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Relacionamento médico–paciente
A prática médica tem sofrido enormes mudanças nas últi- 2. Empatia
mas décadas. O extraordinário avanço tecnológico na área A empatia significa que podemos, por um momento, tentar
de diagnósticos, o advento da informática e a intermedia- colocar-nos no lugar da pessoa e, por meio dessa identifi-
ção do trabalho médico são alguns fatores que causaram forte cação temporária, tentar experimentar a situação sob o ponto
impacto, com profundas mudanças na relação médico–pa- de vista dela.
ciente, modificando-a e muitas vezes trazendo dificuldades “Agora eu o compreendo, porque sei como se sente”.
aos dois lados desse relacionamento. A empatia não significa uma identificação a longo prazo
Esse cenário tem merecido a atenção de diversos autores. com outra pessoa e com sua situação, como é o caso com
A bioética clínica, ramo da bioética que se ocupa do relaci- pessoas entre as quais existe uma amizade íntima ou que
onamento entre paciente e o profissional da saúde, tem apre- partilhem da mesma sorte. A empatia é apenas uma ex-
sentado grande desenvolvimento, discutindo e propondo periência temporária que ajuda a compreendermo-nos
diretrizes para os dilemas éticos, cada vez mais freqüentes mutuamente melhor.
em nossos dias. Em algumas pessoas a empatia é mais desenvolvida e,
O emprego do relacionamento médico–paciente com possivelmente, também cultivada de modo mais consciente.
propósitos terapêuticos é certamente tão antigo quanto a Em outras, o seu desenvolvimento acha-se inibido por di-
história da medicina. O uso compreensivo dessa relação exige versas razões ou por falta de prática.
do médico certos conhecimentos e habilidades. É impor- A empatia é uma das características mais marcantes dos
tante o conhecimento das ciências do comportamento, par- grandes profissionais clínicos.
ticularmente dos elementos delas que são relevantes para o Para a condução eficaz da prática médica, é importante
exercício da medicina. que a capacidade de empatia do médico seja utilizada ple-
Baseando-se nos conhecimentos atuais, as características namente com o paciente em todas as interações diagnósticas
dessa interação podem ser compreendidas com maior pro- e terapêuticas.
fundidade, tornando possível descrever, ensinar e aprender
os princípios desse relacionamento. 3. Transferência e regressão
O médico deve também aprender a conhecer-se sufici- Elementos dos anos de formação sempre desempenham pa-
entemente bem para impedir, até onde for capaz, que seus pel nos relacionamentos humanos, mas a regressão, em es-
próprios preconceitos e problemas perturbem a formação pecial, pode fazer com que modos primitivos de relaciona-
e o emprego da relação médico–paciente com finalidade mentos sejam reativados e busquem expressão nos relacio-
terapêutica. namentos atuais. Quando isso ocorre, a pessoa, sem o saber,
Na prática reumatológica, atividade eminentemente clíni- transfere para os seus relacionamentos adultos expectativas,
ca, a relação médico–paciente assume relevante importância. atitudes, sentimentos que têm suas origens nos importantes
Destacamos abaixo alguns conceitos e procedimentos que relacionamentos humanos de seus anos de formação.
consideramos fundamentais para nossa prática diária: Esse deslocamento do modo de relacionar-se baseado em
relacionamentos passados é chamado de transferência.
1. Princípios da bioética A doença é uma forma de estresse geralmente associada a
É praticamente impossível imaginarmos hoje um ato médi- fenômenos regressivos. É natural que o médico, em quem
co em que o profissional não embase sua conduta sob os os pacientes procuram ajuda e alívio para os seus sofrimen-
quatro princípios básicos da bioética: beneficência, não- tos, torne-se um alvo primário para as expectativas e os
maleficência, justiça e autonomia. sentimentos evocados pela regressão.
A bioética principialista tem sua base teórica na obra de A transferência na maioria das vezes é positiva, mas tam-
The principles of bioethics de Beauchamp e Chidress, de bém pode ser negativa. Embora a transferência envolva ex-
1979, e tais princípios têm norteado nas últimas décadas as pectativas e atitudes irrealistas, dentro de limites razoáveis a
discussões e decisões sobre diversos dilemas éticos, inclusive transferência positiva constitui um dos ingredientes do rela-
e principalmente na área prática da relação médico–paciente cionamento médico–paciente que tem um efeito em grande
à beira do leito. parte benéfico no processo terapêutico.
238 Rev Bras Reumatol, v. 43, n. 4, p. 238-9, jul./ago., 2003
Relacionamento médico–paciente