação dos mesmos à situação comunicativa. Por
exemplo, em situações comunicativas que envolvam a conversa de jovens, adolescentes ou situa-
ções informais entre pessoas adultas que sejam bastante intimas a gíria é perfeitamente cabível,
mas em situações formais, como por exemplo: entrevista de emprego, palestra ou audiências com
juízes tal maneira de falar já não seria aceitável. Logo devemos perceber e diferenciar as situações
de uso da língua e adequar nossa maneira de falar ao contexto em que estivermos inseridos. E isso
também se deve à escrita.

Vale lembrar que embora em nosso país todos falemos a língua portuguesa em todo o território
nacional, o Brasil possui um extenso território e isso causa variações e particularidades regionais.
Deste modo, os sotaques não se distinguem apenas nas cinco regiões brasileiras, mas também den-
tro de um mesmo estado, ou seja, é comum percebemos as diferenças regionais nos falares de uma
pessoa que vive na capital e outra que vive no interior de um mesmo estado por exemplo.

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Contudo percebemos que quando concebemos a linguagem como um grupo de regras a serem
seguidas para “o bem falar” acabamos por rebaixar todas as variações linguísticas que não se ade-
quam à norma padrão da Língua Portuguesa e isto é frequente no contexto social brasileiro, causan-
do o preconceito e a exclusão de grupos minoritários, destinando o poder a grupos que gozam de
maior prestígio social e acentuando a desigualdade social no país, posto que a língua está ligada à
estrutura e aos valores da sociedade.

Neste sentido o sociólogo Bourdieu em seu livro “O poder simbólico”, coloca em questão a aceita-
ção, sem uma análise crítica e cuidadosa, das incorporações que o chamado modelo de Saussure,
filósofo e linguista Suíço produziram na linguística moderna.

É importante, portanto, antes de dizer por que Bourdieu coloca em questão tal modelo destacar-
mos a relevância de Saussure enquanto um autor cujas obras repercutiram nos estudos sobre a
Linguística moderna e orientaram uma geração de pesquisadores estruturalistas dos anos 60 e 70.

O fato é que embora as reconstruções teóricas deste autor tenham dado origem a uma série de
estudos na estruturação de uma linguística com teor científico, e tenha ele sido uma das principais
referencias na articulação do estudo integrado da linguística e da semiologia subjacente que teve
repercussões numa série de áreas do saber, como a filosofia, a sociologia e a psicologia, para Bour-
dieu o modelo proposto por Saussure acaba privilegiando a estrutura dos signos e a decifração de
palavras e dá pouca atenção às funções práticas da linguagem, ou seja, as situações de uso, ou aos
usos que os agentes realmente fazem dos signos, como falamos em parágrafos anteriores. E tal fato
nos leva a concepções de linguagem que privilegiam o domínio de um determinado código para
o bem falar e escrever e percebem a leitura como um ato de decifrar palavras, em contrapondo à
produção de sentidos a partir das situações de comunicação, interação e contexto em que se inse-
rem os falantes e seus falares.

“o simples conhecimento do código não permite senão imperfeitamente dominar


as interações linguísticas realmente efetuadas” (Bourdieu, 1983, p. 50-51).

Para o autor a análise da produção de sentido não pode se desvincular de uma nova Teoria da
Prática ou do que ele chama de “Economia das Trocas Simbólicas”. Afinal as trocas linguísticas
são relações de comunicação, mas não se reduzem a essa função, ou seja, não há como apartar
a linguagem de suas condições sociais de produção uma vez que a eficácia da comunicação não
consiste na linguagem em si, mas no mundo social que a produz.

Partindo desta ideia, percebemos a intima relação entre língua e sociedade e aprofundaremos ainda
mais nossos estudos no sentido de pensarmos de maneira mais profunda como se estabelecem as
relações de poder por meio da linguagem. Ainda seguindo as afirmações de Bourdieu em seu livro
“O poder simbólico” temos que os sujeitos são capazes de fazer coisas com palavras ou imagens,
ou seja, são capazes de exercer ao poder simbólico da linguagem, fazendo as pessoas verem, cre-
rem ou agirem de modo pré-determinado.

[...] poder quase mágico que permite obter o equivalente que é obtido pela força
(física ou econômica), graças ao efeito específico de mobilização, só se exerce se

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for reconhecido, quer dizer, ignorado como arbitrário. [...] O que faz o poder das
palavras e das palavras de ordem, poder de manter a ordem ou de a subverter,
é a crença na legitimidade das palavras e daquele que as pronuncia, crença cuja
produção não é da competência das palavras (Bourdieu, 1989, p. 1415).

Logo as palavras têm o poder de mobilizar os sujeitos quando proferidas por pessoas que gozam de
certa legitimidade social e a linguagem tem se tornado, em muitos casos, um mecanismo de pro-
dução de categorias sociais e de divisão de classes, fazendo com que as pessoas vejam as coisas
de determinado modo, acreditem em algo ou ajam de maneira específica.

Podemos, por exemplo, perceber isso em discursos políticos ou midiáticos que são proferidos por
repórteres, políticos, usuários das redes sociais, líderes comunitários, dentre outros. Os enunciados
produzidos pelas pessoas, ora citadas, adquirem certo valor de verdade em decorrência das posi-
ções ocupadas pelos mesmos, no campo acadêmico, político, midiático, etc, e isso cria condições
para um verdadeiro jogo social de produção de uma ordem discursiva.

“O porta-voz é aquele que, ao falar de um grupo, ao falar em lugar de um grupo,


põe, sub-repticiamente, a existência do grupo em questão, institui este grupo, pela
operação de magia que é inerente a todo o ato de nomeação” (Bourdieu, 1989, p.
159).

Mauss, sociólogo e antropólogo francês complementa as ideias de Bourdieu dizendo que o “porta-
voz” , ou seja, aquele que profere o discurso político ou midiático, por exemplo, e tem certa relevân-
cia no meio em que o faz, não pode ser visto como um indivíduo que age por interesse ou em favor
próprio, mas sim como alguém investido pela sociedade e que tem autoridade na qual ele mesmo
se obriga a crer. Ele é um sujeito que tem naturalmente o espírito de sua função e é levado a sério
porque a sociedade percebe a necessidade dele.

Logo, o poder simbólico das palavras depende de um locutor que tenha seu reconhecimento le-
gitimado por pessoas que por sua parte desenvolveram esquemas de percepção capazes de re-
conhecer a autoridade daquele, bem como é necessário que este locutor se sinta investido por tal
autoridade e conquiste seu reconhecimento para se pronunciar em nome de um determinado grupo
e falar o que os membros deste gostariam de falar se estivessem em seu lugar.

Partindo das discussões acima, conseguimos perceber que a linguagem não é apenas a produção e
troca de signos elaborados pelas pessoas, mas ela consiste na construção de sentidos que se exercem
por meio das relações de poder socialmente instituídas, ou melhor, dizendo, o que se produz por meio
da linguagem não é apenas sentido (pois retornaríamos ao deciframento), mas valor e poder.

Contudo, percebemos que por meio da linguagem, podemos realizar coisas e esse poder não se
deve as relações que os signos estabelecem entre si ou à obediência a uma regra para “bem falar ou
escrever”, mas a forma pela qual tais signos ganham significado social e tem socialmente instituído
o seu reconhecimento.

A língua, a palavra, são quase tudo na vida do homem. Essa realidade polimorfa e
onipresente não pode ser da competência apenas da linguística e ser apreendida

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apenas pelos métodos linguísticos. [...] A linguística estuda somente a relação


existente entre os elementos dentro do sistema da língua, e não a relação existente
entre o enunciado e a realidade, entre o enunciado e o locutor (Bakhtin, 2000, p. 346).

Neste capítulo, porém, podemos perceber a linguagem e sua relação intrínseca com a sociedade,
identificar as relações estabelecidas entre enunciado e realidade e refletir acerca da ideia de que
a linguagem não se dá por meio da combinação de regras ou da codificação e decodificação de
palavras, mas envolve o valor que cada fala assume para grupos específicos (bem como em grupos
específicos) e relações de autoridade e poder entre os falantes.

1. 2  Linguagem e Mídia


A humanidade transmite e recebe seus conhecimentos, ideias e valores por meio da linguagem,
sendo esta necessária ao desenvolvimento de atividades pessoais e profissionais humanas e um
instrumento de progressão e manifestação da cultura humana.

Já falamos que a linguagem nos diferencia dos outros seres vivos, e é para nós uma habilidade
natural, contudo, o ser humano é também capaz de criar linguagens artificiais, buscando formas
inusitadas de se comunicar, por meio, por exemplo, de universos virtuais.

Pierre Lévy, filósofo, sociólogo e pesquisador em ciência da informação e da comunicação nos en-
sina que a capacidade humana de criar linguagens artificiais se deve ao fato de que dispomos da
linguagem natural enquanto instrumento de memória e representações. E que deste modo conse-
guimos construir tempos mais rápidos ou mais violentos do que os dos outros seres vivos.

Como exemplo de linguagens artificiais temos as chamadas mídias. A humanidade as criou ao longo
da história e são elas meios de comunicação social que vem transformando as relações entre os
sujeitos, na medida em nos permitem, por exemplo, estarmos “juntos” a amigos ou parentes ainda
que a longas distâncias. Logo o fato de “estar junto” passa a ser midiatizado pela comunicação e
pode se dar por meio das redes sociais on line.

Jornais, revistas, rádio e televisão, são, por exemplo, mídias tradicionais e tem características dife-
renciadas em relação aos meios digitais, tais como o computador. No primeiro caso temos fluxos
comunicacionais unilaterais de autores para potenciais receptores. Já no segundo caso, temos um
fluxo comunicacional de todos para todos, como no caso da internet, o que rompe com a assime-
tria natural: emissor e receptor.

... uma ordem social organizada de modo a satisfazer uma das mais consideráveis
das demandas latentes na sociedade: a demanda por livre expressão interativa e
pela criação autônoma, hoje distorcida pelo pensamento esclerosado dos meios
de comunicação tradicionais. (Castells, 1999, p. 247)

A reflexão feita a respeito das transformações introduzidas pelos meios eletrônicos nos leva a per-
ceber que se antes cada meio encontrava-se separado dos demais, na atualidade não existem res-
trições quanto à integração das diversas linguagens em um mesmo meio, ou seja, podem-se fundir

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num único suporte todas as mídias. Logo Jornais, revistas, rádio e televisão podem no contexto
atual contemporâneo, incorporar um mesmo espaço, no caso o ciberespaço.

Enfim podemos concluir que a evolução das formas de linguagem nos trouxe modificações tanto
no campo das relações entre os sujeitos quanto no campo de uma nova maneira de organização
das diferentes mídias, inclusive dentro de um mesmo espaço, como foi dito anteriormente. Ademais
percebemos que as formas de linguagem vão desde a oralidade até a linguagem digital e que estas
se configuram em diferentes mídias tradicionais e contemporâneas sobre as quais falaremos pos-
teriormente .

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As antigas concepções percebiam a linguagem enquanto um elemento estável que dependia de
uma série de regras e ou normas gramaticais e deste modo apenas as pessoas que conseguiam se
adequar à linguagem padrão da língua eram consideradas “bons leitores e ou escritores”, contudo
tal maneira de conceber a linguagem não foi capaz de abarcar toda a complexidade da mesma,
uma vez que esta não se resume a um elemento instável, mas a algo que esta em constante pro-
cesso de transformação.

A língua nesta perspectiva é considerada viva e indissociável do ser humano, podendo inclusive
estabelecer relações de poder, dominação, discriminação e ou exclusão. Daí falarmos do poder da
linguagem, na medida em que por meio dela conseguimos levar pessoas ou grupos de pessoas a
fazerem coisas, ou crerem em algo. E isso nos faz perceber a língua longe de uma perspectiva de
combinações linguísticas, mas como algo que só faz sentido no âmbito das situações de comuni-
cação, situações essas que envolvem receptores e locutores (socialmente legitimados) que muitas
vezes comungam das mesmas ideias, e estabelecem diante de grupos diferentes certa relação de
poder.

Poder este que pode também ser reiterado por meio de diferentes mídias, tais como a televisão,
radio, internet, dentre outras. A linguagem midiática, contudo, tema que será melhor abordado no
futuro tem potencializada seu poder de persuasão por conta da abrangência que tem em termos
de alcance quantitativo de pessoas, bem como de espaços longínquos, fato que se intensifica ainda
mais com o advento da internet que é capaz de incluir em um mesmo ambiente diferentes mídias.

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Linguagem, Mídia e Identidade - Luiz Rogério Ludwig Farinha

MAPA MENTAL

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