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Mensagem do Autor 3

A Relação Médico Paciente 4

Os 4 Princípios 6

Mensagem Final 11

Os 4 Princípios da Relação Médico Paciente


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Mensagem do Autor
Não há relação mais sagrada do que a do
médico com o seu paciente. A confiança
para entregar a um estranho seus
maiores segredos e intimidade, com a
esperança de que, em troca, lhe será
concedida a benção de uma cura, é um
sentimento único, decorrente de uma
prerrogativa que somente o médico e os
profissionais da saúde possuem.
Entretanto, esta responsabilidade vem
acompanhada de um ônus, que é
devolver ao paciente toda a atenção e
carinho que ele precisa nesse momento
de vulnerabilidade, colocando à sua
disposição todo o conhecimento técnico

Osvaldo Pires G. Simonelli


adquirido ao longo da formação e
Advogado formado em 1998. experiência de vida. É um
Especialista em Direito Administrativo e Direito relacionamento que se inicia em um
Processual Civil. momento de fragilidade, mas que, de
Mestre em Ciências da Saúde pela maneira ética, tornar-se-á duradouro,
EPM/UNIFESP. saudável e infinitamente generoso para
Professor e Coordenador de Cursos na área do ambos os atores. Essa relação,
Direito Médico e da Saúde desde 2008. entretanto, vem sendo transformada ao
Superintendente Jurídico do Conselho Regional
longo dos últimos anos e o médico
de Medicina do Estado de São Paulo.
precisa estar preparado e adaptado, para
não perder a gratificante sensação de
estar sempre ao lado do seu paciente.
Acompanhe o Prof. Me. Osvaldo Simonelli nas redes sociais:
@Dr.Simonelli osvaldo_simonelli Osvaldo Simonelli

Os 4 Princípios da Relação Médico Paciente 3


“A arte da medicina está em observar. Curar algumas
vezes, aliviar muitas vezes, consolar sempre.”
Hipócrates

O Sigilo Profissional é uma das


bases da Relação Médico- Em artigo publicado pelo Conselho Federal de Medicina sobre a Relação
Paciente; é a garantia que o Médico-Paciente, o Dr. Antonio José Pessoa da Silveira Dórea nos fornece
profissional fornece para poder algumas diretrizes interessantes a respeito do comportamento
ingressar na vida íntima e profissional nesta relação:
privada de um terceiro. E sobre • Confortar – é a mais nobre missão do médico, a síntese perfeita do
tal temática, o STJ possui um humanismo pregado por Asclépio e Hipócrates. Não é piedade
Acórdão extremamente profissional, é apoiar, amparar, consolar. A doença provoca uma
intolerável sensação de angústia, carência, despertando uma necessidade
relevante
de carinho e afeição. Perguntas formais, prescrições, solicitação de
“PROCESSUAL CIVIL. SIGILO
exame, raciocínio diagnóstico, etc., são demonstrações de capacidade
PROFISSIONAL técnica.
RESGUARDADO
• Escutar – respeitar o próximo significa reverenciar a divindade que
O sigilo profissional é exigência
cada um traz no seu interior, e escutar o paciente é a maneira mais
fundamental da vida social que sagrada de reverenciá-la. Nas religiões orientais a menção ao “outro” é
se deve ser respeitado como predicado sagrado. No Ocidente, infelizmente tem-se o significado que
princípio de ordem pública, por levar uma vida previsionada por prazos fatais, pressa, e relacionamentos
isso mesmo que o Poder descartáveis seja uma premissa de sobrevivência. A autêntica escuta
Judiciário não dispõe de força exige paciência, atenção, interesse. O médico que quiser desenvolver com
cogente para impor a sua o paciente uma relação construtiva não pode demonstrar tédio,
revelação, salvo na hipótese de impaciência, insensibilidade.
existir específica norma de lei • Olhar – segundo os gregos, o “rei” dos sentidos. “Nem do escuro o
formal autorizando a olhar consegue mentir”, já diziam os chineses. Ralph Waldo Emerson,
possibilidade de sua quebra, o filósofo norte americano, diz que é impossível um olhar ser diferente da
que não se verifica na espécie. O ação da mente. O paciente gosta e precisa ser olhado: quer ter a certeza
interesse público do sigilo de que existe para o médico, não quer ser apenas um registro de
computador. O médico que esqueceu o significado do olhar precisa
profissional decorre do fato de
reaprendê-lo, e também esquecer o computador.
se constituir em um elemento
essencial à existência e à • Tocar – no primeiro toque de mão o paciente antecipa o clima da
sua relação com o médico. A pressão e a duração do cumprimento a ele
dignidade de certas categorias,
dirigido são muito significativos. O médico experiente sabe que para a
e à necessidade de se tutelar a maioria dos pacientes a consulta já é satisfatória quando são auscultados
confiança nelas depositada, sem e apalpados. Os doentes não só precisam da habilidade de quem os trata,
o que seria inviável o mas compaixão e desvelo podem ser transmitidos pelo toque, além da
desempenho de suas funções, competência profissional.
bem como por se revelar em Fonte:
uma exigência da vida e da paz http://portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&i
social.” STJ. Ministro César d=20464:relacao-medico-x-paciente&catid=46
Asfor Rocha, RMS 9.612

Os 4 Princípios da Relação Médico Paciente 4


A Nova Relação Médico Paciente.

Os princípios que regem a relação entre o médico e seu paciente são os mesmos desde os
tempos de Hipócrates. Cuidar, ouvir, confortar, ter um relacionamento próximo com seu
paciente, entender e participar das suas angústias, são diretrizes éticas, nortes, que o
profissional deve ter na sua formação e aplicar em sua atuação. Contudo, é evidente que
a medicina romântica de outrora não mais existe. A medicina como vivida até o final de
1980 possuía um componente muito forte de confiança, mas também era atrelada a uma
posição, por vezes autoritária e paternalista, em que, ao mesmo tempo que o doente não
tinha voz ativa, o médico era responsável por tomar, sozinho, as difíceis decisões sobre
os tratamentos e procedimentos, numa relação absolutamente vertical. Com o avanço da
tecnologia, o advento da medicina de grupo, a formação médica com um foco cada vez
mais na doença, calcada em múltiplas possibilidades de exames complementares, o
olhar, o tocar e o ouvir foram se distanciando da prática profissional, afastando do
consultório a medicina baseada em evidências. Por outro lado, o paciente também
assumiu uma postura mais defensiva diante de tantas informações de fácil acesso pela
internet, smartphones, além dos noticiários que, diuturnamente, divulgam casos de
“erros médicos”. Trata-se, sem sombra de dúvida, de uma nova relação médico paciente,
que não pode ser catalogada como melhor ou pior do que a “antiga” relação, mas
“diferente”. E ambos atores e partícipes ativos desta nova forma de relacionamento terão
que se adaptar e compreender as angústias e dificuldades para o melhor aproveitamento
em prol da saúde. O médico não é o culpado pela má prestação dos serviços de saúde,
tanto no âmbito privado quanto público, mas apenas mais uma vítima. Tanto as
péssimas condições do atendimento público, quanto as mazelas dos serviços privados
colocam os profissionais de saúde como padeceres dos mesmos males que acometem
seus pacientes: a chamada mistanásia ou eutanásia social. Por tal razão é que, juntos,
devem se esforçar, não para retomar a “antiga” relação, mas resgatar as históricas
diretrizes, adaptando-as à nova realidade da relação médico-paciente.
Este e-book tem, justamente, esta missão: colaborar para o resgate dos princípios que
devem direcionar a relação entre médico e paciente, aplicando-os às novas situações
diárias.

5 Os 4 Princípios da Relação Médico Paciente 5


“O alvo de toda a atenção do Os 4 Princípios da
médico é a saúde do ser humano,
em benefício da qual deverá agir Relação Médico Paciente
com o máximo de zelo e o melhor
de sua capacidade profissional.” Os 4 Princípios da Relação Médico Paciente.
Código Deontológico Médico. A Relação Médico-Paciente é absolutamente
Resolução CFM n. 1.931/09. imprevisível. Cada indivíduo é único, com
sentimentos próprios, com um sistema biológico,
A Atual Relação Médico Paciente uma genética absolutamente peculiar. A
pode ser dividida em algumas responsabilidade do médico é muito grande ao
diretrizes jurídicas, que estarão tratar de um indivíduo. Os órgãos internos possuem
presentes nos quatro princípios disposição semelhante, com a tecnologia atual é
abordados neste e-book. São elas: possível obter imagens altamente definidas do
1. Direito à Informação; corpo humano para a realização de diagnósticos e
2. Direito ao sigilo profissional; procedimentos cirúrgicos. Procedimentos que até
3. Direito ao livre exercício de pouco tempo atrás eram inimagináveis, hoje estão
sua Autonomia; acessíveis à população. Entretanto, o médico não
4. Direito a um tratamento pode trabalhar sua atividade com base nesta
digno e respeitoso; massificação da medicina. Cada um dos 6 bilhões de
5. Direito de encerrar a relação seres humanos que habitam este planeta possui
quando não mais houver características únicas, que transformam uma
confiança. simples consulta em um desafio para o médico
sendo, impossível estabelecer qualquer fórmula
Vejam que se tratam de mágica neste sentido. Entretanto, é possível praticar
diretrizes que se aplicam a alguns princípios para que cada atendimento
ambos partícipes (médicos e prestado seja uma experiência também única e
pacientes). Ambos têm direitos e gratificante, tanto para médicos quanto para
deveres a serem respeitados. pacientes.
Deve ser uma relação equilibrada
e , cada vez mais, horizontal.

Frase proferida por Leon C. Megginson, professor da


Louisiana State University, num discurso em 1963,
onde apresenta a sua interpretação da ideia central de
"A Origem das Espécies" de Charles Darwin.

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4 Princípios da Relação Médico-Paciente.
Direito à Informação; Direito ao sigilo profissional; Direito ao livre exercício de sua Autonomia; Direito
a um tratamento digno e respeitoso; Direito de encerrar a relação quando não mais houver confiança.

1º. Reciprocidade. Recíproco: [que se realiza ao mesmo tempo; em


retribuição, em troca de algo semelhante; mútuo. Observado entre
duas pessoas ou entre duas coisas] (fonte:
www.dicio.com.br/reciproco/). A relação entre médico e paciente
é baseada numa troca constante, que se inicia no primeiro
contato, no primeiro olhar. A partir do momento que o médico
olha para seu paciente, ele já consegue transmitir como será essa
relação. O seu tom de voz ao dizer “bom-dia” já vai dar as
características de como serão os próximos minutos de contato. O
paciente, ao entrar no consultório médico, deve se sentir acolhido,
confortável, e isso não depende dos “equipamentos” ali
existentes, mas pelos gestos demonstrados pelo profissional,
sentindo-se único, importante, relevante, ouvido. E isso é uma
troca, pois quando ele se sente assim, reconhece no profissional
que lhe está atendendo alguém “importante”, que se preocupa
com ele, passando a respeitá-lo de uma maneira ímpar, pronto
para lhe entregar seus bens maiores: sua intimidade e privacidade.

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Direito à Informação; Direito ao sigilo profissional; Direito ao livre exercício de sua Autonomia; Direito a um
tratamento digno e respeitoso; Direito de encerrar a relação quando não mais houver confiança.

2º. Confiança. A confiança é a base de qualquer relação humana, desde


os primórdios. O Juramento de Hipócrates já concedia este caminho ao
afirmar que: “àquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no
convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar,
eu conservarei inteiramente secreto.” O paciente deve confiar no médico
como um católico confia no Padre, dentro do confessionário. Se ele
suspeitar que não pode acreditar no profissional que o está lhe
atendendo, não há mais como prosseguir com a relação. Questões atuais
como a gravação de consultas, as “consultas” prévias feitas pelo Google
ou outros sites de pesquisa, agora fazem parte da relação médico-
paciente, e o profissional de saúde deve estar devidamente adaptado
para, mesmo diante de situações como essas, transmitir confiança ao seu
paciente. Fazê-lo compreender, através de uma boa interlocução e
diálogo, que aquela relação, para você, médico, é sagrada, é a melhor
maneira de prosseguir no atendimento e, de forma indireta, evitar ser
demandado judicial e eticamente. As (más) relações entre médicos e
pacientes têm sido grandes causadoras de processos, quando o paciente
deixa de confiar no profissional, e não obtém o respaldo necessário para
dirimir suas dúvidas. Começando a relação com uma demonstração de
confiança, não há como ela se quebrar no futuro. Destaco, ainda, que esta
confiança é recíproca. Quando o médico não mais confia em seu paciente,
lhe é autorizado, pelo artigo 36, 1º. do Código de Ética Médica, a
romper a relação, exceto, obviamente, em casos de urgência ou
emergência: “Ocorrendo fatos que, a seu critério, prejudiquem o bom
relacionamento com o paciente ou o pleno desenvolvimento profissional, o
médico tem o direito de renunciar ao tratamento, desde que comunique
previamente ao paciente ou a seu representante legal, assegurando-se da
continuidade dos cuidados e fornecendo todas as informações necessárias ao
médico que lhe suceder.”
“Aquele que não tem confiança nos outros, não lhes pode ganhar a confiança”.
Lao-Tse
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Direito à Informação; Direito ao sigilo profissional; Direito ao livre exercício de sua Autonomia; Direito a um
tratamento digno e respeitoso; Direito de encerrar a relação quando não mais houver confiança.

3º. Autoridade.
A Autoridade é um princípio de grande relevância na relação.
Você só consegue estabelecer uma saudável interlocução com
seu paciente se demonstrar que tem conhecimento a respeito
do tema. Como já apontamos nos princípios anteriores, o
paciente hoje tem acesso a uma gama muito grande de
informações e o médico deve estar preparado para isso. O
paciente deve admirar o profissional que lhe atende. Se você
está com um problema e necessita contratar um advogado,
certamente vai pesquisar sobre seu caso antes na internet, vai
estudar o assunto e quando chegar ao profissional vai querer
“checar” se ele realmente sabe o que está dizendo, tal qual
como acontece nas consultas médicas e nas demais relações
atuais. Todavia, se profissional se apresentar confuso, com
informações contraditórias, certamente não demonstrará
“autoridade” no assunto, encerrando a relação naquele
momento. De certo, não terá adiantado em nada percorrer os
caminhos da “reciprocidade” e da “confiança” se houver
conteúdo para demonstrar ao seu paciente, transmitindo
segurança e domínio sobre o assunto. O médico deve
demonstrar firmeza, conhecimento e habilidade para
conquistar seu paciente de maneira perene, fiel e saudável.

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Direito à Informação; Direito ao sigilo profissional; Direito ao livre exercício de sua Autonomia; Direito a um
tratamento digno e respeitoso; Direito de encerrar a relação quando não mais houver confiança.

4º. Ética.
Primun non nocere ou, “primeiro, não prejudicar.” A ética é a base
das relações humanas. Não aquela “codificada”, de cunho
“profissional”, mas a estabelecida para o convívio saudável em
sociedade, a partir das boas relações humanas. Estamos falando de
conduta, de forma de agir, de consciência quanto ao que,
moralmente, é certo ou errado. O médico que se utiliza da
fragilidade de seu paciente para obter qualquer vantagem
indevida, seja de cunho financeiro, emocional, físico, além de
cometer uma infração sob o ponto de vista profissional, quebra o
fator mais importante desta relação, já visto anteriormente: a
confiança. Entretanto, a ética é uma via de mão dupla. O paciente
que procura o serviço médico apenas para obter um “atestado
gracioso”, visando faltar ao trabalho, não age com ética e,
portanto, não colabora para o estabelecimento de uma boa
relação. Por vezes, há que se observar que a conduta adotada não
será “ilegal”, sob o ponto de vista das normas de direito, mas
absolutamente imoral e não aceita pelo convívio social. Assim,
tanto o médico quanto o paciente devem agir de maneira
escorreita, a fim de preservar esta relação sagrada e importante.
Como já citado, não cabe ao paciente procurar o serviço de saúde
apenas para obter algum “proveito”, como também não pode o
médico, por exemplo, fazer qualquer solicitação indevida, como
um pagamento “extra” se está atendendo pelo SUS. Aliás, não
sendo uma situação de urgência e emergência, pode o médico
renunciar ao atendimento, comunicando previamente, desde que
assegure a continuidade dos cuidados e forneça toda as
informações necessárias ao médico que lhe suceder, reforçando a
ideia de que se trata de uma relação que envolve uma postura
correta de ambos os partícipes, ou seja, médicos e pacientes.
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Mensagem Final
Um dos pilares da relação entre o médico e seu paciente é o
chamado “dever de informação” e que, num ambiente saudável,
deixa de ser uma “obrigação”, passando a uma evolução natural.
O paciente tem direito de saber todas as informações sobre seu
diagnóstico, prognóstico, os objetivos do tratamento, a fim de que
participe dos processos decisórios e exerça sua autonomia de forma
plena. Entretanto, há casos que a própria comunicação pode causar
dano ao paciente ou à própria relação, momento em que o médico
deve fazê-lo, se possível, a um terceiro que o represente. Este é o
espírito ético desta sagrada relação: a atuação ética, em prol do
melhor a ser feito ao paciente. E, uma vez construída em bases
sólidas de reciprocidade, confiança e autoridade, a atuação ética
torna-se uma consequência natural.
Não nos esqueçamos, jamais, que: “A Medicina é uma profissão a
serviço do ser humano e da coletividade”, sendo que o “alvo de toda a
atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá
agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional.”
(Princípios do exercício profissional, contidos no Código de Ética
Médica).

Os 4 Princípios da Relação Médico Paciente 11


Esta é uma publicação gratuita do Instituto Paulista de
Direito Médico e da Saúde – IPDMS
www.ipdms.com.br
Permitida a divulgação no todo ou em parte do conteúdo, citando a fonte e o autor.
São Paulo, maio/2018.

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