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34º Congresso de Pesquisa e Ensino em Transporte da ANPET

100% Digital, 16 a 21 de novembro de 2020

IMPACTOS PERCEBIDOS PELOS TRABALHADORES DO SETOR AÉREO E AS


PERSPECTIVAS DE RECUPERAÇÃO DO MERCADO DURANTE A PANDEMIA
DA COVID-19 NO BRASIL

Maria Cecília de Farias Domingos


Nathane Ana Rosa Negri
Viviane Adriano Falcão
Maurício Oliveira de Andrade
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental
Universidade Federal de Pernambuco

RESUMO
O novo coronavírus se espalhou rapidamente pelo mundo, atingindo os setores econômicos, especialmente o
aéreo, de forma antes não vivenciada. O setor de recursos humanos é acionado durante choques econômicos para
reorganizar as equipes de funcionários nas áreas de transporte aéreo e aeroportos, principalmente durante o
contexto da pandemia do COVID-19, em que a movimentação de passageiros foi reduzida consideravelmente. O
artigo possui o objetivo de avaliar o impacto da pandemia na esfera trabalhista e o tempo esperado de
normalização na visão daqueles inseridos no setor aéreo. Através de modelagem econométrica, se analisou a
correlação entre a perspectiva futura do setor e fatores como escolaridade, área de atuação, medidas trabalhistas,
redução de jornada, demissões e medo de voar. Os resultados indicam que medidas trabalhistas e demissões
estão correlacionados positivamente com a perspectiva de recuperação do setor e que para os otimistas, a
retomada acontecerá em outubro de 2020.

ABSTRACT
The new coronavirus has spread promptly across the world, reaching economic sectors, especially the air, in a
way that has not been experienced before. The human resources sector is triggered during economic shocks to
reorganize the staff in the areas of air transport and airports, especially during the context of COVID-19, in
which the movement of passengers has been reduced considerably. The article aims to assess the impact of the
pandemic on the labor sector and the expected time for normalization in the view of those in the airline industry.
Through econometric modeling, the correlation between the future perspective of the sector and factors such as
education, work’s area, labor measures, reduced working hours, dismissals and fear of flying were analyzed. The
results indicate that labor measures and lay-offs are positively correlated with the prospect of a recovery in the
sector and for optimists, this will happen in october 2020.

1. INTRODUÇÃO
Em 2020 a pandemia do novo coronavírus (COVID-19) resultou em decréscimos da
movimentação de passageiros, reduções essas jamais presenciadas pela aviação civil (IATA,
2020c). O mercado aéreo global apresentou uma queda, em junho de 2020, de 86,5% no
índice de passageiros pagantes por quilômetro voado (RPK), em relação ao mesmo período no
ano anterior (IATA, 2020d). Esse cenário advém, principalmente, de medidas de
distanciamento social e proibição de viagens para passageiros com sintomas do novo
coronavírus propostas pela OMS (WHO, 2020), com posterior fechamento de fronteiras,
restrições de viagens e parada da frota de aeronaves das companhias aéreas.

Durante choques econômicos as instituições procuram soluções para equilibrar as altas


despesas em detrimento da baixa receita. Sendo assim, o setor de recursos humanos é
essencial para o gerenciamento, recrutamento e direcionamento dos trabalhadores de uma
organização (Heathfield, 2020). Como o sistema aeroportuário contempla uma ampla
quantidade de funcionários, dentre diversas responsabilidades e atribuições, cabe ao setor de
recursos humanos estruturar os funcionários durante as mudanças de cenários. Assim, a
redução de passageiros e a introdução de novas medidas de segurança nos terminais aéreos,
principiaram a possibilidade de realocação de serviços, suspensão de contratos, férias

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antecipadas e desligamento de funcionários. Nesse contexto, esse estudo tem o objetivo de


avaliar o impacto da COVID-19 na esfera do trabalho no setor aéreo, bem como a perspectiva
de recuperação futura na visão daqueles inseridos na atividade aérea e aeroportuária.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1 COVID-19 e a Aviação Civil
O modo aéreo possibilita que indivíduos se desloquem para outros continentes em algumas
horas. Em tempos de pandemia, esse fator contribui para a rápida velocidade na disseminação
dos patogênicos, sendo capaz de estimular surtos de doenças em poucas semanas (Nikolaou;
Dimitriou, 2020). Da mesma forma, voos domésticos permitem a transmissão local e/ou
comunitária, seja por passageiros que tiveram contato com pessoas doentes vindas ou não de
outros países.

Doenças infectocontagiosas podem ser transmitidas em diversas circunstâncias de um


indivíduo para o outro, por contato direto ou indireto, como observado com a propagação da
pandemia do SARS em 2003, H1N1 em 2009 e COVID-19 em 2020 (Nikolaou; Dimitriou,
2020). Conforme a Organização Mundial da Saúde (WHO, 2020), medidas de colaboração
entre países são importantes na redução de contágio de doenças respiratórias. Apesar das
transações internacionais proporcionarem subsídios e apoio técnico em situações de
emergência, ainda se fazem necessárias elaborações de medidas preventivas, que desacelerem
a proliferação do vírus.

A particularidade do novo coronavírus advém principalmente do rápido espalhamento do


vírus pelo mundo, promovendo cenários jamais vistos pelo setor aéreo (Suau-Sanchez et al.,
2020). Consequentemente, os mercados aéreos domésticos apresentaram redução mais lenta e
heterogênea, enquanto as companhias aéreas detinham os voos nacionais como refúgio (Suau-
Sanchez et al., 2020). Porém, posteriormente, os voos domésticos também foram afetados
pela pandemia. A Figura 01 a seguir mostra a comparação da movimentação de passageiros
nacionais e internacionais entre os anos de 2019 e 2020.

20.500.000
15.500.000
10.500.000
5.500.000
500.000
Janeiro Fevereiro Março Abril Maio

2019 Doméstico 2020 Doméstico


2019 Internacional 2020 Internacional

Figura 1: Tráfego de passageiros – 2019 vs 2020

Em janeiro de 2020, os voos internacionais realizados no Brasil apresentaram queda de 8,67%


no volume de passageiros em relação ao mesmo período em 2019, e em abril, o número
atingiu 98,15% (ANAC, 2020a). Para os voos domésticos, em março a demanda de
passageiros reduziu-se em 34,84% comparada ao mesmo mês do ano anterior e em abril, a
diminuição foi de 94,57% (ANAC, 2020a). Em maio, apesar do número de passageiros ter
aumentado em comparação com abril, a diminuição de movimentação em relação ao mesmo

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período de 2019 foi de 97,47% e 92,31% em voos internacionais e domésticos,


respectivamente (ANAC, 2020a).

O tema sobre a disseminação da COVID-19 por via aérea é um tema de grande preocupação
para o setor aéreo. Bogoch et al. (2020) correlacionaram 50 destinos internacionais como
possíveis potenciais de futuro de transmissão. Por ter sido elaborado no início da pandemia, o
propósito do estudo é alertar e indicar a capacidade de países em controlar ameaças de
doenças infectocontagiosas, com bases em indicadores de saúde e sociopolíticas. Lau et al.
(2020) indicaram que número de passageiros e de rotas de voo são relevantes para a
transmissão do patogênico. Portanto, os aeroportos caracterizam-se por ser um sistema
indispensável para ao controle da disseminação do vírus. Vale ainda ressaltar que o controle
dos funcionários é outro fator preocupante no contágio a doenças, sendo assim, é relevante a
organização da área de recursos humanos em períodos de crises.

2.2 Recursos Humanos no Setor Aéreo


A qualidade dos serviços disponibilizados por um aeroporto é indispensável para a evolução
das suas atividades. Percepções positivas da qualidade do serviço proporcionam
comportamentos favoráveis de indicação do trabalho e lealdade ao terminal (Prentice; Kadan,
2019). Para atingir um nível de padrão de qualidade, aeroportos, organizações e empresas
privadas precisam dispor de técnicos capazes de suprir as necessidades constantes do sistema
aeroportuário. A avaliação do desempenho do setor permite que os operadores aeroportuários
sejam capazes de coordenar os recursos humanos e assegurar eficientemente o investimento
de capital (Vasigh; Gorjidooz, 2006). O gerenciamento de recursos envolve a alocação de
setores, como o de recursos humanos, para proporcionar organização das unidades de
negócios (Yu et al., 2013). O surgimento de um ambiente colaborativo com ênfase no público
alvo é decorrente da ação do setor de recursos humanos, o qual é de extrema importância para
obter desempenho competitivo através do uso efetivo da mão-de-obra.

A gestão de recursos humanos em aeroportos e companhias aéreas, por exemplo, é essencial


pela ampla multifuncionalidade da mão-de-obra, o que pode resultar em problemas e
situações que requerem uma administração mais eficaz (Brooks, 2018), como é o caso de
cenários provenientes de choques econômicos no setor.

2.3 Recursos Humanos em Choques Econômicos


A pandemia do novo coronavírus tem resultado em grande perda de demanda do transporte
aéreo no mundo (ICAO, 2020a) e redução de 5% no crescimento do PIB global em 2020
(IATA, 2020a). No contexto global, a Associação Internacional de Transportes Aéreos
(IATA) revela a importância da retomada do transporte aéreo durante a pandemia da COVID-
19, uma vez que as operadoras, órgãos e governos estão comprometidos a trabalharem
conjuntamente na aplicação de medidas de segurança, para evitar surtos da doença e assegurar
o setor econômico de forma responsável e sustentável (IATA, 2020b). É dito que a aviação
deverá operar segundo padrões globais harmonizados com a Organização da Aviação Civil
Internacional (ICAO) e a Organização Mundial da Saúde (WHO), cumprir metas ambientais e
serem flexíveis a mudanças a partir de cada descoberta científicas e tecnológicas (IATA,
2020b).

No entanto, devido ao impacto econômico refletido no tráfego e na perda de receitas,


implicações vinculadas ao mercado de trabalho e aos recursos humanos foram afetadas. Para

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Lee e Warner (2005), epidemias, mortalidade e o setor econômico são interligados à medida
que viagens aéreas facilitam a transmissão de doenças no mundo, impactando como
consequência, os setores de serviços e o mercado de trabalho.

Com a pandemia da COVID-19 tem-se constatado aumentos no número de funcionários


demitidos ou temporariamente suspensos do trabalho em muitos setores econômicos
importantes como construção, restaurantes, hotéis, manufatura, indústria e transportes.
Adicionalmente, é válido encadear que as relações de trabalho vêm sofrendo mudanças
significativas, como funcionários atuando de forma remota e redução de interação social no
ambiente de trabalho. Tal mudança pode impactar no setor aéreo no futuro, uma vez que as
empresas podem identificar oportunidades de redução de gastos. Por exemplo, reduções de
viagens aéreas para reuniões corporativas.

Além do mais, o setor aéreo, vinculado ao setor de transportes e turismo, vem resistindo a
uma grave crise financeira, sendo essencial a reorganização da estrutura dos aeroportos no
sentido de mitigar o balanço negativo enfrentado. O desafio no momento relaciona-se ao
enfrentamento da pandemia sem prejudicar grandiosamente o fluxo de caixa das empresas, e
assim, evitar falências. Para vencer crises, são necessárias ações conjuntas das operadoras e
companhias aéreas na elaboração de protocolos com regras claras, padronização das medidas
adotadas e estabelecimento de comunicação para reconquistar a confiança no setor.

Alguns estudos evidenciam impactos nos setores de gestão de recursos humanos após choques
econômicos. Segundo Yu et al. (2013), em períodos de crise econômica, os aeroportos são
forçados a reduzir as despesas com pessoal a fim de equilibrar os gastos com a redução de
receitas. A diminuição na movimentação de passageiros e os baixos fatores de carga
produzem ineficiência para os terminais (Pels et al., 2003). Para Lee e Warner (2006), a
economia pode ser impactada em surtos de doenças infectocontagiosas devido à alta taxa de
mortalidade, a qual reflete na demanda de trabalhadores, suprimento de bens e serviços e
assim, proporciona choques de fornecimentos.

Ainda, Yu et al. (2013) analisaram caminhos alternativos para realocação de recursos


humanos em dezoito aeroportos em Taiwan, a partir de funcionários regulares certificados por
exames nacionais e funcionários contratados. O estudo evidencia que a realocação pode ser
uma rápida alternativa, e depende se nos terminais há dificuldade na comunicação
organizacional e se os membros compartilham de uma visão comum para aumentar a
desempenho através da redução de custos com funcionários.

A crise presente pode trazer maturidade para as empresas e operadoras aeroportuárias


melhorarem suas eficiências em logística e custos. A decisão sobre mudanças no setor deve
depender das perspectivas futuras de demanda. A retomada do tráfego aéreo ao longo da
pandemia tem promovido à reorganização das equipes de funcionários nos aeroportos,
decisões comerciais sobre as taxas aeroportuárias e investimento de capital na infraestrutura
que esteja relacionado com a inclusão de medidas de segurança, propulsão no aumento da
demanda e trazer novamente a confiança ao passageiro.

3. MODELO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS


3.1 Banco de Dados e Modelagem

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Para avaliar o reflexo da pandemia da COVID-19 no país, aplicou-se um modelo


econométrico, buscando obter a relação entre as perspectivas futuras no setor aéreo e a
avaliação qualitativa pelos trabalhadores no setor. A regressão linear múltipla permite analisar
a correlação de uma variável dependente com variáveis independentes, a fim de determinar a
importância de cada variável explicativa para a variável dependente. O modelo dos mínimos
quadrados ordinários é essencial para estimar os parâmetros desse modelo de regressão, visto
que consiste na determinação da menor soma possível dos quadrados dos resíduos dos
parâmetros (Gujarati; Porter, 2011).

A base de dados deste estudo foi obtida por meio de um questionário, aplicado de modo
online. A plataforma ficou aberta aos respondentes em abril e maio de 2020. O questionário
teve por finalidade analisar o perfil do trabalhador, os setores profissionais mais afetados pela
pandemia e as perspectivas futuras de retomada do setor aéreo no país. No total foram 108
dados coletados.

Em relação ao tratamento estatístico dos dados coletados, 64,81% trabalhadores são do gênero
masculino e 35,19% do gênero feminino. Além disso, entre os entrevistados, 52,78% são pós-
graduados (Figura 2).

13% 5%
Médio
29% Pós Graduado/Mestre/Doutor
53%
Superior Completo
Superior Incompleto

Figura 2: Nível de escolaridade dos entrevistados.

O questionário alcançou 36 cidades no país, em que São Paulo/SP obteve o maior número de
entrevistados, seguido de São José dos Campos/SP, Recife/PE e Brasília/DF. Há 12 setores
profissionais abrangidos, com o setor de Engenharia possuindo supremacia entre os
entrevistados (Figura 3).

Turismo
Tripulação
Tráfego
Segurança
Regulação
Planejamento
Operação
Fiscalização/Manutenção/Compliance
Ensino/Educação
Engenharia
Comercial/Comunicação
Aeronáutica
0 5 10 15 20 25 30
Figura 3: Setor de trabalho dos entrevistados.

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Ao analisar as estatísticas descritivas das variáveis numéricas, conforme Tabela 1, tem-se que
o grupo de entrevistados possui uma média de idade de 36 anos, sendo que trabalham há cerca
de 11 anos no setor.

Tabela 1: Estatísticas descritivas.


Variável Média Mediana D.P. Mín Máx
Idade 36,5 34,0 10,1 20,0 65,0
Tempo de Trabalho 10,8 9,00 9,54 0,000 45,0
Demissões 5,56 0,000 33,5 0,000 300,
Futuro 3,37 3,00 1,01 1,00 5,00

Ademais, as empresas dos entrevistados realizaram em média seis demissões. No tocante à


nota que representa suas perspectivas do futuro, o valor médio de 3,37 pode ser considerado
alto para uma escala de 1 a 5..

A Figura 4 aponta a correspondência entre o tempo de atuação no setor aéreo e as avaliações


de perspectivas futuras expressadas pelos entrevistados. A nota 3 representa a moda com 41
votos. Observa-se ainda, que trabalhadores com menor tempo de atuação tendem a acreditar
mais na rápida retomada do setor aéreo.

45
Tempo de atuação no setor

40
35
30
aéreo (anos)

25
20
15
10
5
0
0 1 2 3 4 5

Avaliação de perspectiva futura


Figura 4: Tempo de atuação no setor aéreo vs avaliações de perspectivas futuras.

A partir da base de dados da pesquisa, foram selecionadas as variáveis que melhor se ajustam
ao modelo. Desse modo, a base de dados considerada foi composta por sete fatores que
explanam as variáveis do modelo econométrico, a saber:
• Perspectiva futura: variável numérica que revela a perspectiva futura para o setor
aéreo brasileiro, em que 1 é a pior situação e 5 é a melhor esperada;
• Escolaridade: variável dummy para identificar o nível de escolaridade do trabalhador
(sendo 1 para nível superior e 0 para outros);
• Setores de trabalho: variável dummy para classificar a forma de prestação dos serviços
dos trabalhadores dos setores de aeroportos e companhias aéreas (sendo 1 para os
funcionários diretos e 0 para indiretos);
• Medidas alternativas de trabalho: Identificação da situação dos trabalhadores quanto
às possibilidades postas à disposição das empresas pelas medidas provisórias MP 927
e 936 de 2020, como redução de jornada de trabalho, suspensões de contratos e
demissões. Fator avaliado através de variável dummy (sendo 1 para aqueles que
estavam sob as medidas e 0 para os que não estavam);

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• Redução de Jornada: Relativa ao fator anterior. Caso o funcionário esteja sujeito às


medidas trabalhistas, é avaliado o percentual de redução de horas de trabalho. O
percentual variou entre 6% a 100%;
• Demissões: Quantidade de trabalhadores demitidos pela empresa em que o
entrevistado trabalha. O número variou entre 0 e 300 funcionários; e
• Medo de viagens aéreas no futuro: variável dummy para avaliar a opinião dos
entrevistados sobre a possibilidade de os passageiros terem medo de viajar de avião no
futuro devido à pandemia (sendo 1 para o medo e 0 para os que não tem medo).

A análise das correlações entre as variáveis pode ser observada na Tabela 2. A perspectiva
futura da aviação está positivamente correlacionada com a escolaridade, medidas alternativas
de trabalho e demissões, e negativamente com o setor de trabalho, redução de jornada e medo
de voar no futuro.

Tabela 2: Correlação das variáveis.


Escolaridade Setor MedidaMP ReducãoJornada Demissões Medo Futuro
1,000 -0,2417 -0,0714 -0,0394 0,0737 -0,1651 0,0097 Escolaridade
1,0000 0,5476 0,3165 0,1173 -0,0328 -0,2271 Setor
1,0000 0,6309 0,1900 -0,0649 0,0738 MedidaMP
1,0000 0,2555 0,1400 -0,1124 ReduçãoJornada
1,0000 0,0930 0,1228 Demissões
1,0000 -0,3403 Medo
1,0000 Futuro

O modelo econométrico foi utilizado para estabelecer uma relação causal entre as avaliações
das perspectivas futuras e os demais fatores. Aplicou-se regressão linear através dos mínimos
quadrados ordinários, com a variável dependente e variáveis independentes lineares (lin_lin).
A Equação 1 apresenta o modelo econométrico utilizado:
𝐹𝑢𝑡𝑢𝑟𝑜 = 𝛽0 + 𝛽1 ∗ 𝐸𝑠𝑐𝑜𝑙𝑎𝑟𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 + 𝛽2 ∗ 𝑆𝑒𝑡𝑜𝑟 + 𝛽3 ∗ 𝑀𝑒𝑑𝑖𝑑𝑎𝑀𝑃 + 𝛽4
∗ 𝑅𝑒𝑑𝑢çã𝑜𝐽𝑜𝑟𝑛𝑎𝑑𝑎 + 𝛽5 ∗ 𝐷𝑒𝑚𝑖𝑠𝑠õ𝑒𝑠 + 𝛽6 ∗ 𝑀𝑒𝑑𝑜 + 𝑢 (1)
Onde:
β0 é o intercepto, que expressa o efeito médio sobre a variável dependente de todas as
variáveis excluídas do modelo;
β1 a β6 são denominados coeficientes parciais de regressão;
u é o termo do erro estocástico.

3.2 Resultados e Discussões


A escolha do modelo foi baseada na significância das variáveis e na qualidade dos testes
estatísticos verificados através do R-quadrado (R²), p-valor e teste-t, como traz a Tabela 3.

Tabela 3: Resultado da regressão linear.


coeficiente erro padrão razão-t p-valor
Constante 4,57462 0,316546 14,45 2,50E-26 ***
Escolaridade −0,38451 0,229022 −1,679 0,0963 *
Setor −0,89750 0,212354 −4,226 5,22E-05 ***
MedidaMP 0,78282 0,253421 3,089 0,0026 ***
ReduçãoJornada −1,00074 0,497048 −2,013 0,0467 **
Demissões 0,00607 0,002635 2,305 0,0232 **
Medo −0,79220 0,204401 −3,876 0,0002 ***

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O p-valor deve possui valor menor ou igual a 0,10 para que a hipótese nula do teste seja
rejeitada e o teste-t deve possuir módulo maior que 1,96 para uma significância de 5%. Todas
as variáveis possuíram significância estatística, com destaque para o setor de trabalho,
medidas alternativas e medo do transporte aéreo pós pandemia.

A Tabela 3 demonstra que o setor e o grau de escolaridade influenciam negativamente na


visão da perspectiva futura da aviação. Os trabalhadores de nível superior e os que trabalham
indiretamente no setor aéreo tendem a avaliar de modo mais crítico o futuro da demanda do
modal aéreo, possivelmente por não estarem inseridos de modo direto com as atividades. Da
mesma forma, funcionários que tiveram reduções consideráveis nas horas de trabalho e que
consequentemente estão ligados a empresas com notáveis dificuldades financeiras,
evidenciam perspectivas mais pessimistas quanto à recuperação do setor aéreo. Esses
trabalhadores percebem uma lenta recuperação do setor, provavelmente por conta de que as
empresas necessitarão de subsídios para se reerguerem.

O medo em voar também pode indicar baixa perspectiva de demanda por voos pós pandemia.
Acredita-se que muitos passageiros deixarão de voar para evitar contato com pessoas vindas
de diferentes locais, o que acarretaria na proliferação do vírus. Por isso, é ratificada a
necessidade de se conquistar a confiança dos viajantes através de medidas de segurança e
comodidade.

Medidas alternativas para funcionários do setor aéreo revelam uma correlação positiva com a
perspectiva futura da aviação, uma vez que a aplicação de diferentes caminhos para superar
crises são vistos como promissores. Ações como realocação de setores, teletrabalho, redução
da jornada, licença não remunerada e férias antecipadas são reconhecidas como necessárias
para conter despesas e reorganizar financeiramente as empresas. Nesse contexto, as demissões
também estão positivamente correlacionadas com as perspectivas futuras, visto que as
empresas poderão realocar os recursos financeiros para adotar medidas de segurança e
estimular a reação do mercado. Pode-se interpretar que os trabalhadores esperam que com a
redução de mão de obra, as empresas consigam minimizar a crise, permitindo posteriormente
as recontratações.

Adicionalmente, com o intuito de obter a previsão por parte dos entrevistados sobre o tempo
em dias que se acredita que o transporte aéreo será normalizado, obteve-se uma segunda
regressão linear, onde o tempo esperado de normalização do transporte aéreo se comportou
como variável dependente e as avaliações das perspectivas futuras como variável
independente (Tabela 4).

Tabela 4: Resultado da regressão linear.


Coeficiente erro padrão razão-t p-valor
Constante 301,731 45,8933 6,575 1,89E-09 ***
Futuro −25,9478 13,0484 −1,989 0,0493 **

Com os coeficientes, obtém-se a Equação 2 a seguir:


𝑄𝑢𝑎𝑛𝑑𝑜𝑁𝑜𝑟𝑚𝑎𝑙𝑖𝑧𝑎𝑟á = 301,731 − 25,9478 ∗ 𝑁𝑜𝑡𝑎𝑠𝐹𝑢𝑡𝑢𝑟𝑜 (2)
O coeficiente das avaliações ocorreu de modo negativo, ou seja, na medida em que as notas
aumentam, os dias esperados para normalização dos serviços diminuem. Esse fato já seria

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esperado, uma vez que aqueles que esperam retorno mais rápido revelam uma perspectiva
melhor para o futuro da área. Valores de 1 a 5 (expressados pelos entrevistados), média das
notas dos trabalhadores que atuam indiretamente no setor e média das notas daqueles que
atuam diretamente, ou seja, companhias aéreas e aeroportos, foram usados na Equação 2 com
o objetivo de identificar qual período de tempo corresponde aos valores supracitados (Tabela
5).

Tabela 5: Período proposto de normalização do setor aéreo.


Descrição Avaliação Dias Mês/Ano
Nota 1 276 Fev/2021
Nota 2 250 Jan/2021
Nota 3 224 Dez/2020
Nota 4 198 Nov/2020
Nota 5 172 Out/2020
Média Trabalhadores
3,65 185 Nov/2020
Indiretos
Média Trabalhadores
3,18 236 Jan/2021
Diretos

A análise da Tabela 5 indica que o período para a retomada padrão do setor é igual a 172 dias
para os trabalhadores que possuem a melhor perspectiva (nota 5). Em contrapartida, os mais
pessimistas (nota 1) convergem para 276 dias até a normalização. O período entre 171 e 275
dias correspondem aqueles com votos intermediários. Por fim, a média dos trabalhadores
indiretos e a média dos trabalhadores que atuam diretamente no setor resultaram em,
respectivamente, 185 e 236 dias. Foi feita a transformação em termos de mês e ano,
considerando a data das pesquisas, que estavam bem no início da pandemia em abril de 2020
e talvez por isso ainda um certo otimismo dos respondentes. Fazendo-se um teste de hipóteses
para amostras independentes relativas a trabalhadores diretos e indiretos, percebe-se que com
relação à avaliação das expectativas futuras, aceita-se a hipótese nula de igualdades das notas
médias ao nível de significância de 5%, enquanto com relação ao período de tempo esperado
para normalização, rejeita-se a hipótese de igualdade ao nível de 5%, expressando assim, os
trabalhadores indiretos expectativas mais otimistas de prazos mais curtos.

4. CONCLUSÃO
O setor de recursos humanos é essencial para gerenciar a esfera trabalhista e permitir a
readequação das empresas durante choques econômicos. Devido à pandemia do novo
coronavírus, muitos setores foram atingidos, em especial o aéreo. A demanda de passageiros
reduziu-se significantemente desde o surto da doença, atrelada a fatores como fechamento de
fronteiras, medidas de isolamento social e aversão ao uso do transporte pelos usuários como
forma de evitar contaminação.

Para avaliar o impacto da pandemia no mercado de trabalho, utilizou-se a regressão linear


estimada pelo método dos mínimos quadrados ordinários (MQO). Por meio de um
questionário composto por perguntas relacionadas ao perfil do entrevistado, medidas
trabalhistas aplicadas na empresa atuante, comportamento esperado dos passageiros pós
pandemia e notas de perspectivas futuras para o setor, foi possível explorar as consequências
advindas da pandemia para os funcionários do ramo aéreo. Obteve-se a relação causal entre as
perspectivas futuras para o setor e variáveis como escolaridade, área de atuação, medidas
trabalhistas, redução da jornada, demissões e medo de voar.

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Os resultados apontam que a escolaridade e a área de atuação correlacionam negativamente


com a perspectiva de normalização do transporte aéreo, uma vez que, por estarem inseridos
no ramo aéreo, os funcionários possuem uma visão mais crítica e concreta a respeito. É válido
pontuar que funcionários indiretos, ou seja, que não exercem função nas companhias aéreas e
aeroportos tendem a serem ainda mais críticos, provavelmente por possuírem mais temor
sobre a repercussão da doença no setor e não visualizar no decorrer do dia a dia como está a
operação aeroportuária.

Da mesma forma, redução de jornada de trabalho possui efeito antagônico à retomada do setor
na ótica dos funcionários, visto que medidas como essa corroboram para o fato de que as
empresas estão passando por dificuldades financeiras. O medo em voar acarreta na baixa
perspectiva por voos pós pandemia, sendo necessário reconquistar a confiança dos viajantes
por meio de medidas de segurança e comodidade. Em contraste, medidas trabalhistas e
demissões estão correlacionados positivamente com a perspectiva de retomada do setor, uma
vez que a crise demanda ações para minimizar os custos, mesmo que seja necessário atingir o
mercado de trabalho.

Além disso, através de outro modelo de regressão linear, foi possível prever o tempo esperado
de normalização do setor aéreo de acordo com as notas de perspectiva futura propostas pelos
entrevistados. Os resultados indicam que para os otimistas, a retomada seria em outubro de
2020, enquanto para os pessimistas somente em fevereiro de 2021. É esperado que os
passageiros retornem ao transporte aéreo paulatinamente, permitindo o reaquecimento do
setor e posteriormente a realocação e recontratação dos funcionários afetados pela pandemia
do novo coronavírus.

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