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2º Ano Licenciatura em Psicologia

Neuropsicologia

Análise do Artigo 8: Brain and Gender

Prof ª Doutora Ângela Leite

Alunos:
Daniela Marques (221920066)
Rita Martins (221920073)

DEZEMBRO 2021
Informações Gerais

Nome do Artigo: Effects of Chromosomal Sex and Hormonal Influences on Shaping Sex
Differences in Brain and Behavior: Lessons From Cases of Disorders of Sex Development

Ano: 2017

Autores: Matthew S. Bramble, Allen Lipson, Neerja Vashist and Eric Vilain

Nome da Revista: Journal of Neuroscience Research

Análise do Artigo

Esta revisão tem como objetivo compreender como são formadas as diferenças de sexo
a nível cerebral, incluindo o papel de género e a identidade, a orientação sexual, as
habilidades cognitivas, e as variações estruturais, a partir da análise de casos de doenças do
desenvolvimento sexual.

Como este artigo é uma revisão da literatura, a estrutura difere significativamente dos
estudos qualitativos e quantitativos, o que fez com que não fosse possível encontrar
informações para a metodologia como para os resultados, como também não foi possível
encontrar a opinião do autor, já que este não se posicionou nem contra nem a favor de
nenhuma teoria, por isso procedemos ao resumo do artigo.

Resumo

As diferenças sexuais no desenvolvimento do cérebro e no comportamento pós-natal


são em grande parte determinados pelo sexo genético e por secreções de hormonas sexuais
para o feto quando ainda está no útero. Em humanos, determinar o peso que cada um destes
fatores contribuiu permanece um desafio devido às influências sociais também terem um
grande peso. Os casos de doenças do desenvolvimento sexual (DDS) fornecem uma visão
única sobre como as mutações em genes responsáveis pela formação das gonadas podem
perturbar o ambiente hormonal desenvolvimental subsequente e provocar mudanças na
maturação normativa do ser humano. Certos tipos de DDS, como a hiperplasia adrenal
congénita (HAC), a síndrome de insensibilidade androgénica completa (SIAC) e o défice de
5α-redutase têm impacto entre homens e mulheres, e os resultados do desenvolvimento destas
condições são amplamente dependentes da composição dos cromossomas sexuais. Trabalhos
médicos e psicológicos focados na HAC, na SIAC e no défice de 5α-redutase ajudaram a
formar a base para compreender os papéis dos fatores genéticos e hormonais necessários para
orientar o desenvolvimento do cérebro humano.

Introdução

Uma pesquisa na qual foi investigado o papel das hormonas e o papel da genética na
orientação da diferenciação sexual e do comportamento em roedores providenciou uma forte
evidência que sugere que a testosterona, diretamente ou indiretamente, é responsável por
organizar características típicas do sexo masculino, incluindo comportamento de género,
orientação sexual, e talvez identidade de género. As provas fornecidas pelo modelo roedor
lançaram as bases para a nossa compreensão de como o ambiente hormonal no útero e a
composição cromossómica influenciam o desenvolvimento do cérebro e contribuem para as
diferenças sexuais observadas. Infelizmente, pesquisas semelhantes em humanos com uma
profundidade adequada carecem do ponto de vista biológico. Investigar as diferenças sexuais
na estrutura do cérebro humano e no desenvolvimento cognitivo é um desafio porque o ser
humanos é uma espécie socialmente influenciada, tornando difícil separar o efeitos das
influências ambientais das contribuições biológicas. O estudo de casos únicos de DDS quando
a composição cromossômica e alterações hormonais estão presentes melhorou muito a nossa
compreensão dos fatores biológicos que contribuem para as diferenças sexuais dentro do
cérebro do ser humano, do cognitivo ao estrutural. Aqui, os autores revisam e destacam como
é que algumas doenças do desenvolvimento sexual (DDS) melhoraram a nossa compreensão
das origens de certas diferenças de sexo dentro do cérebro, incluindo papel de género e a
identidade, a orientação sexual, as habilidades cognitivas, e as variações estruturais reais que
correspondem às diferenças de género em humanos.

Etiologia da Hiperplasia Adrenal Congénita, da Síndrome de Insensibilidade


Androgénica Completa e do Défice de 5α-redutase

Hiperplasia Adrenal Congénita

A hiperplasia adrenal congénita (HAC) é uma condição autossómica recessiva que


resulta da mutação do gene CYP21A2 localizado no cromossoma 6 e que afeta indivíduos
46,XX. Para além de causar um défice de cortisol e aldosterona, algumas das hormonas
percursoras são transportadas para a via de síntese de andrógenos, levando a níveis
aumentados de testosterona tanto nos fetos XX como nos fetos XY.
Dentro da HAC temos dois tipos: a virilização simples e a forma mais grave conhecia
como perda de sal. Devido à HAC, os indivíduos 46,XX nascem com vários graus de
virilização feminina, sendo mais frequente encontrar os lábios maiores parcialmente fundidos,
um seio urogenital comum e clitoromegalia. Isto torna mais fácil o diagnóstico precoce.

Indivíduos 46,XY com HAC apresentam sinais quase impercetíveis no nascimento,


com a exceção de casos onde há hiperpigmentação dos genitais e crescimento peniano acima
da média. Isto faz com que o diagnóstico seja mais difícil, o que causa um maior aumento da
taxa de mortalidade nos casos de perda de sal.

Quanto ao tratamento de pacientes com HAC, estes são suplementados com


mineralocorticoide para o resto das suas vidas e fazem terapia de reposição de
glicocorticoides nas formas de fludrocortisona e hidrocortisona para compensar os défices de
cortisol e para reduzir a superprodução de hormonas percursoras.

É possível prevenir a virilização genital feminina do feto através da administração do


esteroide dexametasona na mãe enquanto grávida, mas esta prática é muito controversa pelo
facto da terapia ter de começar antes do sexo do feto ter sido determinado, podendo causar
danos colaterais desconhecidos no cérebro em desenvolvimento.

Síndrome de Insensibilidade Androgénica Completa

A síndrome de insensibilidade androgénica completa (SIAC) é a perturbação mais


comum dentro das doenças do desenvolvimento sexual. Esta causa a reversão sexual
exclusivamente em indivíduos 46,XY.

Os indivíduos 46,XY com SIAC são universalmente designados como mulheres ao


nascimento, devido à aparência externa feminina da genitália.

O diagnóstico da SIAC geralmente ocorre durante os anos de puberdade, quando os


pacientes apresentam amenorreia primária devido à falta de estruturas femininas internas.
Estes indivíduos possuem uma vagina com terminação cega, útero e ovários ausentes e
testículos que não desceram para o saco escrotal devido à regressão das estruturas de Müller
por meio da secreção de AMH pelos testículos.

Se os testículos que não descenderam não forem removido antes da puberdade, muitas
vezes ocorre o desenvolvimento normativo da mama, resultante dos altos níveis de
testosterona circulante que é aromatizada localmente em estrogénios ativos, estimulando o
crescimento da mama. Se as gónadas tiverem sido ressecadas antes da puberdade, a
suplementação de estradiol é frequentemente administrada para trazer os pacientes 46,XY
com SIAC até à faixa normal feminina da hormona dada.

Défice de 5α-redutase

O défice de 5α-redutase é uma doença autossómica recessiva muito rara do


desenvolvimento sexual causada por mutações dentro do gene SRD5A2 localizado no
cromossoma 2, que faz com que indivíduos 46,XY com esta condições tenham genitais
fenotipicamente hipomasculinizados.

O gene SRD5A2 codifica uma enzima esteroide 5α-redutase-2, que é responsável por
converter testosterona numa forma mais potente e necessária para o desenvolvimento, a di-
hidrotestosterona (DHT). A DHT é crítica para a masculinização do tecido genital e auxilia no
crescimento adequado do pênis e no desenvolvimento da próstata.

Devido à conversão inadequada de testosterona em DHT, os indivíduos 46,XY


apresentam testículos que não desceram para o saco escrotal, estruturas internas masculinas
normais, e uma redução no tamanho da próstata.

No entanto, externamente, esta mutação leva a vários graus de ambiguidade genital,


apresentando-se como uma mulher completa, quase igual aos bebés típicos do sexo
masculino. Aqueles com ambiguidade genital frequentemente apresentam um escroto bífido,
um clitóris aumentado, uma vagina cega e várias gravidades de hipospádias.

Durante a adolescência, os testículos que não desceram começam a secretar altos


níveis de testosterona e desencadeiam a puberdade masculina, caracterizada pelo
aprofundamento da voz, aumento da massa muscular e aumento da altura. Para além disso,
pode haver um aumento dramático no crescimento do pénis e a descida ocasional dos
testículos para a região escrotal.

Comportamentos Sexuais e Identidade de Género

Duas das maiores diferenças mensuráveis de sexo observadas entre os humanos são a
identidade de género e a orientação sexual.

Descobrir o que causa estas diferenças é um assunto que requer muito debate, no
entanto, muitos membros da comunidade científica acreditam que eles sejam mediados em
parte por cromossomas sexuais e mais diretamente por secreções hormonais das gónadas no
útero. A teoria da organização do cérebro surgiu a partir de obras de meados do século XX,
nas quais foi observado que a administração de testosterona em roedores fêmea durante um
período crítico para a organização do cérebro fetal trouxe mudanças sexuais e
comportamentais ao longo da vida.

Os casos de DDS fornecem-nos uma visão única em como é que as hormonas sexuais
masculinas são capazes de estabelecer estas diferenças sexuais no que diz respeito à
orientação sexual e identidade de género.

Numerosos estudos avaliaram a prevalência de comportamentos não heterossexuais


entre mulheres 46,XX com HAC de várias regiões do mundo.

De um modo geral, foi encontrado na maioria dos estudos que os comportamentos não
heterossexuais estão aumentados em mulheres com HAC, normalmente em comparação com
seus parentes femininos não afetados ou controlos apropriados.

Comportamentos e fantasias não heterossexuais entre mulheres com HAC têm sido
identificados em vários níveis percentuais, conforme destacado num relato exaustivo de tais
estudos compilados por Meyer-Bahlburg e colegas. Em contraste, no entanto, outros estudos
sobre o assunto também não mostraram diferenças na orientação sexual, mas alguns críticos
dessas obras determinaram que os tamanhos das amostras em certos estudos eram muito
fracos para detetar uma diferença.

Num grupo grande de HAC, foi novamente revelado que mulheres com esta condição
mostram mais comportamentos homossexuais e bissexuais, medidos por suas fantasias
sexuais e atuais parceiros sexuais. O estudo também demonstrou com sucesso que o nível de
tendências não heterossexuais aumentou com a gravidade da condição, uma correlação
associada com o nível de exposição ao andrógeno no útero.

Biologicamente, parece que a exposição ao andrógeno no útero num histórico XX


afeta mais significativamente as fantasias sexuais em mulheres com HAC do que alteram
diretamente a sua atual orientação sexual medida pelos parceiros sexuais, o que pode ser
influenciada por restrições adicionais.

Estas descobertas fornecem um forte argumento para a influência biológica na


provocação de tais resultados; no entanto, estes estudos não eliminam a possibilidade de
contribuições sociais e outras contribuições psicológicas para essas observações.

Entre os estudos compilados que têm focado em indivíduos 46,XX com HAC e a
identidade de género, foi descoberto que a grande maioria (95%) dos pacientes a que foram
atribuídos o género feminino ao nascimento estavam satisfeitos e não disfóricos na idade
adulta. No entanto, 5% de mulheres com HAC exibiram disforia de género e/ou identificaram-
se com o género masculino.

Nos casos em que indivíduos 46,XX com HAC foram designados como sendo do
género masculino ao nascimento, um estudo com uma amostra pequena mostrou que 12% dos
casos experienciaram disforia de género e se associaram com o género feminino.

Contudo, estudos posteriores avaliaram os resultados em pacientes 46,XX com HAC


gravemente virilizados que foram designados como homens ao nascimento levaram a
diferentes conclusões sobre a satisfação da atribuição do género masculino e da identidade.

Num pequeno estudo com uma população de 12 indivíduos 46,XX com HAC que
foram inicialmente atribuídos como homens, verificou-se que 10 persistiram no género
atribuído e viveram vidas típicas masculinas e satisfatórias. Dois dos indivíduos mudaram
para o género feminino durante a adolescência e posteriormente se reatribuíram de volta ao
gênero masculino na idade adulta.

Ao contrário dos resultados de estudos que examinam a orientação sexual, disforia na


identidade de género não foi correlacionada nem com a gravidade da condição HAC nem com
o grau de virilização genital, demonstrando que a aparência genital ao nascimento não é o
melhor preditor para resultados de género em casos de 46,XX com DDS.

No entanto, é evidente que exposição a andrógenos em origens genéticas XX pode


aumentar os casos de insatisfação com a atribuição de género à nascença em taxas muito
acima das percentagens estimadas encontradas nas populações em geral.

Algumas das evidências mais convincentes ligando a testosterona ao estabelecimento


da identidade de género masculino e preferência sexual vem do trabalho focado em indivíduos
com SIAC e aqueles com deficiências de 5α-redutase. Na avaliação da orientação sexual nos
casos de SIAC, mostrou-se que as mulheres 46,XY quase sempre são exclusivamente
heterossexuais, preferindo parceiros do sexo masculino, como também vivenciam fantasias e
interesses heterossexuais.

Esta ocorrência, como dizem os autores, pode ser influenciada por outras causas além
da sua incapacidade de responder aos andrógenos durante o desenvolvimento.

Um relatório recente de Brunner e colegas (2016) indicou que mulheres 46,XY, em


comparação com outras mulheres com condições de infertilidade, mostraram tendências
aumentadas de preferência e comportamentos não heterossexuais, evidência que está em
desacordo com as visões previamente estabelecidas de resultados totalmente heterossexuais
em mulheres com SIAC.

Usando uma abordagem mais imparcial do ponto de vista científico para avaliar a
resposta sexual e talvez a orientação em mulheres com SIAC, um estudo recente focou-se na
ativação neural em resposta à visualização de imagens sexuais. Apoiando a noção de
sentimentos predominantemente heterossexuais em SIAC, descobriram que mulheres com
esta condição assemelhavam-se mais com mulheres heterossexuais 46,XX do que a homens
46,XY.

Imagens por ressonância magnética funcional (fMRI) revelaram que ambas as


mulheres 46,XY com SIAC e as mulheres 46,XX diminuíram a ativação da amígdala durante
a visualização imagens de homens nus ou casais em coito. Os resultados deste estudo foram
os primeiros a estabelecer que o cérebros de mulheres com SIAC eram mais parecidos
funcionalmente com aqueles de mulheres típicas, indicando ainda que a responsividade da
testosterona (e não do cromossomo Y) é o condutor mais provável para estabelecer a
preferência ginefílica e a ativação cerebral androfílica típica para estímulos sexuais em
humanos.

No que diz respeito à identidade de género, mulheres 46,XY com SIAC quase sempre
relataram que sentem-se confortáveis com a sua atribuição feminina.

Estas descobertas adicionam força à noção biológica de que a resposta hormonal


influencia a identidade de género masculina mais do que composição cromossómica. Mais
uma vez, no entanto, relatórios recentes começaram a sugerir que esta teoria não é tão
concreta como antes se pensava. Um crescente corpo de literatura e relatos de casos
identificaram disforia de género e sentimentos de género oposto em indivíduos SIAC em
taxas mais altas do que as estabelecidas.

O papel das decisões médicas iniciais e sociais associadas aos casos SIAC podem ser
um fator que contribui para estes resultados.

Além da SIAC, a pesquisa focada na síndrome do défice de 5α-redutase, rara e pouco


estudada, também ajudou a expandir o papel da testosterona no estabelecimento de diferenças
de sexo no que diz respeito à orientação sexual e identidade de género em humanos. Os
indivíduos afetados por essa condição são geralmente criados como meninas; no entanto,
durante o anos da puberdade, quando as secreções de testosterona dos testículos são elevados
e a puberdade masculina surge, a grande maioria muda a atribuição de género inicial.

Depois da mudança no papel de género e identidade de género, estes indivíduos


46,XY normalmente levam vidas heterossexuais, preferindo parceiras do sexo feminino,
apesar de terem sido criados inicialmente como mulheres. Esta mudança de género em
indivíduos durante a puberdade masculina levanta a noção de que, apesar da produção
insuficiente de DHT necessária para o desenvolvimento típico da genitália masculina, os
efeitos organizacionais do cérebro foram estabelecidos e capazes de influenciar um papel de
género masculino e, eventualmente, identidade, que parecem solidificar-se com os aumentos
de testosterona na puberdade.

Destaque de Diferenças Cognitivas Sexuais e Interpretação de Casos de DDS

Foram estudadas de forma pormenorizada e exaustiva, por vários grupos, as diferenças


sexuais relativas a traços cognitivos e detetaram diversas medidas nas quais os homens e
mulheres demonstraram grandes desvios no que concerne às habilidades de atividades
mentais. Essas diferenças consideraram dever-se não só a fatores cromossómicos, como
também a efeitos hormonais e influências sociais. Sabe-se também que diferenças entre
homens e mulheres são identificadas na maioria dos estudos, independentemente dos motivos
que as desencadeiam.

Através dos casos de DDS, fornece-se uma plataforma única com o objetivo
primordial de avaliar os possíveis fatores contribuintes responsáveis por gerar diferenças
sexuais, isto porque estudos em indivíduos com HAC e SIAC estabeleceram influências
hormonais e cromossómicas únicas.

Relativamente à consciência espacial e à capacidade de rotação mental, foi revelada


uma diferença cognitiva mais forte entre homens e mulheres, sendo que mulheres com HAC,
em média, superam os seus controlos não afetados em tarefas de rotação mental e testes de
relações espaciais.

É de salientar que, se verificou que os aprimoramentos de atividades espaciais


demonstraram um efeito mais forte em meninas com uma forma severa de perda de sal de
HAC, enquanto que aqueles indivíduos com uma forma simples da doença não apresentaram
uma diferença estatisticamente significativa. Em comparação, homens 46,XY com HAC
parecem ser desmasculinizados nessas características e têm um desempenho pior no que toca
aos seus controlos correspondentes em ambas as medidas.

As descobertas mencionadas anteriormente são de bastante interesse, na medida em


que apontam para a possibilidade de que a alta exposição ao andrógeno no útero gera
resultados cognitivos diferentes, consoante o complemento do cromossoma sexual. Era
esperado que homens com HAC tivessem um desempenho pelo menos igualmente bom em
oposição aos homens de controlo de baixo desempenho, caso o efeito fosse derivado do
excesso de testosterona.

Foram avaliados traços cognitivos adicionais que mostraram que diferenças de sexo
incluem funções dominantes masculinas que envolvem a perceção espacial, navegação em
labirintos, matemática e várias habilidades de caráter mecânico, e por outro lado, funções
dominantes femininas envolvem a memória de trabalho e fluência verbal. Muitas dessas
características foram avaliadas em casos de HAC XX e XY, porém, as habilidades espaciais e
de direcionamento destacadas são as diferenças a nível cognitivo que mostram a influência
mais forte do sexo e dos andrógenos. Valorizam-se os trabalhos conduzidos em casos de
DDS, dado que contribuíram para a expansão da compreensão da influência da testosterona
nos antecedentes genéticos XX e XY no que diz respeito a alteração das habilidades espaciais
e coordenação mão-olho.

Variações Estruturais do Cérebro em Casos de DDS

Surpreendentemente desenvolveram-se poucos trabalhos com foco no estudo das


variações estruturais do cérebro como resultado do DDS, contrariamente às pesquisas focadas
no comportamento sexual e nas diferenças cognitivas. Através dos iniciais escassos mas
crescentes trabalhos de pesquisa relativos a esta vertente das variações estruturais do cérebro
em casos de DDS, verificou-se que, independentemente da idade, as meninas com HAC
apresentaram uma redução bilateral no volume da amígdala, enquanto os homens afetados por
HAC no estudo tiveram uma redução unilateral de 20% apenas na amígdala esquerda, que
também é a mesma percentagem de redução para a amígdala esquerda em mulheres com
HAC. Foram observados em homens, que se acredita serem decorrentes da estimulação
androgénica, um aumento do volume da amígdala ao longo do desenvolvimento humano.

Foram curiosamente verificadas algumas anomalias, como no caso de meninos do


sexo masculino com HAC na qual o aumento da idade de desenvolvimento estava presente
apenas na amígdala direita, aparentemente não afetada não se sabendo com exatidão as causas
dessas anomalias cerebrais, no entanto, parece haver uma clara diferença de sexo na resposta.
Homens e mulheres com desequilíbrios semelhantes como resultado de HAC apresentam
padrões diferentes de reduções da amígdala.

Através de um estudo focado principalmente em mulheres não-HAC em tratamento de


reposição de corticosteroide de longo prazo, identificou-se também uma redução de 20% no
volume da amígdala esquerda e uma redução de 11% na amígdala do hemisfério direito. De
forma coletiva, essas descobertas indicam que o volume reduzido da amígdala provavelmente
é devido a um desequilíbrio de glicocorticoides, em vez de excesso de andrógenos durante o
desenvolvimento, porque o tamanho da amígdala é realmente reduzido em pacientes com
HAC apesar dos altos níveis de testosterona no útero, enquanto os indivíduos masculinos
saudáveis mostram um aumento no volume da amígdala por via de estimulação androgénica.
Todavia, denota-se que essas descobertas, não oferecem uma explicação mecanicista
biológica direta para as observações de reduções nas regiões do cérebro, por outro lado
apoiam a ideia de que desequilíbrios nos glicocorticoides e outros esteroides são os prováveis
agentes causadores.

Anormalidades da Substância Branca

Foram evidenciadas, através de estudos de ressonância magnética que pacientes


adultos com perda de sal, virilização simples e até hiperplasia adrenal congénita não clássica,
estabeleceram hiperintensidades da substância branca em várias regiões do cérebro. Existem
áreas cerebrais que parecem ser mais frequentemente afetadas em pacientes com HAC, sendo
estas as regiões periventriculares e as áreas do cerebelo e do corpo caloso. Incidências de
atrofia do lobo temporal também foram documentadas em estudos de ressonância magnética
de pacientes com HAC.

São demonstradas, através da vasta maioria dos casos avaliados, anormalidades na


substância branca em regiões do cérebro com pontuação dentro das faixas normais de funções
neurológicas, indicando que, apesar dessas diferenças, o efeito não parece prejudicar o
funcionamento adequado do cérebro. É importante enfatizar que foi levantada a hipótese de
que as causas lógicas desses resultados foram consequência de desequilíbrios a nível
hormonal durante o desenvolvimento, tratamentos de reposição de glicocorticoides de longo
prazo após o nascimento e até mesmo a própria mutação genética. Também foi proposto que o
desequilíbrio das hormonas durante o desenvolvimento contribui para a distinção inadequada
de oligodendrócitos e mielinização inadequada. Evidenciaram-se, além dos estudos para
adultos, diversos casos documentados de recém-nascidos com HAC que exibiram anomalias
da substância branca. As descobertas em recém-nascidos com HAC propuseram a consciência
de que os tratamentos de reposição de glicocorticoides de longo prazo podem não ser a única
explicação para as perturbações na substância branca. Investigar essas descobertas incomuns
mais detalhadamente e de forma mais rigorosa, poderá potencializar uma melhor
compreensão do papel que os glicocorticoides, ou a falta deles, têm na formação da estrutura
do cérebro masculino e feminino em desenvolvimento. Contudo, atualmente, a causa exata e o
mecanismo que estão na origem desses resultados permanecem especulativos.

Conclusões

Relativamente às conclusões gerais retiradas deste estudo, e com o complemento de


pesquisas com foco em casos de DDS, afirma-se que a comunidade científica tem
compreendido melhor a interação entre hormonas sexuais e o complemento do cromossoma
sexual no que concerne a gerar algumas das diferenças sexuais observadas em humanos. Um
ponto extremamente relevante a ressaltar é que através destas pesquisas colocou-se em cima
da mesa a hipótese de que a exposição à testosterona, em oposição aos cromossomas sexuais,
é um fator de maior contribuição para a orientação sexual, e em menor amplitude, a
identidade de género.

A evidência mais forte detetada, que adiciona suporte relativamente à influência da


testosterona na estruturação da identidade de género vem do trabalho focado nos indivíduos
46,XY com SIAC, no qual quase todos os indivíduos pesquisados indicam sentimentos típicos
do género feminino. Contudo, ressalta-se que novos estudos e pesquisas têm surgido
continuamente, sugerindo que a identidade de género bem como a orientação sexual em
indivíduos com SIAC não são tão claras como se pensava, e as taxas não heterossexuais e de
disforia de género podem ser muito mais altas do que as declaradas atualmente.

Observou-se também, que uma esmagadora maioria de indivíduos com condição de


transição “mulher-homem”, transitou confortavelmente para o novo papel de género na
puberdade, uma observação a nível mundial que ocorre em muitos tipos diferentes de
ambientes sociais. Sabe-se que apesar das descobertas convincentes sobre o papel da
testosterona na geração dessas observações, a influência das variáveis sociais e ambientais
também são fatores que exigem consideração e devem ser evidenciados.

Conclusões Cognitivas
A respeito das conclusões a nível cognitivo retiradas deste estudo, possibilitou-se uma
visão sobre alguns dos parâmetros biológicos que geram diferenças sexuais nas habilidades
cognitivas, como a consciência visuoespacial bem como a capacidade de direção ou
orientação.

Estudos com mulheres com HAC ficou bem evidente que através da exposição ao
andrógeno no útero, parece aumentar-se a capacidade de girar objetos mentalmente, bem
como melhorar a coordenação olho-mão durante as atividades de seleção de alvos.

Concluiu-se de igual forma que, homens com HAC na verdade têm um desempenho
pior do que os seus pares de controlo correspondentes, o que é inesperado dado o fato de que
os homens com HAC teriam níveis iguais ou elevados de testosterona circulante, desta forma,
levantou-se portanto, a noção de que o tempo e a dosagem adequada, em homens com HAC,
são importantes para aumentar essas habilidades e que simplesmente ter níveis acima da
média de testosterona durante o desenvolvimento não geraria um "super-masculino".

Estudos de fMRI em indivíduos com SIAC, vieram mais uma vez, minimizar as
influências sociais e permitir uma avaliação mais imparcial no que concerne à exigência da
testosterona sobre a composição genética para moldar essas diferenças sexuais de
desempenho cognitivo.

Conclusões Estruturais

Relativamente aos estudos de ressonância magnética realizados em pacientes com


HAC, fica evidente o facto de que os DDS afetam mais do que o desenvolvimento gonadal. É
inequívoco que sistema nervoso central é altamente sensível a diversas hormonas, e os
desequilíbrios destas podem afetar em larga escala o comportamento, tal como a estrutura
geral do cérebro. Salientaram-se variações relativas ao volume da amígdala em alguns
indivíduos com HAC, sabendo-se que no entanto, o efeito é diferente dependendo da
composição dos cromossomos sexuais. Os estudos ligados a irregularidades da substância
branca, indicam que parecem não ser afetadas pelo sexo cromossómico e causar variações
semelhantes em homens e mulheres com HAC.

Apesar destas descobertas serem limitadas, permitiram que se abrisse uma nova área
para investigação potencial com foco no papel das influências dos glicocorticoides no cérebro
em desenvolvimento, além das contribuições hormonais gonadais mais frequentemente
estudadas. Descobertas, em caso de estudos extensos serem efetuados e centrados em
indivíduos com SIAC, seriam inestimáveis para determinar efetivamente o efeito direto da
testosterona nas estruturas que, em estudos de ressonância magnética, mostraram alterações
na HAC.

É essencial que trabalhos futuros com o objetivo de obter resultados em indivíduos


com DDS, ocorram para elucidar e ajudar a descodificar contribuições do sexo cromossómico
bem como das hormonas para a formação do cérebro humano sexualmente dimórfico.

Apreciação Crítica

Dado que o autor não se posicionou nem contra nem a favor de nenhuma teoria,
iremos fazer a nossa apreciação crítica com base nos resultados e nas respetivas conclusões.

Primeiramente, concordamos com as conclusões apresentadas nesta revisão, e


salientamos a hipótese colocada pelo autor de que de que a exposição à testosterona, em
oposição aos cromossomas sexuais, é um fator de maior contribuição para a orientação sexual,
e em menor amplitude, a identidade de género.

Com base na experiência pessoal, concordamos que para além dos cromossomas e das
hormonas sexuais, as influências sociais têm um peso muito grande na identidade de género,
pois na nossa perspetiva uma das razões para estas diferentes identidades existirem são os
papeis de género e os estereótipos estabelecidos pela sociedade, contribuindo para a
necessidade de transição de género ou até mesmo para a autoidentificação com um género
não-binário.

Pelo facto de terem sido realizados estudos escassos em indivíduos com SIAC, não se
pode concluir com exatidão o efeito direto da testosterona nas estruturas que, em estudos de
ressonância magnética, mostraram alterações na HAC, consideramos que pode ser suscetível a
enviesamentos de algumas conclusões a esse respeito.

Denota-se a importância de terem sido realizados estudos de fMRI em indivíduos com


SIAC, dado que contribuíram para se comprovar as mínimas influências sociais no que
concerne à exigência da testosterona sobre a composição genética para moldar essas
diferenças sexuais de desempenho cognitivo, o que julgamos terem sido estudos de extrema
importância para se chegar a essa conclusão.
Referência do Artigo:

Bramble, M. S., Lipson, A., Vashist, N., & Vilain, E. (2017). Effects of Chromosomal Sex
and Hormonal Influences on Shaping Sex Differences in Brain and Behavior: Lessons
From Cases of Disorders of Sex Development. Journal of Neuroscience Research, 95
(1-2), 65-74. https://doi.org/10.1002/jnr.23832

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