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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
CURSO DE PEDAGOGIA
Rio de Janeiro
2022
Igor da Conceição Gonçalves
Rio de Janeiro
2022
Igor da Conceição Gonçalves
Banca examinadora:
________________________________
Presidente, [Nome Completo]
________________________________
Prof. [Nome Completo]
________________________________
Prof. [Nome Completo]
Rio de Janeiro
2022
[Ficha catalográfica]
Agradecimentos
Agradeço primeiramente a Deus, que fez com que meus objetivos fossem alcançados, durante
todos os meus anos de estudos.
Agradeço também a minha família, especialmente a minha mãe Adriana Ferreira, por todo
esforço em proporcionar uma educação de qualidade desde pequeno.
A minha professora Fatima Lobato, por ter sido minha orientadora e ter desempenhado tal
função com dedicação, paciência e amizade, deixo meu muito obrigado.
Agradeço aos meus amigos, que me apoiaram e me ajudaram durante todo o período
acadêmico: Anne de Castilho, Taiane Tavares, Dayane Pereira e José Luiz.
Por fim, sobretudo agradeço a aquelas pessoas que compartilharam as suas vozes para
tornarem possíveis estudos como este através dos seus relatos. Doar seu tempo e abrir a sua
intimidade movidos pelo desejo da mudança de paradigmas certamente é algo admirável e
meritório.
iv
Resumo
País com a terceira maior população carcerária do mundo, o Brasil também conta com um
quadro onde o índice de escolarização é baixo entre os reeducandos , com um gritante número
de apenados sem nem o Ensino Fundamental. Entendendo que as pessoas que estão no cárcere
não deixam de ser membros da sociedade, e que em algum momento a ela retornarão,
compreender e pensar em políticas públicas que tenham aspecto ressocializador, evitando a
reincidência de futuras delinquências é de suma importância. A educação, mais que um direito
Constitucional, é uma ferramenta para ressignificar a vida não apenas fora, mas dentro do
cárcere, expandindo horizontes e trazendo novas oportunidades para o indivíduo privado de
liberdade. Neste estudo então, pretende se olhar a questão da educação no context do Sistema
Penitenciário Brasileiro, trazendo como suporte ao aporte teórico os relatos de experiência de
um professor e de um aluno, ambos com a vivência da experiência, e a professional neste
contexto.
v
Abstract
Country with the third largest prision population in the world, also has a defying situation
where the schooling rate is low among inmates, without even Elementary School completed.
Understanding that people who are in prision, are still members of society, and that at some
point will return to it to live their lives, acknowledging and thinking about public policies that
have a ressocializing aspect, and avoiding the recurrence of future delinquencies is of
paramount importance. Education, more than a constitutional right, is a tool to reframe life not
only outside, but inside prision, expanding horizons and bringing new opportunities to the
individual deprived of freedom. In this study then, the intention is to look at the issue of
education in the context of the Brazilian Penitentiary System, bringing support to the theory
with the contribution of the experience reports of a teacher and a student, both with life
experience, and the professional experience in this context.
vi
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
vii
LISTA DE ABREVIATURAS
CF Constituição Federal
CNPCP Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária
DEPEN Departamento Penitenciário Nacional
FUNPEN Fundo Penitenciário Nacional
INFOPEN Sistema de Informações Estatísticas do Sistema Penitenciário Brasileiro
MJ Ministério da Justiça
ONU Organização das Nações Unidas
PEESP Plano Estratégico de Educação no Âmbito do Sistema Prisional
SISDEPEN Ferramenta de Coleta de Dados do Sistema Penitenciário Brasileiro
STJ Superior Tribunal de Justiça
viii
Sumário
1. Introdução.............................................................................................................................10
1.2. Objetivos........................................................................................................................12
1.3. Metodologia...................................................................................................................12
1.4. Tema e Justificativa.......................................................................................................12
2. A prisão e a sociedade...........................................................................................................14
3. Ressocialização.....................................................................................................................20
3.1. Reincidência...................................................................................................................22
5. Considerações Finais............................................................................................................30
5.1. Os dois lados de uma moeda: o relato do aluno, o relato do professor e as suas
complementaridades.............................................................................................................30
6. Referências Bibliográficas....................................................................................................31
ANEXO I – Entrevista 1: As visões de um ex – Reeducando sobre educação........................34
ANEXO II – Entrevista 2: A visão de um professor atuante no sistema carcerário sobre a
educação....................................................................................................................................45
ix
10
1. Introdução
Crimes, suas vítimas e as suas consequências são assuntos que nunca saem de pauta.
As consequências do delinquir para o todo, sobretudo para populações que vivem em locais
com elevada criminalidade certamente são uma problemática a muito enfrentada, e que
continua em voga na moderna sociedade, assunto discutido exaustivamente por uma mídia
cada vez mais sensacionalista.
A dinâmica é praticamente uma só, o delinquente é punido com a reprovação da
sociedade, sua pena, e o estigma que carrega após o cumprimento dela, em algumas
sociedades inclusive sendo lhe impingida a pena capital, como tentativa de frear a “ameaça”.
Uma quantidade significativa de países, tem visto a elevação de sua taxa de
criminalidade, incluindo o Brasil, com a terceira maior população carcerária do mundo,
perdendo em números apenas para os Estados Unidos e a Rússia, ambos também
consideravelmente maiores em território.
Este número cada vez maior de pessoas em situação de encarceramento não vem
separado do sucateamento crescente do sistema prisional, que já opera em condições de
superlotação a anos, hoje operando quase que com o dobro de detentos para a real capacidade,
tendo outros problemas relacionados com o elevado contingente, como motins, violência entre
os internos, problemas de vigilância, com apenados usando entorpecentes e aparelhos
celulares para cometer crime mesmo que dentro do cárcere, falta de condições mínimas de
dignidade humana, higiene... A lista é interminável.
A ideia em si de punir um ser humano alienando o do convívio social e das regras
mínimas para viver em sociedade que são aplicadas no dia a dia de todos é em si debatível, e a
permanência durante anos em ambientes hostis e indignos como apresentam em sua
configuração hoje os presídios brasileiros na visão de alguns autores é totalmente
contraproducente, estando a própria sociedade de acordo, quando chama advertida ou
inadvertidamente os presídios de “escolas do crime”.
O interno penitenciário, muitas vezes é excluído de seus direitos sociais mais primais,
contudo a ideia de ressocialização hoje já é discutida, e já se há entendimento, inclusive da
forma escrita da lei que este é um caminho necessário, no entanto, alicerces são necessários
para levantar estes pilares. Um dos grandes problemas que figuram dentre a comunidade
carcerária é a baixa escolaridade, com um grande número de apenados sem alfabetização e
conclusão do Ensino Fundamental figurando em seu currículo escolar.
11
Estudar é um direito, no Brasil garantido pela Constituição Federal em seu artigo 205
“A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada
com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo
para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Estudar garante princípios
fundamentais da CF, a dignidade da pessoa humana, a igualdade, a vida e a liberdade, e
melhora a perspectiva da conquista de outros direitos também fundamentais: o direito ao
trabalho, ao lazer e a moradia.
Considerando o estudo um direito fundamental, e que o reeducando em algum
momento irá ser reinserido ao convívio social, faz sentido que este volte ao seio da sociedade
munido de meios para que tenha uma vida digna e não volte a delinquir. Uma maneira de
garantir, isto é, através da educação.
A educação para o apenado, não é apenas um direito, mas uma forma de abrir novos
horizontes, tanto no entendimento de mundo do reeducando, tirando o mesmo que
momentaneamente de uma lógica diária de punitivismos e alienação do eu, quanto para
horizontes profissionais. Educar é dar perspectiva, chance, oportunidade.
Dentro desta perspectiva, o presente trabalho, dividido em três blocos principais traz
uma discussão sobre a educação no contexto do sistema prisional brasileiro, abordando o
assunto em três blocos principais, no primeiro entendendo o papel da prisão na sociedade, e os
dados gerais sobre encarceramento no Brasil, incluindo o perfil acerca da escolaridade.
No segundo bloco são debatidos os conceitos de ressocialização e reincidência,
fazendo um paralelo entre as oportunidades que a educação, a cultura e o trabalho podem
trazer para a vida de um ex reeducando, e sua inserção de volta ao meio social.
Seguindo para o terceiro e último bloco, na primeira parte é discutido com detalhes o
papel e a importância da educação e do trabalho na vida de uma pessoa privada de liberdade
para seu futuro. Na segunda parte, é feita a discussão sobre o papel da educação na visão de
um aluno e de um professor que passaram pela experiência educacional dentro de um
presídio, em lados diferentes. Ambas as entrevistas figuram transcritas em sua íntegra nos
anexos I e II deste trabalho.
As considerações finais trazem uma discussão acerca do aporte teórico, e em um
segundo momento um debate comparativo entre as falar do aluno e do professor, e o que
ambos puderam perceber acerca da experiência da educação no cárcere através de seus relato
de vivência trazidos no anexo.
12
1.2. Objetivos
O presente trabalho tem como objetivo trazer uma visão geral sobre a educação no
contexto do sistema prisional brasileiro, como os programas educacionais, o perfil da
comunidade carcerária e a influência da educação na ressocialização, trazendo relatos de
experiência como forma de contrapor a literatura com a vivência dos voluntários.
1.3. Metodologia
educação teve na minha vida, e que talvez a falta dela tenha impactado na proporção reversa a
tantos que vi decair em caminhos mais tortuosos.
A partir desta reflexão, me veio de forma clara não apenas a escolha do curso de
pedagogia, mas o caminho em pesquisar e contribuir com alternativas para o entendimento do
papel da educação na vida das pessoas privadas de liberdade. A escolha de trazer relatos,
sobretudo um inspirador, de um ex reeducando que teve sua vida transformada positivamente
pela educação é uma tentativa de trazer o entendimento do quanto a educação pode ser
libertadora pra um indivíduo, nas palavras de Freire (1987, p.88) lembrando que necessitamos
“de uma educação para a decisão, para a responsabilidade social e política” e que advertisse o
homem “dos perigos de seu tempo, para que, consciente deles, ganhasse a força e a coragem
de lutar, ao invés de ser levado e arrastado a perdição de seu próprio “eu”, submetido ás
prescrições alheias” (FREIRE, 1967, p.90).
De acordo com dados comparativos acessados para a realização desta pesquisa,
vivemos em um país com uma taxa de criminalidade alta, não sendo incomuns crimes
violentos, sobretudo em centros urbanos. O medo gerado pela possibilidade de sofrer com um
ato criminoso, torna muitas vezes o desejo popular conivente a atitudes revanchistas.
A educação, frente a uma sociedade que por diversas questões delinque, além de ser
uma alternativa humanitária aos problemas que se apresentam, é uma alternativa prevista
como direito pela Constituição Federal do Brasil (CF):
Visto que é uma garantia fundamental, a educação, sobretudo das pessoas sob custódia
do sistema penitenciário não pode ser vista como uma mera regalia, uma vez que é direito
garantido, inclusive pelo artigo 17 da Lei de Execução Penal (Lei 7.210 de 1984).
Compreender o papel da educação na vida do apenado então, e pensar alternativas para que
esta população possa gozar de seus direitos e ter uma experiência capacitante e
transformadora certamente é um objetivo meritório para um educador.
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2. A prisão e a sociedade
O primeiro ponto que dever ser ressaltado neste tópico é que o acesso a assistência
educacional é um direito garantido a pessoa privada de liberdade pelo estado, conforme
estabelece a Lei de Execução Penal (Lei n° 7.210, art. n°11), e deve ser oferecido pelo estado
na forma de instrução escolar e formação profissional, como medida que visa reintegrar o
apenado a sociedade.
16
condição de reincidência, visto que as oportunidades destas pessoas se tornam limitadas pela
baixa escolaridade. Segundo a resolução 2002/12 da ONU, que dispõe sobre a justiça
restaurativa, mesmo princípio adotado em nosso país, o apenamento deve promover condições
de dignidade, recuperação e reinserção do reeducando na sociedade. Nunes (2009, p. 12)
sobre isto dispõe que:
(...) é preciso distinguir finalidade da pena e objetivos da execução penal. São duas
completamente diferentes. Enquanto a pena tem o condão de prevenir, reprimir e
reintegrar socialmente o condenado, a execução da pena tem a finalidade de efetivar
o cumprimento da sentença penal condenatória e, também, de realizar a recuperação
do condenado (...).
Lei n° 7.210 de 11 de julho de 1984 que dispõe acerca da remição por frequência em
atividades educacionais:
Mais uma vez a realidade destes fatos coaduna com o depoimento dado pelo ex
reeducando entrevistado no ANEXO I, que relata que “gostar eu gostava, por que eu
encontrava com pessoas diferentes e a cada 3 dias que você ia fazer isso (estudar) você
ganhava um dia. Então também já era uma coisa que eu gostava, mas tinha essa condição
então eu fiquei indo”, o que demonstra que o benefício da remissão é benéfico para estimular
o apenado a comparecer as atividades educacionais, tão importantes para sua reintegração a
sociedade.
Certamente ainda deve se percorrer um longo caminho no sentido de fornecer mais
atividades educacionais aos apenados e sanar desde a base a ausência de escolarização tão
gritante entre estes jovens.
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3. Ressocialização
Neste capítulo, com o objetivo de compreender os conceitos de ressocialização e
reincidência, que são complementares, no entendimento que sem um o outro não é possível,
iniciaremos primeiramente a definição e entendimento dos termos, começando com a
definição do termo “ressocialização”, objetivando um entendimento claro sobre o caminho
pelo qual as reflexões posteriores serão pautadas. Uma definição inicial, pode ser a de “tornar
a socializar”, “socializar novamente”.
Definindo aqui através do dicionário Michaelis da língua portuguesa temos para
socialização “Processo pelo qual o indivíduo, no sentido biológico, é integrado numa
determinada comunidade e desenvolve o espírito de solidariedade e de cooperação” e para
ressocialização, o dicionário online “Dicio” define: “Inserção em sociedade; processo de
ressocializar, de voltar a pertencer, a fazer parte de uma sociedade”.
Evidente então que o termo têm uma pesada carga social por trás, dando a entender
que o processo de socialização do indivíduo, e consequentemente de ressocialização trazem a
ideia de que certos padrões de comportamento devem ser adotados no intuito de fazer parte da
sociedade, que tem suas normas, regras e valores, que se estendem não apenas a adequação a
vida em grupo, mas a esfera política e a entender os direitos, deveres e privilégios que se têm
enquanto integrante da sociedade.
Émile Durkhein (1978) trazendo uma perspectiva diferente, aponta que socializar é
sinônimo de educar, e que a nossa forma de viver conflita tanto com nossos quereres
individuais, quanto com o conjunto de crenças e hábitos que nos são ensinados e partilhados
pelas sociedade, onde aceitamos “coerção” que o todo impõe às partes através da educação.
Citando Ipsi Literis o entendimento abordado acima nas palavras do autor:
A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre aquelas não ainda
amadurecidas para a vida social. Tem por objetivo suscitar e desenvolver, na
criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela
sociedade política no seu conjunto e pelo meio especial a que a criança
particularmente se destine (DURKHEIN, 1978, p.10).
Nesta perspectiva então, podemos entender que o meio vai ter uma ação direta em
moldar o indivíduo e sua concepção moral, incluindo a cultura, a geração, os valores que o
cercam, logo não há como excluir a influência dos fatores sociais para a formação de um
agente do mundo do crime (SILVA, 2018). O exercício da liberdade não é compatível sem
acesso aos direitos constitucionais básicos, de acordo com a CF, (1988) saúde, alimentação,
trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, a previdência social, e proteção à maternidade,
21
e eles serem ou não prestados pelo estado de acordo coma garantia pode acarretar em
prestações positivas ou negativas, igualizando ou não situações sociais desiguais, que podem
afetar no exercício factual da liberdade (SILVA, 1999).
Desta forma vale refletir que se ressocializar, é socializar novamente, é trazer de volta
a sociedade, e isto perpassa por aspectos educacionais, e de acordo com os dados visos a
grande maioria dos apenados são pessoas pobre e com baixa escolarização, será que estas
pessoas, uma vez livres do cárcere estarão usufruindo dos direitos que lhes foram
primordialmente negados e assim podendo fazer uso de fato de sua liberdade?
Na ideia da legislação penal na sociedade moderna, especificando aqui o caso
brasileiro, embora por natureza o sistema judiciário seja coercitivo e punitivo com aqueles
considerados injustos ou agressores, existe a ideia da obediência aos princípios da natureza da
liberdade (JULIÃO, 2009).
Alijado a este princípio, vemos na legislação penal uma característica que deixa
apenas de prever a punição, e passa também a celebrar o processo chamado “ressocialização”,
através da execução da pena, ao mesmo tempo em que se pune, reabilitando o delinquente a
viver na sociedade, a ser reintegrado, tornando assim a pessoa em um membro útil da
comunidade. Julião (2019) ressalta que as ideias de reinserção, reabilitação social e
ressocialização são ideias correlacionadas, sendo a ressocialização o momento posterior ao
cumprimento da pena, onde a pessoa passa então a viver de acordo com que é disposto na lei.
Sobre este assunto, é possível trazer a luz os pensamentos de diversos teóricos, tendo
três chamado a atenção quanto a sua ligação com este trabalho. O primeiro , de Focault (2000,
p.20), de sua obra “vigiar e punir: nascimento das prisões” diz acercado aprisionamento que
este não se destina “sancionar a infração, mas a controlar o indivíduo, a neutralizar a sua
periculosidade, a modificar suas disposições criminosas, a cessar somente após obtenção de
tais modificações”, se acordo com esta visão então, o indivíduo podendo se reintegrar a
sociedade no momento em que modificar o comportamento delinquente.
Christie (1998), no seu trabalho “a indústria do controle do crime” traz uma visão mais
humanista, entendendo o crime enquanto uma construção social, onde são atribuídos a aquele
indivíduo atos ilícitos. A autora aponta:
[…] o crime não existe. É criado. Primeiro existem atos. Segue-se depois um longo
processo de atribuir significado a esses atos. A distância social tem importância
particular. A distância aumenta a tendência de atribuir certos atos o significado de
crimes, e às pessoas o simples atributo de criminosas. (CHRISTIE, 1998, p.13)
22
3.1. Reincidência
Se nosso papel é cumprir as leis, o papel do governo é também cumprir o que dispõe a
CF, e não se eximir da construção de uma sociedade justa e igualitária que goze dos seus
direitos sociais. A crise no sistema penal pode atuar então como qualificadora do crime e do
criminoso, e a ausência de perspectiva pode sim trazer um cenário onde o indivíduo volte a
delinquir.
Em uma matéria escrita por Silva et Al. (2015), os autores trazem diversos relatos
sobre a dificuldade de superação após a passagem pelo sistema carcerário de diversos
entrevistados, que relatam sentir dificuldade na busca por emprego e qualificação,
dificuldades estas por serem egressos do sistema penitenciário. Em um dos relatos os autores
trazem a história de uma mulher de 54 anos, egressa do sistema prisional que foi demitida
após seu chefe descobrir seu passado como detenta, tendo que para sobreviver entrar pro
mercado de trabalho como trabalhadora informal.
Um segundo depoimento na matéria, de um homem de 64 anos, também egresso do
sistema prisional, traz os aspectos positivos da oportunidade de entrar em contato com
atividades educacionais. O homem que atende pelo nome artístico “Krick Cruz” em seu
tempo no presídio Carandiru, formou uma banda carcerária com colegas do mesmo pavilhão,
e entende que a combinação de educação e cultura a qual pode experienciar naquele momento
de sua vida teve um aspecto positivo na sua ressocialização e na forma como conseguiu
encontrar novas perspectivas após a saída (SILVA et. Al, 2015).
O ex apenado entendendo o aspecto positivo da experiência na sua vida hoje comanda
um espaço cultural para jovens na Vila Missionária, na Zona Sul de SP: o "Espaço Cultural
2C – Fomento à cultura na periferia", e relata: "Há muita dificuldade pelo estigma de ser ex-
presidiário. A pessoa cumpre [a pena], sai e vai procurar emprego de alguma forma, quer
mudar de vida, sair dessa vida. E, pensando nessa dificuldade, a gente começou a pensar em
um plano de ajuda.".
Sobre isto, como conclusão deste bloco cabe citar na íntegra um trecho do trabalho de
Capeller (1985, p.132) acerca da perspectiva ressocializadora:
(...) Como pressupor que o indivíduo que está preso possa ressocializar se e ser
reintegrado ao sistema produtivo se não há a menor possibilidade de que aprenda um
ofício e possa trabalhar no interior do sistema penitenciário? Como pensar em dar
trabalho ao homem encarcerado, (...) se não há trabalho para os indivíduos que não
cumprem pena, se o desemprego é absoluto? Como colocar em funcionamento real a
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perspectivas sobre fatores da educação que podem mudar a realidade do apenado enquanto
mesmo este cumpre a pena.
Em trabalho anterior, o mesmo autor já seguindo esta linha de pesquisa, relembra que
a possibilidade de ler e escrever de forma não a apenas decifrar o código do alfabeto romano,
permite autonomia ao reeducando, uma vez que este não se encontrará mais em situação de
dependência direta de outrem para escrever suas cartas, ler seu processo e outros documentos,
como bilhetes, informes ou simplesmente regras. Isto significa não apenas autonomia, mas
também liberdade e privacidade.
Onofre (2011) também chama a atenção para o aspecto humanizador que a educação
tem na vida do apenado, quebrando um pouco o padrão diário de desumanidade. Quando
subjugado a uma estrutura autoritária, de rotina rígida, com o controle exercido sobre todos e
os mais mínimos aspectos do dia a dia, o autor entende que vai haver em diferentes graus
assimilação da cultura carcerária. Este viver lentamente pode atuar de forma pungente para a
deterioração da identidade da pessoa, e a desadaptação da vida livre, que é obviamente o
oposto do que se deseja.
Um adendo aqui que faz a literatura e cabe a fala, é que como salienta Onofre (2011),
a escola neste ambiente institucionalizado não está livre da “imagem forjada de
comportamentos” que estes indivíduos precisam adotar para sobreviver no meio repressivo
em que se encontram, e que a frequência as atividades escolares pode ser justificada sim do
mero desejo de aprender, mas também da possível busca de benefícios, como um parecer
positivo em exames criminológicos, a possível alteração de seu tempo de estada na prisão, ou
a possível passagem para um regime semi aberto, o mesmo valendo para a situação do
trabalho. Vale a consideração: o movimento para saída de um estado de letargia, em prol de
mudanças positivas, mesmo que a remição e a conquista de alguma liberdade de movimento
já não é alguma busca por uma mudança?
Certamente, como relembra Julião (2009), o trabalho e a educação são duas categorias
que fazem parte da ressocialização e da reinserção social, e que podem e devem estar
articulados, entendendo que as medidas socioeducativas devem capacitar os trabalhadores
para o atual mercado. Contudo, é importante entender, se este trabalho está ligado apenas ao
desgaste físico, ou se há o estímulo também do aspecto intelectual.
Outro fator de questionamento acerca do trabalho no cárcere são as condições de fato
deste trabalho. Obviamente existem disposições legais e éticas sobre a remuneração 1,
1
Existe debate sobre a adequação da remuneração dos presos no Brasil, pois seu trabalho não está sujeito ao
regime CLT, prevendo a legislação específica que a remuneração não pode ser inferior a três quartos do salário
29
5. Considerações Finais
5.1. Os dois lados de uma moeda: o relato do aluno, o relato do professor e as suas
complementaridades
32
6. Referências Bibliográficas
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2.848, de 7 de dezembro e 1940. Código Penal. Disponível em:
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_______. Presidência da República, Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n°
7.209 de 11 de julho de 1984. Altera dispositivos do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro
de 1940 - Código Penal, e dá outras providências. Disponível em:
<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1980-1988/l7209.htm>. Acesso em 4 de dez. de
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_______. Presidência da República, Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n°
7210 de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: <
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm>. Acesso em 4 de dez. de 2022.
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2014/2011/decreto/d7626.htm#:~:text=DECRETO%20N%C2%BA%207.626%2C%20DE
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_______. Presidência da República, Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n°
12.433, de 29 de junho de 2011. Altera a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de
Execução Penal), para dispor sobre a remição de parte do tempo de execução da pena
por estudo ou por trabalho. Disponível em:
<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12433.htm>. Acesso em 4
de dez. de 2022.
_______. Presidência da República, Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n°
12.714, de 14 de setembro de 2012. Dispõe sobre o sistema de acompanhamento da execução
das penas, da prisão cautelar e da medida de segurança. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/L12714.htm>. Acesso em 4
de dez. de 2022.
_______. Presidência da República, Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei n°
12.852, de 5 de agosto de 2013. Institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos
dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema
33
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. 1ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.
__________. Pedagogia do oprimido, 17ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
SILVA et. Al. Com 322 encarcerados a cada 100milhabitantes, Brasil se mantém no 26°
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Disponível em: <https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2021/05/17/com-322-
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paises-que-mais-prendem-no-mundo.ghtml>. Acesso em 12 de novembro de 2022.
STJ. Superior Tribunal de Justiça – Agravo regimental no habeas corpus. Postal JusBrasil,
2020. Disponível em: < https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/1172222209> Acesso
em 10 de agosto de 2022.
35
cela, todo mundo tem que ser bem asseado, não pode ser sujo. Mesmo por que os
companheiros não deixam, não pode, isso em delegacia. Agora em presídio é mais amplo, no
presídio você pode dormir o dia todo se quiser, e passar a noite acordado. Eu preferia na parte
da manhã, como é o presídio a porta era aberta. Eu preferia fazer um esporte, a de tarde eu
estudava na escola que tinha dentro do presídio e de noite eu ficava lendo a bíblia.
Igor: A próxima pergunta ia ser até sobre isso, se tinha algum projeto de educação lá no
presídio.
José: Tinha, por que... Assim, nós tínhamos uma ONG, um grupo de pessoas, não sei eram
católicos ou evangélicos, não lembro. Mas tinha essa parte da educação e a gente fazia... Nós
íamos para uma sala de aula com séries mistas né. E a gente recapitulava algumas coisas que
tínhamos aprendido. Isso tomava um pouco do nosso tempo né, passava o tempo melhor. A
gente fazia isso de 14h às 16h, era legal.
Igor: Mas você ia para essas aulas por que gostava ou por algum interesse?
José: Não, gostar eu gostava, por que eu encontrava com pessoas diferentes e a cada 3 dias
que você ia fazer isso (estudar) você ganhava um dia. Então também já era uma coisa que eu
gostava, mas tinha essa condição então eu fiquei indo.
Igor: Entendi. Você ficou mais ou menos quanto tempo lá? Desde quando entrou?
José: É os cinco anos.
Igor: E essa experiência você gostava né?
José: É. Por isso quando no ENCCEJA eu via as matérias, linguagens, códigos e suas
tecnologias, vi ciências da natureza, ciências humana, matemática. Eu a falei “pow eu me
lembro disso aqui (risos)”.
Igor: Bom, você disse que era uma ONG, mas tinha alguns dias específicos? Horário? Como
funcionava essa questão?
José: Tinha dias e horários, não era todo dia. Vamos dizer que era umas ou duas vezes na
semana. Aí recapitulava algumas coisas, aprendia outras. Eu lembro muito vago, eu lembro
que falamos de planalto, planície. Nunca gostei muito de física (risos), não compreendo muito
dessas fórmulas aí, essas matemáticas lógicas. Mas gostava muito de história, geografia,
gostava muito disso, me chamava atenção. Nós falávamos de imigração dos italianos, dos
japoneses no Brasil, falávamos do café, das indústrias, dos países industrializados, da segunda
guerra. Essas coisas eu acho maneiro.
Igor: Além dessas matérias pré estabelecidas, vocês tinham algum debate de algumas coisas
que aconteciam no mundo, naquele momento?
38
José: Não
Igor: Não? Apenas a matéria né!
José: É, era... Nós estávamos em lugar onde tinha quase mil presos, e nem dez pessoas iam.
Igor: Então essa questão de debater de coisas que acontecia, não rolava né?
José: Não, não.
Igor: Qual a visão que você tinha dos educadores lá dentro?
José: Pow, os caras queriam ajudar né, de alguma forma. É... Queria te ver se tinha alguém
preparado para fazer um ENEM, perguntavam se tinha alguém estudado, se dava pra trazer
histórico, essas coisas assim. Os caras eram legais, mais aí depois paravam um pouco, as
coisas
eram meio complicadas. Pra você ver, até pra fazer uma biblioteca na cadeia é difícil, a pessoa
fala, fala, fala, mas pra fazer é difícil. Eu lembro que fizeram uma biblioteca no Bangu 3,
quem
fez a biblioteca lá foi meu pai. Montou a biblioteca, teve uma reportagem e tudo da
bandeirante, às vezes tem pessoa lá que quer. Tem vezes que tem pessoas lá que nem
cometeu crime sabia? Lógico, tem muita gente lá culpada, mas tem muita gente que tá
pagando um crime que não cometeu. E tem pessoas muito bem instruídas lá, escreve bem, lê
bem é inteligente nas palavras. Tem pessoas muito inteligentes lá, não tem só pessoas
ignorantes na cadeia não, na cadeia você conhece todo tipo de pessoa.
Igor: E como era essa relação do detento com o educador?
José: Era sempre com muito respeito. Era sim senhor, não senhor, tinha uma regra de uma
distância, era muito rigoroso. Não era nem pela questão policial, a questão era entre presos. É
uma regra! Uma distância entre o visitante e o detento. Tive um professor, que deu aula por
um período no presídio. Ele contava que no começo, tinha um muito de medo. Não pelo fato
de receber algum ataque dos presidiários, até por que ele se sentia muito respeitado a todo o
momento. Mas sentia medo por situações externas. Por exemplo, teve uma vez que ele estava
dando aula e um telefone tocou, no primeiro momento ele pensou que era o dele, mas não era,
pois ele tinha deixado o celular na revista. Aí ele percebeu que era de um detento, então ele
tinha medo dessas situações. De alguém ver e achar que ele estava ajudando, ou caso essa
história chegasse aos ouvidos dos policiais, os detentos acharem que foi ele quem falou.
Igor: Quando você saiu e decidiu voltar a estudar, foi por conta própria ou teve incentivo de
alguém?
José: Na verdade... Eu não preciso nem contar a minha história de vida, por que você já
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conhece. Mas quando saí e quando comecei a refletir, vi que o caminho que eu estava
tomando era um caminho de duas vias. Eu ir pra cadeia e sair de lá velho, passar meu tempo
todo de homem maduro ou ia morrer. Eu tinha minha filha Eduarda, minha filha Edilene já
estava pra nascer. Ainda estava meio drogado, mas uma coisa diferente aconteceu comigo.
Inclusive no Maracanã, uma vez escutei uma voz no Maracanã, em 2007 isso. Estava vendo o
jogo fluminense x cruzeiro, fluminense x vasco, não me lembro agora. Foi em um dia de
domingo, tinha usado cocaína de terça a sábado, o jogo foi no domingo, eu tinha dormido
muito pouco e me chamaram pra ir ao Maracanã. E lá eu escutei uma voz falar comigo “Ou tu
deixa das suas práticas ou vou permitir que você desça a sepultura”, aquilo ficou, eu sabia que
tinha sido algo diferente, mas não sabia o que era ainda. Aí perguntei aos dois amigos que
estavam comigo, se eles tinham falado alguma coisa e eles disseram quem não. Então falei pra
eles “olha, não vou mais roubar, não vou mais fumar, não vou mais traficar, não vou fazer
nada de errado não. Vou mudar minha vida”. Eles riram pra caramba da minha cara, mas eu
sentia que tinha algo diferente em mim. Aquele dia foi um dia especial na minha vida, foi o
dia que tive a consciência que eu precisava mudar. Por que cara, eu acho que o ser humano é
privilegiado por isso. Por que o ser humano pode mudar, ele pode mudar seus atos, suas
atitudes, seu jeito de falar, seu jeito de pensar. O ser humano é um ser racional, e quando o ser
humano analisa e ver que o caminho que tá tomando não é o certo, não está correto como tem
que ser diante de uma sociedade, diante da sua família, eu acho que ele tem todo o direito de
mudar. E eu decidi mudar, eu aceitei Jesus, a gente tem que mudar. Não adianta você “mudar”
fazendo as mesmas coisas, falando as mesmas coisas, tendo as mesmas atitudes. Isso não é
mudança, e quando eu resolvi mudar, percebi que precisava melhorar como pai, como marido,
como filho, como irmão, tinha que melhorar como pessoa. Então falei “como fazer essa
mudança?” Ah, então se eu fumava, não fumo mais, se eu bebia eu não bebo mais, se eu
traficava eu não trafico mais. Eu decidi mudar totalmente. Então a primeira coisa que fiz foi
procurar um emprego. Porém não tinha experiência de trabalho, mas mesmo assim corri atrás.
Eu trabalhei primeiro informalmente. Você deve lembrar quando eu carregava as compras no
mercado.
Igor: Sim, sim. Eu lembro.
José: Depois fui trabalhar nas kombi, mas aí eu pensei que precisava melhorar. Então fui atrás
de tirar uma carteira “D” de motorista, fui trabalhar com caminhão e falei “vou melhorar, vou
trabalhar com ambulância”, mas trabalhar com ambulância, preciso fazer um curso de veículo
de emergência, curso de resgate, de APH. Então isso vai somando pra pessoa melhorar. A
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partir do momento que você aprende, conhece novas pessoas, você tem novas ideias. Então
por que não voltar a estudar, mas pensei em como eu ia estudar se tinha que trabalhar, tinha
que sustentar uma família e qual tempo ia ter pra isso. Então fui procurar, aí vi a oportunidade
do ENCCEJA, por que com o ensino médio eu teria portas abertas. Até as empresas de
ambulância pedem ensino médio, você sabia? Tem que de APH (Atendimento Pré
Hospitalar),
tem que ter curso veículo pré emergência. Então procurei melhorar, para poder atingir meus
objetivos. Aí fiz o ENCCEJA, fiz em 2017, passei até com uma boa nota. Mas pra isso eu
fiquei
igual um doido aqui em casa, “comia” apostila deste tamanho (indicando que era uma apostila
grande). Estudando dia e noite, levava pro trabalho. Não pedia ninguém pra fazer nada não,
era eu lendo, eu e Deus na frente. Então consegui passar. Logo depois pensei “poxa, se
consegui passar, por que não posso fazer uma faculdade? Se eu tenho facilidade em
aprender”. Ai como sou atraído por turismo, precisaria de uma segunda língua, então estou
terminando o espanhol. Cada vez que você procura aprender, sua mente abre mais. Então é
por isso que acho importante as pessoas estudarem. Por isso falo para minhas filhas
estudarem, por que estudar importa, por que o estudo abre portas. Se quer uma vida melhor,
então estuda, tenha uma boa profissão, pois é assim que a gente consegue crescer. Eu sempre
gosto de aprender, aprender é muito bom. Quando você aprende, começa a enxergar os erros.
Se eu não tivesse largado meus estudos, como larguei lá em 1983, hoje eu já estaria formado e
aposentado. Se eu me atento pelos cursos que já fiz, quando jovem, hoje eu estaria
aposentado. Mas não quis isso, mas por que o ser humano é produto das suas próprias
escolhas. Um dia eu escolhi mal pra mim, agora estou escolhendo melhor. Tem pessoas que
não conseguem perceber essas coisas. Mas aí quando falam “ah, mas por que você ficou
viciado em drogas? Por que virou assaltante? Por que virou traficante? Por que era pobre era
isso?” Vivia em um barraco na ribanceira do morro, com quatro irmãos, em um barraco de
quatro cômodos com quatro/cinco pessoas. Isso não é desculpa pra ninguém, isso não pode
ser desculpa. Hoje eu aprendi que não pode ser o lugar que moramos que vai determinar quem
eu sou, hoje aprendi que não é o salário que recebo que vai determinar
onde vou chegar e o que vou fazer. Meus sonhos, meus projetos não podem estar definidos
pelo local geográfico de onde eu moro, nem pela situação financeira que eu tenho. Agora eu
consigo enxergar isso, antes não conseguia. Eu pensava “sou moleque aqui do morro mesmo,
tenho meu barraquinho. Vou entrar pra boca e ganhar dinheiro”. Quando a vida é mais que
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isso, aí às vezes eu olho esses garotos de hoje em dia e penso “caramba, eu vivia no mesmo
erro”. Mas tinha uma diferença, eu não tinha ninguém pra dizer que aquilo era errado, nunca
tive. Hoje eles têm, hoje minhas filhas tem. Essa é a grande diferença, hoje os pais estão mais
preparados pra cuidar dos filhos. Não tô falando de questão cultural, não tô falando de grau de
escolaridade. Por que todas as pessoas, mesmo que simples, hoje tem muita informação de
como criar filhos. Se você tem um filho, se você quer criar bem seu filho, você faz um curso
de psicologia da família, isso agrega, você tem a bíblia sagrada que te ensina a cuidar do filho.
Estou falando disso independente de religião, então os pais de hoje têm mais informação que
os pais de 30/40 anos atrás. Hoje o jovem... Porque as crianças de hoje nascem com olhos
aberto? Antes as crianças
nasciam, ficavam com os olhos fechados, demoravam sete dias pra abrir os olhos. Aí o pai
pensa “eu era esperto quando criança”, mas os filhos são muito mais espertos que ele, por
causa da informação. Você pega um negócio desse (celular) e dá pra uma criança de 1 ano e 8
meses, ela liga e vai direto pro youtube. Coisa impensável na minha época. Pegar um celular?
Não sabia nem ligar um rádio quem dirá um celular. Então a informação hoje tá muito legal,
mas quando você consegue perceber isso? Quando você decide mudar a sua vida. A época do
presídio, do vício ficou no passado. Eu tenho que viver a partir do momento que eu decidi
mudar pra sempre e buscar o melhor e aprender com os erros. Não que eu não vá errar agora,
lógico que vou. Mas eu tenho que aprender com meus erros. Bom seria se eu aprendesse com
os erros dos outros, mas de vez em quando temos que aprender com a própria carne. E a vida
é assim, acho que a gente sempre tem que buscar aprender alguma coisa, não podemos ficar
estacionado.
Igor: Em qual lugar você acredita que mais aprendeu?
José: Cara, questão... É complicado falar. Tenho uma concepção de vida agora pautada no
cristianismo, no braço evangélico. E eu sei, tenho certeza que a bíblia fala de tudo, te ensina
muita coisa. Mas eu vou dizer uma coisa pra você, eu aprendi muito ainda antes de aceitar
Jesus. Antes de aceitar Jesus, eu aprendi uma parte, agora eu estou aprendendo outra parte.
Não que todas as pessoas que conheci fossem mais. Não é isso, eu aprendi coisas boas até
quando fiz coisas erradas. Mas hoje com a consciência melhor, com um entendimento melhor,
uma percepção melhor das coisas da vida, pessoas, locais. Eu digo que agora eu aprendo mais,
por que agora, além de estar aprendendo como lidar com as pessoas, também estou
aprendendo a não ferir as pessoas, não magoar tantas pessoas. Quando antes eu não ligava
muito pra isso, hoje tenho mais preocupação de não decepcionar tantas pessoas. Não por que
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quero me achem bonzinho, não é isso, é por que isso me faz bem. Isso me faz bem, isso me dá
forças pra continuar fazendo isso, as pessoas agora podendo me olhar e poder dizer “Pow
cara, o José é um bom pai, José é um bom esposo. Eu sei José não era assim, mas hoje ele tá
melhor que aquele cara no passado”. Então quando a gente faz uma pergunta de qual tempo
que você aprendeu mais, o tempo que aprendei mais vai ser sempre o agora, vai ser o amanhã.
Por que cada dia a gente aprende e a gente nunca vai cessar disso. O aprendizado é pra vida
toda e cada fase da nossa vida a gente aprende coisas novas, e acaba que ficamos melhores. A
bíblia “o sábio que aceita conselho se faz mais sábio, mas o sábio que não aceita conselho ele
é comparado ao um tolo”, então aquele que aprende e procura saber um pouco mais, esse cara
é bom, é um cara que vai ter uma posição boa, uma fala boa, um pensamento bom, uma
atitude boa. Sabe, uma dinâmica boa dentro da situação.
Igor: O que a educação significa pra você?
José: Pow cara, vou dizer pra você. A educação é mais que oitenta por cento, vou falar pra
você, uma pessoa ignorante é terrível, é terrível. Você olhar e vê que a pessoa não é uma
pessoa má, mas é uma pessoa ignorante. Você que a pessoa não teve a condição de
aprendizado, você ver que o modo de se expressar da pessoa é um modo rude. Então a
educação trás muito benefício a sociedade, a educação faz com que a pessoa seja mais
amável, não só nas suas atitudes, mas no jeito de falar e de empregar as palavras. Por que
quando você vê uma pessoa ignorante, a pessoa ignorante é diferente da pessoa burra. Uma
pessoa ignorante é aquela pessoa que não aprendeu mesmo, agora pior é quando é aquela
pessoa que conhece e mesmo assim não assimila aquilo, não pratica aquilo, essa é uma pessoa
burra. Sabe o que é certo, sabe o que é correto, mas não faz. Então a educação pra mim é mais
de oitenta por cento da uma pessoa, a educação molda a pessoa. Se ela for educada de uma
forma certa, além de tratar as pessoas bem, ela vai somar. É que nem eu falo, nós seres
humanos queremos saber sempre quais são nossos direitos, nós somos craques nisso. Que
tinha que ser assim, tinha que ser assado, tinha que fazer aquilo, tinha que fazer aquilo outro,
mas quando chega aos deveres do ser humano uma pessoa bem instruída vai assimilar melhor
isso. Por que se eu não faço meus deveres, não posso cobrar os meus direitos. Se eu te trato
bem o mínimo que eu espero de você é que me trate bem, mesmo que você não goste de mim.
Se eu te tratei com educação o mínio que você tem que fazer é me
tratar a mesma maneira. Então às vezes os seres humanos tem dificuldade disso, agora tem
gente que tem essa dificuldade por que é ignorantes, mas como eu disse, tem outros que são
burros mesmo. Então a educação é essencial.
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Igor: Você chegou até comentar, mas eu vou ter perguntar. Você acredita que se você tivesse
estudado no tempo “certo”, poderia ter ajudado a fazer as coisas diferentes?
Jose: Eu creio sim. Cara, quando eu converso com as minhas filhas, sempre falo com elas. Se
eu tivesse estudado desde 1979, quando eu entrei na sala de aula, se eu venho estudando de lá,
me formo. Hoje a nossa vida estava diferente, nem estou reclamando da minha vida, eu acho
até que eu vivo com muito conforto dentro das minhas limitações. Eu vivo com muito
conforto
graças a Deus. Aqui em casa não falta comida, tenho minha casa, é dentro da comunidade,
mas é minha casa, tenho meu carro, tenho meu trabalho, tenho meus filhos minha esposa,
meus filhos me respeitam. Então eu vivo uma vida boa dentro das minhas condições, mas se
eu venho estudando desde quando eu fui matriculado, eu creio que eu poderia estar muito
melhor, pois eu tive muita oportunidade quando jovem. Eu servi o exército, eu ia fazer prova
pra cabo, hoje eu poderia ser um segundo sargento já me aposentando, por que já faz trinta
anos que servi o quartel. Hoje estaria com uma vida estabilizada, hoje estaria curtindo minha
vida ao invés de tá trabalhando só, ou curtindo e trabalhando. Então com certeza as coisas
seriam diferentes, não tenha dúvida disso. Mesmo eu sem estar reclamando da minha vida
hoje, sou muito feliz com minha esposa, minhas filhas, meu trabalho. Eu trabalho no que
gosto, mas com certeza seria diferente, com certeza.
Igor: Você acha que a vida foi justa com você?
José: O que é a vida justa? Eu não posso dizer que não tive oportunidade, eu não posso dizer
isso, eu não posso falar que eu fui daquele jeito por causa da sociedade, eu não posso falar
isso. Por que, minha mãe não me matriculou na escola, mas teve uma senhora que matriculou
quando eu tinha sete anos de idade. Eu parei de estudar, fui pra FUNABEM, fiz vime (trançar
cadeirinha de palha), fiz artes cênicas, eu pintura a pistola. Nunca quis isso, fiz, mas nunca
exerci isso, a vida me deu oportunidades, colocou pessoas no meu caminho, mas eu não
aproveitei. Trabalhei na secretária da fazenda, secretária de educação e cultura, me
mandaram fazer um curso no SENAIS, fiz de carpintaria, me mandaram pra empresa pra
trabalhar eu quis? Não! A vida me deu oportunidade, fui pro exército, era um dos três
melhores soldado do quartel, no meu segundo ano eu ia fazer prova pra cabo aí me tiraram e
colocaram o “peixe” do outro coronel, aí o outro coronel me disse que pra ficar que no ano
seguinte eu faria, eu quis? Não! A vida me deu oportunidade cara, na minha vida inteira eu
que não quis aproveitar. Como eu posso dizer que a vida foi injusta pra mim, se eu não quis.
Agora se eu aproveito e tal, aí acontece uma coisa ao contrário eu poderia dizer. Mas eu não
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posso dizer pra ninguém que Deus não me deu oportunidade, que a sociedade não me deu
oportunidade, que eu fui um pobre coitado da comunidade, não posso falar isso. Quando eu
falo no meu testemunho, eu falo que tive oportunidade, mas que nunca aproveitei. As
oportunidades que nós temos, são únicas, às vezes vêm uma, duas, três, quatro, cinco
oportunidades, mas cada uma delas é única e elas têm uma velocidade, elas passam muito
rápidas. Se nós não aproveitarmos, ela passa e passou. Só outra agora, igual àquela, não volta
mais. Ela tem uma dinâmica, a vida é rápida, na vida você pega agora por que quando você
pegar depois já não é a mesma coisa que pegasse lá na frente. Perdeu essa oportunidade da
frente, pega essa de trás. Não estou dizendo que é tarde, pois nunca é tarde pra nada. Mas
quando mais rápido nós pegamos o timing das oportunidades, melhor. Quando eu dou palestra
pra jovens eu falo “Olha, Deus vai apresentar pra vocês oportunidades. Vocês têm que ter esse
discernimento de aproveitar essas oportunidades. Por que quando passa aquela oportunidade
não volta mais” e eu não aprendi isso vendo os outros, eu passei, porém não aproveitei. Eu fui
aproveitar uma oportunidade de Deus com trinta e cinco anos, aí eu resolvi mudar minha vida,
com trina e cinco anos. É tarde? Não, nunca é tarde pra mudar pra melhor, mas eu poderia ter
feito isso antes. Então eu não posso culpar a vida, não posso culpar o destino, não posso
culpar a sociedade, não posso culpa meu pai e minha mãe. Não me vejo em condições disso.
Igor: Pra finalizar, uma última pergunta. O que você deseja alcançar e quais são seus sonhos?
José: Eu tenho vários sonhos, tenho muitos sonhos. Não sei se vou chegar em todos, mas em
algum lugar eu vou chegar. Vou te contar primeiro dos meus projetos pessoais, quero terminar
meu espanhol, quero fazer uma faculdade de turismo. Pós isso, quero depois parar de
trabalhar com ambulância e trabalhar com turismo, mas paralelamente a isso quero ver
minhas filhas formadas, é um sonho meu. Eu tinha um sonho, ainda tenho que é de colocar
minhas filhas pra estudar em colégio particular, mas não pude. Agora quero colocar pra fazer
inglês. Coloquei a Eduarda, ela não quis. Vou colocar a Edilene, em janeiro se Deus quiser a
Edilene tá no inglês, quero ver elas formadas, quero ser um pastor de Jesus, quero ser um
pastor da igreja de Cristo. Quero ganhar alma pra Cristo, quero ver meus filhos melhores,
quero me mudar daqui. Eu tenho planos, quero comprar mais dois barraquinhos e colocar pra
alugar com essa aqui mais o de baixo. Meter o pé, projetos, planos eu não sei se vai acontecer
tudo na íntegra. Mas vai acontecer alguma coisa, eu não vou ficar da mesma maneira que
estou. Por que os sonhos... nem todos os sonhos vão ser concluídos na íntegra, mas em algum
lugar a gente vai chegar. Que não vai ser esse lugar que estamos agora, então por isso é
importante sonhar, sonhar é tudo. Pessoas que não tem sonho não tem projetos, não tem
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desejo de viver, tem que te sonhos, tem que ter objetivos, tem que ter planos. O ser humano é
movido por sonhos, planos e objetivos. Por que as pessoas entram em depressão? Por que
deixam de sonhar, deixam de acreditar, deixam de produzir um pensamento de mudança e
crescimento. As pessoas não querem mais projetar, então elas se trancam na sua casa, no seu
quarto. Não querem falar mais com ninguém, não querem comer, não querem beber, não
querem sair do quarto, por que perderam os sonhos, perderam os projetos, perderam o sentido
da vida. Se eu parar de sonha vou ficar parado aqui olhando pra televisão, nem vou olhar pra
televisão, por que a televisão é um vendedor de sonhos, vou desligar a tv. O ser humano tem
que sonhar, tem que projetar, pra viver, o ser humano vive através de propósito e o ser
humano sempre pode melhorar, esse é o timing. É buscar a melhora todos os dias, é o que eu
falo, a bíblia fala tudo. Nós estamos e um versículo que tá em Ósseas 6, 3. Só a primeira parte
diz “conhecemos e prossigamos em conhecer ao Senhor”, que é isso? É uma busca do
conhecimento sem cessar, um conhecimento contínuo. Conhecer Jesus é como a vida, é você
ter sonhos, ter projetos, ter objetivos, buscar a cada dia melhora como ser humano, como pai,
como amigo, como pessoa. É o tempo todo você buscar uma mudança, a vida é assim, a vida
é rápida, a vida é ligeira e a cada dia a vida parece que está mais vida. Você olha aqui,
quantos amigos seus já faleceram? Amigos que cresceram com você, nasceram na mesma
geração que você e que hoje já não estão aqui. Essa é a vida rápida, mas cada uma trilha a sua
vida e sua história. Mas cada um de nós podemos mudar a nossa história, isso que é
interessante do ser humano. Se você pegar um macaco, um peixe, eles têm a vida pé
determinada. O peixe nasceu pra nadar e vai respirar só ali, é ali que o peixe via ficar. Eu não,
eu posso ir ali onde o peixe está e posso estar aqui.
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Igor: Boa tarde professor, primeiramente, você pode falar um pouco da sua experiência na
área de ensino:
B.: Sou professor de Geografia na rede pública estadual e municipal de ensino, e já atuo a
mais de 15 anos na área da educação.
Igor: Na educação em presídios, a quantos anos o senhor atua como professor?
B.: Atuo atualmente já a 5 anos no sistema prisional.
Igor: Como chegou a este cargo e como é o seu cotidiano como professor no sistema
prisional?
Deste ponto em diante da conversa o professor ficou livre pra falar da sua experiência,
como chegou ao cargo, como é o seu cotidiano como professor no sistema prisional, e sua
visão da importância e dificuldades deste processo
B.: Primeiramente este é um tema muito denso, muito complexo, e é do interesse de todos
enquanto sociedade, a educação e ressocialização do preso. Eu como professor faço parte de
um processo de ressocialização, de construção de um conhecimento crítico nas escolas de
presídio, mas o processo em si é do interesse de todos.
O nosso trabalho lá infelizmente é baseado na experiência aqui de fora. O ingresso até têm um
concurso específico para DIESP (Diretoria Especial de Unidades Escolares Prisionais e
Socioeducativas), onde eu sou lotado, mas também tem possibilidade de ingresso por
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transferência interna entre coordenadorias. Têm o concurso específico, mas nós não temos
uma formação específica para o trabalho em unidades prisionais, o que eu considero um
obstáculo para nossa atividade docente lá. As formações ainda são muito superficiais, muito
escassas, e o acolhimento se da muito por conta dos colegas e equipe da escola, mas não há
uma formação sólida pra trabalho nestes ambientes, que é muito necessário.
Embora nossa visão sobre os alunos seja a mesma dos que estão aqui fora, o objetivo, o
trabalho e a linguagem são bastante específicos. Eu por exemplo, apesar de só trabalhar a 5
anos no sistema prisional, comparando com colegas que estão lá a muito mais tempo que eu,
tenho uma carga horária extensa, devido a carga lá sendo reduzida, eu acabei trabalhando em
muitas escolas pra poder suprir e em várias unidades, e tive neste ponto de vista uma
experiência benéfica, embora nossa luta seja se manter em uma escola só, mas no meu caso,
isto abriu muitos horizontes, e me trouxe a fazer muitas pesquisas e especializações.
A minha formação quando entrei no sistema não existiu, nós contamos com a ajuda uns dos
outros, dos nossos próprios colegas. Aqui no estado (referindo se ao estado da região sudeste
em que leciona), nós sabemos que existem grupos, facções, e estes grupos tem
particularidades. Uma unidade que acolhe determinado grupo, vai diferir bastante de outro
grupo, e nós aprendemos a lidar com essa diversidade no dia a dia, mudando assuntos,
palavras e comportamentos de um grupo para o outro, a gente vai se adequando, não tem uma
formação que nos prepare pra isso, nós nos preparamos entre nós mesmos sem suporte do
estado. A educação no sistema prisional na minha visão exigiria mais formação, pra exercer
um trabalho de qualidade.
B. Um outro tópico que eu gostaria de destacar, e acho que a sociedade deveria estar mais
antenada neste assunto, é sobre a visão que o professor tem sobre seu aluno. O professor
enxerga um aluno como um aluno,