organi-
Realçámos, no nosso exame da percepção, o modo como
zamos ainformação sensorial que nos chega,tendo em vista
discernir
epcfcGpcioqaÍ€of-f€ct4fiìesteos-obiectosnornt''rd^-exterioq,{.o.con-
trãrio Oã que admitiam Locke e Berkeley, o nosso mundo perceptivo
mas um
não é um Àosaico confuso de fragmentos sensoriais isolados'
elementos estão inter-
todo coerente e otganizado,no qual os vários
-relacionados. Passaremos a4of ao tema da memória, onde a otganiza'
t Tradução de FátimaÂndersen.
344
ESTUDO DA MEMÓRIA
MEMóRIA . cap.7 M!
Como estudam os psicólogos a memória? O primeiro passo é
compreender que não existe um sistema írnico de memória oll um só
conjLrnto de processos de memória. O termo memória é simples-
mente um amplo rótulo para um grande nírmero de processos que for-
mam as pontes entre o passado e o pfesente. Mas esses processos dis-
tinguem-se em aspectos importantes.
Comecemospofexaminafoqueosdiferentestiposdememófia
têmemcomum.TodooactodefecofdafimplicasLlcessoemtrês
aspectos do processo de memória. Para rccotdar, é preciso
primeiro
alguma ênfase, dado que
ter aprendido. Parece óbvio, mas merece
muitas falhas de memófia são na realidade falhas da fase inicial de
Amemóriatemsidofrequentementecompafadaattmatmazêm.
EstaconcepçãoremontaaosfilósofosgfegoseaSantoAgostinho,que
t4/
I descreven as "espaçosas salas da memória, onde existem tesoì.lros de
MEMORIA , Cap.7
imagens sem conta..." Esta metáfora equipara as recordações a objec-
tos colocados em compartimentos de um armazém onde são guarcla-
dos durante algum tempo e depois procurados (Roediger, 19g0;
Crowder, 1985).
A teoria clos multi-armazéns da memória, desenvolvida há cerca
de quarenta anos, repl'esenta Llma variante moderna da mesma metá-
fora espacial. Ao contrário cle santo Agostinho, que acreclitava que
havia apenas trm armazém na memória, esta teoria afirma que existem
vários desses sistemas de armazenamento, cacla qual com cliferentes
propriedades (Broadbent, 1958; \íaugh e Norman, 1965; Atkinson e
Shiffrin,1968).
Para que nos serão necessários vários tipos de memória? pensemos
na relação entre a nossa mesa de trabalho e a estante: as prateleiras
levam muitos livros e, portanto, uma grande quantidacle de infor_
mação. Mas esta informação não lhe é imediatamente acessível e, a
ser necessária,poderâ exigir algum tempo de procura. por outro lado,
a mesa tem apenas um espaço limitado e, por isso, só cabem alguns
livros e papéis ao mesmo tempo. Mas o que está sobre a mesa encon_
tra-se imediatamenre disponível, pelo que não se perde tempo a
procllrar a informação.
Claro que cada uma das modalidades de armazenamento tem as
slÌas vantagens: a estante permite afmazenat uma grande quantidade
de conhecimentos incluindo, naturalmente, muita informação que não
precisamos de usar neste momento. Mas a mesa de trabalho dá-nos
acesso imediato a um pequeno armazém de informação pertinente
para o proiecto do momento,
Esta distinção entre mesa de trabalho e estante é semelhante à
que é fnndamental para ? teoria dos multi-armazéns da memór.ia, uma
distinção entre memória de trabalho (chamada memóüa a cur-to
prezo naÍeoia inicial) e memória a longo prazo.A memória de tra_
balho retém a informação por curtos intervalos, isto é, enquanto
estamos a trabalhar com ela. Ao contrário, a memória a longo ptazo
armazena o material por períodos muito mais longos, às vezes por
Qu.ando a capútcidítde é excertida.
torJa a vidat.
A limitada capacidade cognitiva
do sistema de memória de trabalho
tem a sua analogia fisica nas
exigências que a moderna CAPACIDADE DE ARMAZENAMENTO DÂ MEMORIA DE TRABALHO
sociedade tecnológica nos faz, B Oe UnltÓnreÁ, LoNGo PRAZO
caricaturaclas nesta cena do filme
<Je 1936, de Charlie Chaplin , Tempos A memória de trabalho e a memória a longo prazo diferem de
M o d e r n o s. (ALrto r izaçáo cb Ko b a I muitas formas importantes. Uma dessas diferenças diz respeito à
Collection) capacidade de armazenamento de cada uma.A capaciclade da
'A teofia inicial admite que estes dois são precedidos de um armazém
adicional: trm registo sensorial em que o material sensorial é reticlo, durante llm oll
dois segundos (Sperling, lp60;Atkinson e Shiffrin, 1968).
348
Iio
["- unuÓnre . cap.7
I
ldu
fas
E
na plata;foffia por muito tempo.
Este nípido esquecimento da memória de trabalho pode ser aÍi-
.:ir!i:: tl.'iì:;,.: :r. -::... nal uma benção disfarçada pois, sem ele, os nossos sistemas de memória
seriam atravancados por uma massa de informação sem utilidade.
Dada a sua limitada capacidade, a plataforma de entrada tem de ser
desimpedida rapidamente para que haja espaço para os novos pacotes
ïi'ï:: i:Ì:rrj': l
100
MEMÓRIA . cap.7
Ateofiadosmulti.arm^zénsdamemóriadominoufortemente
este campo durante vâtias décadas. Mas, com o passar do
tempo' o
que a teoria
assunto sofreu uma reapreciação. As conclusões indicaram
"arquitectura" de
dos multi-armrzêns da memória descrevera aquela
não tivesse sido
uma forma que se aproximava da verdadeira, embora
capaz de Lburc?r- o importantíssimo papel do aprendiz - as suas
prévio que
esiratégias e objectivos e, acima de tudo, o conhecimento
taz para a situação de aprendizagem'
353
MI
MEMORIA 'CaP T
À
355
-N
357
rÕ'.
358
É importante não carregar demais. Mais vale pouco de cada vez clo que mltito
MEMÓRIA . cap.7 ao rnesmo tempo. Embofâ, à primeira vista, possa parecer qtte tal não ten
importância,fazer muito e clepressa pode trazer ctissabores. Os erros poclerã<l
sair-lhe caros.A manipttlt4ão do mecanistno apropriaclo deverá ser auto-expli-
cativa e não é preciso determo-nos nisso. Ao pdncípio, todo o plocedimento
parecerá complicaclo. Contttdo, clepressa se tornará em mais uma Íàceta da
vicla. É ctificil pfever o fim da necessicÍade desta tarefa no fttttu'o imecliztto,
mas claí nunca se sabe. (De Bransfbrcl eJolmsotl, 1972,p.722)
MNEMONICAS
reqLrer que o suieito visllalize cada Lrm dos itens de que pretencle
MEMORIÀ'CaP'7 recorclar-se num local espacial diferente (locus). Durante a reclrperação,
cacla local é inspeccionado mentalmente e o item aí colocado em
imaginaçáo é r'ecuPerado.
A eficiência deste métoclo é fâcLl de demonstrar" Num dos estu-
dos, estudantes universitários tinham de aprender listas de
qlrafenta
srústantivos comlrns não relacionados. cada lista era apresentada urna
vez, durante cerca de clez minLltos' durante os quais o sujeito
tentava
visualizar cacla um dos quarenta objectos em quarenta localizações
diferentes no clwrtpus nniversitário.Testados logo a seguir, recordaram
uma méclia de trinta e oito a quarenta itens;testados um dia mais tarde'
ainda conseguiam recordar trinta e quatro (Ross e Lawrence' 1968;
par-
Bower, 1970; Higbee, 1977; Roediget 1930)' Em olrtros estudos' os
ticipantes que utilizaram o método dos locais fotam capazes de reter
sete vezes mais do qlre os seus parceiros, que efectuaram a aprcndiza-
gem de uma forma habitual.
Autilid,ad.ed'asmnemónicasnauid'adiária.ossistemasde
mnemónicas proporcionam meios eficazes de impor uma organização
em elementos que, sem ela, náo teriam qualquer relação' Esses
sis-
A B
Fig.7.6 Represerxtetções inteta.ctiuas mtórios de psicologia. Mas que dizer da memorização de materiais
e ,tã.o interactiua.s. Os participantes mais significativos? Um estudante que leia um texto de história, por
na investigação a quem se exemplo, não tem que impor tÚna otganizaçío arbitríria "externa" ao
apresentam elementos relacionados,
material a memorizarBm vez disso, a slra tarefa consiste em descobrir
como, uma boneca numa cadeira e
agitando uma bandeira (A),
a otganizaçâo inerente ao texto. Quando procede deste modo, os
associarão mais provavelmente as
vários acontecimentos e datas encaixam-se todos num esquema men-
palavras boneca, bandeim e cadeira tal apropriado, ligados não apenas entre si mas também às matérias de
do que os participântes a quem se história relevantes que já foram aprendidas. Estas ligações propor-
mostraram os três objectos juntos cionam então uma rede complexa de conexões que aiudaráo o aluno
Lrns aos outros, mas não em interac- a recordar o material.
ção @). (Segundo Bower, 1970) Ao contrário, as mnemónicas levam o sujeito a centrar-se num
conjunto muito mais restrito de ligações de memória e, conse-
quentemente, é frequente que não gerem o tipo de recordação pre-
tendido. Uma imagem que ligue, por exemplo, o General Custer com
o Chefe Touro Sentado será írtil se sair no exame a pergunta "Com
quem é que o General Custer travou abatalha de Little Big Horn?" Mas
nío ajudaúa o aluno a responder à maioria das outras perguntas sobre
essas duas figuras. ("Custer lutou com Sitting Bull antes ou após a
Guerra Civil Àmericana? Terío eles feito alguma negociação antes da
batalha,?") E a imagem não melhorarâ em nada a compreensão do
aluno sobre o conflito entre os índios americanos e os colonos
usurpadores.
Resumindo, as mnemónicas são instrumentos de utilidade para a
memotizaçlo de material sem organização interna. Se o material a
aprender tiver significado ou já estiver organizado,o melhor caminho
será procurar compreender o material enquanto o estamos a aprender,
o que não só resultará numa melhor memória, mas também na flexi-
bilidade de como a informação-alvo pode ser recuperada.
367
. Cap.7 RECUPERAÇAO
MEMORIA
i
362
Recapitulação Elaborativa
A Procura na Memória
. ESTRATÉGIAS DË PROCI]RA
MEMóRIA Cap 7
NumestudocomestLrdantesuniversitários,apresentaram-se
definições do dicionário de palavras inglesas poLlco comuns, como
a.pse, sampa'n e cloaca. Pedia-se aos estudantes que dissessem
as
Instruções DeÍïÍìlções
Estão aqü as definições do diclonário de doze palavras pouco 1. Luta de extrernínio em que os membros da família duma
habituais. Examine, por favor, cada definição e tente recoÍdaí-se da pessoâ assâssinadâ tentam mataf o assassino ou membros
palav n. Hâ v âr ias alteÍnativas: da respectiva família
Z.Talisml pÍotectof pafa manter os espíritos afastados
1. Pode estar seguro de que conhece a palzvn. Ou pocle
estaf seguro de que não a conhece. Em qualquer caso, 3.Velha moeda de Espanha oÌÌ daÀmérica do Sul
4. Rocha vulcânica escura, dum e brilhânte
passe paftr a definição seguinte da lista.
Pode achar que sabe a palavra mas não consegue Secreção do cachalote utilizada na manúactum de perfume
2. 5.
íecofilá'la de momento: Poile, na realidade, estar''debaixo 6, Edificio utilizado pâra a omção pública clos muçulmanos
â. Adivinhe â primeira letm da palavm. 9, Espadâ com uma lâmina curta, pequenâ e curva, utilizadâ
b. Tente lembmr-se de uma ou duas palavms com um sotn por turcos e ámbes
parecido ao dt palavn que está a tentar encontrar'. 10.Trenó russo puxado por três cavalos
L 1. Instrume nto de navegação utilizado para medir a altum dos
Sigã este procedimento à medida qÌre passâ toda a lista de
coÍpos celestes
definições. Passe, depois, para a pâgint seguinte à esquerda,
12. Estreita faixa de terra por que estão ligadas duâs porções
paÍa, alista de palavras que se adaptam a essas definições.
maiorcs de terÍa
Fig.7.8 Ofenómeno para os investigadores que estavam interessados nas situações em que
"debaixo da língua". os sujeitos afifmavam sentif-se pfestes a encontfar a palavra-alvo' sem,
Esta figura dá-nos oportttnidade de Íìo entanto, serem capazes de a recordar (aer Fig. 7.8). Quando isto
demonstrar a maneira como alguma acontecia, pedia-se aos pafticipantes que ousasseuì algumas coniec-
coisa pode estar prestes a ser
ttrras sobre como soava palavra-alvo. Essas conjecturas revelaram-se
recupefiÌda da memória, mas não ^
estreitamente relacionadas com a palavr -alvo: os participantes adivi-
totalmente. (Adaptado de Foard,
nharam a letr inicial mais de 5O% das vezes e foram, geralmente,
r975)
capazes de adivinhar o número de sílabas. Quando se pedia aos
suieitos que dissessem outras palavms que consideÍ^vam soar como a
p alav la-alv o, ele s situavam-se, geralmen te, na v izifihança fonoló gica
correcta. Ao ser-lhes apresentada a definição "pequeno barco chinês",
os participantes que aÏrmaram ter a palavta" debaixo da língua" apre-
sentaram estas palavras de som semelhante: saipan, Siam, Cheyenne
e sarong - todas obviamente semelhantes à palawa real, sanxpa'n
@rown e McNeill, L966; Koljat e Lieblich, I97 4)'
Memória Implícita
respeito à passagem do tempo. Por que será mais fácil recordar o pas-
. cap.j
MEMÓruA sado recente do que lembrar acontecimentos do passado longínquo?
O segundo diz respeito aos erros da memória - casos em que os acon-
tecimentos sáo erradamente tecordados de tal forma que o passado
difere daquele que Ín rcalid^de aconteceu. o terceiro tema diz fes-
100
peito às falhas de memória de tipo extremo, que consideramos como
E80 o que acontece à memória em detefminados casos de lesão cefebral.
o
u
660
o
q
À40 Esquecimento
d
E
,F, ,o
a
O senso comum diz-nos que a lição de ontem está hoje mais
fresca do que a da semana passada, e a da semana passada melhor do
&o 18 24 48
que a do ano anterior. De uma maneita getal,o esquecimento aumenta
Intervalo de retenção OoÉs)
com o interualo de retenção. o tempo que medeia entre a apren-
dlzagem inicial e o momento do teste. uma das primeiras demons-
trações deste facto foi de Herman Ebbinghaus (1850-1909), que estu-
Fig.7.9 Cutua de esquecíntento. don sistematicamente a sua própria memória numa série de estudos
A figura mostm a retenção em experimentais, que se debruçaram sobre a sua capacidade de reter
intervalos diferentes, aPós a listas de sílabas sem sentido, como zup e rif.2 Ebbinghaus foi o
aprendizagem. A retenção é aqui
primeiro tÍ?Lçat Llma curu& d'e esqueclmento, testando.se a si
medida pela redução da
próprio em ^ diferentes intervalos, após a, aptendizagem (utilizou lis-
percentagem, isto é, o decréscimo da
percentagem do nítmero de ensaios
i", àif...trt.s pan cada intervalo). Como esperava, descobriu que a
requeridos para reaprcnder a lista,
memória piorava com a passagem do tempo' Esse declínio, porém,
após um intervalo sem Praticar
erairregtúaqmaisabfuptoimediatamenteapósaapfendizageme
Se a redução for de 100 Por cento,
depois mais gradual (Ebbinghaus, 1885: uer Fig'7 '9)'
a retenção é perfeita - não são
necessários ensaios de
DECADÊNClA
reaprendizagem.
Se a redução for de 0 Por cento, não
há qualquer retenção, Pois são
O que explica o padrão observado por Ebbinghaus (e muitos
necessários tantos ensaios Para
outfos estudiosos do esquecimento)? uma das teofias mais respeitadas
reaprender a lista, quantos os que slrstenta que, tal como as montanhas sofrem a erosão dos ventos e
foram inicialmente uecessários para das águas, também os traçados mnésicos sofrem, com a passagem do
a aprender. (Segundo Ebbinghaus, tempo, vma decadência. Na origem da erosão da memória, estão'
1885) plausivelmente, processos metabólicos normais, por acção dos quais o
traçado mnésico vai enfiaquecendo até acabtr por se desintegrar"
Uma das linhas de comprovação desta teoria explora o facto de'
tal como a maiotiadas reacções químicas, muitos pfocessos metabóli-
cos aumentam os seus índices com a subida da tempemtufa. se estas
inglesa mas faz, seguramente, lembrar algumas (por exemplo, soup - sop^)'Em
segunclo lugar, a influência de associações prévias não é um empecilho a
ser
pafte
removiclo dos estudos da memória mas, sim, uma influência que constitui uma
importante daaptendizagem e da recordação'
37r
INTERTERNNCIA
- /-
372
Grupo
de controlo Aprende lista,4 Recorda lista,4
Grupo
E cperimelttal Àprende lista á Aprende lista.B Recorda lista,4
Grapo
de controlo Àprende lista B Recorda lista B
Grupo
Aprende lista,4 Àprende lista B Recorda lista.B
373
FALHÀ DE RECUPERAçÃO
MEMORIA 'CaP.7
:te
Sugerimos que a interferência não "ap^ga" as memórias, mas
torna-as simplesmente mais di-ficeis de localizar Com um índice otr
A
ajuda adequada, essas memórias podem ser recuperadas. Será isto ver-
dade paru toclo o esqllecimento? Ou algum dele será verdadeiramente
LÌm caso de rasura e conseqllente perda permanente? Trata-se hoje
4 de uma questão algo controvefsa, sendo, no entanto, claro que muito
do esquecimento diz mesmo respeito à falha de recuperação: as
memórias estão extraviadas mas náo apagadas.
Esta ideia vai ao encontro das afirmações anteriores.Já dissemos
rlo
que a recapitulação elaborativa parece promover a recordação,através
da
do estabelecimento de múltiplas ligações de memória, em que cada
:ri-
uma dí acesso a uma memóúa-alvo. Por outro lado, a recapitulação de
da
manutenção estabelece poLrcas ligações e torna,por isso, dificil encon-
trar a memóúa-alvo. Dito de outra forma, uma má codificação totna
na
O mundo da criança é, etn tnuitos mais provável uma falha de recuperação. Também notámos que as
LC-
aspectos, dife,ente do do adulto. memórias são, muitas vezes, desencadeadas por um retorno ao con-
ia. De acordo com alguus autores, a texto (mental ou fisico) em qlÌe se deu a aprendizagem. Até que se
In- amnésia da in-ância desse este retorno, a informação-alvo poderia não ser recordada - um
se é parcialmente produzida pela
caso aparente de esquecimento. O facto de que se trata aqui de uma
0a enorme mudança nos ínclices de
falha de recuperação, e não de autêntica perda de memória, é escla-
Ìo recupemção disponíveis ao adulto.
(Fotografia com autorização de
recido pela presença dos índices correctos de recuperação e do res-
la
SLrzanne Szasz)
surgimento da memória.
o
Existe um outro fenómeno qlre se pode explicar nestes termos.
B
Considere-se o facto de os adultos não costumarem ser c pazes
al
de recordar acontecimentos anteriores aos seus três ou quatfo anos,
c,
um fenómeno conhecido como a.tnnésia infantil (Waldfogel, 1948;
ïa
Sheingold e TenneÍ 1982; uer Fig. 7.10). Esta amnésia poderá ter
origem no facto de o munclo da criança pequena ser muito diferente
do mundo que ela viverâ dez ou quinze anos mais tarde.É um mundo
le
em que as mesas estão irremediavelmente fora do seu alcance, um
ia
mundo em que as cadeiras são objectos a que só se pode trepar
e
com um grancle esforço, e em qLre os adultos são gigantescos no
tamanho e diúnos na habilidade.As memórias da criança são formadas
; e codificadas dentro deste contexto e, por isso, trata-se cle nm con-
Ì-
a,
l6 texto radicalmente diferente das circunstâncias do adulto (Schachtel,
1947; Neisseq 1967).
u
,g t2
Olrtros factores poderão também contribllir para a amnésia infan-
E
til. Por exemplo, o hipocampo, uma estrutura fundamental pan o
o
estabelecimento das memórias autobiográficas coerentes, não está
is
= Fig. 7.10 Núrnero de recordações da infância. Pediu-se a esttldantes
P
universitârios que recordassem experiências da infrncia.A figura representa
U
o número méclio de acontecimentos recordados em fttnção da idade em que
z ocorreram aos homens (azul) e às mulheres (vermelho escuro).As mulheres têm
012345678 ligeiramente mais recordações de idades mais precoces, o qtte pode reflectir o
Idade facto cla maturação das raparigas estar, geralmente,adiantada relativamente à dos
t p^zes. (Dados de Waldfogel,194a')
374
MEMÓRIA , Cap.7
tÊer-
- '-
378
orstonçÕrs on unuóme
MEMóRIA . Crp.7
As experiências mais importantes sobre as distorções da memó_
ria foram levadas a cabo pelo psicólogo britânico Frederic Bartlett há
sessenta anos. Bartlett apresentava aos sujeitos histórias de outras ctú-
turas cujo conteúdo lhes parecia, muitas vezes, bastante estranhos.
A recordação dessas histórias pelos sujeitos, porém, tornava as narrati
vas menos estranhas: partes que náo faziam qualquer sentido para os
indiúduos, como os elementos sobrenaturais, ou eram suprimidas da
recordação dos sujeitos ou eram reinterpretadas segundo linhas mais
comuns. De igual modo, os indivíduos acrescentavam, muitas vezes,
dados de modo a que acontecimentos, que inicialmente parecemm
inexplicáveis, se tornassem compreensíveis @artlett, 1932).
MEMOIÌh . Ctrl>.7
MEMÓRIA 'CAP.7
LIMITÀÇÕES DA MEMÓRIA
n l,iI
infantis. Mas, comparados com os desenhos lealmente Produziclos
pelos sujeitos nessa iclade, via-se claramente qlle el?m mlrito mais
Vun ,p sofisticados.Tracluziam a concepção que Lrm adulto tem do desenho
,. infantil, sem, no entanto, serem Llm desenho infantil (Fig' 7'12; Orne,
a 1951). Do mesmo mo<lo, esses adtlltos hipnotizados respondem a per-
;$l'Uffi" glrntas e percebem o mundo não como crianças mas como achctm
que é próprio das crianças. Quando incorrectas as suas crenças (acllú-
tas) sobre as crianças, a sua simlúaçâo falha também.
Como poclemos explicar estes resultados? Em primeiro lugaq é
claro que a hipnose não tem, de facto, os poderes quase mágicos de
*ürffi c
allmentar a memória qlle por vezes se lhe têm atribuído (Barbeq 1969;
Orne e Hammer, L974;Hilgard, 1977).4 hipnose não nos torna mais
reviver o passado clo que quando acorclados (nem,iâagora,
pazes de
nos permite prodígios de agilidade e força de que de outro modo
seríamos incapazes). o que realmente acontece é que tofila os inclivi
duos inwúgafmente desejosos de acreditar e coopefaf com oÌrtfa pes-
s soa, o hipnotizadot, prontificando-se a fazer o que este lhes peclir
(dentro das fronteiras de certas limitações mutlramente acorcladas).
para lhe agtadar'
Qtranclo ele lhes pede para rccordaq fazem tudo
põem-se obedientemente ao trabalho, rebuscam o espírito pafa encon-
tfaf Ìlm possível índice de fecupefação. É o que fazemos todos, hip-
notizados ou não, descle que queiramos muito recordar. E que acon-
tece se não o conseguirmos? se não estivefmos hipnotizados, talvez
possamos assumir o fracasso. Mas não é o que fazem as pessoas sob
Fig.j.lz A recordação estudada hipnose. Tentam a todo o custo agradat ao hipnotizador que lhes disse
a.trítués de desenbos realizados sob para recordar, e as convenceu de que podiam fazê-lo'E,pan agradar ao
bipnose. (À) Desenhos feitos aos hipnotizador, produzem "memórias", acfescentando e feconstfLrindo
seis anos. (B) Desenhos executados criativamente na base de algo que já sabem. como vimos, estas fecons-
pelo participante hipnotizado a tfuções constituem Ìlma cafactefística habitual de muito daquilo a que
quem foi clito que tinha seis anos
chamamos lembrar. A diferença é que, sob hipnose, os suieitos tof-
Note-se algumas diferenças
llam-se extfemamente confiantes na realidade das suas recordações.
interessantes entre os desenhos, por
Isto foi pafcialmente demonstrado nlrm estudo sobre a suscepti-
exemplo, a teÍda teqee,müito mais
pormenorizada em (B); a ottograÍia bilidade dos hipnotizados a perguntas viciadas. o experimentador uti-
da palavrt balloon,e um sentido Iizou a técnica jâ familiar de mostrar aos sujeitos o vídeo de um aci
geral de composição Patente em (B) dente, e de mais tarde lhes pedir que recordassem certos pormenores'
e totalmente inexistente em (A). encontrando-se os participantes sob hipnose ou não' Algumas das
(Segundo Orne, l95l) questões colocadas efam questões viciadas, outfas tinham expressão
mais objectiva. Como vimos, as perguntas viciadas levam a erros'
mesmo quando os sujeitos não estão sob hipnose' Mas levam ainda a
mais erros nos sujeitos hipnotizados do que nos sujeitos de controlo'
"a placa de matrícula do
Quando interrogados sobfe se tinham visto
veículo...,'(que na realidade náo eta visível), alguns dos sujeitos hip-
notizados não só afkmaram que sim, como se lançaram em descrições
parciais do número da referida placa. Resrútados como este lançam
384
da hipnose em contextos
sérias dúvidas sobre avalidade dautilizaçâo
MEMÓRIA . caP.7 judiciais reais @utnam ,1979;Smith, 1983) e'nl re lldade' os tribunais
"facilitado" por
americanos reieitam quase sempre o testemLrnho
hipnose .
queforam..recalcadas''durantemuitosanosedepois..recuperadas,,.
qLranto
Como grande preocupação, muitos investigadores são cépticos
a se o fenómeno de recalcamento existe de facto
(e. g.,Holmes, 1990;
defen-
Loftus, 1993, L9g7)' Os acontecimentos altamente emocionais'
dem eles, tendem a set rnelbor recordados em comparação
com as
corriqueiras - exactamente o oposto do (alegado)
ocorrências mais
padrâo de recalcamento. Assim, é frequente as vítimas de violação
-ra..-
p.rr.guidas, durante anos, pela sua terrível experiência; os
os pensamen-
sobreviventes do Holocausto têm dificuldade em evitaf
tos sobre os horrores que sofreram' ffoltamos a estas memórias
de
stfesse pós-traumático.)
Além disso, é tristemente plausível que as memórias "recuperadas"
apósumperíododeamnésiasejam,emmuitoscasos,falsas,fabricadas
mediante os mecanismos já discutidos. Assim, sabemos,
por exemplo,
passado dis-
que a possibilidade de erro é maior para a rccordação do
que
tante do que para o passado fecente' Do mesmo modo' sabemos
o interrogatório apertado de uma testemunha pode criar"memórias"
de acontecimentos integrais que nunca acontecefam' especialmente
se as perguntas forem repetidas uma e outra vez @or
exemplo' Ofshe'
e Smith, 1994;Hyman' Husband' e Billings' 1995;
L992;Ceci,Huffman,
e Mitchell ,1996>' Sabemos também que falsas
Loftus, 1997;Zatagoza
memórias, quando ocorrem' podem ser recordadas tão completa-
quanto
mente, tão confiadamente e, de facto, com tanto sofrimento
os acontecimentos reais'
recupera-
Vale também a petr notar que muitas dessas memórias
de um terapeuta' que está genuina-
das só emergem com a assistência
menteconvencidodequeosproblemaspsicológicosdoclienteorigi-
pensa que esses
nam-se no abuso da infincia. Mlritas vezes, o tefapeuta
o paciente os encarar de frente e
problemas só podem ser tratados se
desse abuso (por exemplo, Bass
tfouxef à luz as recordações espinhosas
pode confiar
e Davis, 1988). Para ajudar nesse processo, o terapeuta
numadiversidadedetécnicasquevisammelhoraramemória,técnicas
386
LIMITES DA DISTORçÃO
.ÀlgunsautoresafirmamqueaSpessoasabusadasnainÍânciapodemdesen-
volver uma diversidacle de sintomas, incluindo pefturbações da alimentação'
etc' (por
incapacidade para estabelecer relações íntimas,vários tipos de.ansiedade'
exemplo,BasseDavis,lgSS)'Mascadaumdossintomaspodefacilmenteteíouüa
quaisquer
origem, isto é, não ter história de abuso. Não podemos, pois, interpretar
sintomas ou padúo de sintomas como prova de abuso antefiof na vida
do indivíduo
é imporlante ter em conta que somos uma espécie resistente' e que
AIém disso,
algumascfiançasabusadasseapfesentamsemquaisquersintomassubsequentes
(KendallTackett,williams, e Finkelhor, 1993; Kihlstrom' 1996) Mas seiamos claros
qtre isso nío tetira nada ao horror deste crime Abusar de uma criança' sexualmente
sinto-
áu de outra forma, é um acto terrível e um crime, quer a criança desenvolva
mas subsequentes quer não.
387
Perturbações da Memória
AMNÉSIAANTERÓGRÁDA
lef A
:m MEMORIA ' CaP.7
)n-
de
Recordações remotíts e recentes nos
;CS
É40 ... É como se cada dia fosse ílnico, independentemente da alegria que
o tenha tido, e independentemente da tristeza que tenho tido (Milner, Corkin,
u e Teuber, 7968;ptn aproftindar o caso de H.M', uer Hilts' 1995).
e20
0 AMNÉSIA RETRÓGRADA
20 ,tnos 30 {0 Anos 50 Anos 60
^nos ^ros
Década
Um déflce oposto ocorre na atnnésia retrógrad'a' (tetrógrada
la
OI]TROSTIPOS DE MEMORTA
Respostas ao teste de "rostos
famosos". Anos 60: Nikita Temo-nos centrado na distinção que depende da forma, implícita
Khrushchev, Mohammed Ali, Golda
ou explícita, como a memória se revela; do que o suieito faz (cor;.he'
Meir.Anos 70:Anwar Sadat, Betty
cimento procedimental) ou do que diz (conhecimento declarativo)'
Ford, Patty Hearst.Anos 80: Mary Lott
Retton, Nancy Reagan, Boy George.
Mas as memórias também se podem distinguir segundo o tipo de
Anos 90: Michelle Kwan,Timothy informação contido na memória e, também aqui, a distinção pode ser
McVeigh, Colin Powell. esclarecida através do estudo da amnésia.
393
APRECIAÇÃO FINAL
SUMÁRIO
l. Todo o acto de recordar implica que se seia bem sucedido em cada uma
das três seguintes fases: aquisição,arrnazenatnento e
'ecuperação'
2. De acordo com teoria de ,ltulti-arrnazéns da memór'ia, existem vários
^ (ini-
sistemas de memória. Destes, os Ínais importantes sáo a memória de trabalbo
cialmente memória a curto pÍ:Ìzo), que fetém o material que está a sef activamente
trabalhado, e a mem.óría a longo prazo, em que a informação é atmazenadt
por
períodos mìJito mais longos. De acordo com a teoria de multi-armazéns, para entfaf
no sistema cle memória a longo pràzo, o material tem cle passar primeiro pela
memória de trabalho.
4.Quandosepedeaospafticipantesnumainvestigaçãoqrrerecorclemlistas
de itens não relacionados, eles recordam, mais pfovavelmente os primeifos itens
escutados e, também, os Íútimos. À vantagem, nos primeiros itens' designa-se de
efeito de prhna.zi6.,e está associado com a fecì.lperação do armazenamento de
longo
pt^zo.Avantagem, nos íútimos itens, designa-se de efeito de recência, e reflecte a
5.Emboraacapacidadedamemóriadetrabalhosejalimitada'ossuieitostêm
na
uma flexibilidade considerável na forma como os materiais são empacotados
grande
memória.Ào recodificar o material, em agruparnentos maiores de memória,
parte da informação pefmanece reticla na memória de trabalho
396
9. Uma das razões por que determinadas formas de codificação (por exem-
plo, a orgrnizaçáo e a compreensão) sáo táo efrcazes é a de que elas ajudam a
pfeparaf a vií- pafí- uma fecuperação postefiof ao fixar muitas vias de recuperação
que levam ao material-alvo. Esta mesma ideia explica o efeito do reca.pitalação
elaboratiua que, ao contrário da Íecapitulação de manutençío,aiuda a recordação,
pois proporciona vias adequadas de recuperação.
1Ì- 16. À hipnose, é por vezes, recomendada como forma de melhorar a precisão
a da memória. Os dados mostram, todavia, que a hipnose nada faz para melhorar a
io memória, e pode mesmo aumentar o risco de erros da memória.
ío
17.Hâtma grande controvérsia sobre o estatuto das memórias recalcadas.
o,
As provas sugerem que se deve ter grande cautela na avaliaçáo dessas memórias,
especialmente quando surgidas com a ajuda de interrogatório, hipnose ou drogas
of que alegadamente aiudam a recordação.
to
18. Determinadas lesões cerebrais, paÍticularmente a nível do hipocampo e
)s
regiões vizinhas, podem dar origem a perturbações da memória. Na amnésia
,r-
anterógrad.a, a capacidade do paciente para reter material na memória a longo
prazo está reduzida.Na amnésia retró8rada',dá-se a perda das recordações de acon-
tf- tecim€ntos ocorridos antes da lesão a qual é, por vezes, atribuída a uma perturbação
f,S da consolidação do traçado.Actualmente, uma questão importante é a da razáo por
lf- que os pacientes com amnésia anterógnda grave podem adquirir algumas recor-
ta dações a longo prazo (aprender um percurso num labirinto ou beneficiar da pre-
as paração por repetição), mas não outras (recordar que já vitam o labirinto otl ouvimm
ta uma palavra). Segundo uma hipótese, é fundamental distinguir entre conhecí-
ia ,lrento procedittental e conÍteclmento declaratiuo; segundo outta, é necessário
o, distinguir entÍe recuperaçã.o ilnplíctta e a rccuperação explícita'