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Basílio Patrício
Resumo
Universidade Rovuma
2022
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Basílio Patrício
Resumo
Universidade Rovuma
2022
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Índice
1. Introdução...............................................................................................................4
8. A sociedade do descontrole..................................................................................21
22. Conclusão..........................................................................................................49
1. Introdução
O ser humano é “ser de relação”, dizia Paulo Freire. Um ser caracterizado pela sua
“incompletude”, pelo seu “inacabamento” e pela sua condição de “sujeito histórico”. Os
seres humanos “estão sendo”, são “seres inacabados, inconclusivos”. Seres situados em
e com uma realidade que, sendo igualmente histórica, é tão inacabada quanto eles, por
isso passível de mudança, de transformação.
O diálogo é condição para o conhecimento. O ato de conhecer se dá em um processo
social, e é o diálogo o mediador desse processo. Para o pensamento freiriano, ele se dá
sob algumas condições.
Ele não existirá sem uma profunda relação amorosa com o mundo e os homens. Quem
tem amor à vida, aos seres humanos, ao mundo, busca o diálogo na esperança de
encontrar caminhos para a mudança e a construção de novas realidades. Não se trata de
uma relação amorosa ingénua ou piegas, limitada a uma manifestação de sensibilidade
ao problema, a uma ajuda temporária, que não transforma. Paulo Freire fala de uma
relação amorosa que implica comprometimento com a promoção da vida. Refere-se a
um amor “armado”, para que a esperança na mudança, a esperança na possibilidade de
construir um mundo melhor, mesmo em condições adversas, não se esmoreça e alimente
o permanente diálogo e compromisso.
Outra condição que a relação dialógica impõe é a humildade. Não haverá diálogo entre
educador e educando quando aquele se reconhecer como o único a possuir saber e este
como o que deverá recebê-lo. A humildade está presente no educador que se reconhece
ser incompleto e inacabado (tendo sempre, portanto, algo a aprender) e reconhece que o
educando também é portador de conhecimento, tendo, nesse sentido, algo a ensinar.
A pronúncia do mundo, com que os homens o recriam permanentemente, não pode ser
um ato arrogante. O diálogo, como encontro dos homens para a tarefa comum de saber
agir, rompe-se, se seus pólos (ou um deles) perdem a humildade. Como posso dialogar,
se alieno a ignorância, isto é, se a vejo sempre no outro, nunca em mim? (Paulo Freire,
1981, p. 94 e 95).
A fé nos seres humanos é outra exigência da dialogicidade. “Fé no seu poder de fazer e
de refazer. De criar e recriar. Fé na sua vocação de Ser Mais” (Paulo Freire, 1981, p.
95). Está aberto ao diálogo aquele que entende o ser humano como sujeito histórico,
capaz de agir no contexto em que vive e construir novas realidades. Dialoga aquele que
sabe da capacidade de o ser humano rever-se, reinterpretar-se, de “renascer”, de
aprofundar a compreensão sobre seu estar sendo no mundo e sobre seu próprio mundo e
transformá-lo.
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Além do amor ao mundo e aos homens, da humildade e da fé, Paulo Freire fala-nos da
necessária confiança e esperança para a relação dialógica se concretizar.
Sem a esperança, que nos estimula, dá sentido, movimenta nossas ações em direção ao
projeto com o qual sonhamos, não pode haver diálogo.
Se o diálogo é o encontro dos homens para Ser Mais, não pode fazer-se na
desesperança. Se os sujeitos do diálogo nada esperam do seu quefazer já não pode haver
diálogo. O seu encontro é vazio e estéril (...) Finalmente, não há diálogo verdadeiro se
não há nos sujeitos um pensar verdadeiro. Pensar crítico.
(...) Este é um pensar que percebe a realidade como processo, que a capta em constante
devenir e não como algo estático (Paulo Freire, 1981, p. 97), que a entende como
construção histórica e social, por isso, mutável".
Não é possível, para Paulo Freire, que a leitura de mundo seja esforço intelectual que
uns façam e transmitam para outros. Ela é uma construção coletiva, feita com a
multiplicidade das visões daqueles que o vivem.
Transmitir ou receber informações não caracterizam o ato de conhecer.
Conhecer é apreender o mundo em sua totalidade, e essa não é uma tarefa solitária.
Ninguém conhece sozinho. O processo educativo deve desafiar o educando a penetrar
em níveis cada vez mais profundos e abrangentes do saber. Nisso se constitui uma das
principais funções do diálogo, que se inicia quando o educador busca a temática
significativa dos educandos, procurando conhecer o nível de percepção deles em relação
ao mundo vivido.
É necessário um trabalho permanente para desmontar as bases do poder autoritário, das
relações de desrespeito, do medo, do clientelismo, do patrimonialismo, da
discriminação, enfim, é necessário um investimento em ações continuadas que criem
condições de materialização da democracia e da cidadania no dia-a-dia da unidade
educacional.
Não devemos chamar o povo à escola para receber instruções, postulados, receitas,
ameaças, repreensões e punições, mas, para participar coletivamente da construção de
um saber, que vai além do saber de pura experiência feito, que leve em conta as suas
necessidades e o torne instrumento de luta, possibilitando-lhe transformar-se em sujeito
de sua própria história.
(...) A escola deve ser também um centro irradiador da cultura popular, à disposição da
comunidade, não para consumi-la, mas para recriá-la. A escola é também um espaço de
organização política das classes populares. A escola será então um centro de debate de
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idéias, soluções, reflexões, onde a organização popular vai sistematizando sua própria
experiência. O filho do trabalhador deve encontrar nessa escola os meios de auto-
emancipação intelectual independentemente dos valores da classe dominante. A escola
não é só um espaço físico. É um clima de trabalho, uma postura, um modo de ser.
(PAULO FREIRE, 1991, p. 16)
Um governo comprometido com a gestão democrática investe na formação para a
participação. Para isso, garante orçamento, pois são necessários recursos para elaborar
material didático-pedagógico, para pagar professores que ministrem cursos, para
produzir material de divulgação e visibilidade das ações realizadas, etc., assim como
promover encontros, seminários, conferências para reflexão e troca de experiências.
O Estado contribui para a gestão democrática quando põe a máquina burocrática a
serviço dos sonhos progressistas e emancipadores, reinventando o poder,
democratizando-o, reestruturando a máquina de forma que ela seja meio e não fim em si
mesma.
pode se dar alheia ao contexto do educando, nem o conhecimento pode ser construído
ignorando o saber dos alunos. Daí a importância da leitura do mundo.
Desde seus primeiros escritos, Paulo Freire procurava uma teoria do conhecimento que
possibilitasse a compreensão do papel de cada um no mundo e de sua inserção na
história. Ele estava preocupado em elaborar uma pedagogia comprometida com a
melhoria das condições de existência das populações oprimidas. O conhecimento
construído através do processo educativo, nessa perspectiva, tem a função de motivador
e impulsionador da acção transformadora. O ser humano deve entender a realidade
como modificável e a si mesmo como capaz de modificá-la. Sua pedagogia proporciona
aos educandos a compreensão de que a forma de o mundo estar sendo não é a única
possível. Ela revela como possibilidade tudo aquilo que a totalidade opressora apresenta
como determinação.
Nesse processo de leitura e de releitura do mundo, de leitura e de releitura da palavra,
uma leitura mais crítica do mundo e da palavra forma o sujeito, que constrói uma visão
de mundo e que pode, a partir dessa visão, não apenas vê-lo, entendê-lo melhor, mas
pode, assim fazendo, entender melhor como somos capazes de mudar o mundo pela
nossa acção. Nessa problematização, o educador desafia os alunos para que expressem
de maneiras variadas o que pensam sobre diferentes dimensões da realidade vivida. O
educando dialoga com seus pares e com o educador sobre seu conhecimento, sobre sua
vida. Essas discussões permitirão ao educador apreender a visão dos alunos sobre a
situação problematizada para fazê-los perceber a necessidade de adquirir outros
conhecimentos a fim de melhor entendê-la. No processo de construção do
conhecimento, ele parte sempre de temas relacionados ao contexto do educando e da
compreensão inicial que este tem do problema, para, por meio de um processo
dialógico, da relação entre educandos e educadores, ir ampliando a compreensão dos
alunos, construindo e reconstruindo novos conhecimentos.
O respeito, então, ao saber popular implica necessariamente o respeito ao contexto
cultural. A localidade dos educandos é o ponto de partida para o conhecimento que eles
vão criando do mundo. A partir dela, uma “re-admiração” da realidade inicialmente
discutida em seus aspectos superficiais vai sendo realizada com uma visão mais crítica e
mais generalizada.
O ser humano é “ser de relação”, dizia Paulo Freire. Um ser caracterizado pela sua
“incompletude”, pelo seu “inacabamento” e pela sua condição de “sujeito histórico”. Os
seres humanos “estão sendo”, são “seres inacabados, inconclusivos”. Seres situados em
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e com uma realidade que, sendo igualmente histórica, é tão inacabada quanto eles, por
isso passível de mudança, de transformação.
O diálogo é condição para o conhecimento. O ato de conhecer se dá em um processo
social, e é o diálogo o mediador desse processo. Para o pensamento freiriano, ele se dá
sob algumas condições.
Ele não existirá sem uma profunda relação amorosa com o mundo e os homens. Quem
tem amor à vida, aos seres humanos, ao mundo, busca o diálogo na esperança de
encontrar caminhos para a mudança e a construção de novas realidades. Não se trata de
uma relação amorosa ingénua ou piegas, limitada a uma manifestação de sensibilidade
ao problema, a uma ajuda temporária, que não transforma. Paulo Freire fala de uma
relação amorosa que implica comprometimento com a promoção da vida. Refere-se a
umamor “armado”, para que a esperança na mudança, a esperança na possibilidade de
construir um mundo melhor, mesmo em condições adversas, não se esmoreça e alimente
o permanente diálogo e compromisso.
Outra condição que a relação dialógica impõe é a humildade. Não haverá diálogo entre
educador e educando quando aquele se reconhecer como o único a possuir saber e este
como o que deverá recebê-lo. A humildade está presente no educador que se reconhece
ser incompleto e inacabado (tendo sempre, portanto, algo a aprender) e reconhece que o
educando também é portador de conhecimento, tendo, nesse sentido, algo a ensinar.
A pronúncia do mundo, com que os homens o recriam permanentemente, não pode ser
um ato arrogante. O diálogo, como encontro dos homens para a tarefa comum de saber
agir, rompe-se, se seus pólos (ou um deles) perdem a humildade. Como posso dialogar,
se alieno a ignorância, isto é, se a vejo sempre no outro, nunca em mim? (Paulo Freire,
1981, p. 94 e 95).
A nova perspectiva educacional, vê o aluno como construtor do seu próprio futuro,
porque ele tem a capacidade de planejar suas acções e compartilhá-las no processo de
aprendizagem. E, porque vivemos em uma sociedade em constante transformação,
como exigência histórica, a educação como “campo de acção e aplicação do
pensamento ou conhecimento científico” e, como tal, é catalizadora de todas as áreas do
conhecimento.
Segundo Kilpatrick (2011, p. 11), “a educação como condutora do processo de
reorganização social, deve discutir e conceituar as novas demandas por uma
organização mais equilibrada das instituições, começando por ela mesma na sua
organização interna”. Cabe à educação a condução duma reflexão sobre as mudanças
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estruturais mediante um projecto novo e promissor que tem um plano científico com sua
especificidade, e a escola serve de locus de experimentação e renovação.
O primeiro estímulo que marcou o pensamento político-pedagógico de Paulo Freire, foi
a concepção duma educação virada para a formação do ser humano e das suas
implicações; onde a grande preocupação dele, para com o processo educativo, residia na
fundamentação da ontologia humana. Contudo, Freire têm como ponto de partida do seu
projecto pedagógico as relações político pedagógico que ocorrem particularmente
dentro da escola. Entretanto, é preciso criar um projecto virado mais para as relações
educadores-educandos, orientados para a prática desse diálogo político-pedagógico em
que se fazem sentir as virtudes éticas, e que se estabeleçam as condições que abram a
possibilidade de ambos se existenciais na autonomia, na cidadania responsável e na
apropriação crítica do conhecimento e sua recriação (FREIRE, 2014a).
A concepção pedagógica da autonomia Freireana, apresenta uma plataforma
teóricoprática sobre a qual os educadores tem a missão de se encontrar, junto com os
demais especialistas de outras áreas do conhecimento, para em conjunto analisar as suas
práticas e projectar da melhor forma possível o futuro da educação. Na visão de Freire
“toda a prática educativa pressupõe uma inter-ralação ou existe um vínculo cooperativo
entre os sujeitos envolvidos” (FREIRE, 2014a, p. 12).
A busca da autonomia é uma das grandes preocupações centrais de todos os pedagogos
que edificaram a pedagogia moderna. Já em a Pedagogia do oprimido, publicado em
1968, Freire articulou seu pensamento pedagógico dialógico dentro duma realidade em
conflito; por um lado, pretendia que houvesse a passagem da sociedade fechada para
uma sociedade aberta, e doutro lado, do homem-objecto para o homem-sujeito, e
somente com a pedagogia, dentro da sua radicalidade, seria preciso recriar-se para uma
identificação explícita com aqueles que têm rejeitado o seu direito de “ser mais”.
De acordo com Freire (2014a, p. 11), “fazer do aluno conhecer a liberdade, tornar-se
apto a se construir crítico e responsável, foi sempre o grande objectivo da sua
pedagogia”. Ele, sendo um homem comprometido com a vida: não pensava em ideias,
mas sim, na existência do ser humano. A sua pedagogia sendo mais existencial, virada
ao esforço da práxis humana, estava mais ligada com a “prática da liberdade”.
No entanto, Freire via a educação libertadora não compatível com a pedagogia que, de
forma consciente ou mistificada, era palco duma prática de dominação. Para isso, era
necessário, encontrar uma pedagogia em que os oprimidos tivessem condições mais que
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Sem a esperança, que nos estimula, dá sentido, movimenta nossas acções em direção ao
projeto com o qual sonhamos, não pode haver diálogo.
Se o diálogo é o encontro dos homens para Ser Mais, não pode fazer-se na
desesperança. Se os sujeitos do diálogo nada esperam do seu quefazer já não pode haver
diálogo. O seu encontro é vazio e estéril (...) Finalmente, não há diálogo verdadeiro se
não há nos sujeitos um pensar verdadeiro. Pensar crítico. (...) Este é um pensar que
percebe a realidade como processo, que a capta em constante devenir e não como algo
estático (Paulo Freire, 1981, p. 97), que a entende como construção histórica e social,
por isso, mutável".
Não é possível, para Paulo Freire, que a leitura de mundo seja esforço intelectual que
uns façam e transmitam para outros. Ela é uma construção coletiva, feita com a
multiplicidade das visões daqueles que o vivem.
Transmitir ou receber informações não caracterizam o ato de conhecer.
Conhecer é apreender o mundo em sua totalidade, e essa não é uma tarefa solitária.
Ninguém conhece sozinho. O processo educativo deve desafiar o educando a penetrar
em níveis cada vez mais profundos e abrangentes do saber. Nisso se constitui uma das
principais funções do diálogo, que se inicia quando o educador busca a temática
significativa dos educandos, procurando conhecer o nível de percepção deles em relação
ao mundo vivido.
A educação, em uma perspectiva libertadora, exige a dialogicidade, portanto, a leitura
do mundo coletiva. É a partir dela, do conhecimento do nível de percepção dos
educandos, de sua visão do mundo, que Freire considera possível organizar um
conteúdo libertador. A realidade imediata vai sendo inserida em totalidades mais
abrangentes, revelando ao educando que a realidade local, existencial, possui relações
com outras dimensões: regionais, nacionais, continentais, planetária e em diversas
perspectivas: social, política, económica, que se interpenetram. A localidade do
educando é, dessa forma, o ponto de partida para a construção do conhecimento do
mundo. Fazer os educandos falarem a partir de seu território, do seu lugar de vida, de
convivência, de trabalho, das relações sociais e, em um movimento solidário, dialéctico
e dialógico, criativo e crítico, ir permitindo que eles desvendem o local e o universal,
denominem o mundo e se comprometam com as acções necessárias à construção do
mundo novo, com justiça social e sustentabilidade, é a grande exigência de um projecto
político-pedagógico voltado à formação da cidadania activa e da transformação social.
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8. A sociedade do descontrole
Um segundo modelo é proposto por Anthony GIDDENS. Para o sociólogo britânico, a
pós-modernidade ainda está por vir. Estamos na modernidade, mais precisamente em
seu estágio derradeiro: a era actual é a “modernidade tardia”, “tardo-modernidade”,
“alta modernidade” ou “modernidade radicalizada”, onde as consequências da
modernização se tornam mais radicalizadas e universalizadas do que antes. Esta
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autonomia e postula a hegemonia de sua função e todas as funções são igualmente vitais
para o funcionamento do sistema social global. Esta múltipla auto-exortação significa
que nenhum deles (Política, Economia, Direito, Educação, Moral, Religião, etc.) pode
pretender isoladamente a condição de centro representativo (“cartão de visitas”) da
sociedade como um todo: inexiste qualquer tipo de superioridade ou hierarquia. Não há
“categorias centrais”. Cada um dos sistemas realiza sua própria descrição da sociedade,
segundo o ponto de vista exclusivo estabelecido pelo respectivo código binário de
diferenciação16. Em suma, a sociedade actual é “a cêntrica”, marcada pela
“policontextualidade” (diferenciação funcional).
do mundo actual resulta no “fim da clareza”, manifesto na confusão entre o cálculo dos
acontecimentos e a relevância das pautas de comportamento vigentes. Em suma, a
preocupação com os estranhos é a principal marca da contemporaneidade: “num mundo
constantemente em movimento, a angústia que se condensou no medo dos estranhos
impregna a totalidade da vida diária.
O mal-estar da modernidade era fruto da renúncia aos prazeres da vida, ou seja, da
limitação do princípio do prazer pelo princípio da realidade (“o homem civilizado
trocou um quinhão das suas possibilidades de felicidade por um quinhão de
segurança”). Resultava do “excesso de ordem” e da consequente “escassez de
liberdade” para busca do prazer: mais liberdade significa menos mal-estar e mais ordem
significa mais mal-estar. Já o mal-estar da pós-modernidade resulta da
desregulamentação e da privatização, i.e., da desordem. A liberdade individual reina
mais soberana do que nunca e o princípio do prazer limita o princípio da realidade: “o
homem pós-moderno troca um quinhão de suas possibilidades de segurança por um
quinhão de felicidade”. A questão fundamental é encontrar um “equilíbrio óptimo” entre
estas duas exigências: liberdade sem segurança não garante mais felicidade do que
segurança sem liberdade. muitas terras habitáveis desabitadas ou escassamente
ocupadas), mas no sentido sociológico e político, referido não à situação natural da
Terra e sim a cada vez mais intensa degradação das formas e meios de subsistência de
seus “moradores” (o que fazer para “ganhar a vida” neste ambiente pós-moderno?
Tânia Zagury, filósofa, professora e escritora nos fala que essa ascensão do consumismo
trouxe a troca de valores na formação ética do ser humano. A sociedade está sendo
bombardeada por falsos conceitos que estão deturpando os nossos valores. Temos hoje
exemplos de “heróis”, falsos modelos que passam para as gerações futuras maus
exemplos. Ela relata também que a corrupção, a impunidade está enfraquecendo o
tecido estrutural da sociedade e para salvar as novas gerações precisamos sanar a
impunidade. A sociedade precisa crer que vale a pena ser honesta, íntegra, que o mal
será castigado, não podemos deixar a corrupção e a impunidade tomar conta de nossa
sociedade. Nussbaum defende a tese em suas várias pesquisas reproduzidas por
Zimbardo, que existem várias estruturas que são perniciosas que fazem as pessoas
agirem de determinada maneira e a primeira delas é “as pessoas se comportam mal
quando não são responsabilizadas pessoalmente”, elas agem muito pior escondidas
sobre uma “massa sem rosto”, como a nomeia, “do que quando são observadas e
responsabilizadas como indivíduos”. Tânia Zagury finaliza dizendo que a família
precisa agir, dar bons exemplos, passar valores que promovam a cidadania, precisa
pensar e ensinar a pensar o que realmente tem valor. Fazer prevalecer os verdadeiros
valores que regem uma família, enfim educar para o futuro para ser um cidadão, não um
cidadão que apenas pensa em si.
Nossa vida cotidiana está sendo bombardeada por uma sequência de eventos rápidos, de
diversos assuntos ao mesmo tempo em que tomamos conhecimento, mas não nos dá o
tempo necessário para nos envolvermos completamente. A revolução tecnológica, a
globalização nos remete ao imediatismo, as relações passageiras, tudo muito rápido e
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efêmero. Não se dá tempo necessário para se investir nas relações sociais. Será essa
sociedade que queremos para nós? É essa sociedade que nos dá alegria?
A família a e escola, até então únicos agentes socializadores, dividem este papel com
um grande, múltiplo e constante desenvolvimento das tecnologias, com a revolução dos
meios de comunicação e das tecnologias digitais e de rede que surgem a partir do século
XX. Este acontecimento faz com que o ser humano tenha um enorme número de
escolhas que o força a ter mais autonomia não apenas seguindo as massas, mas seja
capaz de ter juízos próprios e projetos seus, sem imposição dos meios de comunicação
de massa ou do grupo a qual pertence, seja um sujeito autônomo, construindo sua
própria identidade. Giddens (apud CENCI e MARCON, 2015b) chama este processo de
reflexividade a capacidade de os indivíduos fazerem escolhas conscientes entre várias
alternativas existentes com base em novas formas de conhecimento que estão a seu
dispor. Todo esse cenário demanda do ser humano um grande esforço de decisão.
Com o processo de globalização e a evolução dos meios de comunicação um evento que
acontece agora, em um local bem distante pode repercutir mundialmente influenciando
nosso dia-a-dia. A reflexividade inclui a vida social do indivíduo e suas instituições
como também a seu auto identidade. Cenci e Marcon cita Giddens que “defende a tese
de que as mudanças em aspectos íntimos da vida pessoal (auto identidade) passaram a
estar diretamente relacionados a conexões sociais de grande amplitude envolvendo o
pessoal e o global, o eu e a sociedade” (2015, p. 7).
Uma das características centrais da sociedade moderna é a sua reflexividade, sinaliza
Giddens, como nos fala Elimar Pinheiro do Nascimento: “esta é a única sociedade que
tem a obsessão de pensar sobre si mesma.
formação como processo” (BERMAN apud CENCI, 2015a). A formação tem como
objetivo formar indivíduos capazes de ter uma visão de mundo, de fazer uma leitura do
mundo aberta, ampla. O ser humano deve sim ter instrução, especialização no campo a
que se propõe, mas sem perder o foco também na formação. O conhecimento técnico
deve ser usado como uma ferramenta para se chegar ao objetivo de ensinar, mas não
pode ser o único. Hoje o nosso cenário social econômico fez com que muitas
instituições educativas mercantilizassem o ensino, realizando a educação sem formação,
apenas instrutiva, tecnicista o que está resultando em profissionais também dentro deste
padrão.
Como pensar em sujeitos que possam se constituir como humanos sem formação? Uma
mídia bombardeando e deturpando os valores, criando falsos modelos a seguir, numa
família que não age, numa corrupção e impunidade enfraquecendo a sociedade?
Desse modo:
Ao mesmo tempo, todo professor precisa ser pedagogo, no sentido de
assumir, para além da capacidade de reconstruir conhecimento, o
compromisso com a aprendizagem do aluno. Trata-se menos de
tácticas de motivação como quer a “qualidade total”, por mais que
estas possam ser pertinentes, do que da habilidade de “formar”. O
professor é figura essencial da “formação” do aluno, através de
processos bem conduzidos de aprendizagem reconstrutiva política.
Com isso, formamos não só profissionais de bom porte, mas
principalmente cidadãos que possam mudar nossa sociedade e
economia (DEMO, 2014, p.9).
Nussbaum coloca que estamos passando por uma crise silenciosa em nosso sistema de
educação mundial, fazendo-nos jogar fora imprudentemente as competências
indispensáveis para a democracia. Para ela:
Estamos em meio a uma crise de enormes proporções e de grave
significado global. Não me refiro à crise económica global que
começou em 2008. Pelo menos naquela época todos sabiam que
estavam diante de uma crise, e muitos líderes mundiais agiram de
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seu filho, pelo médico que realiza uma consulta em um posto de saúde, pelo professor
que realiza uma reunião de pais na escola, etc. O servidor público é a presença física,
material, do Estado para muitos cidadãos. Dependendo da forma como o funcionário
atende à população, ele reforça o conceito de que tudo que vem do Estado não é de boa
qualidade e endossa o discurso daqueles que, insistentemente, desqualificam essa
categoria.
Segundo Dalmo de Abreu Dallari, “o servidor público é quem trabalha para a
administração pública em carácter profissional, não eventual, sob vínculo de
subordinação e dependência, recebendo remuneração directamente dos cofres públicos”.
(2001, Internet). Ao entrar para o serviço público, o funcionário implicitamente assina
um contrato para ser um agente do Estado na busca do bem-estar de toda a sociedade, e
deve estar sempre comprometido com essa missão. Todo funcionário público é um
servidor do público, e a ele deve servir com eficiência e cortesia. A gestão democrática
cria espaços para que o cidadão exerça melhor controle e acompanhamento do serviço
que lhe é oferecido.
Por outro lado, não podemos ignorar que ainda predomina em nosso país um Estado que se
revela insuficiente para tratar das questões sociais e em permanente aperfeiçoamento para
atender aos interesses da reprodução e ampliação do capital. Um Estado assim constituído traz
consequências para o quadro do funcionalismo público: não investe na actualização dos
funcionários (educação continuada); não valoriza o funcionário pagando melhores salários; não
oferece condições favoráveis de trabalho – os funcionários lidam com equipamentos obsoletos,
espaços inadequados para a realização de suas atribuições, etc.
A gestão democrática, no interior da escola, cria oportunidade de a população apresentar suas
insatisfações, seus projectos, seus interesses e, por outro lado, também de ouvir, conhecer e
compreender com mais profundidade as condições de trabalho do próprio servidor. Dessa forma
ambos os lados têm a chance de se juntar em lutas colectivas, pois há questões que ultrapassam
a escola e exigem uma luta mais ampliada na sociedade, para fazer uma mudança para melhor
tanto para os funcionários como para a comunidade. Quanto mais a população se sente
representada e acolhida pelo funcionário, mais ela defende o espaço público conquistado e
melhor é a relação entre o servidor e o cidadão. Servidor e população percebem que são vítimas
de uma política económica e de uma estrutura social que exigem actuação conjunta para sua
transformação.
Não interessa o que fizeram connosco. Mas o que fizemos com o que fizeram connosco.
Sartre
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Se a educação que defendemos é aquela que contribui para a democracia, a escola deve
começar por ela mesma, se organizando como campo de relações democráticas que
antecipem uma ordem social mais colectiva, mais participativa, mais igualitária, mais
comprometida com a construção de uma sociedade mais justa.
Para que os estudantes possam assumir os princípios éticos, são necessários pelo menos
dois factores:
A melhor forma de ensiná-los, portanto, é fazer com que sejam alvo de reflexões e de
vivências. Mais do que os discursos, são a prática, o exemplo, a convivência e a
reflexão sobre eles em situações reais que farão com que os alunos e as alunas
desenvolvam atitudes coerentes com os valores que queremos que aprendam. Por isso, o
convívio escolar é um elemento-chave na formação ética dos estudantes e, ao mesmo
tempo, é o instrumento mais poderoso que a escola tem para cumprir sua tarefa
educativa nesse aspecto. Daí a necessidade de os adultos reverem o ambiente escolar e o
convívio social que ali se expressa, a partir das relações que estabelecem entre si e com
os estudantes, buscando a construção de ambientes mais democráticos.
Por fim, é necessário introduzir tais conteúdos e preocupações como temas sociais que
integrem os conteúdos trabalhados nas escolas, de forma que seus princípios estejam
presentes nas acções quotidianas nas salas de aula e nos demais espaços das instituições
escolares.
Outro aspecto importante a ser considerado nesse processo é o papel activo dos sujeitos
do aprendizado, estudantes e professores, que interpretam e conferem sentido aos
conteúdos com que convivem na escola a partir de seus valores previamente construídos
e de seus sentimentos e emoções. Tal premissa está de acordo com a visão de que os
valores e princípios éticos são construídos a partir do diálogo, na interacção estabelecida
entre pessoas imbuídas de razão e emoções e um mundo constituído de pessoas,
objectos e relações multiformes, díspares e conflituantes. Enfim, uma educação em
valores deve partir de temáticas significativas do ponto de vista ético e propiciar
condições para que os alunos e as alunas desenvolvam sua capacidade dialógica, tomem
consciência de seus sentimentos e emoções (e das demais pessoas) e desenvolvam a
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Nas escolas em que são respeitados princípios como respeito mútuo, solidariedade,
justiça e diálogo, em que alunos e alunas se apropriam de canais de participação na vida
escolar e são incentivados pelos educadores a fazê-lo, cria-se um espaço democrático,
do qual emergem as características de uma cidadania plena.
dos que sabem e dos que não sabem, dos talentosos e dos não talentosos. Tal situação
direciona o pensar sobre o real e o ideal de pessoa humana e da sociedade, com vistas à
mudança e à transformação. Para tanto, emerge também uma necessidade de ações
planejadas e intencionais, por parte da escola e de seus educadores, visando à trans-
formação social, de forma que todos possam participar efetivamente na reconstrução do
humano que habita em cada ser.
c) As possibilidades de uma emancipação social estão na emancipação humana de
todos. As providências e os estímulos para que o indivíduo busque e realize sua emanci-
pação social, são evidentes na sociedade. Porém, a observação que se tem encontra-se
no fato de que o humano se educa na construção de sua relação com o mundo e com os
outros. (FREIRE, 2002). Por isso, é impossível falar em conquista humana sem situá-la
no espaço e no tempo, uma vez que é preciso refletir sobre o que, como, quando e onde
ocorrem as conquistas dos indivíduos. Na reflexão sobre essas interrogativas, apreende-
se que as ações dos indivíduos originam-se das oportunidades e condições
proporcionadas em sua historicidade. Fato que encaminha a escuta e a visão de que
poucos são os indivíduos que estão envolvidos nessa situação, embora estejam situados
como parte desse todo denominado sociedade. Enaltecer práticas individuais em
detrimento do grupo, do coletivo e/ou de uma comunidade, é excluir o todo e as partes
que o compõem. Nesse sentido, a busca de uma emancipação social encontra-se
condicionada à emancipação de todos. Quanto mais houver eclosão individual, isolada e
solitária, maiores serão o afastamento e o distanciamento da emersão social de todos.
Nesse caso, educação escolar e educação não escolar desempenham esse papel de
trabalhar e privilegiar ações coletivas, por meio de vivências e experimentações, sem
perder de vista o eixo giratório da sociedade. (MORIN e MOIGNE, 2000).
d) As práticas educativo-pedagógicas solidárias, coletivas e reflexivas podem levar
à conscientização crítica. Potencializar e creditar práticas educativo-pedagógicas
solidárias e coletivas torna-se necessário na sociedade atual.
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei Nº. 9.394/96, art. 32, salienta que,
para o Ensino Fundamental, a formação básica do cidadão tem como objetivos:
Escola, em seu todo, necessita indagar-se sobre quais práticas dominantes vem
protagonizando.
20.1. Pedagogia de Projecto Interdisciplinar
Tendo como princípio a gestão democrática e participativa de todos os sujeitos
educativos (pais, alunos, funcionários, professores, comunidade em que a Escola se
insere), a partir dos problemas que a escola enfrenta em termos de (não)democracia e
(não) cidadania.
20.2. Reelaboração da matriz curricular
Existe possibilidade de reorganização da matriz curricular que se configurará em plano
de estudos, através de eixos temáticos integradores das diferentes áreas de conheci-
mentos, na perspectiva de uma escola cidadã que inclua a avaliação escolar na dimensão
crítica, participativa e cooperativa.
20.3. Oficina de Cidadania
Com o propósito de se trabalhar uma das problemáticas referidas pela acção
diagnóstica, tendo como princípio a gestão democrática, é possível incluir nas oficinas
pedagógicas temáticas que envolvam situações do quotidiano social, tais como:
violência, corrupção, acesso aos serviços públicos, direitos humanos, participação,
democracia, política e políticos, entre outras.
A educação ocupa-se das tarefas de formação humana em contextos determinados por marcos
espaciais e temporais. O objecto de investigação na educação, implica considerá-lo como uma
realidade em mudança.
Em suma:
As teorias contemporâneas da educação têm sido associadas cada uma a um só pólo, apesar
disso, cada vez mais, esses pólos interferem entre si, criando ligações interdisciplinares,
multidisciplinares e transdisciplinares.
Para todos estes construtivismos a organização do conhecimento é feita pelo homem e não
aparece como um dado objectivo da natureza.
Segundo Von Glaserfeld (1996), o conhecimento não é recebido passivamente mas é construído
activamente pelo sujeito conhecedor. O processo de construção do conhecimento está
dependente da sociedade da qual o indivíduo faz parte.
22. Conclusão
Na expectativa de deixar mais claro o problema da educação junto as tecnologias
emergentes, o discurso comunicacional contemporâneo que envolve mercado, parece
redignificar a produção do conhecimento, em consonância com a mudança do modo de
perceber e experimentar a vida. Cada vez mais, os jovens realizam novas experiencias
com abordagens distintas e, ao mesmo tempo, inusitadas, que surpreendem a sociedade.
A cada nova investigação, um exercício de percepção experimenta outro desafio
aplicado que provoca a reformulação de uma teoria geral. As actualizações revigoram
os sentidos em efeitos. E o saber atesta-se na complexidade contínua do pensamento
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