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Petrobras volta a contratar companhias alvo da Lava-

Jato
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Salvador Dahan, diretor da estatal: “Há empresas que ainda não possuem as bases de um
programa de conformidade” — Foto: Divulgação

Empresas que prestam serviços à Petrobras e que foram impedidas, a partir de 2014, de
celebrar novos contratos com a estatal por envolvimento em casos de corrupção
investigados pela Lava-Jato estão voltando a se relacionar comercialmente com a
petroleira. Nem todas, entretanto, conseguiram fechar contratos de bens e serviços até
agora. A SBM, com sede na Holanda, e as brasileiras Camargo Corrêa e Nova
Participações, ex- Engevix, estão entre as companhias habilitadas na base de fornecedores
da Petrobras, mas vivem situações diferentes.

A SBM tem contrato com a Petrobras para entregar até 2023 uma plataforma para o
campo de Mero, na Bacia de Santos. Foi o primeiro contrato da SBM com a estatal depois
das investigações da Lava-Jato em que a empresa foi acusada de mal feitos pelo
Ministério Público Federal (MPF) e teve que fazer acordo de leniência com o poder
público. A leniência funciona como uma delação premiada para pessoas jurídicas que
admitem irregularidades com o governo.

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A Petrobras atribui um grau de risco de integridade a todas as empresas com as quais tem
relação comercial

A Operação Lava-Jato investigou, de 2014 a 2021, irregularidades cometidas por


fornecedores e ex-empregados da Petrobras. Segundo o último dado disponível, a
Petrobras havia sido ressarcida em R$ 6,2 bilhões pelos danos apurados nas
investigações. Tanto a estatal como fornecedores passaram por aprimoramentos nas
políticas de governança corporativa.

O presidente global da SBM, Bruno Chabas, afirma que os episódios de corrupção


revelados ajudaram a empresa a se reinventar: “Foi parte da nossa história e aprendemos
com isso. Nos tornamos uma empresa diferente, somos mais transparentes e temos
consciência do nosso impacto na sociedade”, disse ao Valor (leia mais na matéria
abaixo).

A Camargo Corrêa também foi readmitida, em 2020, aos fornecedores aptos a negociar
com a Petrobras, mas ainda não assinou novos contratos. Já a Nova Participações, ex-
Engevix, retornou à base de fornecedores da estatal, mas ainda é considerada de risco
elevado, classificação que impede o fechamento de contratos com a Petrobras.

Parte das companhias liberadas, pela Petrobras, para contratações não fechou novos
negócios como resultado da redução dos investimentos da estatal em grandes projetos de
infraestrutura, dizem fontes da área de construção. As contratações da Petrobras em
obras movimentam cadeias de fornecedores longas. Em 2021, a companhia fechou R$
239,85 bilhões em contratos de fornecimento de bens e serviços no Brasil e no exterior
com 9.751 empresas, incluindo plataformas e outros bens. Em 2020, a estatal havia
fechado contratos no valor de R$ 253,3 bilhões, com 10.335 fornecedores.

Apesar de retomar o relacionamento com empresas da Lava-jato, ainda há 76 companhias


na lista da Petrobras que estão suspensas das licitações ou em bloqueio cautelar. Essa
classificação surgiu em 2014 para tratar dos investigados na Lava-Jato. Nem todos os
casos, porém, têm relação com a Lava-Jato. Do universo total de bloqueios, 62
correspondem a decisões tomadas a partir de 2021, ano em que foi encerrada a força-
tarefa que investigou os casos de corrupção.

O diretor-executivo de governança e conformidade da Petrobras, Salvador Dahan, disse


ao Valor que os motivos para as suspensões atuais são diversos e vão desde problemas na
estrutura societária a falhas nos programas de integridade identificados pela estatal:
“Algumas [empresas] podem não ter problemas [de corrupção], mas não possuem as
bases de um programa de conformidade”, afirmou.

Entre as companhias ainda bloqueadas pela Petrobras que estiveram envolvidas na Lava-
Jato, estão a Odebrecht Ambiental e a Base Engenharia, antiga Schahin. A Odebrecht
Ambiental teve os ativos operacionais vendidos para a BRK em 2017 e hoje é uma
companhia não-operacional. A Novonor, antiga Odebrecht, não teria buscado tirar a

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Odebrecht Ambiental da lista de bloqueio da Petrobras pois hoje a companhia não faz
mais parte dos ativos operacionais do grupo, dizem fontes. A Base Engenharia teve a
falência decretada em 2018.

A Petrobras passou a atribuir em 2015 um grau de risco de integridade (GRI) às empresas


com as quais tem relação comercial. O processo de avaliação dos fornecedores começa
com o preenchimento de um questionário de diligência, conhecido como due diligence de
integridade (DDI), com questões sobre a idoneidade e os programas internos de controle
das empresas. Depois desse processo interno de avaliação, a Petrobras define o grau de
risco de cada empresa, que pode ser alto, médio ou baixo. Estão aptas a participar das
concorrências para fechar contratos as companhias de grau baixo ou médio.

“Não queremos associar nosso nome e marca a empresas que estejam cometendo
violações, ilegalidades ou que não respeitem os mesmos princípios que temos. O objetivo
é proteger a Petrobras e toda a sua cadeia de valor”, disse o diretor da estatal. Mais de
80% das empresas da base de fornecedores da Petrobras, diz Dahan, são consideradas de
risco baixo, enquanto apenas 2% ainda têm grau alto. Ele afirma que 40% das
companhias que em algum momento foram identificadas como de grau de risco alto pela
Petrobras conseguiram reverter o quadro e se tornar de GRI baixo ou médio, que
permitem a participação nas licitações.

A antiga Engevix é uma das empresas cadastradas na Petrobras que buscam melhorar o
GRI. A empresa integrou, segundo o MPF, um esquema de pagamentos de propina e
formação de cartel. A companhia fechou acordo de leniência, em 2019, em que se
comprometeu a pagar R$ 516 milhões até 2047, pelos prejuízos gerados, e também
precisou passar por restruturação.

Adjair dos Santos, diretor de governança e integridade da Nova Participações, diz que a
companhia contratou consultoria externa para mapear riscos de integridade nos
processos internos em 2017. A partir de então, foi instituída uma área de compliance
(conformidade), responsável por mensurar ações e mitigações para riscos. Em 2019, a
gerência de governança da Nova Participações foi promovida a diretoria, área que
monitora os processos que ocorrem dentro da companhia, o que inclui contratações,
pagamentos e encerramentos de contratos. “Tudo isso gerou uma transformação de
pessoas, de processos, de visualização de riscos”, disse.

Apesar dos esforços, a Nova Participações ainda não voltou a fechar contratos com a
Petrobras. Hoje a empresa presta serviços a companhias privadas do setor elétrico, na
engenharia de usinas de geração hidrelétrica e solar e de linhas de transmissão. A
companhia pediu recentemente à estatal uma reavaliação no grau de risco. A expectativa é
melhorar o GRI para baixo ou médio, diz Santos.

Os riscos identificados na Lava-Jato levaram a Petrobras a instituir, em 2014, a lista


pública de fornecedoras com as quais não poderia fechar novos acordos, além de reforçar
os mecanismos de vigilância. Em 2015, a estatal criou uma diretoria de governança. Para

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voltar a fechar contratos com a Petrobras, as fornecedoras tiveram que implementar
melhorias nos controles internos para prevenir e combater fraude e corrupção.

As empresas que estiveram envolvidas nas investigações saíram da lista de bloqueada pela
estatal à medida em que fecharam acordos de leniência com o MPF. Esse tipo de acordo,
considerado uma espécie de “reabilitação” para pessoas jurídicas, permite às empresas
envolvidas em práticas ilícitas colaborar com as investigações e adotar ações para que
irregularidades não voltem a ocorrer, em troca do abrandamento de sanções. Os acordos
de leniência também envolvem pagamento de multas.

Depois dos acordos de leniência, a Petrobras readmitiu as empresas nas licitações, mas a
reintegração foi caso a caso. Entre os critérios para que uma companhia se habilite nos
certames da estatal, está a garantia de que a administração não tenha executivos
envolvidos em escândalos, além da existência de um conselho de administração
independente. O desenvolvimento de áreas de governança é um dos fatores que
permitiram às empresas de bens e serviços voltar à base de fornecedoras da Petrobras.

A advogada da área de compliance do Souto Correa, Emilia Malacarne, afirma que o


propósito de um programa de conformidade é a prevenção e detecção de fraudes, atos
ilícitos e irregularidades, além de remediar um problema, quando detectado. Ela ressalta
que é importante que a empresa aplique essas políticas nas atividades cotidianas:
“Compliance é uma mudança de cultura, feita através de mecanismos. Mas é preciso que a
empresa mostre, no dia a dia, que esses valores têm efeito prático.”

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