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TEORIA DO EU-TU - BUBER (1878-1965}

Tanto a psicologia quanto a psicoterapia vieram da medicina, e sofreram, inicialmente, uma


grande influencia do objetivismo, do modelo médico (onde a ênfase do método está na técnica).
Ainda hoje, esse modelo médico ainda se perpetua através da psicanálise e das terapias
comportamentais.

Foi um momento crucial quando a psicologia e as psicoterapias começaram a se questionar


sobre esse tal modelo médico, ou seja, ter de usar este paradigma para lidar com pessoas, com
suas existências, suas vivências. Para lidar com a mudança e a criatividade em termos de pessoas,
de seres humanos.

Esse questionamento surgiu a partir dos movimentos humanistas-existencialistas, quando


as psicoterapias começam a propor outro modelo, outro paradigma, não centrado apenas na
técnica, já que esta diz respeito ao modo acontecido de sermos, ao modo coisa de sermos, já que
acreditam que a vivência se dá ao nível do modo fenomenológico de sermos.

Surgiam psicoterapias visando a compreensão dessa dimensão da existência, da dimensão


fenomenal. Os psicoterapeutas, na maioria, entenderam que a técnica não daria conta de lidar com
a vivência e as mudanças humanas. passam, pouco a pouco, a usar a TEORIA (o modelo EU-TU)
DE BUBER, no relacionamento entre terapeuta-cliente (paciente, pessoa, etc.)

Os psicoterapeutas, na sua maioria, passam a concordar que na medida em que lidamos


com humanos carecemos de nos situar no modelo fenomenológico existencial de sermos, e técnica
nenhuma, por mais que bem aplicada, chega a esse modo.

A técnica não consegue dialogar com o cliente e contribuir para coloca-lo num modo de ser que
permita a vivência ontológica, que permita a criatividade, a superação e com isso a regeneração.

Concluíram que era preciso trocar as técnicas pela própria relação humana entre o terapeuta
e o cliente e, então, começa a surgir o que chamamos de “TERAPIA DA RELAÇÃO” (ou Terapias
Existencialista, Humanistas ou Fenomenológicas) , enquanto paradigma oposto ao paradigma
técnico.

Na Psicologia da Relação (que teve entre outros, a expressiva figura de Rogers e Pearls) o
terapeuta busca interagir globalmente com o cliente enquanto ser humano, busca se relacionar
enquanto pessoa e não simplesmente como um técnico.
Na relação é possível que se desenvolva a vivência, e a interação nessas vivências
fenomenológicas existenciais, tanto do cliente quanto do terapeuta.

BUBER esclarece o sentido do termo “relação”. Ele utiliza especificamente este termo, para
o modo fenomenológico de sermos, que ele chama de modelo EU-TU. Relação entre o eu e um
diferente, no qual o EU se relaciona com uma alteridade, que é eminentemente vivida enquanto
possibilidade, enquanto ação, no modo fenomenológico existencial.

No modo EU-TU de sermos, no modo da relação, no sentido efetivo do termo, tanto o EU


quanto o TU se dão como possibilidade de ação. Um se remete ao outro e acontece a interação, a
construção da esfera do “entre, do inter”, que envolve tanto o eu quanto o tu.

Essa esfera pode ser entendida como dialógica, que é a esfera de vivencia da lógica, de
sentido compartilhado, por ser a esfera de vivencia e desdobramento de possibilidades de ação.

Se for um simples relacionamento entre duas pessoas, podemos encontra-la também no


modo técnico, no modo de ser do acontecido, mas nesse caso, será uma relação EU-ISSO, onde
tanto o outro quanto o EU são ISSO, duas coisas.

Nesse caso, o EU-ISSO, já não é o modo de vivência de possibilidades de ação (interação).


Buber reserva para esse modo de ser o termo “RELACIONAMENTO” ( a interação entre o EU e o
ISSO, mesmo que o ISSO seja outra pessoa). Logo, o relacionamento, não se aplica a qualquer
relação, mas sim ao modo EU-ISSO, o modelo SUJEITO-OBJETO.

Para BUBER, é na RELAÇÃO humana que encontramos o único modo de sermos da


emoção, da cognição (do conhecimento). Uma relaçãop sempre será compreensiva, Pré-reflexiva,
que é a ação da motivação, da criação, logo da superação e, com isso, o modo de sermos da
regeneração (resignificação), que é o que entendemos como saúde em termos de fenomenologia
existencialista

Na sua ontologia antropológica, Buber designa e descreve os dois modos humanos de ser:

1. O modo FENEMENOLÓGICO, que ele chama de EU-TU (do acontecer); e

2. O modo EU-ISSO (do acontecido, modo coisa de sermos).


Embora o EU esteja presente nos dois modos, aparecem com sentidos completamente
diferentes: O EU do EU-TU (alteridade) é a pessoa, e o EU do EU-ISSO é o egótico.

NOTA: Um EGÓTICO é mais do que um egoísta. Pessoas egoístas enxergam o próximo, mas
escolhem a si próprios. Egóticos sequer enxergam os outros, de tão obcecados com a própria
pessoa.

É quando surge o egótico que o EU-TU se separa, visando uma experienciação do ISSO (do
outro) como objeto e utilidade.

A PESSOA surge quando nos relacionamos com outras pessoas, através do EU-TU. É a forma da
vinculação, da presença e da participação.

O EU egótico não participa, não é vinculação, é separação, é a experienciação e uso do


outro como objeto. Que afirma o “meu”, o “seu”.

O EU do EU-TU é o devir de um ser (é o ser do devir), no qual ele participa. Ele é ator, mas
não controla, não se apropria.

BUBER cita 3 exemplos de cada uma das relações EU-TU:

1. Da esfera da RELAÇÃO DIALÓGICA com os seres humanos. EX: Sócrates.

2. Da esfera da RELAÇÃO COM A NATUREZA, da dialógica com a natureza. EX: Goeth.

3. Da esfera da RELAÇÃO COM O SAGRADO, que é um caso de vivência com o sagrado.


Ex: Jesus.

Relação dialógica é como se chama, própria e especificamente, o processo coletivo das


pessoas e as interações destas com o grupo.

O dialógico é o modo de viver onde o outro é eminentemente uma alteridade absoluta, um


TU, que está fora de nosso controle, que é um foco autônomo de produção de sentido e que interage
com os outros no processo de produção, de possibilidades de ação e de sentido. NÃO É uma
relação que se dê no eixo da dicotomia Sujeito-Objeto.

O TU, numa visão fenomenológica, faz parte de uma relação dialógica (interação com o
outro) e se encontra no modo de sermos anterior à dicotomia Sujeito-Objeto.
A interação “individual”, para Buber, é entre aspas porque ela é sempre relação. Ao
interagimos criamos uma esfera que BUBER chamava de “esfera do ente”.

Tanto o EU, quanto o TU, inclusive o EU-TU, sem que estejam em relação, não são nem
objeto e nem sujeito, porque são Sujeitos-Objetos, são afastados da ação, da relação.

EU-TU, para Buber, em específico, é a vivência da ação, da relação, que se dá anteriormente


à dicotomia Sujeito-Objeto (que constitui o modo “coisa”, o modo acontecido, o modo reflexivo de
sermos).

Muitos problemas decorrem, principalmente na contemporaneidade, da incapacidade de


sairmos da dicotomia Sujeito-Objeto, ou seja, de resgatarmos naturalmente o modo fenomenológico
de sermos, o EU-TU.

Quando pensamos a filosofia do diálogo de Martin Buber na perspectiva do FATO e do


DIÁLOGO, estamos pensando no modo EU-ISSO e EU-TU.

O modo EU-ISSO é o modo do FATO, do feito, dos objetos, dos usos, da causalidade, o
modo coisa. Um modo que não é lógico (logos significa sentido), não é do sentido e nem da
compreensão.

O modo de ser EU-TU é o modo do DIÁLOGO, do fazer, do acontecer (o desdobramento de


possibilidades do acontecer) e da dialógica do EU-TU, é o modo de sermos do sentido (que é a
vivência das possibilidades), que intrinsecamente se constitui como logos.

Assim, como para Husserl, as possibilidades, ao se desdobrarem se coisificam se instalam


como feito, enquanto coisa.

O mundo do acontecido (o EU-ISSO), continuamente se recria, a partir do acontecer. Toda


vez que vivenciamos o modo EU-TU de sermos, nós recriamos a dimensão do EU-ISSO na vida
da gente.

O FATO continuamente precisa retornar ao modo de ser do diálogo, onde ele é feito, é criado.
Assim que, de todo um EU-ISSO, pode-se resgatar um EU-TU.
- SAÚDE EXISTENCIAL: Alternância do EU-TU com o EU-ISSO, de modo dialógico e do modo
factual de sermos.

BUBER – AUTOCONTRADIÇÃO

Vivemos no mundo EU-ISSO (modo coisificado, do acontecido) e frequentamos momentos


de vivência do modo EU-TU ( o modo do acontecer, o modo Fenomenológico Existencial ).

Quando vivemos o modo EU-TU de ser, vivemos a novidade, a possibilidade, a


movimentação existencial, a emoção, a alegria, a criação, a motivação, a superação e a
regeneração.

A nossa saúde, a nossa qualidade de sermos é a alternância entre o modo EU-TU e o modo
EU-ISSO.

Quando há uma redução da vivência no modo EU-TU, isso significa fatalidade, perda da
liberdade, perda da capacidade de construirmos nosso próprio destino. O EU não se joga, não se
coloca na relação com o TU no mundo, não interage com esse mundo, não se abre para o mundo.

Quando nos limitamos ao mundo EU-ISSO, nós não nos oferecemos à vivência, ao encontro.
Nessa limitação, é quando esse EU se limita ao modo EU-ISSO de ser, se remete a si próprio,
busca uma relação consigo mesmo, o EU se volta para o EU, numa relação EU-ISSO, que se
remete a um EU-COISA.

Esse voltar-se do EU-ISSO para o EU COMO UM ISSO, nessa volta não estará presente as
principais características do EU-TU, a presença e a atualidade.

Essa é a contradição de um EU inerte que se relaciona com outro EU inerte, relação de coisa
com coisa que apenas potencializa progressivamente a frustração num labirinto da não–presença,
no labirinto da coisificação.

- Eventualmente, esta relação do EU com o ISSO pode assumir formas sofisticadas, empoladas,
pode adquirir, por exemplo, uma caracterização religiosa ou uma caracterização intelectual, um
EU que remete a um EU, numa suposta vida interior que é o modo EU-ISSO de ser, sem presença,
sem emoção, sem superação, sem regeneração, será um EU que se frustrará da possibilidade da
relação com o diferente, com o outro.

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