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Teste/Exame Escrito – Antropologia

Licenciatura em Psicologia

Ana Rita Teixeira Martins (221920073)

1. “É o primeiro instante em que alguma coisa está lá no lugar de uma outra


coisa. É o símbolo originário”.

R. Girard

Identifique esse elemento apontado pelo autor e refira-se criticamente ao papel por
ele desempenhado na génese da cultura humana.

R: Segundo Girard, o assassínio ou linchamento coletivo é o acontecimento


fundador de todas as culturas e origem da própria humanidade. Assim, o “símbolo
originário” apontado pelo autor é o “bode expiatório” – expressão ligada literalmente
ao ritual de origem judaica descrito no Levítico e que consistia em carregar
simbolicamente um bode com todos os males e pecados da comunidade e expulsá-lo
para o deserto. É a partir deste sentido que a expressão assume posteriormente o
significado de vítima inocente que, num grupo de hominídeos pré-históricos, iria ser
usada de modo a restabelecer a harmonia, descarregando toda a raiva na vítima e
sacrificando-a. É fundamental que se acredite que o bode expiatório é culpado, apesar
da sua inocência. Um exemplo muito conhecido é o de Jesus, que chama a si os
pecados da humanidade.

A existência de um símbolo implica a existência de uma totalidade, e está é


impossível sem a religião, pois só passa a existir graças ao mecanismo do bode
expiatório. Não há outro modo de obtê-la, modo, alias, bem natural, uma vez que o
primeiro símbolo constitui a fonte da totalidade. Tudo então organiza-se em torno
desse primeiro símbolo. Depois, mediante o rito, ou seja, mediante a repetição que
este supõe, o mecanismo expiatório converte-se num processo de aprendizagem. Não
repetimos para aprender, repetimos para evitar a violência, o que em última análise,
dá no mesmo. Trata-se de um processo de aprendizagem também no sentido
experimental.

2. “Se o homem permitir, o mundo do ISSO, no seu contínuo crescimento, o


invade e seu próprio EU perde sua atualidade”.

M.Buber

Partindo de um comentário pessoal a esta passagem, refira-se à dupla atitude


proposta pelo autor.

R: Buber sitia a existência do Homem no mundo, referindo que o mundo é dual


para o homem e, para o homem existir no mundo, é relevante a palavra que este
profere e nela fixa-se a partir desse momento. Neste início distingue também
conceitos relativamente às palavras princípio, referindo que estas não são
simplesmente vocábulos isolados, mas pares de vocábulos. Fazem parte das palavras-
princípio o par EU-TU e EU-ISSO e assim, o autor quer realçar que não existe o EU por
si só, mas o EU das palavras-princípio acima referidas. “Quando o homem diz EU, ele
quer dizer um dos dois.” Relativamente à palavra-princípio EU-TU, Buber pretende
evidenciar dois seres que comunicam entre si, sendo que o TU representa o mundo de
cada sujeito, ou seja, o par de vocábulos EU-TU remete para as relações fundamentais
para a existência do homem, relações estas que são formadas por pensamentos e
sentimentos puros. Considera-se então este mundo mais complexo. Só é considerada
uma relação EU-TU quando o meu EU consegue tocar o TU do outro, o que se torna
num diálogo autêntico. Para isso, tem de haver uma abertura de ambos os lados. Por
outro lado, o EU-ISSO, é como uma relação sujeito-objeto (objetifica a relação) ao
invés de sujeito-sujeito, como visto anteriormente no EU-TU, transformando o outro
em alguma coisa ou algo útil. É uma relação sempre atravessada pela racionalidade e
pouco contacto. É de muito importante referir que esta palavra princípio EU-ISSO, é de
menos complexidade e proximidade, pouca revelação daquilo que é autêntico. Posto
isto, podemos concluir que quando se cria uma conexão mental e emocional, por meio
de diálogos entre os indivíduos em questão, faremos parte do EU-TU. Quando tal não
acontece, falamos do EU-ISSO, algo mais distante. Contrariamente ao que podemos
pensar inicialmente, o mundo EU-ISSO tem também muita importância, uma vez que é
através dele, proferindo-o, que o indivíduo conhece o mundo, no entanto, torna-se
algo negativo se o indivíduo se debruçar apenas sobre o ISSO. Inclusive Buber afirma
que não é um erro relacionar-se assim com o mundo, e que devemos alternar entre
estas duas posições.

Quando Buber fala do EU-ISSO, fala do mundo da experiência onde se pretende


descobrir o mundo, do conhecimento. O mundo do isso ou da objetividade ordena o
real, transformando-o em habitável e reconhecível. Este é o distanciamento do EU-TU,
distanciamento este que o autor considera necessário pois, quando queremos adquirir
novos conhecimentos, não é através de relações entre indivíduos, mas através de
experiências.

Quem vive só no Isso não pode ser capaz de assumir a sua humanidade
integralmente. Devemos ser capazes de combinar/articular estes dois tipos de relação.
“E com toda a seriedade da verdade, ouça: o homem não pode viver sem o Isso, mas
aquele que vive somente com o Isso não é homem”. Aquele que vive somente com o
Isso não se pode “deixa” de ser humano.

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