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O D. Sebastião de Lagos
D. Sebastião, 1973-1993 ― maquetas de esculturas para espaços públicos,
Centro Cultural de Lagos. Expresso/Revista 28 Agosto 1993, pp. 26-27
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Thomaz que devia assinalar, entre a multidão saída à rua, o centenário de
Lagos. Instalada por iniciativa da Câmara, graças à relativa autonomia de
decisões que o marcelismo permitia, a obra de Cutileiro era «um dos
melhores monumentos portugueses, por razões plásticas e intelectuais
também» e uma «ruptura escandalosa» com as regras vigentes, como
escrevia José-Augusto França, aparecido em sua defesa no «Diário de
Lisboa» e na «Colóquio-Artes», antes de que se avolumassem as pressões
apostadas no derrube da estátua irreverente.
Tratava-se, de facto, de uma peça realizada à margem dos cânones com que
a estatuária do Estado Novo trocara as pobres tradições naturalistas vindas
de Oitocentos pela procura de uma pretensa austeridade neoclássica, bem
representados por um Infante D. Henrique hieraticamente sentado em
bronze logo a cerca de 500 metros, com a assinatura de Leopoldo de
Almeida e data de 1960.
A inovação (e não estilização decorativa de volumes, essa tolerada) era
imediatamente visível na construção articulada com mármores de cores
diferentes, em vez do talhe de um bloco único, no corte mecânico deixando
à vista as marcas dos instrumentos, em lugar do «bom acabamento»
obrigatório, e na ausência do pedestal que respeitosamente elevasse a figura
acima dos comuns mortais. Mais grave ainda era a figura ambígua de
menino com que o rei se retratava miticamente, imberbe e inseguro, entre o
sonho e o susto, anti-herói desengonçado, com as mão perdidas nos guantes
e o elmo desmesurado caído aos pés.
Era a representação de um rei, mesmo se de um rei vencido, e a sua
presença devia ser autoritária e institucional. Não é. E tocava-se então em
coisas sérias ao revisitar o seu mito.
«O D. Sebastião era o símbolo da derrota de África. Essa era uma das
razões por que eu mais gostei da ideia de fazer o D. Sebastião. Se fosse
outro rei qualquer, tinha de me informar historicamente, de fazer
pesquisas... O D. Sebastião era já um mito, era um misto de derrota e de
esperança.»
«Eram interditos para uma crítica talvez muito intelectual a que eu nunca
liguei. Nunca achei que fossem interditos, não os sentia na pele. Para mim,
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havia coisas interditas, por exemplo, em relação à estatuária do Estado
Novo, pelo lado ideológico e formal, aquelas formas que se usavam na
estatuária. Havia umas pessoas mais benévolas que diziam que o
[Francisco] Franco era bom e os outros é que eram maus, e que faziam
umas hierarquias dentro daquela porcaria toda; mas, para mim, eram
todos muito maus, não havia nada de aproveitar. Nem o Martins Correia,
nem o António Duarte... Quando jovens, certamente que uns eram mais
talentosos do que outros, mas como tinham todos optado por fazer aquele
frete...»
«Ofereci aquela, mas não poderia oferecer muitas mais. Eu não me mexo
para as encomendas, mas o certo é que as estátuas, os monumentos
públicos, aparecem feitos. Se calhar, em todas as sociedades é assim; se
lermos a autobiografia do Cellini, vemos que na Renascença aqueles
meninos se envenenavam uns aos outros para sacar a encomenda. A mim,
talvez por uma herança de passado antifascista, como se diz, repugna-me
andar a esfregar os ombros com o poder para sacar as estátuas. Há
pessoas responsáveis com quem tenho o maior dos prazeres em lidar, há
outras que não, e eu transmito, um pouco como os cães, um cheiro que diz
às pessoas que não gosto delas, e eles não me encomendam. De facto, as
grandes coisas nunca vêm para mim.»
Jogos de guerra
"Recordações de Guerra", Centro de Arte Moderna, Expresso/Cartaz,
20 Abril 1991, pág. 12 e capa (As outras guerras de João Cutileiro)
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armadura, capacete e viseira, e são imagens de guerra e caricatura de
guerreiros, desengonçados robots de pedra. Não se sabe se mais
ameaçadores ou paródicos, são monumentos que representam todos os
heróis e aventuras da História e também o seu reverso pícaro, são anónimas
estátuas de guerreiros talvez troçando de outros ídolos com nome e rosto,
tal como a estatuária oficial os celebrou.
Na retrospectiva que a Fundação apresentou há um ano eram as últimas
peças saídas do atelier de Cutileiro, à mistura com pequenos cavaleiros que
prometiam estátuas equestres. Chamavam-se eles, então, Securitas e
retomavam, em pedra e com os processos industriais de a modelar (cortar e
colar, aliás), um tema antigo que esboçara em poliester e pó de bronze nos
anos 60 - e note-se que são de guerreiros quase todos os raros corpos
masculinos saídos da oficina. Multiplicaram-se entretanto, a par com a
actualidade de modernas guerras. Cresceram repetidos e sempre diversos,
na sua forma longilínea que é homenagem a Giacometti, desdobrando uma
pesquisa de «assemblages» inéditas em pedra, tótemes imponentes nos seus
equilíbrios aparentemente instáveis mas sempre, afinal, monumentais.
A pedra é apenas branca, ora exibindo a rugosidade das fracturas, ora
expondo-se como polidas engrenagens de série; às formas maciças soma-se
a ligeireza geométrica dos fragmentos imbricados, erguidos por
empilhamento e articulados como «kits» de armar. Numa constante
variação de processos, a simetria que consolida algumas figuras dá lugar,
noutras, a um insólito equilíbrio feito de diferenças entre cada metade
lateral, e outras ainda transportam a lição das formas bífidas estabelecida
em tantos corpos femininos. Observe-se a correcção com que assentam
algumas nas suas bases e o modo como outras irrompem directas do chão.
Juntos, os guerreiros voltam a lembrar que a escultura em Portugal tem
hoje um nome; depois, há discípulos, há promessas. Tal como voltam a
mostrar, aos catecismos vários, que a escultura, a estatuária até, sem
capotes oficiais e sem rotinas de escola, é ainda possível (mas raríssima!),
em objectos feitos com invenção e com gozo partilhável. Curioso seria,
entretanto, avaliar a diversidade das criações recentes que directamente se
vêm enfrentando criticamente com a representação da História e dos seus
mitos portugueses, desde Os Reis de Costa Pinheiro, que com estes
guerreiros têm visível parentesco, passando pelo Dom Sebastião também
de Cutileiro, por certas imagens de José de Guimarães, por algumas
pinturas de Júlio Pomar, e pouco mais.
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«Memórias», Galeria Valentim de Carvalho (Mês da Fotografia, Lisboa,
1993), No catálogo geral do Mês publicaram-se dois notáveis retratos, um de
Álvaro Lapa, outro de Maria Cabral e Vasco Pulido Valente.
João Cutileiro tinha mostrado fotografias na sua 1ª exposição, em Novembro de 1961 (que foi
a 2ª, contando uma em Monsaraz e Évora aos 15 anos, em 1951), na Sociedade Nacional de
Belas Artes: "25 Esculturas / Fotografias / Desenhos de João Cutileiro". O folheto que a
acompanhou não trazia reproduções (o autor informa que eram praticante todas retratos). Dos
"modernos" ou novos desse tempo, tinham mostrado fotografias em exposições individuais de
galeria só Fernando Lemos (em 1952-53) e a dupla Victor Palla/Costa Martins (1958). Um
segundo passo público (publicado, neste caso) foi dado só dez anos depois (1971) com a
impressão tardia de algumas imagens de Monsaraz (as mais antigas de 1959 e outras de 63,
estas expressamente feitas) no livro do irmão José Cutileiro A Portuguese Rural Society
(Oxford, Clarendon Press), onde se publicaram também outras fotografias do então
desconhecido Gérard Castello-Lopes
Metro-arte
Expresso/Revista, 25 Agosto 1995, pp. 66-71
Um lugar na cidade
Expresso/Cartaz, 3 Maio 1997, pp. 18-19
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JOÃO CUTILEIRO prepara-se há perto de 40 anos para fazer uma estátua
equestre. Uma pequena maquete em bronze, de 1962, pensada
precisamente para aquele lugar, foi mostrada em Lagos, quando, a
propósito dos 20 anos do D. Sebastião (1973-1993), se puderam rever os
seus projectos de esculturas para espaços públicos. Agora, porém, optou
por destruir o plinto que existia no cimo do Parque Eduardo VII, para onde
se chegaram a prever, no regime anterior, as figuras de Nuno Álvares
Pereira ou D. João I. O cavaleiro que alguém terá ainda de encomendar ao
escultor irá para outro lado.
Ali, no exacto enfiamento do Marquês de Pombal e do obelisco do Rossio,
sobre o panorama da cidade e do Tejo, que é também um lugar fisicamente
marcado pela monumentalidade do regime anterior (nas colunas de directa
referência nazi e, através desta, de invocação de uma mitificada ordem
clássica — recorde-se, por exemplo, o projecto de Albert Speer para as
portas de Salzburgo, de 1937, incluindo um plinto-altar vazio), Cutileiro
instalou uma fonte que é, ao mesmo tempo, monumento evocativo e anti-
monumento. Não se tratava de substituir os emblemas de um regime pelos
de outro, mudando apenas de sinal um acto de celebração do poder
(questão ideológica e ético-artística essencial), mas de evocar o 25 de Abril
no seu sentido mais decisivo de deposição de uma ditadura e de início de
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um projecto de democracia que será «o que nós quisermos», como diz o
escultor.
Para Cutileiro, «o 25 de Abril é anti-monumental por definição», no acto
do derrubar um regime imóvel e autoritário (como um monumento) e de
recolocar um destino colectivo nas mãos de um povo. E a sua intervenção
de escultor também não quis ser um monumento no sentido tradicional de
consagração formal de um momento congelado no tempo, de sacralização
da distância entre os símbolos de um poder, divino ou heróico, e o espaço
comum da cidade. A sua «Evocação do 25 de Abril», título presente na
necessária lápide inaugural, é bem uma fonte, tipologia construtiva que põe
em evidência quer o significado da permanente agitação da água em
movimento quer a ideia de que «a fonte é a origem» (J.C.).
A abordagem dos emblemas formais e dos seus sentidos seria inesgotável:
a fonte e o cravo, o derrubar de uma forma prévia autoritária, a ideia de
inacabamento de um processo em construção, a recusa de uma
«mensagem» escrita (mas estão lá sinais de trabalho trazidos da pedreira), a
instalibilidade da água, a forma fálica presente em qualquer obelisco ou
coluna, e que aqui remete para a configuração dos megalitos alentejanos. E
teria ainda de prolongar-se com absoluta coerência no equacionar da
problemática da escala.
A opção do escultor foi a de contrapor uma dimensão humana ao
gigantismo autoritário das colunas pré-existentes, transformando um lugar
votado à representação do poder (com maiúscula, tal como em algumas
concepções da arte) num espaço de uso público, de lazer e de prazer. Os
degraus que limitam um dos lados do lago são um convite directo a
mergulhar os pés na frescura da água corrente; o arranjo do espaço
envolvente é propício à permanência, inventando uma praça num lugar
previlegiado da cidade mais ainda inóspito. Às memória romanas que as
colunas transportam, com sentido imperial, contrapõe-se a lembrança das
fontes de Roma, mas despidas das suas mitologias de Neptunos e sereias,
que também não podereiam ter lugar na evocação do 25 de Abril.
A intervenção de João Cutileiro, com o sentido político da sua reflexão
sobre a data e sobre ideia de monumento, com a ironia própria de uma
modernidade que já não quer ser construtora de mitos (ao contrário dos
modernismos vanguardistas), exercida na inteligência das formas e também
dos seus sentidos, está, como sempre, à beira do escândalo. Tal como
sucedeu com o seu D. Sebastião de Lagos, estátua de menino e equívoco
herói nacional, a fonte-evocação do 25 de Abril é um monumento
controverso. O que também significa, se for necessário dizê-lo, que o
escultor não se limita a gerir a sua própria consagração e que a escultura
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continua a ser inventiva e problemática, desafiando convenções e
expectativas.
Vale a pena, como exemplo, considerar uma primeira expressão pública das
resistências com que a obra de Cutileiro se enfrenta, contida numa crónica
de Rúben de Carvalho («Capital», 29 de Abril) — mas sem de modo algum
pôr em dúvida o seu «direito a dar opinião» por falta de uma qualquer
alegada especialização. O que importa é ver como é decisiva a questão da
escala na vontade expressa de uma monumentalidade formal que, sob a
aparência de uma questão de dimensões, tem a ver com significados,
concepções de poder e ideologias.
Diz R.C.: «O problema do monumento ao 25 de Abril é que não tem o
tamanho, a envergadura, a proporção, o significado do sítio onde está».
Antes, porém, considerara que as duas colunas pré-existentes (talvez por
efeito de uma contradição entre a encomenda fascista e a autoria
democrática de Keil do Amaral — a qual seria essencialmente decisiva,
embora sem tradução formal) «têm equilíbrio, proporção, dignidade,
coerência, ao nosso lado acompanham na sua altura os quilómetros de
vista...». Mas esses atributos traduzem ali a imposição de uma ordem que é
a da autoridade, são as marcas de um poder que se afirma na arrogância da
perfeição e da altura. Noutro passo, atribui ao D. Sebastião, apesar da sua
pequena escala, «o fascínio e a grandeza de um monumento». São sinais da
mesma recusa de entender a condição de anti-monumento com que
Cutileiro soube expressar o sentido mais radical da sua última obra.
De Mapplethorpe a Cutileiro
Diz Cutileiro que a fotografia é a mãe das artes visuais e são as
fotografias de Mapplethorpe que estão na origem das suas novas
esculturas de flores
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tivesse pedido para fotografar estas flores. É quase inconcebível que ele
chegasse aqui e dissesse: ah não, a cor é que é!
Mas as esculturas são a cores. — São. As esculturas são a cor, mas a maior
parte dos grandes fotógrafos trabalham a preto e branco, e a cor é uma
concessão. Os grandes autores disseram que o trabalho que fizeram a cores
foi uma gracinha, uma experiência ou uma concessão ao gosto do mercado.
Sei que encarou esta exposição de um modo diferente, que a quis fazer num
museu e não está à venda. — O facto de querer conservar estas obras – que
cabem todas em cima de uma grande mesa de jantar que tenho em casa, de
forma que é muito fácil ficar com elas – levou-me a escolher uma
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instituição, que não precisa de vender para justificar o acto de expor. Não
me apetece vendê-las, ...por enquanto, pelo menos. Apetece-me ter um
canto da casa onde elas estejam juntas. Esta é a exposição mais completa
que eu fiz, completa desde a coerência das peças, à iluminação, ao
catálogo, às fotografias, tudo isso é uma unidade, é uma bola, e daí talvez
uma das razões porque não me apeteça vender. E, no entanto, se alguém de
fortes poderes económicos, que não um galerista, me viesse propor a
compra da totalidade, para a manter como tal, era já. Não é tanto a questão
de ficar a viver com elas, é mais a garantia de que elas não se separam.
Partir da obra de outro artista é uma coisa que muitas vezes não se
confessa. — Com a educação museológica que tive, lembro-me do Picasso
as fazer as Meninas, do Bacon a fazer o Velásquez. Quando se chega a um
determinado estatuto, deixa-se de se ter inibições de ir roubar aos outros
descaradamente, e um tipo faz o que o outro fez à nossa maneira. E dá
muito gosto assim.
Mundos paralelos
«Macho—Fêmea», Centro Cultural e de Congressos de Aveiro, Expresso/
Cartaz 29 Abril 2000, pág. 18
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Sob o título «Macho — Fêmea», a exposição não é exactamente um
sumário antológico que sistematize a relação da escultura de Cutileiro com
a forma humana, até porque se trata apenas da exibição de obras recentes.
No entanto, a configuração temática do projecto, montado em dois espaços
autónomos e comparativos, é indicativa de algumas das linhas que
atravessam a sua obra e, desde logo, de uma diferenciação radical na
abordagem dos dois sexos.
Por outro lado, o homem surge desde muito cedo na sua escultura
subordinado ao tema do guerreiro, logo em 1963, em blocos únicos de
cimento fundido ou poliester, e também muito mais tarde em peças de
grande porte, construídas por empilhamento e «assemblage» de blocos de
pedra. Não são nunca figuras complementares ou simétricas dos corpos
femininos, nem são mesmo reconhecíveis como formas orgânicas, que são
sempre imediatamente sensuais na sua escultura. Emblemas do poder e da
autoridade nas suas poses hieráticas, também nunca são figuras heróicas e
talvez se devam entender apenas como fantoches, espantalhos, bonecos
articulados mais patéticos que ameaçadores, efígies absurdas de uma ordem
absurda do mundo. Na sua configuração mecanizada de «robots»,
artificializando-se o corpo e a sua energia no invólucro da armadura, esses
Guerreiros é de desumanização e violência que falam.
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Torso branco, 1993
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Estas figuras guerreiras parecem saídas de «kits» de montar, com os seus
módulos aparentemente idênticos (talvez encontrados, talvez feitos em
série), com os parafusos que lhes articulam o tronco e os membros e os
adereços bélicos. Os mesmos pequenos cubos de pedra sobrepostos
constroem as pernas desmesuradas ou o torso breve, que noutros casos se
sustenta em réguas também de pedra ou em tubos de latão. Pequenos
blocos perfurados (as cabeças ocas e cegas), discos e volumes cilíndricos,
fragmentos irregulares, possíveis desperdícios recortados que terão sobrado
de peças ornamentais, articulam-se em formas infinitamente variáveis, num
jogo de colagem ou «assemblage» que é aparentemente ocasional mas, de
facto, rigorosamente controlado, como se comprovará sujeitando cada peça
a uma observação que a circunde e que atente às suas sombras projectadas.
Aliás, esse mesmo jogo de sombras, que amplia a escala dos fragmentos,
propiciará um diferente olhar sobre as peças articuladas, isolando volumes
e destacando neles a sua qualidade formal «abstracta».
A prisão e o voo
«Pássaros», Museu do Traje, Expresso/Cartaz, 3 Agosto 2002
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não exista), recriada com a moldura de pedra, esta prisão não se vê de fora
ou de dentro, não exclui. Aprisiona o observador que livremente a circunda,
olhando através das grades, porque a liberdade que se limita nos torna a
todos menos livres. A evocação da figura histórica torna-se partilhada
experiência física e prolonga-se num sentido actual.
Um centro periférico
“Lagos, Anos 60-80”, Centro Cultural de Lagos, Expresso/Actual 23
Julho 2005, pág. 40
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Num contexto de intensas circulações e actualizações europeias, que então
alargam a Londres e à energia dos «sixtie’s» a mais tradicional formação
parisiense, o grupo dos pintores de Lagos diferencia-se por fazer, do
interior, uma viragem para a informação norte-americana, num caminho já
entretanto aberto por Charrua e António Areal. É um acesso quase sempre
indirecto e muito acelerado, que concentra o efeito súbito de Pollock, a
prolongar automatismos psíquicos vindos do surrealismo, com imaginários
«beatniks» e a admiração por Motherwell, e por via dele com um universo
intelectual que inclui John Cage e o budismo Zen, a que se seguiam já as
rupturas de Jasper Johns e Rauschenberg, obviamente visíveis nas obras
expostas de Palolo.
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apareça a sobrepor-se ao universo das questões literárias e formais
presentes nos seus trabalhos.