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Olá, caro leitor!


Feliz ano novo!

Que 2023 seja um ano repleto de conquistas, realizações e


Kung Fu Wushu para todos nós!

E, o ano já começou diferente para nós da Revista KF,


provavelmente você já percebeu que esta edição foi lançada
no começo do mês e não no final do mês como era em
2022.

Esta é a primeira novidade de 2023, as edições da nossa


revista digital serão lançadas sempre no começo de cada
mês.

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Desta forma, acreditamos que seja mais fidedigno relacionar
a edição com o mês em que foi lançada, assim como, os
artigos que recheiam tal edição também serão mais
coerentes.

Por exemplo, é melhor falarmos do Ano Novo Chinês no


começo do mês do que após a data, já beirando o próximo
mês.

Mas esta é só a primeira de muitas novidades que ainda


acontecerão em 2023, veja mais alguns exemplos: o retorno
do nosso canal do YouTube, a nossa plataforma online com
conteúdos exclusivos, o nosso podcast com as edições da
Revista KF narradas, etc.

Logicamente que todas estas novidades serão executadas


com a intenção de divulgar e expandir ao máximo a arte
marcial chinesa pelo Brasil.

Então, sugiro que você me siga nas redes sociais para não
perder nenhuma novidade, os links estão abaixo.

Aguardem, coisas boas virão nos próximos dias e vamos


juntos fazer o Kung Fu Wushu crescer cada vez mais!

Espero que você aproveite ao máximo a primeira edição


deste ano, boa leitura e até a próxima.

Erik Souza KF

Siga-me:

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Quer divulgar a sua academia,
as suas aulas ou o seu evento?
Nós podemos lhe ajudar!

Para saber mais entre em contato pelo e-mail abaixo


perguntando sobre divulgação e nós entraremos em contato o
mais breve possível.

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pelo e-mail: contato@eriksouzakf.com.

A sua opinião é muito importante para nós!

Você pode mandar os seus elogios, críticas, sugestões, entre


outros assuntos, para o e-mail contato@eriksouzakf.com.

Contamos com o seu apoio para trabalharmos juntos pelo


crescimento do Kung Fu Wushu.

Revista Digital Erik Souza KF


Edição 009 – Janeiro 2023

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Índice
2023, o Ano do Coelho.................................................... 6

Como são feitos os Uniformes de Kung Fu Wushu?....... 9

Wing Chun - Conheça esta Arte Marcial......................... 14

Bate Papo com o Professor Marcelo Alexandrino........... 34

Templo Shaolin - Uma Breve História............................. 46

Clique e baixe as edições anteriores!

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2023, o Ano do Coelho
No dia 22 de janeiro de 2023 iniciará o ano do coelho de
água de acordo com o calendário e horóscopo chinês.

Na China, é utilizado o calendário lunar que corresponde à


doze ciclos da lua.

O coelho é um dos signos do zodíaco chinês e todas as


pessoas que nascerem entre o dia 22 de janeiro de 2023 e
o dia 09 de fevereiro de 2024 serão regidos por este signo.

Paciência, racionalidade, sorte, gentileza, serenidade,


diplomacia, atencioso, sensibilidade, indulgência,
criatividade, estas são as características do coelho de
acordo com a astrologia chinesa.

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Logo, é esperado que o ano do coelho seja calmo, sereno,
racional e próspero para a maioria das pessoas.

Porém, é preciso tomar cuidado para não cair no


comodismo, no tédio, na preguiça, na solidão e no
pessimismo, ou seja, não deixe o lado sombrio do coelho
interferir na sua vida.

Madeira, fogo, terra, metal e água são os elementos


conhecidos da medicina chinesa e que, de acordo com a
astrologia da China, influenciam cada um dos signos.

Este ano também contará com a regência do elemento


água, trazendo equilíbrio, fluidez e favorecendo a
comunicação intrapessoal.

A água também poderá potencializar as características boas


e ruins do coelho.

Aproveite este ano para meditar, refletir e trabalhar o


autoconhecimento, desta forma o elemento água lhe
ajudará a contornar as adversidades e os obstáculos que
poderão surgir.

O ano do coelho de água favorecerá os relacionamentos


pessoais e profissionais.

O ano do coelho tende a ser mais alegre e romântico, então,


aproveite os momentos com familiares e amigos, as trocas
de afetos e presentes, as reaproximações e encontros.

Profissionalmente, não deixe de aproveitar as chances que


surgirão, fortaleça as parcerias comerciais, pense com

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calma e racionalidade antes de tomar qualquer decisão e
aproveite as boas vibrações do coelho para prosperar.

Também é fundamental não deixar de lado ou adiar os


assuntos desagradáveis e as tarefas chatas do seu dia a dia
no trabalho.

Enfim, no geral, o ano do coelho de água será agradável e


próspero para aqueles que buscarem a introspecção, pois
este será o caminho para quem buscar evoluir em qualquer
área da vida neste período.

Está procurando um livro


digital sobre Kung Fu Wushu?

Então, clique abaixo e confira!

O guia definitivo para Shaolin Kung Fu

O Sanda da China

Wing Chun – Muk Yan Jong

Relatos Históricos sobre a Origem e a


Evolução do Choy Lay Fut

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Como são feitos os Uniformes de
Kung Fu Wushu?
Se você pratica Kung Fu Wushu e não faz ideia de como o
seu unforme é feito, então, veja este artigo até o final e
descubra como um pedaço de tecido se transforma em
uniformes de Kung Fu Wushu.

Para falarmos sobre este assunto, convidamos o pessoal da


Lúcia & Paula Costuras para nos contar como é o processo
de criação das peças que utilizamos nos treinos.

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Para quem não conhece, Lúcia & Paula Costuras é uma das
maiores fabricantes de uniformes de Kung Fu Wushu do
estado de São Paulo e produz uniformes e roupas para
diversas escolas e academias do Brasil.

A Lúcia, uma das proprietárias, é quem vai nos ajudar a


entender como é a linha de produção da confecção. Veja
abaixo o que ela nos contou.

Lúcia, o cliente chega aqui na confecção e quer fazer


um uniforme para a sua academia. Como vocês definem
como será este uniforme?

“Primeiro, é importante decidir o modelo do uniforme.


Qual será o tecido para fabricação e as cores utilizadas
(que geralmente seguem as cores da escola ou
academia do cliente), se vão ter algum tipo de estampa
ou bordado e, por fim, a quantidade de peças de acordo
com a nossa produção, que é por atacado.”

Após a definição dos detalhes, vocês iniciam o


processo de fabricação. Quais são as etapas da
confecção até o uniforme estar pronto?

“Depois de anotado o pedido, a primeira etapa é a de


corte do tecido. Em seguida, as partes que serão
estampadas ou bordadas, são selecionadas e enviadas
para a estamparia ou para o bordado. Retornando para
a confecção, é realizada a conferência das partes e o
pedido segue para a linha de produção. Já finalizando,
temos as etapas de acabamento, conferência e
embalagem. Por fim, é feita a entrega do produto para o
cliente.”

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Todas as etapas são feitas aqui na confecção?

“Não, as etapas de corte, estamparia e bordado são


terceirizados com nossos parceiros.”

Tem alguma etapa da confecção que é considerada


fundamental, a mais importante, que não pode ser
pulada de nenhuma forma?

“Todas são importantes, já que uma etapa depende da


outra. Afinal, não tem como costurar sem cortar o
tecido... Mas, sem dúvida, as etapas de conferência são
essenciais para que o produto seja entregue de acordo
com o que foi combinado com nosso cliente.”

Camisetas, calças, coletes, blusões, etc. Quais peças


são as mais pedidas?

“Coletes, calças e faixas, já que são as peças que


compõem o uniforme de grande parte de escolas e
academias de Kung Fu.”

A escolha do tecido afeta na qualidade final do


produto? Ele pode acabar tendo uma durabilidade
menor? Este tecido escolhido pelo cliente também
interfere no processo de confecção das peças?

“Sim, com certeza. Tecidos mais delicados precisam de


maior cuidado, como uma roupa de festa. Assim, o
cuidado também interfere na durabilidade da peça.
Porém, temos o costume de esclarecer para o cliente as
características do tecido que ele escolheu, inclusive

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indicando outro que seja mais adequado para os treinos
e que seja resistente. O processo de confecção também
é afetado, pois alguns tecidos demandam maior atenção
e cuidado na costura.”

Quais tecidos são mais pedidos para a produção dos


uniformes?

“Gabardine e Oxford para os coletes de treino no dia a


dia. Para apresentações e competições, o Cetim é mais
procurado. Já para as calças, os mais pedidos são
Gabardine e Trilobal. E, nossas faixas são todas de
Cetim. Para as outras peças que produzimos temos
uma variedade de tecidos, como Algodão e Dry para
camisetas e também Tactel para shorts.”

Vocês já receberam algum pedido diferente, algum


modelo de uniforme ou matéria prima muito especifica
que vocês tiveram que correr atrás para entregar?

“Sim, e é bem comum. Já tivemos clientes que enviaram


tecidos pra gente de outro país, uniformes inspirados
nos da série Cobra Kai (que era uma novidade para
nossa modelagem) e alguns conjuntos de Tai Chi, que
pedem tecidos mais leves e fluidos, e que não são tão
comuns na nossa produção.”

Por outro lado, já teve algum pedido que você falou:


isso nós não fazemos, não vou nem tentar?

“Para o Kung Fu, por incrível que pareça, nunca


aconteceu! Geralmente sempre tentamos pelo menos
fazer um teste com peça piloto (nem sempre dá certo!).

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Só dizemos “não” logo de cara, se for algum pedido fora
do Kung Fu.”

Por que o Kung Fu Wushu? Como surgiu a ideia de


fabricar uniformes de artes marciais chinesas?

“Nossa história começou com a costura sob medida.


Quando dois amigos nossos, Sifu Daniel Hirata e
Professor Márcio Lima, nos pediram para confeccionar
os uniformes para a Academia Wushu. Assim surgiu a
oportunidade para entrar nesse mercado. E, deu tudo
certo! Já estamos há 12 anos confeccionando uniformes
de Kung Fu e Sanda, trabalhando com diversas escolas
presentes em todo o Brasil.”

Para quem quiser saber mais sobre o trabalho de vocês,


como os leitores podem entrar em contato?

“Temos a nossa página no Instagram,


@luciaepaulacosturas, o WhatsApp (19)99574-8531 ou
e-mail contato@luciaepaulacosturas.com.br.”

Lúcia, muito obrigado pela participação, por abrir as


portas da confecção para a nossa revista digital.
Esperamos que haja cada vez mais uniformes para
vocês produzirem!

“Magina! Nós que agradecemos a oportunidade de


mostrar um pouco do nosso trabalho para todos vocês e
para os leitores. Muito sucesso também!”

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Wing Chun
Conheça esta Arte Marcial
O Wing Chun ganhou muito destaque nos últimos anos com
o sucesso da série de filmes Ip Man – O Grande Mestre,
porém, este estilo de Kung Fu Wushu não foi criado tão
recentemente.

Este estilo é conhecido pelos seus movimentos curtos,


simples e eficientes, características que chamaram a

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atenção do grande astro e mestre Bruce Lee que praticou
Wing Chun diretamente com o mestre Ip.

No Brasil, o estilo vem ganhando cada vez mais adeptos,


logo, convidamos o Sifu Marcos de Abreu da Brazilian Wing
Chun Academy para falar mais sobre esta arte marcial
chinesa.

Sifu Marcos é especialista em Wing Chun, escritor, treinou


atletas campeões em Kung Fu Wushu, assim como, atletas
do UFC, foi aluno do grão mestre Li Hon Ki (1952 - 2016),
um dos introdutores de Kung Fu Wushu no Brasil e hoje
estuda com Sifu Gorden Lu, sobrinho-neto de Ip Man.

Confira abaixo como foi este bate papo e aprenda mais


sobre o estilo Wing Chun de Kung Fu Wushu.

Sifu, muito obrigado por aceitar o nosso convite.


Falando sobre o Wing Chun, dizem que este estilo foi
criado no sul da China, mas por quem e quando ele foi
criado?

“Há duas versões que devemos levar em conta quando


analisamos uma explicação para a origem de um estilo
de Kung Fu: a primeira e mais importante é a tradição
oral, as histórias que são passadas de mestre para
discípulo de geração a geração. É como o seu mestre
lhe contasse coloquialmente no dia a dia. Aqui não há
qualquer preocupação em seguir científica e
cronologicamente o desenrolar dos fatos, mas contar
uma espécie de "moral da história" que envolve o
respeito aos ancestrais, o funcionamento estratégico da
arte e uma exortação ética de seu uso para o bem da

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sociedade e preservação das tradições chinesas. Havia
a necessidade de se esconder os nomes reais de
mestres e substituí-los por personagens folclóricos. Isso
acontece porque no passado os mestres corriam risco
real de serem mortos por serem defensores da
derrubada da Dinastia Ching. Outra versão, mais
científica, é a história documental, os fatos
comprovados e ordenados cronologicamente que nos
ajudam a entender como uma arte se desenvolveu de
acordo com as demandas de seu tempo, os
acontecimentos políticos e culturais. A melhor forma de
entender mais profundamente uma arte marcial chinesa
em sua origem é chocar a tradição oral com o que há de
documentação a respeito, tendências e mesmo
modismo de outros estilos praticados na mesma época,
intercâmbios, mudanças tecnológicas, etc. Isso porque
há uma dificuldade de se estudar arte marcial chinesa
pela falta de elementos que comprovem elementos
passados na tradição oral de muitos estilos. As pessoas
tendem a desprezar a tradição oral hoje em dia. Mas se
é verdade que quem conta um conto "aumenta um
ponto", também é verdade que toda mentira tem um
fundo de verdade. Isso, no ocidente é o equivalente a
importância de se ler romances. E, não é um romance
um compilado de mentiras? Mas os grandes romances
nos dão a perspectiva de ver a vida sob o olhar de
histórias contadas por outras pessoas, muitas vezes
baseados em experiências e fatos reais, e com a
experiência artística de poesia e beleza. Arte marcial
chinesa também é assim. Segundo a tradição oral o
Wing Chun teria surgido a partir das observações de
uma monja, chamada Ng Mui (ela mesma, uma dos
Cinco Anciãos remanescentes da destruição do Templo

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Shaolin), sobre uma luta entre um grou e uma serpente.
Ela saia regularmente do templo da Garça Branca e
descia a montanha para comprar tofu com Yim Yee, que
seria um ex-discípulo do templo e tinha uma filha
adolescente chamada Yim Wing Chun. Em certa
ocasião um bandido chamado Wong teria tentado forçar
o pai de Yim Wing Chun a ceder sua filha para que se
casasse com ele. Acontece que sua filha já havia sido
prometida em casamento a outro jovem, como mandava
a tradição da época. Ng Mui, ao saber da história,
propôs-se a ensinar a jovem a lutar. Na data em que
Wong prometera voltar para desposar a moça à força,
Yim Wing Chun desafiou e derrotou Wong, casando-se
com Leung Bok Tao, tendo este nomeado
posteriormente o estilo de "Wing Chun Kuen" em
homenagem à sua esposa. No que temos de origem
histórica real do Wing Chun, sabemos que "Wing Chun"
(Canção da Privamera) é de fato uma leve corruptela do
nome Weng Chun (Eterna Primavera), o nome da
cidade onde o estilo surgiu, provavelmente dividindo
uma origem em comum com o estilo da Garça Branca.
Repare a repetição das referências. No estilo da Garça
Branca a tradição oral também relata uma monja, só
que de nome Fang, que teria ensinado a uma moça que
observa a luta entre dois animais (garça versus garça,
neste caso) e cria um estilo para vingar a morte do pai.
Esta história chegou ao Japão no século XIX, está
relatada no Bubishi e tem relação com a origem do que
é hoje o Karatê Do. Em 2009, um historiador americano
chamado Stanley Henning encontrou a primeira
referência documental de que realmente existiu uma
mulher, casada com um comerciante local, que tinha
uma escola com vinte e quatro discípulos na cidade de

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Weng Chun, chamada "Ding Número Sete". Seu nome
estava anotado num anuário geográfico que data ainda
do começo para meados do século XVII, muito antes do
estabelecimento formal da maioria dos estilos modernos
mais famosos do sul da China. Suspeita-se que embora
o Wing Chun tenha semelhanças com a Garça Branca
(inclusive em trechos de formas antigas) em algum
momento posterior o estilo da garça se fundiu com um
estilo de serpente, dando origem ao que chamamos
Wing Chun moderno, com características próprias,
durante o período em que o estilo foi preservado por
uma trupe artistas de Teatro de Ópera Cantonesa que
usava para seu deslocamento nos rios os juncos
(barcos) pintados de vermelho, os Hung Suen.”

Muitos estilos sulistas foram desenvolvidos para a


guerra e acabaram sendo utilizados nas várias batalhas
que aconteceram na China durante a Dinastia Qing, o
Wing Chun também teve esta finalidade ou é um estilo
mais voltado para a autodefesa?

“Essa ideia de que os estilos sulistas foram


desenvolvidos para a guerra é só parcialmente
verdadeira. É fato que ao longo de seus respectivos
desenvolvimentos, vários estilos de Kung Fu que
inicialmente tiveram forte influência de manuais militares
foram mudando sua lógica de funcionamento à medida
que muitas de suas armas foram caindo em desuso,
seja por questões logísticas ou militares, e substituindo
estes elementos por outros. A função do Kung Fu nunca
é apenas utilitária, ou seja, no sentido de funcionar
apenas para um fim específico. No Kung Fu há folclore,
ritos, senso de estética, preceitos morais e tradições

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culturais que se perpetuam no tempo. Muitos dos
praticantes de estilos sulistas, entretanto, tinham em
seu coração o desejo de restaurar a dinastia Ming,
destronando os manchus e reconduzindo a etnia Han de
volta ao poder. Para isso muitos destes estilos tomaram
parte, direta ou indiretamente, em sociedades secretas
com o objetivo de fomentar rebeliões, utilizando para
isso seu conhecimento marcial. É tido que praticantes
de Choy Lee Fut e Wing Chun estabelecidos nos Hung
Suen (Barcos Vermelhos) teriam tomado parte na
rebelião de Tai Ping (1854), o que teria levado o
governo manchu e desmontar e proibir a Companhia de
Ópera de funcionar, tendo muitos de seus integrantes
se radicando em Foshan, que seria o berço dos estilos
modernos de Hung Gar, Wing Chun e Choy Lee Fut. O
Wing Chun tem uma lógica de funcionamento bem
objetiva; seu soco em alguns estilos (Ip Man e
aparentados) acabou se adaptando e especializando
nos contragolpes na curta distância, o que o deixou de
certa forma limitado no ataque e, assim sendo, para
competições de alto rendimento. Assim sendo, olhando
sobre o prisma de nosso tempo e comparando com
outras lutas modernas, o Wing Chun pode sim ser
definido como mais propenso à defesa pessoal, bem
focado nos primeiros e muitas vezes decisivos
movimentos. O Wing Chun se especializou naquilo que
chamamos nos estilos do sul de "Kiu Sao" (Mãos em
Ponte), onde o exercício Chi Sao é o ápice da
sofisticação metodológica. Falando em linguagem de
gente, o Wing Chun é muito bom nos bloqueios, usando
basicamente variações de três movimentos, governados
por três conceitos que dão origem a todo o seu
repertório técnico. Ao contrário de lutas esportivas onde

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subjugar o outro é importante, no Wing Chun estamos
tão interessados não tanto em bater, mas em não
sermos atingidos. Isso não quer dizer contudo que o
Wing Chun não tenha a sua combatividade, seu
emprego em brigas e desafios no passado é bem
conhecido e relativamente bem documentado. Em
termos meramente conceituais, contudo, se você é um
lutador de Wing Chun e se envolveu numa briga contra
a sua vontade, significa que falhou em sua estratégia.
Não estamos interessados em lutar, mas interessados
em vencer. É um mindset totalmente diferente.”

O Wing Chun possui movimentos bem característicos,


ele foi desenvolvido baseado em outros estilos de artes
marciais? Ele possui movimentos imitativos, golpes de
vários animais?

“Como mencionei numa resposta anterior, o Wing Chun


é, muito provavelmente, uma mistura do estilo da Garça
Branca da cidade de Weng Chun com a Serpente da
Montanha Emei; entretanto há algo muitíssimo
interessante aí. Ao longo de seu desenvolvimento, o
Wing Chun passou de uma mera imitação ou referência
simbólica do gesto animal e passou a utilizar o
"comportamento" do mesmo em combate. Esta é a
visão de meu falecido mestre Li Hon Ki. Por exemplo,
ao invés usar minha mão para fazer um gesto teatral
para imitar uma serpente, eu uso todo o meu corpo para
me inclinar para trás quando recebo um ataque e, da
mesma forma, tomo a elasticidade da defesa para o
"bote" quando soco ou chuto no contragolpe. Nos estilos
mais modernos de Wing Chun, notadamente na família
de Ip Man, as referências aos animais mudaram aos

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poucos para copiar os gestos mais humanos, aqueles
que fazemos no dia a dia. Assim, quando tomamos uma
técnica como “Bong” (Asa), o nome enquanto
substantivo é o membro do animal, mas, enquanto
verbo, quer dizer "amarrar", "juntar". Para tornar os
movimentos mais naturais e aplicáveis, os mestres
estimulam os alunos
a procurarem
semelhanças entre o
gesto técnico
propriamente dito e
ações biomecânicas
semelhantes. Assim,
uma continência, o
gesto de jogar uma
braçada de nado
"crawl", uma criança
que coça os olhos
com as costas de
sua mãozinha ao
acordar, o Wing
Chun copia estes
gestos naturais para
usar o "Bong" de
acordo com cada
situação. Essa é a
visão de meu mestre
atual, Sifu Gorden Lu. Aproximar o estilo de práticas do
dia a dia torna cada gesto corriqueiro num gesto de
treino. A psicomotricidade do Wing Chun moderno não
separa a vida comum da vida marcial, elas são espelhos
uma da outra. Entender o passado é muito importante
para entender o que se faz hoje; todavia essa ideia de

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que tudo que é antigo e necessariamente melhor que o
atual é algo muito usado para se ganhar dinheiro em
cima do perfil erudito e intelectual do praticante do Wing
Chun. É preciso entender que muito do que não é mais
feito hoje foi jogado fora pelos mestres do passado, e
isso certamente tem um motivo, não foi à toa. Estilos de
luta se influenciam mutuamente todo o tempo, com
maior ou menor velocidade, naturalmente, de acordo
com as necessidades exigidas pelo ambiente e
preferências de seus mestres. Achar que estilos
melhores são estilos "puros" é um erro, embora bem-
intencionado, porque não acompanha a história real do
desenvolvimento das artes marciais.”

Quais são os movimentos mais característicos do Wing


Chun?

“Para um observador leigo, além dos socos "corrente"


na posição vertical desferidos em uma saraivada veloz,
certamente a base Yee Ji Kim Yeung Mah (com os
joelhos voltados para dentro e os calcanhares para
fora), movimentos como Tan Sao e Bong Sao e guarda
com as mãos abertas na linha central. Isso causa um
certo estranhamento e também curiosidade nas
pessoas. O que a maioria não sabe é que os
movimentos do Wing Chun estão também presentes em
muitos outros estilos originários do sul da China,
incluindo vários estilos de Karatê e, até mesmo, estilos
do norte. A diferença é o grau de especialização que o
Wing Chun atingiu no uso de pontes (bloqueios e
defesas) e a sua busca pela simplicidade, mas não do
jeito que as pessoas imaginam. No Wing Chun, não se
trata do quanto eu consigo acumular, mas como posso

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adaptar e mesmo misturar os mesmos elementos
defensivos a partir de ângulos e situações diferentes.
Numa luta esportiva é muito importante que tenhamos
poucos movimentos também, mas eles estão
estritamente em função daquele ambiente, regras e
igualdade de meios. A defesa pessoal pode envolver
sim, a luta em ritmo esportivo e o praticante deve estar
preparado, mas as pessoas se enganam ao julgar todas
as artes marciais apenas por esta lente. As situações de
defesa pessoal irrestrita têm um espectro muito maior
de potenciais agressores e gravidade de ferimentos:
pode envolver, por exemplo, desviar de um objeto que
vem em sua direção por acidente, um soco desferido de
surpresa por um oportunista, um golpe de bastão ou
faca totalmente inesperados, uma luta em um ambiente
confinado, evitar ambientes cheio de gente sem nada a
perder, ao invés de imaginar que para ser bom deve-se
lutar com todos e vencer. Infelizmente, temos recebido
notícias de muitos atletas multi campeões que perderam
sua vida em situações de defesa pessoal que poderiam
ter sido evitadas porque eles têm a falsa impressão de
que sua capacitação para ser bem-sucedidos na
competição lhes dá um salvo conduto de
invulnerabilidade, mas quando saímos de um ambiente
controlado entram fatores inimagináveis que somente o
jeito de pensar de um sistema de arte marcial lhe dá
mais amplas condições de adaptação. Assim sendo,
mentalmente falando, o movimento mais característico
do Wing Chun é antecipar uma situação de perigo, e
não remediar um problema. Só assim é possível
"defender e atacar simultaneamente", característica
mais marcante não só do Wing Chun como de outros
estilos do sul.”

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As facas borboleta (imagem da página 14) são
praticamente um símbolo do Wing Chun, quais outras
armas chinesas há no estilo?

As chamadas Hudiedao (espadas duplas) tem sido


enfatizadas no Wing Chun por causa do cinema, mas
esta arma foi adotada praticamente no mesmo período
em vários estilos do sul como resultado da popularidade
que esta arma ganhou durante o começo até a segunda
metade do século XIX. Muito utilizada na navegação
mercantil, era item obrigatório como arma de curto
alcance. Já em terra, na escassez de armas de fogo,
era muito usada por milícias da baixa nobreza, fosse
para o trabalho policial, fosse para a defesa de vilas e
cidades, e até em brigas de gangues em comunidades
chinesas na América. Ela tinha vários designs diferentes
podendo ser usada como uma só espada longa
adaptada para furar combinada com escudo, ou em
dupla, dividindo a mesma bainha. O historiador marcial,
praticante de Wing Chun e analista de sociedades
antigas, Benjunkins, tem feito um fantástico trabalho que
nos permite entender a dinâmica de mudanças daquela
época. Com o desuso prático, diferentes estilos de Kung
Fu que já haviam adotado estas facas foram mudando o
seu design durante o século XX até o seu formato atual,
mais curto, arredondado e largo (daí o provável nome
moderno de "espada borboleta"). Outro fato que
corrobora para minha crítica sobre a idealização da
pureza de estilos nas respostas anteriores é que este
formato de arma é raro nas artes marciais chinesas, e a
sua guarda ao estilo ocidental mesmo sendo adotada há
mais de dois séculos, é uma mutação moderna. O Wing

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Chun adaptou a arma a seu próprio repertório técnico e
conceitos combativos, de forma que atualmente seu uso
se parece demais com o uso das mãos livres, embora
obviamente seja muito mais decisiva e letal. No Wing
Chun, temos além das Baat Jam Dao (Facas de Oito
Cortes, nome que Ip Man deu à sua forma de facas
borboleta) há um bastão "rabo de rato" (por ser longo e
afinado na ponta como um bastão de bilhar) chamado
de Luk Dim Boon Kwan (Bastão de Seis Pontos e Meio),
que dividimos historicamente com o estilo Hung Gar,
embora no Wing Chun essa forma seja muito mais
simplificada, seguindo os preceitos de praticidade do
estilo. Em outros estilos de Wing Chun fora de Ip Man
este bastão é mais curto e tem um maior grau de
especialização, sendo a arma principal. O bastão longo
do Wing Chun diz a tradição oral ser originalmente uma
arma de campo, uma lança. Uma vez que para derrotar
um homem com o bastão longo é preciso que se vença
uma grande distância, o treinamento de facas versus
bastão teria favorecido o estudo de bases triangulares
associadas às facas e a ideia o bastão fornecido a ideia
de manutenção da "Linha Central" presente no estilo de
Ip Man.”

O boneco de madeira do Wing Chun é bem conhecido


no universo do Kung Fu Wushu, qual é a importância de
treinar com este equipamento?

“O boneco de madeira, chamado Muk Yam Jong (Pilar


do Homem de Madeira) fascina as pessoas por este
aparelho remeter à habilidade do praticante em desferir
golpes e defesas de forma curta e veloz, com aparente
complexidade. O boneco também exorta em quem o vê

25
aquele sentimento legítimo de que somente a prática
conduz à perfeição, simbolizado por aquele ator solitário
que, nos filmes, continua a praticar sozinho mesmo
quando não há mais ninguém por perto. A realidade é
que a maior parte das pessoas não tem nem bons
bonecos para a
prática, acha que
qualquer similar
basta, o que leva a
erros de execução
grosseiros,
tampouco sabem
para que serve este
aparelho, como usá-
lo para refinar suas
habilidades, por
vezes passando
anos de suas vidas
praticando algo que
não as levará a lugar
algum. As pessoas
acham que ao
praticar com o
boneco tem-se à sua
frente um adversário
de frente para você,
que você está a lutar
com seu adversário.
No entanto este
implemento é usado para treinar gestos das três
primeiras formas do sistema Wing Chun de forma
dinâmica, imitando o posicionamento de defesas não
mais em relação a você mesmo, mas em relação ao

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adversário de qualquer posição e o modo correto de
transacionar entre estas defesas seguindo os princípios
de aprendizado do sistema Wing Chun. Isso estimula o
praticante variar entre as posições de forma criativa e
segura, mas ainda simbólica, ainda como num Tao Lu
(Kuen To, Kati, forma). Assim sendo, dentro do sistema
Wing Chun, o boneco de madeira não é um conteúdo
técnico, mas cultural, de refino do sistema depois que
se domina a fase de mãos livres. Por isso se chama
informalmente de "108 Muk Yam Jong", os cento e oito
movimentos representam as trinta e seis técnicas de
cada uma das três formas fundamentais. Assim sendo,
o boneco é sim importante, mas não imprescindível,
uma vez que você já conhecia as técnicas. Como
qualquer outra forma, não lhe deixa melhor em luta, mas
aumenta sua memória muscular na transição entre os
movimentos e lhe dá condições de criar no calor do
momento (somente a quem já treina e está habituado a
combates e sparrings), fator de adaptação importante
para situações irrestritas ou de rua, onde as coisas
normalmente acontecem de modo repentino e caótico.
Sem estas condições prévias o uso do boneco é quase
que inútil, uma vez que ninguém ficará com os braços
estáticos na sua frente para você se defender.”

O cinema ajudou muito na divulgação do estilo Wing


Chun?

“Sem a figura de Bruce Lee (1940-1973) o Wing Chun


ainda seria um ilustre desconhecido. O Wing Chun deve
sua popularidade ao cinema por conta deste astro do
passado, elevado à categoria de ícone mundial até hoje,
mesmo quase cinquenta anos após a sua morte.

27
Embora já fizesse um tremendo sucesso na Ásia no
comecinho da década de setenta, foi quando o filme
Enter The Dragon (Operação Dragão) tornou-se um
estouro de bilheteria nos EUA que as pessoas quiseram
treinar Kung Fu e o estilo de Bruce Lee aqui no
ocidente. Sua morte precoce justamente na época do
lançamento deste filme levou as pessoas, perplexas
com suas habilidades, a procurar pelo Jeet Kune Do,
estilo que ele havia criado alguns anos antes. Na falta
deste estilo ainda muito incipiente, as pessoas
procuravam o Wing Chun, uma vez que Lee havia sido
aluno de Ip Man, a única pessoa a quem se referiu
como sendo seu mestre em vida. Por mais que o Jeet
Kune Do guardasse muitos dos princípios originais do
Wing Chun, Bruce Lee era deveras crítico dos sistemas
tradicionais. Isso criou um problema: o Wing Chun, um
estilo tradicional, nos deu Bruce Lee e este por sua vez
popularizou nosso estilo, mas Bruce Lee era aquilo que
as pessoas queriam se tornar para manter viva a sua
memória. O Wing Chun era apenas um meio de ter a
bagagem de base de Bruce, e assim quem sabe um dia
ser como ele, ou encontrar alguém que ensinasse o
Jeet Kune Do para facilitar o processo. À medida que
essas pessoas começaram a treinar Wing Chun com
outros estudantes de Ip Man, muitas delas se
apaixonaram pelo Wing Chun pelo que a arte é, não
mais pela ideia de ser Bruce um dia; entenderam sua
mensagem e estudaram com afinco por décadas. Mas
até que saísse o filme Ip Man (O Grande Mestre, 2008)
com Donnie Yen no papel principal, não havia a vontade
por parte do grande público de treinar Wing Chun por
aquilo que é o Wing Chun, ou seja, o Wing Chun não
era "pop", a verdade é que ninguém sabia o que era.

28
Agora, em qualquer mesa de bar você pode topar com
alguém que tenha assistido ao menos um filme original
da franquia, mesmo que nunca tenha treinado nada.
Donnie Yen não é uma apoteose muscular, uma
espécie de semideus da genética como fora Bruce Lee.
Ip Man, cuja personalidade e temperamento foram
melhor retratados por Yen, era o sujeito pacato que de
uma situação confortável ficou pobre, passou
dificuldades, mas manteve a dignidade. O Ip Man do
filme usou sua arte não apenas para se defender, mas
para restaurar o orgulho de seu povo, numa época de
humilhação. Assim sendo, passou-se a ideia que o Ip
Man, o da vida real, tanto defendia: que o Kung Fu é
morto até que alguém o traga à vida. E, Ip Man trouxe,
tanto em vida quanto depois de morto; como pessoa
real e depois como personagem. Qualquer pessoa pode
ser um Ip Man se batalhar muito, se tiver Kung Fu, já
que este termo pode ser traduzido como "trabalho duro".
Pouquíssimas serão Bruce Lee, não importa o quanto
se esforcem.”

Qualquer pessoa pode praticar o Wing Chun ou há


algum tipo de restrição?

“O Wing Chun foi feito para pessoas com restrições e


não o contrário. Normalmente quando pensamos em
arte marcial, a única coisa que conseguimos enxergar
são duas pessoas jovens, em iguais condições de peso,
medindo habilidades num combate justo. No mundo real
não é assim que funciona. Você pode ser humilhado por
alguém em posição de chefia em seu ambiente de
trabalho, pode ser atacado na rua por múltiplos
assaltantes. Pode ser atacado de surpresa por um

29
sujeito armado. Ter o tapete puxado por alguém que
você ama e confia. Em Wing Chun não se trata do
quanto você pode aprender ou render fisicamente, mas
o quanto você faz com aquilo que você tem, o quanto
pode antecipar e evitar problemas e, caso não consiga,
se adaptar à situação adversa. Já supomos de saída
uma posição de desvantagem. Por termos em nossa
origem simbólica a ideia de que a luta fora criada por
uma mulher, as defesas usam ângulos e contrapesos
tirados da física para que nossas defesas suportem
ataques de alguém maior e mais forte. Quebramos o
ritmo para parar um adversário veloz. Usamos
alavancas biomecânicas para gerar mais força e
procuramos objetividade no contra ataque. Eis aí um
resumo da teoria do sistema. Mas não pense que isso
tudo é muito diferente de outras artes marciais; todas
elas fazem a mesma coisa de modo levemente
diferente, com outras ferramentas. No Wing Chun,
entretanto, o foco dentro de sua proposta faz com que,
por exemplo, um homem baixinho e gordo não tenha de
chutar na altura da cabeça, por exemplo, mas no joelho.
As aplicações práticas favorecem o relaxamento e uso
adequado da força em espaço curto de tempo ao invés
da resistência, que perdemos mais rápido com a idade.
Se eu chuto sua canela e você olha para baixo, eu pego
você com minha mão dianteira. Eu faço você olhar para
minha mão enquanto lhe chuto a barriga. Isso faz
parecer que sou rápido, mas na verdade eu apenas usei
um truque. Segundo Sifu Gorden Lu estes truques são
mecânicos, distrativos, psicológicos, etc. Nós usamos
golpes na região genital. Mas qualquer idiota com um
pouco de malícia também pode fazer isso. Como o Wing
Chun conduz naturalmente suas partes contundentes

30
para as partes frágeis do adversário, isso a maior parte
dos mestres não sabe explicar. Na minha escola já tive
alunas (aprendem mais rápido no geral pelo fato do
estilo ser muito intuitivo), idosos (tenho atualmente o
Ivan, que quando começou tinha minha idade atual e
hoje tem setenta anos) e mesmo um praticante com
nanismo. Tenho o professor de música e designer
Lucas, que veio por indicação médica (tem toda a
coluna fixada por parafusos). Todas estas pessoas são
potenciais vítimas de agressores mais fortes. Mas seria
idiotice tentar fazê-las render fisicamente além de suas
capacidades, ou achar que lutar em situação de
desvantagem resolverá algo. Eu as treino para superar
suas dificuldades, para serem pessoas melhores hoje
do que foram ontem. Para serem mais atentas e
evitarem conflitos. É para isso que serve o Kung Fu.
Para tornar a sua vida melhor. No Kung Fu tradicional a
luta é método, não fim. Kung Fu é a expressão
psicomotora do pensamento clássico chinês.”

Muito obrigado pela sua participação, Sifu Marcos! Foi


uma honra aprender sobre o Wing Chun com você. Por
favor, qual mensagem você gostaria de deixar para os
nossos leitores?

“Durante a minha carreira enquanto divulgador desta


arte sempre tentei focar nos leigos e iniciantes, por isso
gostaria de me dirigir primeiro a este público e dizer que
não importa o quanto demore, só comece a treinar
quando tiver a certeza de estar numa escola legítima e
com um mestre ligado indiscutivelmente à genealogia
daquele estilo em questão. Com alguém que tenha
treinado com afinco ou esteja com igual esforço no

31
treinamento de estudantes e na preservação das
tradições chinesas. A internet nos dá ferramentas para
checar isso. Usem-nas. Por outro lado, há praticantes
seguindo mestres legítimos porém em escolas com
posturas anti éticas, arrogantes e por vezes alienantes,
com características de "seita". Muitas vezes estes
mestres usam a vontade dos alunos de se formarem e
os exploram financeiramente por anos, para apresentar
em contrapartida um resultado pífio. Hoje eu vejo
professores bem intencionados formados por pilantras
ou seguindo mestres chineses apenas por serem
chineses, quando muitas vezes têm perto deles mestres
que tem uma vida de experiência e igual legitimidade.
Se você quer se aproximar do Wing Chun tem de saber
que não será um lutador esportivo famoso apenas
lutando Wing Chun, que o sucesso não vem de derrotar
seu inimigo com golpes espetaculares, mas passar
longe de brigas e conflitos desnecessários. Que suas
pequenas vitórias na academia devem se refletir na sua
vida. Paradoxalmente entretanto, àqueles que tem perfil
mais erudito e que tanto amam a cultura do sistema,
digo-lhes que uma arte que somente é praticada, mas
não lutada, é vazia de espírito. Este tem sido o principal
problema do sistema Wing Chun. Para que a teoria
tenha sentido é preciso chocá-la com seu teste na
realidade do combate livre, mesmo que com pouco
contato. Para ter noção de distância, saber dosar
energia para não fatigar, noção de equilíbrio, saber das
próprias potencialidades e limitações, não há outro
caminho, é preciso arriscar minimamente. Se o seu
mestre não lhe conduz ao combate em sua escola, por
mais que o objetivo final não seja esse, dê o fora, não
importa ou quão legítimo este mestre seja. Sua ambição

32
por se formar, treinar
em uma boa escola
é legítima, mas ela
não deve ser
superior a viver algo
em sua plenitude.
Para o domínio do
Wing Chun, a noção
de tempo correto,
timing, é algo
imprescindível. Não
perca seu tempo
com quem não vale
a pena. Tempo é
algo precioso
demais para ser
jogado fora.”

E-books sobre Kung Fu Wushu:

O guia definitivo para Shaolin Kung Fu

O Sanda da China

Wing Chun – Muk Yan Jong


Relatos Históricos sobre a Origem e a
Evolução do Choy Lay Fut

33
Bate Papo com o
Professor Marcelo Alexandrino
Discípulo do Sifu Wong Jan Yum, representante da
Associação Pugilística Ancestral de Choy Lee Fut de Xinhui
no Brasil, ensina Kung Fu Wushu para quem quiser
aprender, o nosso convidado para o Bate Papo é o
Professor Marcelo Alexandrino (à esquerda na foto acima).

34
Professor, muito obrigado por aceitar o nosso convite, é
uma honra contar com a sua participação na nossa
revista digital. Gostaria de começar lhe perguntando
como, quando e por que o Kung Fu Wushu entrou na
sua vida?

“Eu que agradeço pela lembrança e pela oportunidade.


Comecei a praticar Kung Fu no início a década de 80
quando tinha por volta de 11 ou 12 anos de idade.
Costumava passar pela academia Faixa Preta, muito
famosa naquela época, e ficava intrigado com o letreiro
que listava o Kung Fu entre outras artes marciais. Um
dia, ao pegar um panfleto ilustrado e ler um texto sobre
o estilo Hung Gar, ver fotos do mestre Li Hon Kay, fui
inflamado pela ideia de praticar aquela arte marcial. Na
semana seguinte, já estava matriculado nas aulas do
professor Marcos Vinícius Monteiro Neves,
representante do mestre Kay no Rio de Janeiro.
Infelizmente, o professor Marcos Vinícius se adoentou e
passou um bom tempo sem ministrar aulas. Soube,
então, que o mestre Dean Lee iniciaria uma turma de
Shaolin do Norte a poucos quarteirões da minha casa.
Tive a honra de ser seu aluno e de receber orientações
do professor Luiz Pessanha que, na época, era o
instrutor auxiliar do mestre Lee. Após cerca de um ano e
meio, dois anos, as aulas foram transferidas para o
Leblon e fui inviabilizando a continuidade da minha
aprendizagem. Cheguei a retornar aos treinos de Hung
Gar em 1986, mas logo me mudei para Nova Friburgo e
só voltei a ter um breve contato com o Kung Fu por volta
de 1989, quando já havia retornado ao Rio e pude
participar de poucas aulas de Choy Lee Fut com o
professor Marcello Teixeira.”

35
Você treinou ChoyLayFut há muitos anos, depois
praticou outras artes marciais, mas você voltou a treinar
o estilo ChoyLayFut há alguns anos e continua até hoje.
O que te fez escolher o ChoyLayFut como a sua arte
marcial?

“Na verdade, tive pouquíssimas aulas com o professor


Marcello Teixeira, representante do Choy Lee Fut da
escola do mestre Chan Kwok Wai aqui no Rio. Era final
de 1989. Na época, acabei ingressando no Centro
Preparatório de Oficiais da Reserva do Exército e não
tive como dar prosseguimento, pois também tinha um
emprego de meio expediente à tarde e à noite ia para a
faculdade. Acontece que o Choy Lee Fut me
impressionou bastante, principalmente pelos
deslocamentos e golpes em ângulos incomuns. Só
voltei a praticar Kung Fu em 2001, depois de ingressar
na magistratura. Na época, o professor Marcello havia
migrado para o estilo Xing Yi e não ensinava mais Choy
Lee Fut. Acabei me interessando pelo Wing Chun e fiz
parte da primeira leva de instrutores da escola Hung Fa
Yi no Brasil. Um pouco mais para frente, pratiquei Luta
Livre com os mestres Daniel D’dane e Alexandre
“Pequeno” Nogueira, o “Rei da Guilhotina”, e tive aulas
de Sambô Militar com o mestre Erik Campos. Foi
somente em 2011, que viajei para Nova York para
conhecer meu atual Sifu, mestre Wong Zen Yem. Os
ensinamentos de Wong Sifu mudaram meu modo de
enxergar o Kung Fu em geral e o Choy Lee Fut em
particular. Surpreendi-me com o enraizamento, o
deslocamento angular, os golpes nas oito direções, a
conexão cavalo-cintura-ombro, a geração de força

36
relaxada e, sobretudo, a organicidade do Choy Le Fut
da Escola Ancestral. Enfim, fiquei encantado com
aquela abordagem da arte marcial chinesa e, desde
então, minha vida e o Choy Lee Fut se mesclaram
definitivamente.”

Você tem o seu sifu nos Estados Unidos e também tem


o sifu Davi Liang que lhe dá aulas aqui no Brasil. Como
é ter dois mestres chineses especialistas em
ChoyLayFut?

“Até mudar-se para os Estados Unidos, Wong Sifu foi o


instrutor-chefe da primeira escola de Choy Lee Fut da
história, fundada por Chan Heung no distrito de San Wui
(mandarim: Xinhui), cidade de Goon Mun (Jiangmen),
província de Cantão. Também foi competidor e treinador
de Sanda e de rotinas (toulou em cantonês; taolu em
mandarim), passando a ser chamado de “Rei dos
Punhos do Sul”. Hoje, é o embaixador da Associação
Pugilística Ancestral de Choy Lee Fut no ocidente, onde
tem trabalhado com muito afinco para preservar e
transmitir o Choy Lee Fut da escola do Fundador. O
professor Leung (Liang em mandarim) é natural da vila
rural de Naam Haang, não muito distante de San Wui.
Foi o discípulo predileto do mestre Mok, com quem
aprendeu versões muito antigas e raras de Choy Lee
Fut e Hung Gar, dança do leão, Feng Shui e botânica
medicinal. Também treinou técnicas específicas com
outros mestres de sua vila, como, por exemplo,
diferentes tipos de armas com o mestre Bak Mou Lou e
os estilos Pak Mei e Ping San Wing Chun com o mestre
Fei Lung Meng. Apesar de residir no Rio há quase duas
décadas e de já nos conhecermos desde 2014, foi

37
apenas no início da pandemia que finalmente concordou
em dar aulas fechadas para mim e meus alunos.
Também é importante mencionar o mestre Germán
Bermudez, com quem tenho aprendido, desde 2018, o
sistema de cultivo interno do Choy Lee Fut da Escola
Ancestral, denominado Lohon Heigung (Luohan
Qigong), que é composto de cinco formas (rotinas) e
uma diversidade enorme de exercícios. Como já dá para
imaginar, é uma oportunidade ímpar de aprender
diretamente de mestres que conhecem o Choy Lee Fut
tradicional em essência e profundidade e que sempre se
mostram empolgados para nos transmitir os
fundamentos mais profundos e os detalhes mais
diminutos, que distinguem a nossa modalidade das
demais artes marciais.”

Muitos mestres, sifus, professores de Kung Fu Wushu


no Brasil não aceitam que seus alunos treinem com
outros mestres. Você tem este tipo de problema com os
seus sifus e com os seus alunos?

“Tratando-se de Choy Lee Fut, essa postura é um


contrassenso imperdoável. O fundador da modalidade,
Chan Heung, teve três mestres até criar o Choy Lee Fut:
Chan Yuen Wu, Lee Yau San e Choy Fook. A
denominação da modalidade, Choy Lee Fut, é uma
homenagem aos dois últimos, e o primeiro foi
substituído por “Fut”, que significa “Buda” em cantonês,
porque, para além de ensinar um estilo provindo do
monastério budista Siulam (Shaolin), Chan Yue Wu era
seu tio, e Chan Heung não queria que nossa arte
marcial ficasse caracterizada como algo que
pertencesse a um específico clã. Meu “avô Kung Fu”

38
(Chan Jeong Git Sigung), atual Presidente da
Associação Pugilística Ancestral de Choy Lee Fut de
San Wui (em mandarim, Xinhui) não cansa de
esclarecer que “Choy Lee Fut é uma família aberta”. Por
esse motivo, tive a honra de treinar com grandes
mestres de nossa mesma “linhagem” aqui e no exterior,
como Angelo Cornejo, Carlos San Teófilo, Javier Ortiz,
Jason Wong e Germán Bermudez, e também com
mestres como Lee Chi Wai, da tradicional escola Hung
Sing Choy Lee Fut de Futsan (não confundir com o
estilo que se apresenta com esse mesmo nome no
Brasil); Chon Chang, da escola Hong Luck; Terry Ho, da
escola Buk Sing; Giovanni Antonieta, da escola Nam
Tien Men/Poon Sing; Tony Rey Garcia, da escola Nam
Pai/Wong Yi Man, além de ter praticado por um bom
tempo com o saudoso mestre Paul Fraga, discípulo do
legendário Lee Koon Hung. Muitas podem ser as razões
pessoais para que um professor de Choy Lee Fut proíba
seus alunos de interagir com professores e praticantes
de outras escolas. Só não podemos admitir que os que
têm essa conduta afirmem que a restrição tem
fundamento na “tradição”, simplesmente porque tal
afirmação estaria muito longe de ser verdadeira.
Novamente: Choy Lee Fut é uma família aberta – esta,
sim, é a nossa tradição, e graças às frequentes
interações entre os praticantes, nossa modalidade está
em constante evolução.”

Os seus treinos costumam ser no condomínio onde


você reside. Lá você treina e ensina também. Como é
ensinar a todos que quiserem aprender o estilo
ChoyLayFut no espaço do condomínio?

39
“É mais do que excelente. Meu condomínio é cercado
por uma floresta e possui espaço reservado e equipado
para a prática de artes marciais. Ali temos não só o
Choy Lee Fut, mas também Muay Thai e Judô. Ou seja,
tenho espaço, estrutura e principalmente privacidade
para ensinar somente a quem me inspire confiança e
tenha disposição para suportar o treinamento
tradicional.”

Você planeja ter uma escola de Kung Fu Wushu em


algum momento no futuro?

“Não tenho nenhum plano de ensinar o Choy Lee Fut


abertamente. Primeiro, porque são raras as pessoas
que compreendem e aguentam o treinamento tradicional
– que é livre de faixas e despreza a quantidade de
rotinas (toulou, taolu) como medida de proficiência
marcial. Segundo, porque ocupo um cargo público de
enorme responsabilidade e que exige muito da minha
dedicação. Terceiro, porque minha vida acadêmica
também é muito intensa. E quarto porque o tempo que
me sobra é voltado para desfrutar com a minha família e
com os nossos poucos, mas verdadeiros, amigos. De
todo modo, estou sempre disposto a ensinar a quem
queira, um dia, tornar-se um elo na corrente de
transmissão do Choy Lee Fut da Escola do Fundador.
Hoje, por exemplo, meu aluno Warner Lopes representa
a Associação Ancestral em Teresina, Piauí. É um
praticante muito talentoso, que tem se dedicado
bastante para assegurar a qualidade do treinamento dos
alunos locais.”

40
Professor, o ChoyLayFut que você pratica e ensina vem
da Família Ancestral de Xinhui, que é a linhagem que
descende diretamente do mestre Chan Heung, o criador
do estilo. Qual é a importância de aprender e transmitir
tais conhecimentos?

“Aprender e transmitir o Choy Lee Fut da Escola


Ancestral significa estar alinhado com a missão de
preservar uma modalidade marcial cuja história registra
incríveis feitos de bravura e de serviço. Nossos
antepassados estiveram em batalhas sangrentas,
lutando, mas também em hospitais, curando. Nossos
métodos de treinamento e nossas formas (rotinas) dão
testemunho sobre aquele passado, enquanto nossa
permeabilidade a novas técnicas e nossa adaptabilidade
às exigências do tempo mantêm as portas do futuro
abertas para o Choy Lee Fut de San Wui (Xinhui) – já
eternizado como Patrimônio Cultural Intangível da
República Popular da China. Seja na China, onde a vila
de King Mui (Jingmei), epicentro do Choy Lee Fut no
distrito de San Wui (Xinhui), foi transformada pelo
governo em “Cidade do Kung Fu” e onde nossa
modalidade compõe, até mesmo, o currículo escolar; ou
no Brasil, onde o Choy Lee Fut da linhagem direta do
Fundador é ensinado ainda muito discretamente, estar
inserido nesta história tão gloriosa é, ao mesmo tempo,
uma honra enorme e uma responsabilidade gigantesca.”

Você tem acesso a um conhecimento que poucos


possuem aqui no Brasil, principalmente quando falamos
de fundamentos, bases, características etc. Pensando
nisso, como você enxerga o ChoyLayFut hoje no Brasil
em relação ao modo como ele é ensinado?

41
“Na verdade, eu não sei como a modalidade é ensinada
no Brasil. O que sei é que é nítida a diferença entre o
nosso modo de expressar o Choy Lee Fut e o que
vemos em grande parte dos vídeos publicados nas
redes sociais. Isto se deve a alguns fatores. Em primeiro
lugar, vem o fator histórico: Chan Heung Sijo criou o
Choy Lee Fut em uma época muito conturbada. Grande
parte de seus discípulos deixou San Wui com poucos
anos de prática. O próprio Chan Heung aliou-se à
Revolução de Taiping e, com a queda de Nanjing,
refugiou-se por anos no sudeste asiático e nos Estados
Unidos, certamente elevando o Choy Lee Fut a um nível
mais alto nesse período. Também na época da
Revolução Cultural, muitos praticantes emigraram para
outros países. Mesmo a bisneta de Chan Heung, Chan
Kit Fong Sitaipo – com quem estive pessoalmente em
2016 – refugiou-se em Hong Kong, onde fundou a
Associação Memorial de Chan Heung, de onde enviou
recursos para manutenção da Escola Ancestral, que
entrou em declínio até a intervenção de Chan Jeung Git
Sigung, já nos anos 2000. O segundo fator é
consequência direta dessa diáspora: longe da Escola-
Mãe, professores desenvolveram seus próprios
métodos, muitas vezes mesclando o Choy Lee Fut com
outros estilos, como Fut Gar, Hung Gar e, até mesmo,
Bak Siulam (Shaolin do Norte). Como resultado, não
apenas as rotinas (formas) das diferentes ramificações
são completamente diferentes, como, em grande parte
delas, os fundamentos do Choy Lee Fut foram perdidos
ou substituídos por fundamentos de outras
modalidades. O terceiro fator é a McDonaldização do
Choy Lay Fut. Cada vez mais, é comum a padronização

42
do ensino e implantação de um sistema de faixas que
comporta exercícios inócuos e técnicas de “defesa
pessoal” que beiram a má-fé. Junto com isso, formas
inteiras são oferecidas em seminários que duram, no
máximo, três dias, transformando o toulou (taolu, rotina),
de método de treinamento em coreografia sem
propósito. Mesmo entre os competidores que
costumamos ver nos pódios, não raro os movimentos
são incompletos, os deslocamentos são desenraizados,
a geração de força subverte a cadeia cinética, enfim, os
fundamentos do Choy Lee Fut parecem lhes ser
desconhecidos. Esses três fatores são muito claros e
talvez influenciem o modo como o Choy Lee Fut é
ensinado, mas, novamente, não sei o que se passa nas
academias do Brasil.”

Você acredita que, de forma geral, o Kung Fu Wushu


está perdendo as suas raízes?

“Não. O que percebo é que, como em qualquer


atividade, a McDonaldização do Kung Fu tem
massificado a prática com óbvio sacrifício da qualidade.
No entanto, existem escolas que prezam pela
continuidade de um Kung Fu muito fundamentado, que
oferecem conhecimento teórico e treinamento prático
capaz de cumprir a promessa de fazer com que alguém
mais fraco sobreviva à agressão de outro alguém mais
forte. Essas escolas também preservam as antigas
práticas de cultivo da saúde e de fortalecimento do
espírito, desenvolvendo nos alunos um sentido de
emancipação que foge por completo da lógica do
contrato de fidelização e da obediência cega. É preciso
ser uma pessoa criteriosa e, em certa medida,

43
obstinada para encontrar professores que saibam e
queiram transmitir esse Kung Fu que ainda honra a
história e a eficiência da arte marcial chinesa. E veja:
tradição vem de “traditio”, vocábulo latino que significa
“entrega”. Não se trata de estar preso ao passado, mas
de contribuir para a preservação do Choy Lee Fut,
passando adiante ensinamentos devidamente
adaptados ao tempo e ao meio em que vivemos.”

Para os leitores que quiserem conhecer mais sobre o


ChoyLayFut da Família Ancestral ou quiserem treinar
diretamente com você, o que eles precisam fazer?

“Interessados no Choy Lee Fut tradicional podem


conhecer um pouco mais sobre a nossa escola
acessando o site choyleefut.com.br ou o Instagram
@choyleefut.brasil. Para entrar em contato, podem
enviar uma mensagem por direct ou através do e-mail
choyleefut.rio@gmail.com.”

Professor Marcelo, muito obrigado pela sua


participação, foi uma honra ter esse bate papo com
você! Por favor, qual mensagem você gostaria de deixar
para os nossos leitores?

“Nas artes marciais chinesas derivadas de Shaolin,


como é o caso do Choy Lee Fut, é comum a expressão
“Coração de Buda, Mão do Demônio”. Está aí a síntese
do que o Kung Fu pode entregar ao praticante diligente:
tornar-se uma pessoa perigosa, mas que escolhe fazer
o bem por opção consciente. Em outras palavras, a
verdadeira virtude não está em sermos inofensivos, mas
em reconhecermos o monstro que habita em nós e

44
voluntariamente trabalharmos para mantê-lo sob
controle, como bem aponta Jordan Peterson, um dos
grandes pensadores da atualidade. Mas como alguém
pode alimentar e domar esse monstro ao mesmo
tempo? Adquirindo competências fundamentais e
conhecimentos incomuns; sendo disciplinado, mesmo
na ausência de motivação; falando e escrevendo bem;
lembrando-se de ser um bom ouvinte e cuidando de
ampliar sua percepção; comportando-se eticamente,
não por medo, mas porque é certo fazer a coisa certa;
construindo pontes sem descuidar de estabelecer
limites; selecionando friamente as pessoas com quem
anda; respeitando e exigindo respeito; cuidando do
corpo, que é o templo em que habita a alma: é assim
que o artista marcial se torna um exemplo para todos
que o cercam. É com esse espírito que praticamos o
Choy Lee Fut da Escola Ancestral e é esta a mensagem
que gostaríamos de deixar para todos os leitores que
nos acompanharam até aqui.”

Conheça o e-book mais vendido no Brasil sobre


o estilo Choy Lay Fut de Kung Fu Wushu!

45
Templo Shaolin
Uma Breve História
Localizado no monte Shaoshi, na cordilheira Song, na
província de Henan, na República Popular da China, o
Templo Shaolin é um dos mosteiros budistas mais
conhecido do mundo.

Este templo, que já foi destruído e reconstruído algumas


vezes durante a sua história, possui uma forte relação com
as artes marciais e a religião na China.

46
Acredita-se que o Templo Shaolin foi construído em
aproximadamente 495 d.C.

Segundo a lenda, um monge budista indiano peregrinou da


Índia para a China em 480 d.C. para espalhar os
ensinamentos budistas.

Este monge, conhecido pelo nome Buddhabhadra ou Batuo,


teria recebido fundos do imperador Xiaowen da Dinastia Wei
do Norte (386 - 534) para construir um templo no sagrado
monte Shaoshi.

O templo foi construído, Batuo se tornou o primeiro abade e


ensinou o budismo a muitas pessoas.

O nome Shaolin foi escolhido para o mosteiro e os termos


“Shao”, que significa pequeno ou jovem, foi escolhido em
homenagem ao monte Shaoshi, já o termo “Lin” significa
bosque ou floresta.

Outra tradução para o nome Shaolin é “Espessa floresta da


montanha Shaoshi”, mas, popularmente, o mosteiro também
é conhecido como Templo da Pequena Floresta ou Templo
da Jovem Floresta.

Em, aproximadamente, 520 d.C. outro monge indiano chega


ao Templo Shaolin, seu nome é Bodhidharma, também
conhecido como Ta Mo.

O monge Bodhidharma é muito conhecido no universo do


Kung Fu Wushu, pois se acredita que ele foi o responsável
iniciar os treinamentos no Templo Shaolin.

47
Por nove anos Bodhidharma meditou em uma caverna atrás
do mosteiro e logo quando chegou percebeu que os
monges chineses não eram fortes fisicamente para aguentar
as longas horas de meditação.

Então, segundo a lenda, Bodhidharma teria criado uma


série de exercícios focados em respiração e movimentos
que simulavam uma luta, estas técnicas foram ensinadas
aos monges para que estes fortalecessem seus corpos.

Além disso, Bodhidharma também desenvolveu o Chan


Budismo ou Zen Budismo e ensinou técnicas de meditação
aos monges Shaolin.

Com horas diárias de treinamento físico e meditação, os


monges começaram a dominar o corpo e a mente, se
transformando em verdadeiros guerreiros.

Logo, os monges começaram a proteger o templo de


saqueadores que sempre atacavam, pois os monges eram
fracos e não tinham como se defender.

O auge dos duros treinamentos no Templo Shaolin foi


durante a Dinastia Tang (618 - 907), quando um grupo de
treze monges salvou o futuro imperador, Li Shimin, que ao
se tornar imperador retribuiu com várias doações ao
mosteiro.

Acredita-se que, os ensinamentos de Bodhidharma se


desenvolveram com o passar dos anos, logo, as técnicas
ensinadas pelo monge indiano evoluíram para técnicas de
artes marciais.

48
E, assim, teriam surgido os estilos de Kung Fu Wushu
Shaolin que conhecemos hoje em dia.

Os monges participaram de diversos conflitos na China no


decorrer da história, em alguns momentos treinaram
soldados dos imperadores e em outros lutaram em batalhas
utilizando suas famosas técnicas de bastão.

Logo, o Kung Fu Wushu Shaolin se espalhou por várias


regiões da China e se difundiu amplamente durante a
Dinastia Ming (1368 - 1644).

Um dos conflitos mais famosos ocorreu em 1733, quando os


Manchus, que dominavam a China nesta época, atacaram e
destruíram o Templo Shaolin.

Segundo a lenda, apenas cinco monges sobreviveram a


este ataque, ficaram conhecidos como os Cinco Anciões de
Shaolin e foram muito importantes para o desenvolvimento
do Kung Fu Wushu no sul da China.

Os relatos contam que, durante o governo Manchu, Dinastia


Qing (1644 - 1911), o Templo Shaolin foi atacado e
destruído três vezes, pois os imperadores tinham receio que
os monges estivessem ensinando Kung Fu Wushu para
opositores.

Nas ultimas décadas, mais precisamente no início dos anos


2000, o abade do Templo Shaolin, Shi Yongxin, autorizou a
abertura de filiais do mosteiro fora da China, com a intenção
de difundir a cultura e os ensinamentos Shaolin pelo mundo.

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Em 2010, o Templo Shaolin foi declarado patrimônio
mundial pela UNESCO como parte dos monumentos
históricos de Dengfeng.

Apesar da sua conturbada história, o mosteiro continua em


funcionamento até hoje, atraindo milhares de turistas e
visitantes todos os anos.

Assim como, os treinamentos marciais, meditação e o


budismo continuam sendo ensinados e propagados.

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