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ESCOLA DE CIÊNCIAS, EDUCAÇÃO, LETRAS, ARTES E HUMANIDADES

CURSO DE BACHARELADO EM TEOLOGIA NA MODALIDADE À DISTÂNCIA

MANUAL DE ELABORAÇÃO DE TCC DO CURSO DE TEOLOGIA-EAD

DUQUE DE CAXIAS, MARÇO DE 2018


2

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY -


UNIGRANRIO

REITOR

Arody Cordeiro Herdy

PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO ACADÊMICA

Carlos de Oliveira Varella

PRÓ-REITOR DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

Emílio Antônio Francischetti

PRÓ-REITORA COMUNITÁRIA E DE EXTENSÃO

Sônia Regina Mendes

PRÓ-REITOR ADMINISTRATIVO
José Luiz Rosa Lordello

DIRETORA DE PESQUISA E INICIAÇÃO CIENTÍFICA

Virginia Genelhu

DIRETORA DA ESCOLA DE CIÊNCIAS, EDUCAÇÃO, LETRAS, ARTES E


HUMANIDADES

Haydéa Maria Marino de Sant’Anna Reis

COORDENADOR DO CURSO DE TEOLOGIA

Marcio Simão de Vasconcellos


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SUMÁRIO

1. Introdução ............................................................................................................................ 4
2. Orientações para a produção do Projeto de Pesquisa e do TCC do curso de Teologia ........ 4
3. Projeto de Pesquisa – MODELO .......................................................................................... 7
4. Projeto de Pesquisa – EXEMPLO PRONTO ..................................................................... 13
5. Artigo – MODELO ............................................................................................................ 18
6. Artigo – EXEMPLO PRONTO .......................................................................................... 25
7. TCC – MODELO ............................................................................................................... 38
8. TCC – EXEMPLO PRONTO ............................................................................................ 54
4

1. INTRODUÇÃO

A elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) deve ser estimulada nos Cursos de
Graduação, conforme as Diretrizes Curriculares Nacionais de 2001, respeitando-se as
particularidades de cada Curso. Esse deve constituir um momento de participação em
situações reais ou simuladas de vida e trabalho, bem como de potencialização e
sistematização de competências e conhecimentos adquiridos ao longo de sua formação na
forma de pesquisa acadêmico-científica.

O TCC tem o objetivo de estimular a busca sistematizada de informações, organizando os


conteúdos obtidos pelos acadêmicos no decorrer da sua graduação, na medida em que estes
escolhem temas de pesquisa e desenvolvem reflexões relacionadas com os conhecimentos
trabalhados nas disciplinas, e das atividades do estágio supervisionado. Aliando assim, a
vivência acadêmica com a práxis do profissional que se almeja formar, dando ao aluno a
aplicabilidade dos conhecimentos, uma vez que temos de prepará-lo para a atuação no
universo do trabalho profissional, conferindo-o o empreendedorismo, a empregabilidade e a
sustentabilidade, previstos no PDI (2010-2014).

O TCC deve dar aos acadêmicos a oportunidade de aplicar e desenvolver novos


procedimentos metodológicos e de pesquisa que propiciem sistematizar, os conhecimentos
teóricos adquiridos. Portanto, consiste em realizar uma pesquisa orientada que culminará em
uma produção cientifica, articulada com a iniciação científica (IC), tecnológica e inovação,
conforme preconiza o PDI (2010-2014).

2. ORIENTAÇÕES PARA A PRODUÇÃO DO PROJETO DE PESQUISA E DO TCC


DO CURSO DE TEOLOGIA

Atendendo ao proposto no Art. 11 da RESOLUÇÃO Nº 4, DE 16 DE SETEMBRO DE 2016,


“o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) será componente curricular obrigatório e será
realizado a partir do penúltimo ano de integralização do curso, centrado em determinada área
teórica prática ou de formação profissional, como atividade de síntese e integração de
conhecimento e consolidação das técnicas de pesquisa, observado os seguintes preceitos:

I. Deverá ter carga horária mínima de 100 (cem) horas em duas modalidades: a)
trabalho monográfico, individual, podendo versar sobre tema específico de
Teologia ou estudos do campo teológico mais amplo ou b) trabalho específico de
Teologia aplicado a organizações religiosas, organizações do terceiro setor e afins,
elaborado individualmente ou em grupo, acompanhado de fundamentação,
reflexão teórica e intervenção documentada;
II. O TCC deverá ser orientado por docente do curso e avaliado por docentes e/ou
profissionais, conforme resolução específica da Instituição de Educação Superior.

Parágrafo único. A Instituição deverá constituir regulamentação própria para o trabalho


de conclusão de curso, aprovada pelo colegiado acadêmico competente, contendo,
obrigatoriamente, critérios, procedimentos e mecanismo de avaliação, além das diretrizes
e técnicas relacionadas com sua elaboração.”

Portanto, como pré-requisito para a obtenção do título de Bacharel em Teologia, o(a) aluno(a)
terá que produzir um Trabalho de Conclusão de Curso – TCC do tipo monografia ou artigo
5

acadêmico, de conteúdo teológico e sob a orientação de um professor do Curso de Teologia.


No TCC, o aluno deverá demonstrar habilidade para lidar com fontes teológicas e bíblicas
para a confecção de um trabalho escrito pertinente ao tema escolhido, em diálogo crítico e
criativo com a realidade que o cerca. O TCC deverá estar alinhado a uma das linhas de
pesquisa apresentadas pelos PCA’s lecionados ao longo do curso, conforme se segue:

1º fluxo: Laboratório de Reconhecimento de Práticas Teológicas e Doutrinárias


Essa linha de pesquisa vincula-se ao estudo das relações entre a reflexão teológica e suas
sistematizações doutrinário-religiosas no ambiente eclesiástico, expressas em produções
didáticas como livros teológicos, revistas de estudos bíblicos, seminários, planos de aula etc.
Trata-se, portanto, de analisar criticamente as formas como as diversas comunidades de fé
refletem teologicamente e as práticas que daí surgem. Como produto, este PCA gera uma
análise crítica de uma dessas sistematizações à escolha do(a) aluno(a).

2º fluxo: Laboratório de Reconhecimento de Práticas de Ação Social e Política


Essa linha de pesquisa vincula-se ao estudo da relação entre a teologia cristã e a sociedade,
suas tensões e possibilidades, e das diferentes matrizes religiosas da cultura brasileira e suas
inter-relações com instituições, organizações, movimentos e poderes públicos, ressaltando
questões de gênero, raciais, socioeconômicas, históricas e políticas. Analisa criticamente a
prática teológica e eclesial em contexto público auxiliando no desenvolvimento de propostas
de inclusão social, econômica, política e cultural. Como produto, este PCA gera uma análise
crítica de propostas de inclusão realizadas em ambiente eclesiástico e/ou paraeclesiástico.

3º fluxo: Laboratório de Reconhecimento de Práticas em Educação Religiosa


Essa linha de pesquisa desenvolve investigação crítica e dialogal sobre modelos educacionais
adotados por entidades religiosas diversas, preferencialmente ligadas ao contexto religioso
do(a) aluno(a). Analisa também práticas ecumênicas e de diálogo inter-religioso no contexto
educacional (público e privado), eclesiástico e paraeclesiástico brasileiro. Como produto, este
PCA gera uma proposta de plano curricular passível de ser adotada pela entidade religiosa
estudada.

4º fluxo: Laboratório de Reconhecimento de Técnicas de Elaboração e de


Implementação de Projetos
Essa linha de pesquisa vincula-se ao estudo crítico de projetos eclesiásticos e/ou
paraeclesiásticos, de caráter sociocultural, inclusivo e educacional, adotados por diferentes
entidades religiosas ou ong’s. Como produto, este PCA gera uma proposta de intervenção
sobre a realidade socioeconômica e cultural, de caráter educacional, que seja capaz de
promover metodologias criativas que possibilitem reduzir níveis de analfabetismo, sobretudo
em regiões de periferia.

5º fluxo: Laboratório de Reconhecimento de Práticas em Liderança e Gestão


Eclesiástica e Paraeclesiástica
Essa linha de pesquisa vincula-se ao estudo de projetos eclesiásticos e paraeclesiásticos, de
caráter social, vinculados especialmente à recuperação de dependentes químicos. Como
produto, este PCA propõe a criação de um projeto de caráter semelhante, elaborado a partir da
análise da rotina de atividades do projeto escolhido para análise.

OS PCA’s do 6º e 7º fluxos serão utilizados, respectivamente, para o desenvolvimento do


Projeto de TCC e para a escrita do TCC, como se segue:
6

6º fluxo: Laboratório de Reconhecimento de Técnicas de Produção Acadêmica


Neste PCA, o(a) aluno(a) desenvolverá o Projeto para o TCC a partir de uma das linhas de
pesquisa elaborada no PCA dos fluxos anteriores. Assim, este projeto fundamentará a reflexão
teórica, sendo acompanhado e avaliado por membro do corpo docente da Unigranrio. Serão
apresentados ao docente os procedimentos epistemológico-metodológicos necessários para
elaboração de projeto de pesquisa visando a preparação do trabalho de conclusão de curso
(TCC). Trata-se, portanto, de uma exigência curricular para obtenção de grau de Bacharel em
Teologia. Como produto, este PCA exigirá do(a) aluno(a) a produção de um Projeto de
Pesquisa que servirá de roteiro para a produção do TCC no 7º fluxo.

7º fluxo: TCC
Na disciplina PCA do 7º fluxo, o(a) aluno(a) desenvolverá o TCC propriamente dito,
apresentando os resultados da pesquisa devidamente documentados, sob forma escrita. Ao
final do semestre letivo, deverá apresentar seu TCC a uma Banca Examinadora, composta
pelo orientador e mais dois professores do curso de Teologia. Este PCA dedica-se a apresentar
as principais orientações de fundo teórico, metodológico e documental, segundo as novas
tendências e abordagens historiográficas, com vistas à elaboração da Monografia ou do Artigo
Científico, contemplando, ainda, a estrutura e a forma dos trabalhos acadêmicos. Seu produto
final, portanto, é o TCC.
7

3. PROJETO DE PESQUISA – MODELO


8

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

Nome do(a) aluno(a)

TÍTULO DO TRABALHO
Subtítulo do trabalho (se houver)

Projeto de pesquisa apresentado à Escola de Educação, Ciências,


Letras, Artes e Humanidades da Universidade do Grande Rio como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Teologia.

Duque de Caxias
2018
9

1
Área
Escolher uma das linhas de pesquisa dos PCA’s estudados ao longo do curso que melhor
esteja relacionada ao tema da pesquisa:

1) Laboratório de Reconhecimento de Práticas Teológicas e Doutrinárias;

2) Laboratório de Reconhecimento de Práticas de Ação Social e Política;

3) Laboratório de Reconhecimento de Práticas em Educação Religiosa;

4) Laboratório de Reconhecimento de Técnicas de Elaboração e de Implementação de


Projetos;

5) Laboratório de Reconhecimento de Práticas em Liderança e Gestão Eclesiástica e


Paraeclesiástica.

2
Tema / título provisório
O tema refere-se ao assunto da pesquisa, geralmente expresso num termo específico que
esclareça o teor do que será pesquisado do TCC. Por exemplo: O tema da pesquisa é a relação
entre evangelização e ação social.

O título (provisório) deve, de igual forma, estar bem vinculado ao tema da pesquisa e ao seu
problema ou intenção. Pode ser utilizado um subtítulo. Neste caso, usualmente se faz da
seguinte maneira: o título é mais “chamativo” e o subtítulo é explicativo. Por exemplo:

“Evangelização integral: uma análise da relação entre evangelização e ação social a partir da
Teologia da Missão Integral”

3
Objetivo(s) da pesquisa
São apresentados nesse ponto os objetivos gerais e específicos que a pesquisa busca alcançar.
São suas hipóteses afirmadas com força de conclusão. Trata-se de afirmar o que se deseja
alcançar, defender, argumentar, provar e demonstrar por meio da pesquisa realizada. Deve-se
utilizar verbos no infinitivo para apresentar tais conteúdos. Exemplo:

“Esta pesquisa busca demonstrar que a evangelização e a ação social devem ser
compreendidas como integrantes fundamentais da fé cristã”.
10

4
Problema(s) da pesquisa
Neste ponto, deve ser indicado o problema (ou problemas) que a pesquisa busca solucionar.
Esta parte é central para o TCC/artigo acadêmico, pois só haverá uma pesquisa caso exista um
problema claramente percebido e compreendido. Os problemas de uma pesquisa são
apresentados sob a forma de perguntas. O número de problemas, elaborado sob a forma de
questões, deve corresponder ao número das hipóteses, apresentadas no tópico seguinte.
Exemplo:

“Por que a igreja cristã usualmente separa evangelização da ação social em sua prática de fé?”

5
Hipótese(s) da pesquisa
Neste ponto, apresentam-se as hipóteses de solução para os problemas levantados no quesito
anterior. Uma hipótese é a “promessa” de uma resposta ao problema levantado. Isto é, trata-se
da resposta vinculada ao problema levantado pela pesquisa. Exemplo:

“A igreja separa evangelização da ação social por ainda sofrer influências da filosofia
neoplatônica em sua teologia e prática.”

6
Metodologia da pesquisa
Nesse ponto, descreve-se a metodologia utilizada na pesquisa: 1) pesquisa bibliográfica; 2)
pesquisa de campo (com entrevistas sob a forma estatística); 3) entrevistas gravadas e
transcritas. Nos dois últimos casos – pesquisa de campo e entrevistas – deve-se inserir os
resultados obtidos como ANEXO(S) ao TCC. Em todos os casos, deve-se descrever de forma
detalhada o processo a ser utilizado pela pesquisa.

Também deve-se fazer aqui uma breve descrição do que será tratado em cada capítulo da
monografia.

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Sumário (divisão dos capítulos)
Neste ponto, apresenta-se uma divisão (estrutura) da monografia. Esta divisão é provisória.
Serve apenas como “roteiro de viagem”, podendo ser alterada no decorrer da pesquisa.
Normalmente, divide-se em três capítulos, cada um com três subtópicos (embora esse número
possa ser ampliado, se for o caso). Um modelo básico poderia ser o seguinte:
11

1. Introdução

2. TÍTULO DO CAPÍTULO
2.1. Subtítulo
2.2. Subtítulo
2.3. Subtítulo
3. TÍTULO DO CAPÍTULO
3.1. Subtítulo
3.2. Subtítulo
3.3. Subtítulo
4. TÍTULO DO CAPÍTULO
4.1. Subtítulo
4.2. Subtítulo
4.3. Subtítulo
5. Conclusão
6. Referências bibliográficas
12

8
Bibliografia / Referencial teórico
Descrevem-se aqui as principais obras que serão utilizadas para a pesquisa (mínimo de 7
fontes, entre livros e artigos acadêmicos).

A formatação das referências bibliográficas seguirá o modelo abaixo:

SOBRENOME DO AUTOR EM MAIÚSCULA, seguido de vírgula, Primeiro Nome do autor


com apenas as iniciais em maiúscula, seguido de ponto. Título do livro em negrito seguido de
ponto. Nº da edição (apenas da 2ª edição em diante). Cidade da editora seguido de dois
pontos: nome da editora seguido de vírgula, ano de publicação do livro.

Exemplos:
CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. São Paulo: Cultrix/Pensamento, 2003.
CROATTO, José Severino. As linguagens da experiência religiosa: uma introdução à
fenomenologia da religião. 2ª edição. São Paulo: Paulinas, 2004.
DOWNING, David. C. S. Lewis: o mais relutante dos convertidos. São Paulo: Vida, 2006.
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4. PROJETO DE PESQUISA – EXEMPLO


PRONTO
14

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

Nome do(a) aluno(a)

O CUIDADO COMO A VOCAÇÃO DO EVANGELHO


Uma análise da relação entre evangelização e cuidado à luz da Teologia da Missão Integral

Projeto de pesquisa apresentado à Escola de Educação, Ciências, Letras,


Artes e Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito parcial
à obtenção do grau de Bacharel em Teologia.

Duque de Caxias
2018
15

1
Área
Laboratório de Reconhecimento de Práticas de Ação Social e Política.

2
Tema (introdução ao tema) / título provisório
Tema: Relação entre evangelização e cuidado. Evangelho em proposta integral.

Título: O CUIDADO COMO A VOCAÇÃO DO EVANGELHO: uma análise da relação entre


evangelização e cuidado à luz da Teologia da Missão Integral

3
Objetivos da pesquisa
Essa pesquisa possui os seguintes objetivos:

 Analisar criticamente o tipo de evangelização praticado pela igreja a partir de uma perspectiva
integradora do ser humano.
 Identificar, à luz da fé cristã, as várias dimensões do cuidado na relação humana com o
mundo, com o próximo e consigo mesmo.

4
Problema(s) da pesquisa
O problema principal que norteia essa pesquisa é o seguinte: 1) por que em muitas ocasiões a
evangelização praticada pela igreja não leva em consideração outras dimensões da vida humana além
da meramente espiritual?

Vinculado a esse problema central, podemos estabelecer outra questão:

2) A Teologia da Missão Integral (TMI) pode nos auxiliar a responder a essa temática?

5
Hipótese(s) da pesquisa
Esta pesquisa possui como hipóteses de trabalho as seguintes propostas:
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1) Em muitas ocasiões, a evangelização praticada pela igreja divide o ser humano em suas
dimensões espiritual e material (ou carnal) privilegiando a primeira em detrimento da
segunda. Isso ocorre por influências originadas da filosofia neoplatônica que ainda se faz
presente na reflexão e prática teológica.
2) A Teologia da Missão Integral proporciona uma visão integral do ser humano e da fé cristã.
Por isso, ela pode auxiliar a superar esse dualismo antropológico que, por vezes, caracteriza
a evangelização cristã.

6
Metodologia da pesquisa
A pesquisa será realizada através de pesquisa bibliográfica.

A pesquisa encontra-se dividida em três capítulos. No primeiro capítulo, buscaremos estabelecer


uma compreensão sobre os fundamentos filosóficos e teológicos que levaram a igreja a separar, na
prática, a evangelização de outras dimensões da vida humana, como o cuidado.

No segundo capítulo, abordaremos mais profundamente o tema do cuidado e suas dimensões.

No terceiro capítulo, por fim, iremos propor uma evangelização integradora a partir da teologia
proposta pela Teologia da Missão Integral.

7
Sumário (divisão dos capítulos)

1. Introdução
2. Fundamentos da separação entre evangelização e cuidado
2.1. As influências do neoplatonismo.
2.2. A prática dualista da evangelização da igreja.
2.3. Consequências do dualismo para a fé cristã.

3. Dimensões do cuidado.
3.1. A integralidade do ser humano como lugar da evangelização cristã.
3.2. O cuidado com o próprio ser.
3.3. Alteridade: o cuidado com o outro.
3.4. O cuidado com o mundo.
17

4. Contribuições da Teologia da Missão Integral para a superação do dualismo na evangelização.


4.1. Surgimento da Teologia da Missão Integral (TMI).
4.2. A teologia da TMI: o Pacto de Lausanne.
4.3. Implicações da TMI para a evangelização cristã.
5. Conclusão
6. Referências bibliográficas

8
Bibliografia / Referencial teórico
BOSCH, David J.. Missão transformadora: mudanças de paradigma na teologia da missão. São
Leopoldo: Sinodal, 2002.
ROCHA, Alessandro & VASCONCELLOS, Marcio Simão de. O poder da palavra na força do
Espírito: elementos da fé cristã na perspectiva da Teologia da Missão Integral. São Paulo:
Garimpo, 2016.
VICEDOM, Georg. A missão como obra de Deus: introdução à teologia da missão. São Leopoldo:
Sinodal, 1996.
COMBLIN, José. Teologia da missão. Petrópolis: Vozes, 1980.
LONGUINI NETO, Luiz. O novo rosto da missão: os movimentos ecumênico e evangelical no
protestantismo latino-americano. São Paulo: Ultimato, 2002.
MÜLLER, Karl. Teologia da Missão. Petrópolis: Vozes, 1995.
SCHERER, James A.. Evangelho, Igreja e Reino: estudos comparativos de Teologia da Missão.
São Leopoldo: Sinodal, 1991.
VICEDOM, Georg. A missão como obra de Deus: introdução à teologia da missão. São Leopoldo:
Sinodal, 1996.X
18

5. ARTIGO – MODELO
19

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

TÍTULO DO TCC
Subtítulo (se houver)

Nome do(a) aluno(a)

Duque de Caxias – RJ
2018
20

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

TÍTULO DO TCC
Subtítulo (se houver)

Nome do(a) aluno(a)

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de Educação, Ciências, Letras, Artes e


Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Teologia.

Professor(a) orientador(a):

Duque de Caxias – RJ
2018
21

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

Nome do(a) aluno(a)

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de Educação, Ciências,


Letras, Artes e Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito
parcial à obtenção do grau de Bacharel em Teologia.

Trabalho considerado _______________ com nota _________.

____________________________
Professor (a) Orientador (a): Inserir nome do(a) professor(a)

UNIGRANRIO

____________________________________
Inserir nome do(a) professor(a) examinador(a)
UNIGRANRIO

____________________________________
Inserir nome do(a) professor(a) examinador(a)
UNIGRANRIO

Duque de Caxias – RJ
2018
22

RESUMO

Escrita de um breve texto que apresente o resumo da pesquisa, o(s) problema(s), a(s)
hipótese(s) e seus objetivos. O texto deve possuir no mínimo 500 caracteres, escrito em
espaçamento simples.

Palavras-Chave: inserir as palavras-chave da pesquisa. Máximo de 3 palavras.

ABSTRACT

Inserir o mesmo texto do resumo, mas em língua inglesa.

Keywords: Inserir as mesmas palavras-chave em inglês.

Introdução

Deve-se elaborar, nessa seção, uma introdução geral ao tema, apresentando o(s)
problema(s) da pesquisa, a metodologia e os referenciais teóricos utilizados. O objetivo da
introdução é apresentar aos leitores do texto o “estado da questão” que possa conduzi-los ao
tema pesquisado pelo(a) aluno(a). Trata-se, portanto, de situar o assunto pesquisado, de
apresentar o contexto da pesquisa, que coloca seus leitores a par de tudo o que já foi tratado
sobre o tema.

Tópico de desenvolvimento
Nesse e nos demais tópicos de desenvolvimento, o(a) aluno(a) deverá criar subtítulos
vinculados ao tema abordado em cada subtópico. A argumentação deve manter coerência,
sentido e clareza em sua proposta.

Tópico de desenvolvimento
Idem ao anterior.

Tópico de desenvolvimento
Idem ao anterior.
23

Conclusão
Deve-se elaborar aqui um texto conclusivo que ressalte as hipóteses descobertas durante
a pesquisa e proporcione caminhos para novas pesquisas na área estudada. Observação: todo o
artigo, contando da introdução até a conclusão, deve possuir entre 7-10 páginas.

Referências bibliográficas

Segundo o modelo abaixo, as referências bibliográficas devem ser inseridas em ordem


alfabética, pelo sobrenome do autor:

SOBRENOME DO AUTOR TODAS AS LETRAS EM MAIÚSCULA seguido de vírgula


Primeiro Nome do autor somente com as iniciais em maiúsculas seguido de ponto. Título do
livro em negrito seguido de ponto. Nº da edição (somente a partir da 2ª edição) seguido de
ponto. Cidade da editora seguido de dois pontos: nome da editora seguido de vírgula, ano de
publicação do livro.

Exemplo:
CROATTO, José Severino. As linguagens da experiência religiosa: uma introdução à
fenomenologia da religião. 2ª edição. São Paulo: Paulinas, 2004.

Outras observações quanto à formatação:


 A fonte deverá ser Times New Roman, tamanho 12 para o corpo do texto, tamanho 11
para citações em destaque e tamanho 10 para as notas de rodapé
 Página no modelo A4, com as seguintes margens: 3cm superior; 2cm inferior;
2cm direita; 3cm esquerda.
 Espaçamento entre as linhas = 1,5 (excetuando-se citações em destaque com mais de três
linhas, notas de rodapé, referências bibliográficas e legendas de fotos ou gráficos, que
deverão ser digitados com espaçamento simples). O texto deve ser justificado. Parágrafo =
1 cm, com 0 cm para o antes e o depois de cada parágrafo.
 Citações em destaque (acima de 3 linhas) deverão possuir espaçamento simples entre as
linhas, tamanho da fonte = 11, recuo de 1cm da margem esquerda.

As normas da ABNT (norma NBR 6023) serão seguidas nas indicações bibliográficas
citadas nas notas de rodapé e na bibliográfica final. Exemplo:

ALVES, Rubem, Filosofia da ciência: introdução ao jogo e suas regras, p. 25.


24

Alguns exemplos básicos de referências bibliográficas:

Livro:

BETTENSON, H.. Documentos da igreja cristã. 4ª edição. São Paulo: Aste, 2001.

Dois autores:

ROCHA, Alessandro & VASCONCELLOS, Marcio Simão de. O poder da palavra na força
do Espírito: elementos da fé cristã na perspectiva da Teologia da Missão Integral. São
Paulo: Garimpo, 2016.

Obra organizada:

YUNES, Eliana (org.). Pensar a leitura: complexidade. São Paulo: Loyola, 2002.

Artigo de periódico

BARCELLOS, José Carlos, Literatura e teologia: perspectivas teórico-metodológicas no


pensamento católico contemporâneo in Numem: revista de estudos e pesquisa da religião,
Juiz de Fora, v. 3, n. 2, p. 23.

Artigo de jornal

BERTONE, T. O Pai-Nosso dever ressoar na vida do cristão. L’Osservatore Romano,


Roma, p. 1, 31 de julho de 2010.

Artigo disponível em Internet

VASCONCELLOS, Marcio Simão de. Ouvir o Espírito: caminho da mística cristã e de


uma espiritualidade humanizadora. In: Atualidade Teológica, Vol. 48, p. 623-633, set/dez
2014, disponível em: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/24503/24503.PDFXXvmi=
(acesso dia 14/3/2018).
25

6. ARTIGO – EXEMPLO PRONTO


26

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

TEOLOGIA E CIÊNCIA: DIÁLOGO POSSÍVEL?


Uma perspectiva interdisciplinar

Marcio Simão de Vasconcellos

Duque de Caxias – RJ
2018
27

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

TEOLOGIA E CIÊNCIA: DIÁLOGO POSSÍVEL?


Uma perspectiva interdisciplinar

Marcio Simão de Vasconcellos

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de Educação, Ciências, Letras, Artes e


Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Teologia.

Professor(a) orientador(a):

Duque de Caxias – RJ
2018
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UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

Marcio Simão de Vasconcellos

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de Educação, Ciências,


Letras, Artes e Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito
parcial à obtenção do grau de Bacharel em Teologia.

Trabalho considerado _______________ com nota _________.

____________________________
Professor (a) Orientador (a): Inserir nome do(a) professor(a)

UNIGRANRIO

____________________________________
Inserir nome do(a) professor(a) examinador(a)
UNIGRANRIO

____________________________________
Inserir nome do(a) professor(a) examinador(a)
UNIGRANRIO

Duque de Caxias – RJ
2018
29

Resumo
A proposta deste artigo é abordar a relação entre teologia e ciência, buscando identificar suas
especificidades e seus pontos de contato. Teologia e ciência constituem duas áreas da vida
humana que são profundamente necessárias à compreensão do mundo e da própria identidade
de homens e mulheres. Nesse sentido, é necessário possuir uma perspectiva interdisciplinar,
capaz de sustentar o diálogo entre estas dimensões do conhecimento. A teologia e a ciência
saem enriquecidas desse diálogo: por um lado, ambas reconhecem seus espaços de reflexão.
Por outro lado, ambas também aprendem uma da outra novos enfoques metodológicos para
refletir sobre a vida e a experiência religiosa. Nessa reflexão, recebe especial importância a
teologia de Teilhard de Chardin, cujo pensamento tem ecoado novas maneiras de pensar o
universo.

Palavras-chave: Teologia; ciência; interdisciplinaridade; Teilhard de Chardin.

Abstract
The purpose of this article is to discuss the relationship between theology and science, seeking
to identify its specificities and its points of contact. Theology and science are two areas of
human life that are profoundly needed to understand the world and the very identity of men
and women. In this sense, it is necessary to have an interdisciplinary perspective, capable of
sustaining the dialogue between these dimensions of knowledge. Theology and science are
enriched by this dialogue: on the one hand, both recognize their spaces for reflection. On the
other hand, both also learn from each other new methodological approaches to reflect on
religious life and experience. In this reflection, Teilhard de Chardin's theology receives
special importance, whose thinking has echoed new ways of thinking the universe.
Keywords: Theology; science; interdisciplinarity; Teilhard de Chardin.

Introdução

A relação entre fé e ciência, sobretudo as ciências naturais, é, historicamente, muito


conturbada. De rejeições mútuas e mesmo violentas1 à tentativas frágeis de gerar concordismo
entre elas, estas duas dimensões da vida humana caracterizam-se pela tensão, nem sempre
produtiva, que gerou uma visão dualista (quase maniqueísta) da vida. A abertura ao diálogo,
articulando coragem e discernimento, que foi marca da prática teológica da época patrística e
medieval2, foi sendo paulatinamente substituída, no decorrer da história cristã, por uma
teologia feita em trincheiras, recusando-se se abrir aos novos paradigmas formados. Tal

1
É possível lembrar o conflito entre a Igreja medieval e Galileu Galilei, no século XVI, cujos desdobramentos
até recentemente foram sentidos pela teologia em sua relação com a ciência evolutiva.
2
Cf. RUBIO, Alfonso Garcia, A teologia da criação desafiada pela visão evolucionista da vida e do cosmo
em: AMADO, Joel Portella & RUBIO, Alfonso Garcia (orgs.), Fé cristã e pensamento evolucionista, p. 18.
30

resistência teológica a novos horizontes ficou bastante evidenciada na Modernidade,


especialmente (mas não unicamente) por parte da teologia católica.
Assim, a partir desta perspectiva, ciência e fé tornam-se inimigas irreconciliáveis, cada
uma lutando para resguardar seu espaço dos avanços da outra. Tal postura criou seus
estereótipos: em múltiplas ocasiões, o cientista é visto pelo teólogo como o inimigo da fé
(caracterizado, muitas vezes, injustamente como o cético ateu), enquanto este é encarado pelo
cientista como retrógrado e limitado em sua visão pré-moderna de mundo. Assim, se por um
lado, há o fundamentalismo teológico como um claro empecilho a uma compreensão de
mundo mais integral e cientificamente sustentada, de outro subsiste uma espécie de
fundamentalismo científico, uma visão fechada da vida que gera um subproduto da ciência: o
cientificismo, cuja compreensão reduz drasticamente a vida humana a uma racionalidade
considerada supostamente objetiva3.
Em outras palavras, esta crise leva tanto a teologia como a ciência a perderem sua
relevância para o ser humano e para a construção de uma sociedade mais justa e harmoniosa.
Nesse sentido, portanto, cabe a necessidade de repensá-las a partir de um viés mais integrador.
É o que veremos a seguir.

A necessidade da interdisciplinaridade

O diálogo entre teologia e ciência exige, por sua própria natureza, uma perspectiva
interdisciplinar. Essa abertura epistemológica, capaz de gerar diálogo entre essas dimensões
do saber humano, só pode surgir num ambiente desvinculado de uma visão de mundo
positivista, característica do século XIX e início do XX. Assim, aquela espécie de saber
totalitário (enciclopédico), marca do século XIX-XX, seria abarcada por uma visão mais
integradora. Os saberes “recortados” desse período seriam reunidos, numa perspectiva de
interdisciplinaridade, respeitando suas respectivas áreas mas em mútua e constante relação,
numa verdadeira teia de relações. Assim, “fé e ciência devem ser domínios separados, mas
devem trabalhar levando-se em conta.”4. Tal relação de complementaridade só pode ocorrer
quando a arrogância científica e/ou teológica cede lugar à humildade de quem se percebe
como detentor de uma verdade não absoluta, mas parcial. E também quando se percebe que
ambas querem dar conta das questões que envolvem a existência humana, embora sempre de
perspectivas diferentes.

3
Cf., a respeito, a excelente análise feita por John F. HAUGHT, especialmente em sua obra: HAUGHT, John F.
Cristianismo e ciência: para uma teologia da natureza. São Paulo: Paulinas, 2009.
4
ARAGÃO, Gilbraz, Do transdisciplinar ao transreligioso em: TEPEDINO, Ana Maria & ROCHA,
Alessandro (orgs.), A teia do conhecimento, p. 134.
31

Para tanto, também é necessário que a teologia não se afaste do mundo, sob pretexto de
salvaguardar a própria mensagem. Caso o faça, ela poderá negligenciar a criação como espaço
de vida e atuação divina e humana, gerando uma hermenêutica teológica reprodutora de uma
divisão entre mundo natural e sobrenatural que, aliás, tem se mantido atuante desde o início
do cristianismo. Nas palavras de Alfonso Garcia Rubio:

Não se pode negar que essa teologia tem orientado um tipo de existência que separa o mundo da
salvação, a realidade da graça, a missão da igreja, o sentido dos sacramentos, a vida eterna, a
oração, o mundo do sagrado, etc., do mundo das realidades temporais, isto é, o mundo da
economia, da política, do comércio, das finanças, da educação, da ecologia e assim por diante.5
Ao enxergar a criação com essa lente dualista, o cristão se sente possibilitado para
participar da liturgia da igreja, levantando mãos para adorar ao Deus criador, ao mesmo
tempo em que, no “mundo natural” desvinculado de sua profissão de fé, vive alheio à ética do
reino de Deus. Liturgia vazia torna-se companheira da manipulação, da dominação e da
exploração do próximo e da criação, práticas dissociadas da fé por uma ruptura desastrosa
entre criação e salvação.
Mas como tornar realidade essa prática dialógica entre ciência e fé? Como superar
visões redutoras, de ambos os lados, a fim de produzir um ambiente onde se possa “escutar e
dizer, compreender e avançar, permanecer e mudar”6? Vale lembrar que para a fé cristã – e,
consequentemente, para a teologia que surge a partir dela – não se relacionar com a cultura na
qual está inserida significa trair seu próprio caráter, isto é, implica em não fazer a inculturação
necessária para afirmar as boas novas de Jesus. Aliás, esta relação entre fé e cultura, delineada
pela expressão inculturação da fé, é ponto essencial para o cristianismo, pois a fé nele
proclamada nunca é pura, antes, “toda fé é necessariamente fé inculturada”7.
De fato, cada contexto cultural reinterpreta a palavra original da fé cristã a partir de suas
próprias necessidades e características. Porque é experiência humana, a experiência da fé, do
encontro salvífico com Deus, sempre é previamente interpretada. Se negligenciarmos essa
necessidade de refletir sobre a inculturação da fé, e de dialogar com a cultura que vivemos,
perdemos o elemento essencial à própria fé cristã, a saber: a fé que surge do evangelho não é
mera representação, morta e estéril, mas sim ação, práxis, que se insere na vida cotidiana das
pessoas. Portanto, novas visões de mundo exigem novas formulações da fé e criativas
maneiras de expressá-la.

5
RUBIO, Alfonso García, Superação do dualismo entre criação e salvação, in MÜLLER, Ivo (org.),
Perspectivas para uma nova teologia da criação, p. 217.
6
AMADO, Joel Portella, Entre Deus e Darwin: contenda ou envolvimento? A respeito dos desafios que o
pensamento evolucionisa apresenta para a compreensão de Deus e vice-versa em: AMADO, Joel Portella &
RUBIO, Alfonso Garcia (orgs.), Fé cristã e pensamento evolucionista, p. 83.
7
MIRANDA, Mario de França, Inculturação da fé: uma abordagem teológica, p. 63.
32

Sendo assim, a teologia também precisa ser considerada por um novo ponto de vista.
Para tanto, podemos propor duas abordagens diferentes e complementares que se constituem
em dois caminhos possíveis para essa reelaboração. Nessa jornada, exige-se uma perspectiva
interdisciplinar, que una em diálogo ciência, teologia e cultura. Trata-se de rever conceitos da
teologia e da pastoral, objetivando um caminhar mais integrador entre as múltiplas dimensões
da vida humana. Do ponto de vista da fé cristã, que caminhos podem ser traçados aqui?

Caminhos teológicos e pastorais para o diálogo teologia-ciência

O primeiro caminho impele a teologia a repensar sua imagem de Deus. Fazer isso
implica, antes de tudo, em manter a perspectiva do Mistério em suas afirmações sobre Deus.
Nesse sentido, a teologia deve lembrar que toda linguagem religiosa é simbólica; remete a
algo transcendente que só é percebido porque se revelou, antes, na história humana. Daí poder
afirmar-se, também, que a impossibilidade da linguagem em apresentar Deus – como que
engaiolado porque definido / confinado – não é mera questão linguística. De fato, todas as
falas humanas sobre Deus fracassam em defini-lo. Esse fracasso, contudo, não é indicativo de
uma impossibilidade de se relacionar com Deus. Antes, pelo contrário: esse Deus que é
Mistério escolheu se revelar, numa proposta amorosa e graciosamente relacional, aos seres
humanos. Por isso, tanto o conteúdo como a forma desta revelação são essenciais para a
teologia em seu diálogo com a ciência moderna, pois muito da rejeição por parte de cientistas
à religião cristã surge do tipo de imagem que a teologia constrói de Deus.
Esta questão é extremamente séria e atual. De uma perspectiva cristã, imagens de Deus,
inteiramente dissociadas da vida humana e da própria revelação neotestamentária a respeito
de Deus, revelado em Jesus, podem servir de máscara para uma certa arrogância teológico-
eclesiástica de quem quer se apresentar como porta-voz da vontade absoluta da divindade.
Normalmente, quando isso ocorre, vincula-se uma imagem incorreta de Deus a um pensar
incoerente sobre Deus que traz muitos prejuízos à vida dos crentes e vários questionamentos
aos não crentes8.

8
Adolphe Gesché nos lembra que a pergunta sobre Deus é parte integrante da história humana. “A palavra Deus
existe. Sem dúvida, é a única certeza que consegue obter unanimidade. Com exceção disso, há a contenda para
saber se essa palavra tem um correspondente ou não e o que significa. [...] Com efeito, uma coisa é certa: ‘um
dia, em algum lugar’, homens forjaram essa palavra (e outros continuam recorrendo a ela). Ao menos uma vez
(de fato, incontáveis vezes), essa palavra fez sentido para o homem. Ora, nada daquilo que teve (e tem)
significado para o homem pode ser escamoteado. Portanto, para qualquer um, a questão de Deus se torna, sob
esta forma e por esse viés, uma questão indiscutível e primeira: qual é essa experiência de linguagem? O que ela
reveste? Qual realidade se dá a ver, a ler, a decifrar?” (GESCHÉ, Adolphe, Deus, p. 5, 28). No restante de seu
livro, Gesché apresenta vários caminhos para identificar os traços bíblicos do Deus que se revela no Judaísmo e
no Cristianismo. Cf., especialmente, o capítulo 3 deste livro.
33

O conteúdo da revelação de Deus é Jesus Cristo. Isso quer dizer, primeiramente, que
Deus se revela no humano, no Logos que se faz fraqueza humana, que se esvazia de si mesmo
em serviço (cf. Fl 2.5-8)9. Em outros termos, é a encarnação que nos permite conhecer a Deus.
Negligenciar esta imagem de Deus dada em Jesus resulta numa prática teológica agressiva,
fundamentalista e fanática que, em nome desse Deus criado pelo encontro da filosofia com a
sede de poder do ser humano, mata, destrói, esmaga e exclui muitas pessoas.
Essa revelação de Deus em Jesus implica também em refletirmos sobre a forma pela
qual esta revelação ocorre. Ela surge do encontro entre o desejo de Deus de relacionar-se com
a criação – o Deus-Trindade é relacional – e da kênosis (esvaziamento) que ele realiza ao
cumprir esse intento. É esse desejo de alteridade divina, de se relacionar com o outro criado,
que faz nascer a teologia como proposta de reflexão sobre o criador. Parece estranho, por isso,
que atualmente a teologia queira se desvencilhar dessas propostas. Ora, um Deus relacional
implica numa teologia igualmente relacional. Um Deus que se esvazia de si mesmo para, em
Cristo, reconciliar consigo mesmo toda a criação (2ª Co 5.19), requer uma teologia que faça o
mesmo em prol do outro. Por isso, é incompreensível uma teologia que se negue a apresentar-
se, humilde, ao diálogo com a ciência e a cultura.
Por seu próprio caráter, a revelação diz respeito ao que se passa no universo, mas trata
de uma dimensão da realidade que passa, necessariamente, despercebida pela ciência. E uma
teologia da natureza, sem negar o valor e a importância da ciência, propõe níveis de
profundidade na natureza que a ciência simplesmente não pode atingir. Assim, ambas,
teologia e ciência, tem seu espaço necessário na compreensão do universo. A revelação cristã
aponta para um Deus que se revela no e através do mundo observável (tanto pela teologia
como pela ciência); por isso, como diz Haught, “em virtude da encarnação, todo drama da
natureza que se desdobra ao longo de bilhões de anos é também a revelação de Deus” 10, e,
além disso, “o universo como um todo, em virtude da encarnação, encontra-se
indissociavelmente conexo com a revelação de Deus em Cristo.”11. Por isso, revelação é
muito mais que um conjunto de informações sobre Deus. Antes, revelação é “dom do próprio
ser e individualidade de Deus para e através de todo o universo”, e seu conteúdo é “o infinito
mistério do próprio ser de Deus.”12.

9
O termo grego usado pelo apóstolo Paulo para se referir a Jesus, nessa passagem da Carta aos Filipenses, é
kênosis. Esse termo significa “esvaziamento” e faz referência direta à encarnação de Deus em Jesus de Nazaré,
isto é, à afirmação da fé cristã de que Jesus é a expressa imagem do ser de Deus (cf. Hb 1. 3). Lido nessa
perspectiva, a kênosis representa um dos mais importantes temas teológicos contemporâneos.
10
HAUGHT, John F., Cristianismo e ciência, p. 61
11
Ibidem
12
Ibid., p. 63-64
34

Por isso, a imagem de Deus que surge da fé cristã é construída sobre dois fundamentos
que a caracterizam: a) A autoabnegação humilde de Deus, eterno gesto de rebaixamento que
possibilita a existência da criação, isto é, a kénosis divina; b) A promessa de Deus que abre
espaço à afirmação do futuro, isto é, a esperança escatológica. Dessa forma, a humildade e a
promessa divinas são expressões do amor incondicional que constitui a essência de Deus.
Porque ama, Deus se revela, e ao se revelar, se compromete com sua criação. Esta imagem
revelada de Deus encontra sua plenitude em Jesus, em quem a kénosis assume carne, suor e
sangue. Nesse sentido, Jesus revela um Deus “vulnerável, sofredor”, que, devido ao seu amor
pela criação, se esvazia de sua condição de Deus “todo-poderoso” para se entregar ao
universo. De igual modo, o Deus que se revela possibilita um futuro sempre novo.
Um segundo caminho possível para a teologia nesse diálogo com a ciência a conduz na
direção de repensar sua imagem acerca do ser humano e do cosmos. Nesse sentido, vale
ressaltar que o desejo pelo Mistério, que caracteriza o ser humano, é revelacional. Assim, o
mistério como condição antropológica é anterior a todas as coisas. Nesse voltar-se ao
Mistério, a teologia encontra seu papel de responder às questões-limite: sofrimento, dor,
angústia existencial e morte. Aliás, essa experiência é vivida por Jesus: na cruz, diante de uma
experiência-limite (a morte precedido pelo sofrimento injusto (Lc 23.41)), Jesus faz uma
questão-limite: “Deus meu, por que me desamparaste?” (Mt 27.46). Mas diante desse
mistério, Jesus se lança com esperança nos braços do Pai: “Pai, nas tuas mãos entrego meu
espírito” (Lc 23.46). Entre essas duas frases há palavra de perdão aos que não souberam
perceber um Deus que ama em sua kênosis na cruz. E entre essas duas frases também subsiste
o abismo do desespero e da perda de sentido que uma visão fundamentalista da vida (seja rela
religiosa ou científica) pode produzir.
Esse mistério de Deus permeia a criação inteira, gerando vínculos de relação
intersubjetiva entre os seres criados. Nesse sentido, toda a criação participa do mesmo
mistério de Deus, não numa perspectiva panteísta (Deus não se dissolve na criação), mas sim
numa leitura panenteísta, isto é, a presença de Deus ilumina desde dentro toda a realidade,
sem se confundir com as coisas criadas. Isso confere uma dimensão mística à existência
humana e ao cosmos. É nesse ponto que as reflexões propostas por Teilhard de Chardin
revelam-se necessárias ao tema. Para Teilhard, o universo conta com uma noosfera, isto é, a
esfera da mente: uma “camada de pensamento da história da terra, uma rede formada de
pessoas, sociedades e criações culturais e tecnológicas.”13. Segundo Teilhard, a noosfera é um

13
Ibid., p. 113
35

dos mais interessantes desenvolvimentos da história do universo. Por isso, nas palavras de
Haught:

O empirismo mais lato de Teilhard, que restitui a dimensão do pensamento a seu domínio
próprio na natureza, coloca em xeque a metafísica materialista do naturalismo científico
subjacente ao moderno reconhecimento de que o universo carece de propósito. Ao mesmo
tempo, a recusa de Teilhard a separar a subjetividade ou o pensamento da natureza como um
todo, proporciona à teologia um meio de tornar inteligível a crença cristã, segundo a qual Deus
atua na natureza de maneira muito íntima e efetiva, ainda que sempre misteriosa.14
Dessa forma, um reino de matéria desprovido de mente nunca existiu, já que a matéria
já estava impregnada da mente e do espírito desde o início do universo. Além disso, não mais
se enxerga a vida pela lente dualista do corpo versus espírito, pois para Teilhard, matéria e
espírito “são rótulos de duas tendências polares na evolução da natureza, não dois tipos
isolados de substância. (...) Além disso, é o espírito, e não a matéria, que imprime solidez e
consistência ao cosmo.”15.
Além da dimensão mística (fundamentalmente necessária para o fazer e o refletir
teológico em nosso tempo), essa perspectiva resgata uma compreensão salvífica do cosmos.
Nas palavras de Garcia Rubio, “a criação já é o começo da salvação. Na criação, encontramos
já o movimento kenótico em Deus”16. E mais: o universo inteiro é resignificado como espaço
litúrgico para celebrar a Deus, rompendo toda ótica dualista. O universo é visto como espaço
de vida, e não de morte. Aliás, numa perspectiva da teologia da criação, Deus não criou ou
criará; Deus cria. O sábado do descanso divino não é ausência do ato criativo de Deus, mas
sim convite à criação que participe (celebrando, criando) deste ato da criação. Por isso, devido
à vida exuberante que surge de Deus, como dom à sua criação, o sol levanta-se todas as
manhãs, de forma regular, “por nunca se cansar de levantar-se”; ou, ainda nas palavras de
Chesterton:

Talvez Deus seja forte o suficiente para exultar na monotonia. É possível que Deus todas as
manhãs diga ao sol: “Vamos de novo”; e todas as noites à lua: “Vamos de novo”. Talvez não
seja uma necessidade automática que torna todas as margaridas iguais; pode ser que Deus crie
todas as margaridas separadamente, mas nunca se canse de criá-las. Pode ser que ele tenha um
eterno apetite de criança; pois nós pecamos e ficamos velhos, e nosso Pai é mais jovem do que
nós. A repetição na natureza pode não ser mera recorrência; pode ser um BIS teatral.17
Reafirma-se, portanto, a atuação relacional de Deus com sua criação, como resultado de
sua kênosis, que o leva, em nome de seu amor, a dar espaço para que o outro seja, bem como

14
Ibid., p. 113-114
15
Ibid., p. 114
16
RUBIO, Alfonso Garcia, A teologia da criação desafiada pela visão evolucionista da vida e do cosmo em:
AMADO, Joel Portella & RUBIO, Alfonso Garcia (orgs.), Fé cristã e pensamento evolucionista, p. 38
17
CHESTERTON, G. K., Ortodoxia, p. 100
36

a esperança cristã de que toda esta criação está conectada com o ser humano e será também
integralmente redimida por Deus-Criador-Salvador (cf. Rm 8.19-23).

Conclusão

A relação entre teologia e ciência ainda precisa ser desenvolvida de forma mais plena e
dialogal. Essa abordagem interdisciplinar, longe de descaracterizá-las enquanto disciplinas
independentes, auxilia no enriquecimento tanto da teologia como da ciência. Se a teologia
afirma a criação como espaço onde Deus se faz presente, animando todas as coisas com a
força de sua Ruah, a ciência cria novas e interessantes lentes de análise para enxergar tal
criação de um viés mais meticuloso. Tal abordagem também propicia análises sobre as
questões ecológicas, vistas tanto sob o ponto de vista da ciência como da teologia. Exemplo
recente dessa proposta, aliás, é a Carta Encíclica Lautado Si’, elaborada pelo Papa Francisco
em 2015. Esse documento da Igreja mereceria maiores estudos, sobretudo de grupos
protestantes no Brasil.
É nesse sentido que, do ponto de vista cristão, é possível tratar do tema da entropia, a
destinação do universo para sua destruição. A partir desta nova imagem de Deus, do ser
humano e do cosmos, inter-relacionados mutuamente, não se compreende a entropia como
palavra definitiva para o futuro do ser humano. Antes, pelo contrário: a entropia anuncia,
paradoxalmente, novo momento criacional. O caos é combustível da evolução do mundo
rumo ao seu pleno desenvolvimento. Em termos teológicos, poderíamos dizer que morte de
Cristo na cruz foi um momento entrópico – pois a entropia faz parte do universo em evolução
– mas dela surge o novo. Nesse sentido, a ressurreição de Cristo anuncia o fim da entropia,
cujo climax é a nova criação. Só quando se vê a ressurreição como anúncio do fim da
entropia, pode-se pensar num tempo (eternidade) em que não haverá mais entropia, quando
Deus “lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem
pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram” (Ap 21.4). Dessa forma, quando Deus
for tudo em todos (I Co 15.28) e “quando este corpo corruptível se revestir de
incorruptibilidade, e o que é mortal se revestir de imortalidade, então se cumprirá a palavra
que está escrita: tragada foi a morte pela vitória.” (I Co 15.54); então a morte (entropia) será
vencida. Por isso, a entropia não tem a última palavra! Ela é necessária para o processo
evolutivo, maneira que Deus escolheu conduzir sua criação, mas haverá o momento de seu
fim.
37

O futuro é sempre melhor, pois é futuro do criador. Todo pecado entrópico – isto é, toda
destruição da alteridade do outro – será revertido na afirmação da individualidade de cada ser
humano, reconhecida e valorizada por Deus, que dá a cada um “uma pedrinha branca e sobre
ela um nome novo que somente quem o recebe conhece.” (Ap 2.17). Pensar teologia a partir
desta esperança é a maneira de se relacionar com a ciência e com a cultura que nos cerca.

Referências bibliográficas

AMADO, Joel Portella & RUBIO, Alfonso Garcia (orgs.). Fé cristã e pensamento
evolucionista: aproximações teológico-pastorais a um tema desafiador. São Paulo:
Paulinas, 2012.
CARDENAL, Ernesto. Vida en el amor. Buenos Aires: Carlos Lohlé, 1972.
CHESTERTON, G. K.. Ortodoxia. São Paulo: Mundo Cristão, 2008.
GESCHÉ, Adolphe. O sentido. São Paulo: Paulinas, 2005.
HAUGHT, John F. Cristianismo e ciência: para uma teologia da natureza. São Paulo:
Paulinas, 2009.
MIRANDA, Mario de França. Inculturação da fé: uma abordagem teológica. São Paulo:
Loyola, 2001.
MOLTMANN, Jürgen. O Espírito da vida: uma pneumatologia integral. Petrópolis:
Vozes, 2010.
MÜLLER, Ivo (org.). Perspectivas para uma nova teologia da criação. Petrópolis: Vozes,
2003.
SCHILLEBEECKX, Edward. História humana: revelação de Deus. São Paulo: Paulus,
1994.
TEPEDINO, Ana Maria & ROCHA, Alessandro (orgs.). A teia do conhecimento: fé, ciência
e transdisciplinaridade. São Paulo: Paulinas, 2009.
38

7. TCC – MODELO
39

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

TÍTULO DO TCC
Subtítulo (se houver)

Nome do(a) aluno(a)

Duque de Caxias – RJ
2018
40

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

TÍTULO DO TCC
Subtítulo (se houver)

Nome do(a) aluno(a)

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de Educação, Ciências, Letras, Artes e


Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Teologia.

Professor(a) orientador(a):

Duque de Caxias – RJ
2018
41

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

Nome do(a) aluno(a)

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de Educação, Ciências,


Letras, Artes e Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito
parcial à obtenção do grau de Bacharel em Teologia.

Trabalho considerado _______________ com nota _________.

____________________________
Professor (a) Orientador (a): Inserir nome do(a) professor(a)
UNIGRANRIO

____________________________________
Inserir nome do(a) professor(a) examinador(a)
UNIGRANRIO

____________________________________
Inserir nome do(a) professor(a) examinador(a)
UNIGRANRIO

Duque de Caxias – RJ
2018
42

DEDICATÓRIA

Espaço destinado à escrita da dedicatória (opcional).


43

AGRADECIMENTOS

Espaço destinado aos agradecimentos do(a) aluno(a).


44

RESUMO

Escrita de um breve texto que apresente o resumo da pesquisa, o(s) problema(s), a(s)
hipótese(s) e seus objetivos. O texto deve possuir no mínimo 500 caracteres, escrito em
espaçamento simples.

Palavras-Chave: inserir as palavras-chave da pesquisa. Máximo de 3 palavras.


45

ABSTRACT

Inserir o mesmo texto do resumo, mas em língua inglesa.

Keywords: Inserir as mesmas palavras-chave em inglês.


46

SUMÁRIO

1. Introdução ........................................................................................................................... xx
2. Título do primeiro capítulo ................................................................................................. xx
2.1. Subtópico .............................................................................................................. xx
2.2. Subtópico .............................................................................................................. xx
2.3. Subtópico .............................................................................................................. xx
3. Título do segundo capítulo ................................................................................................. xx
3.1. Subtópico .............................................................................................................. xx
3.2. Subtópico .............................................................................................................. xx
3.3. Subtópico .............................................................................................................. xx
4. Título do terceiro capítulo .................................................................................................. xx
4.1. Subtópico .............................................................................................................. xx
4.2. Subtópico .............................................................................................................. xx
4.3. Subtópico .............................................................................................................. xx
5. Conclusão ........................................................................................................................... xx
6. Referências bibliográficas .................................................................................................. xx
Anexos (se houver) ................................................................................................................. xx
47

1. INTRODUÇÃO

Deve-se elaborar, nessa seção, uma introdução geral ao tema, apresentando o(s)
problema(s) da pesquisa, a metodologia e os referenciais teóricos utilizados. O objetivo da
introdução é apresentar aos leitores do texto o “estado da questão” que possa conduzi-los ao
tema pesquisado pelo(a) aluno(a). Trata-se, portanto, de situar o assunto pesquisado, de
apresentar o contexto da pesquisa, que coloca seus leitores a par de tudo o que já foi tratado
sobre o tema.

Deve possuir entre 2-3 páginas.


48

2. TÍTULO DO CAPÍTULO

Cada capítulo de uma monografia deverá ser bem estruturado, de forma que apresente
um pensamento coerente e argumentações bem fundamentadas nas fontes pesquisadas. O
ideal é que cada capítulo apresente um subtema alinhado ao tema principal da monografia.
Cada capítulo deverá possuir, em média, 10 páginas.

Cada um dos subtópicos do capítulo deve auxiliar na argumentação criando uma


narrativa coesa, lógica, com escrita clara e pertinente ao tema. Os títulos dos capítulos e dos
subtópicos dentro de cada um deles deverá ser escolhido pelo(a) aluno(a) a partir do sumário
elaborado no Projeto de Pesquisa.

2.1. Subtópico do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).

2.2. Subtópico do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).

2.3. Subtópico do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).
49

3. TÍTULO DO CAPÍTULO

Cada capítulo de uma monografia deverá ser bem estruturado, de forma que apresente
um pensamento coerente e argumentações bem fundamentadas nas fontes pesquisadas. O
ideal é que cada capítulo apresente um subtema alinhado ao tema principal da monografia.
Cada capítulo deverá possuir, em média, 10 páginas.

Cada um dos subtópicos do capítulo deve auxiliar na argumentação criando uma


narrativa coesa, lógica, com escrita clara e pertinente ao tema. Os títulos dos capítulos e dos
subtópicos dentro de cada um deles deverá ser escolhido pelo(a) aluno(a) a partir do sumário
elaborado no Projeto de Pesquisa.

3.1. Subtópico do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).

3.2. Subtópico do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).

3.3. Subtópico do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).
50

4. TÍTULO DO CAPÍTULO

Cada capítulo de uma monografia deverá ser bem estruturado, de forma que apresente
um pensamento coerente e argumentações bem fundamentadas nas fontes pesquisadas. O
ideal é que cada capítulo apresente um subtema alinhado ao tema principal da monografia.
Cada capítulo deverá possuir, em média, 10 páginas.

Cada um dos subtópicos do capítulo deve auxiliar na argumentação criando uma


narrativa coesa, lógica, com escrita clara e pertinente ao tema. Os títulos dos capítulos e dos
subtópicos dentro de cada um deles deverá ser escolhido pelo(a) aluno(a) a partir do sumário
elaborado no Projeto de Pesquisa.

4.1. Subtítulo do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).

4.2. Subtítulo do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).

4.3. Subtítulo do capítulo

Cada subtópico deve ser elaborado a partir do roteiro estabelecido no sumário do


Projeto de Pesquisa, de acordo com as intenções do(a) aluno(a).
51

5. CONCLUSÃO

Deve-se elaborar aqui um texto conclusivo que ressalte as hipóteses descobertas durante
a pesquisa e proporcione caminhos para novas pesquisas na área estudada. A conclusão deve
possuir em média 2 páginas.
52

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Segundo o modelo abaixo, as referências bibliográficas devem ser inseridas em ordem


alfabética, pelo sobrenome do autor:

SOBRENOME DO AUTOR TODAS AS LETRAS EM MAIÚSCULA seguido de vírgula


Primeiro Nome do autor somente com as iniciais em maiúsculas seguido de ponto. Título do
livro em negrito seguido de ponto. Nº da edição (somente a partir da 2ª edição) seguido de
ponto. Cidade da editora seguido de dois pontos: nome da editora seguido de vírgula, ano de
publicação do livro.

Exemplo:

CROATTO, José Severino. As linguagens da experiência religiosa: uma introdução à


fenomenologia da religião. 2ª edição. São Paulo: Paulinas, 2004.
Outras observações quanto à formatação:

 A fonte deverá ser Times New Roman, tamanho 12 para o corpo do texto, tamanho 11
para citações em destaque e tamanho 10 para as notas de rodapé
 Página no modelo A4, com as seguintes margens: 3cm superior; 2cm inferior;
2cm direita; 3cm esquerda.
 Espaçamento entre as linhas = 1,5 (excetuando-se citações em destaque com mais de três
linhas, notas de rodapé, referências bibliográficas e legendas de fotos ou gráficos, que
deverão ser digitados com espaçamento simples). O texto deve ser justificado. Parágrafo =
1 cm, com 0 cm para o antes e o depois de cada parágrafo.
 Citações em destaque (acima de 3 linhas) deverão possuir espaçamento simples entre as
linhas, tamanho da fonte = 11, recuo de 1cm da margem esquerda.

As normas da ABNT (norma NBR 6023) serão seguidas nas indicações bibliográficas
citadas nas notas de rodapé e na bibliográfica final. Exemplo:

ALVES, Rubem, Filosofia da ciência: introdução ao jogo e suas regras, p. 25.

Alguns exemplos básicos de referências bibliográficas:

Livro:

BETTENSON, H.. Documentos da igreja cristã. 4ª edição. São Paulo: Aste, 2001.

Dois autores:

ROCHA, Alessandro & VASCONCELLOS, Marcio Simão de. O poder da palavra na força
do Espírito: elementos da fé cristã na perspectiva da Teologia da Missão Integral. São
Paulo: Garimpo, 2016.

Obra organizada:
53

YUNES, Eliana (org.). Pensar a leitura: complexidade. São Paulo: Loyola, 2002.

Artigo de periódico

BARCELLOS, José Carlos, Literatura e teologia: perspectivas teórico-metodológicas no


pensamento católico contemporâneo in Numem: revista de estudos e pesquisa da religião,
Juiz de Fora, v. 3, n. 2, p. 23.

Artigo de jornal

BERTONE, T. O Pai-Nosso dever ressoar na vida do cristão. L’Osservatore Romano,


Roma, p. 1, 31 de julho de 2010.

Artigo disponível em Internet

VASCONCELLOS, Marcio Simão de. Ouvir o Espírito: caminho da mística cristã e de


uma espiritualidade humanizadora. In: Atualidade Teológica, Vol. 48, p. 623-633, set/dez
2014, disponível em: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/24503/24503.PDFXXvmi=
(acesso dia 14/3/2018).
54

8. TCC – EXEMPLO PRONTO


55

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

“VENHA O TEU REINO!”


Uma análise bíblica e teológica do reino de Deus na perspectiva de Jesus de
Nazaré

Ana Patrícia Botelho Grossi

Duque de Caxias – RJ
2018
56

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

“VENHA O TEU REINO!”


Uma análise bíblica e teológica do reino de Deus na perspectiva de Jesus de
Nazaré

Ana Patrícia Botelho Grossi

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de Educação, Ciências, Letras, Artes e


Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Teologia.

Professor(a) orientador(a): Marcio Simão de Vasconcellos

Duque de Caxias – RJ
2018
57

UNIVERSIDADE DO GRANDE RIO


“PROFESSOR JOSÉ DE SOUZA HERDY”

Ana Patrícia Botelho Grossi

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Escola de Educação, Ciências,


Letras, Artes e Humanidades da Universidade do Grande Rio como requisito
parcial à obtenção do grau de Bacharel em Teologia.

Trabalho considerado _______________ com nota _________.

____________________________
Prof. Me. Marcio Simão de Vasconcellos

PROF. ORIENTADOR – UNIGRANRIO

____________________________________
Prof. Dr. Alessandro Rodrigues Rocha
UNIGRANRIO

____________________________________
Prof. Especialista Antonio Lucio Avellar Santos
UNIGRANRIO

Duque de Caxias – RJ
2018
58

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todos os homens e mulheres


que sinalizam o reino de Deus por meio de suas vidas.
59

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, de todo o meu coração, por que escolheu esvaziar-se de sua divindade
e encarnar para que compreendêssemos o seu projeto para a humanidade: o Reino!

Agradeço à minha família: Sonia, minha mãe, in memorian, pois muito do que sou hoje
devo à ela: mulher incrivelmente batalhadora. Te amo mãe! Diego José, meu paizão, que
dedicou a vida para criar a mim e à minha irmã. E desdobrou-se por nós quando minha mãe se
foi! Te amo pai! À minha irmã (um pouco mãe, um pouco filha), Tatiana, por ser minha
melhor amiga e companheira, te amo irmã! À minha sobrinha Alayne por colorir meus dias, te
amo como se você fosse minha filha!

Ao amor da minha vida, Etimar, por me apoiar, me compreender e cuidar de mim...


Obrigada por tudo, amo você!

Aos pastores Paulo Vicente e Milton Pereira... agradeço a vocês, pois fizeram grande
diferença em minha vida!

Aos professores do Curso de Teologia da Unigranrio, especialmente ao meu orientador


Marcio Simão, vocês me inspiram!

A todos os colegas de turma, especialmente às meninas: Luciana, Dani, Claudia e tia


Lourdes e aos meninos: Cleiton, Deivis, Alan, Erik e Alex por dispensarem a mim amizade e
apoio constantes.
60

RESUMO

A presente pesquisa pretende investigar a ação e mensagem de Jesus de Nazaré, que declara
ter como missão fazer a vontade do Pai (Jo 4,34). Esta vontade se torna evidente se
analisarmos seriamente os textos neotestamentários, consiste no estabelecimento do Reino de
Deus. Diante da relevância deste tema para aqueles que se declaram seguidores de Jesus,
buscamos, inicialmente, conceituar Reino de Deus e resgatar historicamente as expectativas
messiânicas que o povo de Israel tinha com relação a esse tema, assim como, ressaltaremos os
grupos religiosos e suas expectativas messiânicas na época de Jesus. Logo depois,
pensaremos, efetivamente, sobre o Jesus histórico e refletirmos sobre sua proposta – o Reino
de Deus – baseados no evangelho de Lucas e demonstraremos como a vida de Jesus foi
vivida, basicamente, para anunciar o Reino. Por fim, demonstraremos como a visão
escatológica é determinante para a prática eclesiológica, analisando a tensão entre o “já” e o
“ainda não”, as primeiras comunidades de fé, em Atos dos Apóstolos, e concluiremos falando
sobre a missão da Igreja como agência sinalizadora do Reino de Deus.

Palavras-Chave: Reino de Deus; Jesus de Nazaré; Eclesiologia do reino de Deus


61

ABSTRACT

The present research intends to investigate the action and message of Jesus of Nazareth, who
declares that his mission is to do the will of the Father (Jn 4,34). This will becomes evident if
we seriously analyze the New Testament texts, it consists in establishing the Kingdom of God.
In view of the relevance of this theme to those who declare themselves to be followers of
Jesus, we initially sought to conceptualize the Kingdom of God and to rescue historically the
messianic expectations that the people of Israel had with regard to this theme, as well as
emphasizing religious groups and their expectations messianic in the time of Jesus. Soon
after, we will think effectively about the historical Jesus and reflect on his proposal - the
Kingdom of God - based on the gospel of Luke and demonstrate how the life of Jesus was
basically lived to proclaim the Kingdom. Finally, we will demonstrate how the eschatological
vision is decisive for ecclesiological practice, analyzing the tension between the "already" and
the "not yet", the first communities of faith, in Acts of the Apostles, and conclude by talking
about the Church's mission as signifying agency of the Kingdom of God.

Keywords: God's kingdom; Jesus of Nazareth; Ecclesiology of the Kingdom of God


62

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 10
2. REINO DE DEUS E EXPECTATIVA MESSIÂNICA .................................................. 11
2.1. Abordagem conceitual sobre o reino de Deus ....................................................... 11
2.2. A expectativa messiânica em Israel ...................................................................... 13
2.3. Grupos religiosos da Palestina no período de Jesus de Nazaré ............................. 17
3. REINO DE DEUS E A PROPOSTA DE JESUS DE NAZARÉ ................................... 22
3.1. Um olhar sobre o Jesus do Reino .......................................................................... 22
3.2. O Reino de Deus: uma análise a partir do Evangelho de Lucas ........................... 25
3.3. A vida de Jesus como anúncio do Reino ............................................................... 29
4. REINO DE DEUS COMO MODELO DE UMA ECLESIOLOGIA RELEVANTE . 34
4.1. O Reino de Deus como anúncio escatológico para a prática eclesiástica ............. 34
4.2. O Reino de Deus na prática da igreja cristã primitiva: uma leitura de Atos dos
Apóstolos .............................................................................................................. 38
4.3. A igreja cristã como sinal do Reino de Deus ........................................................ 43
5. CONCLUSÃO .................................................................................................................. 49
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 51
63

1. INTRODUÇÃO

Através da leitura das obras lucanas (Lucas/Atos dos Apóstolos) temos um acesso
à história da vida, ministério, morte e ressurreição de Jesus de Nazaré. De posse desse
conhecimento, olhando para as nossas igrejas atuais e observando as práticas cristãs ali
desenvolvidas, muito facilmente nos espantaremos com tamanha discrepância entre o
que Jesus viveu/pregou e o que hoje nossas comunidades de fé vivem/pregam. Nesse
sentido, o estudo do tema aqui proposto é de suma importância porque nos revela o
conteúdo mais central do evangelho, a saber: o reino de Deus. A partir da análise da
vida e ministério de Jesus de Nazaré, especialmente baseados nos textos lucanos,
buscaremos refletir sobre sua proposta - o Reino de Deus.
A presente pesquisa busca refletir sobre a pregação e a prática de Jesus de Nazaré
com o objetivo de relacioná-las com a realidade da vivência da fé cristã em nossos dias.
Como caminho para essa reflexão, buscaremos respostas para algumas questões:
Que ideias o povo de Israel tinha sobre o Reino de Deus? Qual era a sua expectativa
messiânica? Como Jesus de Nazaré interpretava o Reino de Deus? Qual foi a
importância desse tema para sua vida e sua pregação? Como a tensão entre o “já” e o
“ainda não” pode contribuir para nossa prática eclesiológica? Como essa tensão se
configura hoje? Qual contribuição as comunidades primitivas nos oferecem? Existem
hoje igrejas sinalizadoras do Reino de Deus, na mesma perspectiva, anunciada por Jesus
de Nazaré?
No primeiro capítulo, falaremos de forma breve sobre o conceito do Reino de
Deus a fim de entender a profundidade da pregação de Jesus. Falaremos sobre as
expectativas messiânicas judaicas e sobre as tradições messiânicas que estavam vigentes
durante o ministério do Jesus para percebermos o contexto em que Jesus estava quando
viveu e pregou. Contaremos para isso com o apoio de alguns autores, entre os principais
estão: Oscar Cullmann, Hans Kessler, David Bosch, Jon Sobrino, Milton Schwantes e
Alfonso G. Rubio.
No segundo capítulo, abordaremos de forma breve o tema do Reino de Deus na
proposta de Jesus de Nazaré, lançando um olhar sobre o Jesus histórico para
compreendermos melhor sobre quem foi o homem por trás do Cristo da fé. Em seguida,
analisaremos a proposta do Reino feita por Jesus, a partir do evangelho lucano,
buscando pistas para compreender o que era que Ele de fato estava propondo. Por fim,
demonstrarmos como a vida de Jesus, com suas palavras e atitudes, anunciou o Reino.
64

Os autores principais aqui serão: José Antônio Pagola, David Bosch, Albert Nolan e
Maria Clara Bingemer.
O último capítulo considera que a visão escatológica influencia a postura e a
prática eclesiológica. Nesse sentido, buscamos superar algumas visões escatológicas
historicamente difundidas e, já que nosso tema central é o Reino de Deus, pensarmos
sobre a tensão entre o “já” e o “ainda não”, refletindo em como esta possibilidade pode
alterar o comprometimento da igreja com o mundo à sua volta. Logo depois, propomos
a análise das primeiras comunidades cristãs no livro de Atos, refletindo sobre a questão
da koinonia, característica principal das primeiras comunidades. E, por fim, fazemos um
convite à Igreja de hoje, com o intuito que ela se permita uma autorreflexão sobre sua
prática cristã. Os autores que contribuirão neste capítulo serão: Bosch, Stott e
Moltmann.
A presente pesquisa apresenta a seguinte proposta: é necessário haver um contato
com estudos a respeito do Jesus histórico, e do ambiente no qual Ele exerceu sua
pregação, pois o seguimento de Jesus, tem sido trilhado através dos tempos, quase que
exclusivamente, baseados nas afirmações sobre o Cristo da fé, porém, entendemos que,
de igual forma precisamos levar em conta os estudos e as perspectivas sobre o Jesus
histórico, do qual afirmamos ser discípulos e discípulas. Cremos que urge a necessidade
de haver mais estudos sérios sobre o Jesus histórico e sobre o Reino que Ele demonstra
e anuncia.
Ao longo do tempo, houve um grande distanciamento entre a pregação/vida de
Jesus e o comportamento da Igreja hoje em relação à proposta do Reino de Deus. A
partir dessa premissa, questionamo-nos: Porque existe um tão grande abismo entre a
proposta de Jesus de Nazaré e as propostas das Igrejas atuais? Nossa hipótese principal
é a seguinte: O Reino de Deus, tema que permeou a vida e pregação de Jesus de Nazaré,
é hoje negligenciado pela maioria das igrejas locais em sua prática eclesiástica e
teológica.
Nosso objetivo é demonstrar que o Reino de Deus, não pode ser negligenciado
dessa forma, mostrando que, além do Reino de Deus ser uma realidade futura (AINDA
NÃO), é fato inquestionável que ele JÁ se fez presente com a vinda de Jesus de Nazaré
e que nós, discípulos e discípulas do Mestre, temos a responsabilidade de vivenciar os
valores do Reino em nossa sociedade que tanto carece de modelos de justiça, paz e
amor. Devemos demonstrar, assim como Jesus, que o Reino está entre nós!
65

2. REINO DE DEUS E EXPECTATIVA MESSIÂNICA

Qualquer tentativa de explicar ou falar sobre Reino de Deus que não busque
resgatar historicamente as ideias e as expectativas messiânicas que o povo de Israel
tinha sobre ele, torna-se instantaneamente invalidada, pois foi naquele tempo e naquela
cultura que este conceito começou a tomar forma. Quando Jesus de Nazaré encarnou, já
haviam conceitos formados e grandes expectativas com relação ao Reino de Deus.
Portanto, ressaltamos a necessidade de retornar à história judaica, com o objetivo de
traçar o desenvolvimento teológico da noção de Reino de Deus em Israel a fim de
percebermos como esse conceito é interpretado por Jesus e pela nascente fé cristã.

2.1. Abordagem conceitual sobre o reino de Deus

Bosch explica que “a expressão ‘reinado de Deus’ (Malkuth Yaweh em hebraico)


não aparece no Antigo Testamento (Bright 1953:18).”18 Entretanto, hoje é possível
percebermos que essa ideia foi sendo amadurecida ao longo da história e do
desenvolvimento teológico de Israel.
Entretanto, antes de compreender a perspectiva judaica sobre o Reino ou Reinado
de Deus, faz-se necessário buscar a etimologia dessas expressões. Embora o conceito de
Reino de Deus tenha se tornado o centro da pregação de Jesus, é fundamental olharmos
para os aspectos da história judaica a fim de ampliarmos nossa compreensão sobre o
significado da chegada do Reino de Deus anunciado por Jesus de Nazaré. É interessante
notar que:
No Antigo Testamento o termo hebraico malkuth é proveniente da raiz hebraica mlk que
está relacionada com a ideia de ‘rei’, ‘reino’, ‘domínio real’, ‘pessoal real’, ‘reinado’,
‘soberania’, ‘monarquia’ (...) Essa raiz é usada indistintamente para designar tanto reis
terrenos (...) como ídolos religiosos. (...) Este termo também é usado no Antigo
Testamento designando Deus, como Rei.19

Percebemos então que Deus é denominado com o termo melek (rei), e o termo
malkuth é usado para designar o seu poder. A malkuth do Senhor é descrita em
grandeza, exaltação e domínio sobre tudo.20
No hebraico existem três termos ligados à noção de reino: melukâ, malkut e
mamlakâ que são traduzidos para o grego como basileia. A expressão grega Basileia tou

18
BOSCH, David J., Missão transformadora: mudança de paradigma na teologia da missão, São
Leopoldo: Sinodal, 2002. p. 52.
19
PADILLA, René & PINO, Carlos A. Del, Reino, igreja e missão, São Paulo: Seminário Presbiteriano
do Brasil e Missão Oriente, 1998. p. 12.
20
Ibid., p.13.
66

Theou corresponde a Reino de Deus ou Reinado de Deus e significa o poder salvífico de


Deus irrompendo na história, se referindo a um evento e não a um lugar. Sendo assim,
podemos afirmar de forma simples que Reino de Deus é todo ambiente onde Deus reina.
No Antigo Testamento percebemos que a ideia de Reino se configura após a
pressão dos filisteus, a elevação de Davi como rei e, principalmente, após Deus ter
concedido à sua casa a legitimação religiosa definitiva através do pacto davídico 21.
Entretanto, apesar de referir-se a um reino terreno, o conceito de Reino era também
usado para referir-se a um Rei Redentor. Isso é claramente observado na totalidade das
ideias político-religiosas ligadas ao rei, pois através do que se esperava dele o povo ia
sendo conduzido a desenvolver uma fé messiânica.22
Com o tempo nota-se a ampliação deste aspecto e o conceito do Reino passa a
associar-se ao fato de Deus ser Rei. Surge a esperança no Messias Redentor, vista a
partir da perspectiva de uma fé no Reino Superior de Deus, que determina o presente e o
futuro. Assim, principalmente durante os períodos de dominação estrangeira, vai se
amadurecendo a ideia de que o Reino de Deus era uma entidade futura, que se
manifestaria concretamente, fazendo com que Israel predominasse sobre seus
opressores. A partir desta lógica, falar da vinda do Reino de Deus implicava, no
ambiente judaico, a referir-se ao Messias, pois era por meio dele que Deus estabeleceria
seu reinado sobre Israel. Segundo Bosch, na época do ministério de Jesus esta era a
concepção que predominava.23 Eis aí o motivo pelo qual, além de esclarecer o conceito
do Reino de Deus, torna-se necessário tratar da expectativa messiânica do povo de Israel
na época de Jesus.
Cullmann, entretanto, ressalta que no judaísmo as noções relativas ao fim dos
tempos estavam vinculadas ao título de Messias, mesmo que não houvesse muitos
pontos de contato entre esses termos. Na época de Jesus, encontrava-se entre os judeus
ideias diversas e que contrariavam-se entre si acerca do Messias. Cullmann afirma que,
nesta época:
Não existia, (...), uma concepção única e firme acerca do Messias. Costumamos falar do
Messias judaico, como se se tratasse de uma figura bem conhecida, com contornos
rigorosamente demarcados. Sem dúvida, a esperança de todos se resumia num Redentor,

21
II Sm 7.12-16
22
PADILLA, René e PINO, Carlos del, Reino, Igreja, Missão, São Paulo: Seminário Presbiteriano do
Brasil e Missão Oriente, 1998. p.18.
23
BOSCH, David, Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, São
Leopoldo: Sinodal, 2002. p.52.
67

que apresentava traços nacionais judaicos. Porém, dentro deste enfoque comum a todos,
podem apresentar-se os conteúdos mais diversos.24

Entretanto, desde antes do nascimento de Jesus de Nazaré, o tipo de Messias que


se tornou predominante foi o que podemos chamar de “Messias Político”25. Sendo
assim, após compreendermos de forma breve como se formou o conceito de Reino de
Deus, iremos aprofundar nos próximos tópicos a expectativa messiânica judaica e as
expectativas messiânicas na época de Jesus de Nazaré.
Para Jon Sobrino abordar o reino de Deus requer de nós, conhecimento,
esperança e cooperação para colocar em prática a vontade de Deus para a criação. Ele
afirma que o estudo desse tema em teologia é capaz de nos conduzir à uma
espiritualidade mais jesuânica e a uma igreja mais parecida com Jesus. Sobrino anuncia
que somos incentivados a fazer crescer o reino afim de glorificarmos o nome de Deus.
Pala ele, este não é só um tema teológico, mas um tema que deve tirar a nossa paz.26

2.2. A expectativa messiânica em Israel

Para Hans Keller a compreensão judaica de redenção e salvação se resumia a um


acontecimento histórico. Para fundamentar sua argumentação, Keller cita Gershom
Scholem:

O judaísmo (...) sempre se ateve a um conceito de redenção que a concebia como um


processo que se realiza publicamente, no palco da história e no meio da comunidade, em
suma: que se realiza de maneira decisiva no mundo visível e não pode ser concebido sem
essa aparição no visível” (G. Scholem, Grundbegriffe, 121)27

Nesse sentido, percebe-se que, para Israel, a salvação consuma-se na plenitude de


saúde, subsistência econômica, terra, descendência, paz, liberdade, direito e acesso
intacto a Deus. Cullman contribui com essa visão ao explicar que nesse contexto a
palavra “escatológico” deve ser compreendida em seu sentido etimológico, ou seja,
temporal. Para Cullman, o povo de Israel pensava que uma realeza terrena traria a
salvação futura. Isso configura-se como uma esperança escatológica, que deveria
realizar-se inteiramente na esfera terrena.

24
CULLMANN, Oscar, Cristologia do Novo Testamento, São Paulo: Custom, 2003. p.149-150.
25
Ibid., p.150.
26
Cf. SOBRINO, Jon, O reino de Deus e Jesus: compaixão, justiça e mesa compartilhada. In:
BINGERMER, Maria Clara; BORGMAN, Erik; CAHILL, Lisa Sowle; QUEIRUGA, Andre Torres.
Jesus como Cristo: o que está em jogo na Cristologia?, Petrópolis: Vozes, 2008. (grifo meu)
(Concilium – Revista Internacional de Teologia)
27
KELLER, Hans, Cristologia. In: SCHNEIDER, Theodor (org). Manual de Dogmática, Petrópolis:
Vozes, 2008. p. 222.
68

A expressão Messias tem sua origem no hebraico mâschiach. O termo significa


"Ungido" e era empregado para designar o rei de Israel, conhecido como “O Ungido de
Iahweh” referindo-se ao ritual de unção real28. A unção era feita com azeite, fazia parte
do rito de coroação real29 e era como se a pessoa ungida passasse a ter qualidade sobre-
humanas, elevando-se acima dos demais.
Entretanto, este título não era exclusividade dos reis. Qualquer homem
encarregado de uma missão divina poderia tê-lo também. Dessa forma, temos em Êxodo
28.41 o sacerdote como mâschiach (Ungido), em I Reis 19.16 Eliseu “ungido” como
profeta, e até mesmo, um estrangeiro poderia receber o título caso o Senhor o
encarregasse de alguma missão, como parece ser o caso do Rei Ciro em Isaías 45.1.30
Cullmann resume em quatro pontos principais da expectativa messiânica judaica:
1. O Messias cumpre sua missão em um plano puramente terreno.
2. (...) ele inaugura o fim dos tempos (...). Do ponto de vista temporal, o Messias se
distingue, pois do profeta escatológico.
3. A obra do Messias é a de um rei político de Israel, seja seu caráter pacífico ou
guerreiro.
4. O Messias judaico é da casa de Davi, é por isso que leva também o título de “Filho de
Davi”.31

Através da análise dos Salmos 2 e 110, ambos salmos messiânicos, Milton


Schwantes32, contribui com o estudo da expectativa messiânica de Israel. Para
Schwantes, o salmo 2 é peculiarmente messiânico, pois nele o rei é proclamado como
filho de Javé. É provável que este salmo tenha sido usado na entronização do rei de
Jerusalém, um rei que assume o poder para fazer oposição ao caos político e exigir a
submissão dos povos, que queriam autonomia.
O Salmo 2, segundo Schwantes, relaciona os ungidos aos povos; sua entronização
visa o senhorio em meio às nações. O motivo do salmo é o motim dos povos contra o rei
de Jerusalém, e sua função é a submissão dos amotinados. Ele deduz uma
internacionalização dessa repressão, destacando que ler esse salmo sem a devida
discussão crítica pode fazer dele, um texto promotor de dominação. É acentuada a
estreitíssima relação entre Javé e seu ungido (v.2). O rei, pela oração, tem acesso direto

28
I Sm 9.16; 24.7.
29
II Sm 2.21; II Sm 14.2.
30
CULLMANN, Oscar, Cristologia do Novo Testamento, São Paulo: Custom: 2003. p.152.
31
Ibid, p.155-156.
32
SCHWANTES, Milton, O rei-messias em Jerusalém. Observações sobre o messianismo davídico
nos Salmos 2 e 110, in: https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/CA/article/viewFile/
1551/1985, acessado dia 20/9/2014h.
69

a seu Deus (v.8) podendo agir como agente plenipotenciário de Deus na subjugação dos
povos (v.9).
A relação entre Javé e seu ungido, isto é, o Messias, não poderia ser mais estreita.
O auge dessa proximidade está no v.7 “tu és meu filho, eu mesmo hoje te gerei”.
Embora saibamos que a filiação divina era comum neste contexto no Antigo Oriente,
neste texto, temos a ideia de adoção e não de geração física do rei pelo ser divino.
Schwantes esclarece que aqui, “O rei é gerado no dia da entronização, isto é, (...),
através da posse, é assumido e adotado como filho de Deus”.33
É importante percebermos que embora esta adoção, seja distante da explicação
mítica na qual o soberano é gerado pela divindade, ainda assim, a adoção do soberano
como filho, ao ser empossado, confere ao rei uma autoridade ímpar, pois, através desta
qualificação o rei é tido como dependente de Deus, mas também é investido da
autoridade dele, tornando-se seu representante autorizado e plenipotenciário. Além
disso, vemos no v.8 que o rei tem a promessa de ser sempre atendido em suas orações.
Pela gramática do Salmo 2, deduz-se que ele está relacionado ao momento
presente da entronização de um rei em Jerusalém. Entretanto, as promessas atribuídas à
este rei são de tão grande proporção que não se esgotam naquele momento presente,
antes, ultrapassam-no. É fato que os governos de Davi, Salomão, Jeroboão II e
Azarias/Uzias tiveram uma considerável extensão, mas nunca alcançaram os reinos da
terra (v.8). Sendo assim, percebemos o quanto as dimensões expostas no v.8 extrapolam
e transcendem o momento presente.
Analisando agora o Salmo 110, Schwantes34 defende a relacionalidade entre o rei
e Sião, embora não se fale explicitamente do rei davídico e do ungido, o autor conclui
que os conteúdos se referem a ele. A temática é a mesma do salmo 2: “o rei é o
subjugador de inimigos e de nações”35. Schwantes discorre sobre quatro ângulos
enfocados pelo Salmo 110:

Primeiro: O mais relevante é que o rei é feito assentar-se à direita de Javé. (...). Isso pode
referir-se à posição do templo em relação ao palácio real ou pode ter outro significado
original. Por exemplo, também pode referir-se a um trono real que seria colocado
próximo à arca. Decisivo é que o rei é colocado num lugar de honra máxima (Salmo
45.10; 1 Reis 2.14). Segundo: (...) a qualificação do rei como “sacerdote para sempre
segundo a ordem de Melquisedeque” (v.4). Esta titulação pode ter sido atribuída ao rei no
decorrer do ritual da posse, no próprio santuário. (...). Isso nos há de parecer estranho.

33
Ibid, p. 6.
34
Ibid, p. 8.
35
Ibid, p. 9.
70

Contudo, no antigo oriente o reinado costumava ter dignidade sacerdotal. Sabemo-lo das
nações circundantes (confira Salmo 14.18-20). No próprio Antigo Testamento,
deparamos com diversas evidências de que os reis assumiram funções sacerdotais: 1
Samuel 13.9; 2 Samuel 6.12-14, 17-19, 24-25; 1 Reis 8.14.62; 2 Reis 22-23. Terceiro: o
v.7 (...) se refere à proximidade do rei com seu Deus. Estou aludindo à expressão: “a
caminho ele (= o rei) bebe da torrente” (v.7a). Deve ser uma alusão a um ato no ritual de
entronização, realizado junto à Fonte de Giom, ao leste da encosta, na qual se situa
Jerusalém. Esta fonte era sagrada. Confirmam-no 1Reis 1.38-39 e Salmo 46.5. (...). O
sentido da fonte não é, pois, outro do que o do templo: apontar para a proximidade e
presença de Javé. Quem bebe das águas, achega-se ao divino. Incorpora-o. Assume suas
forças. Torna-se apto a enfrentar os inimigos (v.5-6). Quarto: (...), o v.3 delineia em
símbolos a origem divina do soberano. (...) “O rei divino vem de alturas bem acima da
terra, vem do mundo de Deus.”36

Em resumo, Schwantes constata que o salmo 110 ritualiza a submissão das nações
que contestam o reinado de Jerusalém e, ainda, realça a relação entre o rei, como
ungido, e Javé. Destacando os quatro pontos acima, ele constata a estreiteza da relação
entre o divino e a realeza davídica, fator que impulsionou uma determinada leitura do
messias com um tom bélico-militar, que purificaria Israel da presença pagã, isto é, de
seus inimigos.37
Sobrino corrobora com o estudo do reino de Deus na tradição de Israel mostrando
que esse povo, baseado em sua fé em Deus, continuou acreditando na “passagem de
Deus pela história” e nomeou essa passagem como reinado de Deus. O reinado de
Deus: “(...) transforma uma realidade histórico-social injusta em outra justa, na qual
reina a solidariedade e na qual já não há pobres (cf. Dt 15.4)”38
O reinado de Deus, para Sobrino, é algo benéfico, formal e libertador, pois Deus
passa pelo mundo afim de libertar o povo da opressão para que tenha vida. Segundo
Sobrino, Deus é compassivo e descentrado de si mesmo. Sobrino explica que assim
como não há povo sem reino, não há reino sem povo, mostrando a dimensão
essencialmente social do Reino de Deus.
Para concluir, o Prof. Dr. Pe. Ari Luís do Vale Ribeiro39, esclarece-nos que a
evolução do messianismo no Antigo Testamento não se deu de forma homogênea, antes

36
Ibid, p. 9 e 10.
37
Cf., a respeito, CULLMANN, Oscar, Cristologia do Novo Testamento, São Paulo: Custom, 2003p.
154.
38
SOBRINO, Jon, O reino de Deus e Jesus: compaixão, justiça e mesa compartilhada. In:
BINGERMER, Maria Clara; BORGMAN, Erik; CAHILL, Lisa Sowle; QUEIRUGA, Andre Torres.
Jesus como Cristo: o que está em jogo na Cristologia?, Concilium, 2008, p. 69 [381].
39
Cf. RIBEIRO, Ari Luís do Vale, Jesus e os movimentos messiânicos. In:
http://revistas.pucsp.br/index.php/culturateo/article/viewFile/15490/11569, acessado dia 20/9/2014 às
14:36h.
71

essa evolução foi sendo moldada a partir do desenvolvimento de certos temas e crenças
originados na religião israelita primitiva. Ele reitera que o povo de Israel tinha uma fé
no poder e na salvação que se instauraria por intermédio de Javé. Em consequência
desta fé, Javé se manifesta, na medida em que Israel compreende seu poder e sua ação
na sua história.
Ribeiro destaca que, geralmente, os elementos do messianismo trazem os ideais
de um Israel do futuro, correspondente ao Reino de Javé, e que, nem sempre, o
messianismo implica a ideia de um rei ou libertador futuro. Segundo este autor, a
aliança pode ser identificada como o momento fundante e referencial da história de
Israel, através da qual, este se torna o povo e o Reino de Deus se estabelece. A partir
deste núcleo é que o messianismo se torna universal. Com o estabelecimento da
monarquia israelita, o messianismo assume a forma da monarquia, e o próprio rei Davi,
com sua dinastia, transforma-se em elemento determinante.

2.3. Grupos religiosos da Palestina no período de Jesus de Nazaré

Embora muitas comunidades de fé atuais prefiram imaginar um Jesus afastado do


mundo e do povo, cuja pregação apontasse exclusivamente para o além, para Alfonso
Garcia Rubio40 as escrituras e as próprias pesquisas históricas sobre Jesus revelam que
ele viveu uma vida como pregador em Nazaré e, consequentemente, estava em meio ao
povo. Por outro lado, também revela-se insuficiente pensar em Jesus como um
revolucionário político, pois sabe-se que ele não pregou a luta armada contra a
dominação romana. Jesus não pertenceu a nenhum dos grupos religiosos de sua época,
embora tivesse preocupações religiosas com forte implicação política e social. Jesus
também não foi um “sábio professor moral”, como muitos dos fariseus. Ao contrário
disso, ele anunciou a liberdade em relação à todo legalismo. Ele era, na verdade, um
leigo.
No tempo de Jesus, havia diversos grupos religiosos, e cada um deles tinha certa
reputação diante do povo. O povo em geral era influenciado pelos ideais desses diversos
grupos e isso gerava grandes expectativas. Esses grupos apresentavam diversas
doutrinas, especialmente no que se referia ao messianismo41. Os principais grupos eram

40
RUBIO, Alfonso Garcia, O encontro com Jesus Cristo Vivo, São Paulo: Paulinas, 1994. p.24-25.
41
Cf. MORIN, E. Jesus e as estruturas de seu tempo. São Paulo: Paulus, 2003.
72

os fariseus, os essênios, os saduceus e os zelotes. Vejamos a expectativa messiânica de


cada um desses grupos42.
Os fariseus eram extremamente apegados à Lei e cumpriam cada prescrição dela.
Tinham a esperança de que o Messias cumpriria as Escrituras e levaria Israel à vivenciar
plenamente a Lei, não eram favoráveis à dominação romana e esperavam que o Messias
acabasse com o reino opressor, depositando nele a esperança da restauração do reinado
de Davi. Esse grupo sustentava o culto nas sinagogas, onde a Lei era explicada. Embora
os fariseus acreditassem no Reino de Deus como uma proposta universalista, eles eram
muito nacionalistas. Para eles, a realização do plano de Deus na história girava em torno
da escolha de Israel e das promessas feitas à dinastia davídica. Para os fariseus, além de
Israel, as outras nações também reconheceriam o Messias e seriam a ele submetidas. O
objetivo essencial do Messias seria a exclusão do pecado, injustiça e opressão. Na
expectativa messiânica farisaica, Israel deveria esforçar-se seguindo um caminho
diferente e único: o cumprimento da Lei.
Segundo Saulnier e Rolland, é injusto pensar nos fariseus somente em termos
pejorativos. Nem todos eram iguais, eles mesmos sabiam distinguir os bons e os maus
dentre eles. Nesse sentido, os autores trazem textos do Talmud que oferecem listas dos
diferentes tipos de fariseus:
Os "de costa larga": escrevem suas ações nas costas para se fazerem honrar pelos
homens.
Os "vagarosos": pretextam um preceito urgente a cumprir para retardar o salário dos
operários.
Os "calculadores" que assim refletem: já que tenho em meu ativo muitos méritos, tenho
com que pagar algum pecado.
Os "ecônomos": Que pequena coisa vou executar para aumentar meus méritos?
Os "escrupulosos" que perguntam a si mesmos: Que pecado oculto cometi para
compensá-lo com uma boa ação?
Os "fariseus do temor": que agem como Jó.
Os "fariseus do amor": que agem como Abraão, esses são os verdadeiros.43
Para esses autores, os fariseus eram homens piedosos que conheciam bem a Lei,
esforçavam-se para vivê-la e difundiam a Lei ao seu redor, sobretudo na sinagoga. É
lamentável o fato de muitos de nós hoje caracterizarmos todos os fariseus como
hipócritas, baseando-nos no texto de Mt 23. Este texto é polêmico e muitos fariseus, na
verdade, o aprovariam, estando convencidos de sua imperfeição. Apesar de serem do

42
Confira, para o que se segue, o excelente artigo Jesus, o Messias, escrito por J. B. Libânio do qual
parte dessas informações sobre os grupos sócio-religiosos na época de Jesus foi retirada. Artigo
disponível em: http://www.senhoradorosario.org/2012/09/pe-libanio-jesus-o-messias.html (acessado dia
20/9/2014 às 12:15h)
43
SAULNIER, Christiane e ROLLAND, Bernard, A Palestina no tempo de Jesus, São Paulo: Paulus,
1983. (Cadernos Bíblicos; 27), p. 56
73

povo e constituir um partido do povo, os fariseus procuravam ser separados dele. O


povo ignorava a Lei e, por isso, era considerado pelos fariseus como impuros, pois só na
medida em que se respeita toda a Lei, escrita e oral, é que se adquirem os méritos
necessários à salvação e ao envio do Messias que estabelecerá enfim o Reino de Deus.44
Os essênios eram judeus de estilo monástico, moravam em centros onde
praticavam a vida comunitária e eram profundamente admirados por sua ascese e
piedade. Eram hostis à Roma e ao culto realizado no templo. Esperavam um Messias
que destruiria o culto desvirtuado praticado no templo e instituiria o culto verdadeiro.
Eles estavam dispostos a pegar em armas e lutar guiados pelo Messias.
[Os essênios] Consideram-se como o exército santo de Deus, que deverá combater na
terra e aniquilar todos os ímpios no momento em que Deus lhes der o sinal; nesse
momento, os anjos do céu também combaterão contra os demônios, num combate
escatológico que garantirá a vitória final de Deus, o

aniquilamento de todos os ímpios e o triunfo dos santos. Querem estar sempre ritualmente
prontos para essa guerra santa, mas, ao contrário dos zelotas, recusam-se a iniciá-la
enquanto Deus não lhes der o sinal.45

Os saduceus era um grupo formado pela aristocracia sacerdotal, ou seja, aqueles


que dominavam o templo. Possuíam uma doutrina extremamente fechada, aceitavam
apenas a Torá, eram muito reservados quanto a aceitação de novidades teológicas, como
a existência de anjos e a ressureição de mortos. Os saduceus simpatizavam com a
dominação romana e não esperavam o Messias.
Os zelotes eram nacionalistas como os fariseus, porém eram ainda mais zelosos.
Eles concordavam em tudo com os fariseus, o que diferenciava-os era a paixão que eles
tinham pela liberdade devido à convicção de que Deus era seu único senhor. A diferença
entre os zelotes e os fariseus estava concentrada no campo das atitudes práticas. Os
zelotes estavam sempre dispostos a tomar armas para enfrentar os dominadores
romanos.
Religiosamente, os zelotas têm uma confiança absoluta em Deus e nas instituições
queridas por ele: o Templo e a Lei. Estão convencidos de que, por suas ações de
"extermínio dos ímpios", apressam a vinda do seu reino, do seu Messias; Deus é o único
senhor, mas ele não age sozinho e tem necessidade dos homens: quanto mais alguém for
zeloso por ele, inclusive no plano político e temporal, melhor será!46

44
Ibid., p.57.
45
Ibid, p. 58.
46
Ibid, p. 55.
74

Aqui, há uma divergência, pois Richard Horsley e John Hanson 47, defendem que
“os zelotas” não apareceram antes de 67-68 d.C. Segundo eles, não há provas de que
tenha havido um movimento organizado, motivado religiosamente, que tivesse
defendido a revolta armada contra Roma entre 6 e 66 d.C. Entretanto, é fato que, nesse
período, anterior à revolta, houve uma série de pequenos movimentos. Entre estes,
temos dois grupos: os sicários e os salteadores. Horsley e Hanson afirmam que “os
zelotas” são uma elaboração acadêmica moderna e tem pouca relação com a história
judaica real do primeiro século, isso porque, em primeiro lugar, a maior parte das ideias
que se julgavam características dos zelotas, provavelmente eram ideias comuns no
judaísmo palestinense. Em segundo lugar, porque, fora os zelotas, é possível perceber
significativas semelhanças entre Jesus e os diversos movimentos até então reunidos,
formando, ainda que de forma artificial, um monolítico movimento de libertação.
Acreditava-se que a oposição estava concentrada unicamente no movimento dos zelotas,
entretanto, o que se percebe hoje é que quase todos os movimentos e eventos tinham
orientação anti-romana, especialmente os movimentos mais organizados, liderados por
profetas ou messias populares, que buscavam conscientemente um tipo de libertação.
Apesar de constituírem-se em grupos diferentes, percebemos pontos em comum
que sintetizam a figura de um messias político, e dele se esperava a restauração da
glória do império davídico. Os judeus do século I esperavam um messias que fosse de
descendência davídica e que oferecesse libertação política, aniquilando qualquer poder
estabelecido no paganismo, visando o estabelecimento de uma sociedade justa de
acordo com a Torá.48 Percebemos então, o quanto os contemporâneos de Jesus,
inclusive seus discípulos, possuíam uma compreensão messiânica influenciada por esses
grupos. Quando afirmavam que Jesus era o Messias, eles faziam isso dentro de seus
paradigmas messiânicos.

47
Cf. HORSLEY, Richard A. & HANSON, John S., Bandidos, profetas e messias: movimentos
populares no tempo de Jesus, p.9-10.
48
Cf. GRELOT, Pierre, Esperança judaica no tempo de Jesus. Disponível em:
http://books.google.com.br/books?id=PQ30aB4NmVQC&pg=PA211&lpg=PA211&dq=No+s%C3%A9c
ulo+I,+os+judeus+de+forma+geral+esperavam+um+messias,+filho+de+Davi,+que+realizasse,+em+prim
eiro+lugar,+sua+liberta%C3%A7%C3%A3o+pol%C3%ADtica+e+exterminasse+as+pot%C3%AAncias
+pag%C3%A3s&source=bl&ots=m-beo3lMo_&sig=uedobJ5VL2O976b86961M3kvF20&hl=pt-
BR&sa=X&ei=O1RYVKzeGMWZ
gwSNpYD4CA&ved=0CB0Q6AEwAA#v=onepage&q=No%20s%C3%A9culo%20I%2C%20os%20jud
eus%20de%20forma%20geral%20esperavam%20um%20messias%2C%20filho%20de%20Davi%2C%20
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l%C3%ADtica%20e%20exterminasse%20as%20pot%C3%AAnc&f=false
75

A pregação de Jesus foi muitas vezes mal compreendida pelos discípulos e por
todos aqueles que o ouviam, pois ora percebiam que Jesus atendia às expectativas
messiânicas de todos os grupos, ora notavam que ele não atendia completamente a
nenhuma delas. Quando Jesus falava dos mistérios do Reino, o povo e os discípulos
ficavam fascinados por ele e por suas palavras, porém o entendiam conforme suas
limitadas perspectivas. Simultaneamente, nutriam também expectativas reduzidas em
relação a ele, que não correspondiam ao que Jesus sentia ser sua missão.
Apesar de ser o tema central da pregação de Jesus, o Reino de Deus não era
exclusividade de sua pregação. O Reino de Deus era o desejo mais profundo de Israel.
Entretanto, Jesus de Nazaré, a partir de sua experiência de Deus, oferece um novo
horizonte à esperança que já havia no coração do povo.49
Devido a situação de opressão em que povo de Israel se encontrava, a expectativa
de um Reino de libertação era sua esperança. A mensagem da proximidade do Reino de
Deus é proclamada por Jesus como Boa Notícia, que não demanda esforço humano, o
que já estava destacado na passagem de Is 52.7, que anuncia o senhorio de Iahweh.
O ungido com o Espírito de Iahweh50 é enviado aos pobres, cativos, e oprimidos.
A pregação de Jesus está embasada nesta expectativa da chegada do Reino, em que os
doentes são acolhidos, tratados e curados51, os demônios são expulsos52, as crianças são
respeitadas53 e pecadores públicos tem a oportunidade de recomeçar uma vida nova54.
É fato que a expressão Reino de Deus tem raízes na tradição judaica, e Jesus
sabia disso quando ensinava os discípulos a orarem dizendo: “Pai, venha o teu Reino”55.
A grande expectativa de Israel era o reinado de Deus, que mudaria o curso da história,
libertando Israel das opressões e começando uma época de justiça, paz e prosperidade.
Neste contexto, as ideias de Jesus eram revolucionárias, sua concepção de Reino
de Deus era bastante diferente, assim como seu relacionamento com o próprio Deus.
Para Jesus, Deus não era um imperador que dominava o povo. Jesus experimentava
Deus como seu Abbá, ele via o reino de Deus como o reino do Pai amoroso que incluía
os pobres, os pequenos, os pecadores, os marginais e os perdidos.

49
PAGOLA, José Antônio, Jesus: aproximação histórica, Petrópolis: Vozes, 2012. p. 116.
50
Is. 61.1
51
Mt. 4.23.
52
Mt. 12.28.
53
Mc. 9.36-37.
54
Mt. 21.31.
55
Lc. 11.2.
76

3. REINO DE DEUS E A PROPOSTA DE JESUS DE NAZARÉ

Pensar em Reino de Deus e não recorrer à vida e pregação de Jesus de Nazaré é


impossível, pois não há quem tenha falado ou vivido com o objetivo de estabelecer esse
reinado tão intensamente quanto ele. Para Albert Nolan56, apesar dos milhões de
pessoas que veneraram e veneram o nome de Jesus, poucas conseguiram colocar em
prática a proposta dele. Segundo Nolan, as palavras de Jesus vem, ao longo do tempo,
sendo interpretadas e deturpadas, passando a significar algo completamente diferente
de sua proposta.
Sendo assim, urge compreendermos quem foi o Jesus do Reino, para que, como
cristãos, nossas vidas se tornem uma contribuição efetiva para sinalização do Reino de
Deus em nossos dias.

3.1. Um olhar sobre o Jesus do Reino

Através de diversos estudos, hoje compreendemos a impossibilidade de


acessarmos o Jesus Real57, o homem que viveu na Galileia no século I, entretanto, as
pesquisas sobre o Jesus histórico, que se iniciaram no século XVIII, nos trouxeram
grandes contribuições para compreendermos o humano por trás do Cristo. Daí,
sugerimos esta análise a fim de percebermos traços característicos de Jesus de Nazaré
que contribuam para entendermos suas palavras. Sobretudo, é importante salientar que,
cada pesquisa histórica sobre Jesus revela uma interpretação pessoal do pesquisador,
neste contexto vale lembrar a frase de Leonardo Boff: “Todo ponto de vista é a vista de
um ponto.”58
Para Bingermer, a questão da historicidade da pessoa de Jesus não pode ser
indissociada da fé no Cristo. Tanto que as narrativas da vida, da morte e da ressurreição
de Jesus, o relato de sua pessoa, de sua história, de seus atos e palavras, devem-se à
comunidade cristã. Para ela, é impossível, hoje, acessarmos o Jesus histórico sem que
haja a influência do Cristo da fé. E ainda, sem que haja a influência de uma cristologia

56
NOLAN, Albert, Jesus Antes do Cristianismo, São Paulo: Paulus, 1987. p.15
57
Cf. MYRE, André, Jesus e seu movimento, in: MAINVILLE, Odette (org.), Escritos e ambientes do
Novo Testamento: uma introdução. Petrópolis: Vozes, 2002
58
BOFF, Leonardo. A águia e a galinha, Petrópolis: Vozes, 1997. p. 15
77

ascendente ou descendente.59 “O Cristo da fé, (...), não é pois, um conceito cristológico


oposto ao do Jesus histórico, mas o integra e o assume em sua totalidade.”60
Por isso, é importante percebermos que os evangelhos não são biografias, assim
como os demais textos neotestamentários não são meramente históricos, antes, são
resultado da reflexão teológica daquele tempo sobre a vida de Jesus de Nazaré, exaltado
como Cristo da fé.
Nas nossas comunidades de fé, é muito comum enfatizarmos a divindade de Jesus.
Embora isso seja correto do ponto de vista da fé cristã, também é necessário não
negligenciarmos as dimensões sociais, econômicas, políticas e religiosas que cercaram a
dimensão humana de Jesus de Nazaré. Nesse sentido, vale apresentar a reflexão de
Albert Nolan61; ele destaca a diferença entre Jesus e João Batista. Para ele, Jesus “não se
sentia chamado a salvar Israel levando todas as pessoas a receberem o batismo de
penitência no Jordão”.62 Embora isso possa parecer irrelevante, os quatro evangelhos
destacam que a prática de Jesus consistia em aproximar-se mais dos pobres, dos
quebrantados de coração, dos cativos, dos cegos, dos oprimidos, dos publicanos, dos
famintos, das prostitutas, das crianças, dos aleijados, dos mancos, dos leprosos, dos
endemoninhados, dos perseguidos... enfim, daqueles que eram considerados pecadores e
rejeitados.63 Nolan destaca a impossibilidade de compreender Jesus sem que tenhamos
compreendido o mundo dos pobres e oprimidos da Palestina do século I.
Nos evangelhos, o termo pobre não se refere somente aos desfavorecidos
economicamente. Os pobres na Palestina do século I eram os aleijados, os cegos, os
surdos-mudos, os coxos, os leprosos, enfim, todos os doentes que não tendo família
eram obrigados a recorrer à mendicância. As viúvas e órfãos que também não tivessem
mais ninguém a quem recorrer, viviam de esmolas e do tesouro do Templo. Além disso,
havia também os operários, os camponeses e os escravos. Os pecadores, que eram
quaisquer pessoas que se desviassem da lei e dos costumes tradicionais dos escribas e
fariseus, também pertenciam à mesma classe social dos pobres. Somavam-se a esses as
pessoas de profissões impuras: prostitutas, publicanos, ladrões, pastores, usurários e

59
BINGEMER, Maria Clara, Jesus cristo: servo de Deus e messias glorioso, São Paulo: Paulinas, 2008.
p. 11,12,13.
60
Ibid, p.14, “Itálico do autor”
61
Cf. NOLAN, Albert, Jesus Antes do Cristianismo, São Paulo: Paulus, 1987.
62
Ibid, p.39.
63
O “público alvo” de Jesus é claramente perceptível nos evangelhos. Citaremos aqui apenas textos
lucanos, pois esta é a delimitação da presente pesquisa. Ver: Lc 4.18-19; 5.13; 5.27; 6.20-21; 7.34; 7.37-
39; 8.27; 10.21; 14.13 e 21; 15.1-2; 18.10-22.
78

jogadores. Ainda incluía-se nesse rol os que não pagavam o dízimo e os que eram
negligentes quanto à observância da guarda do sábado e da pureza ritual.
Para algumas dessas pessoas, era teoricamente possível sair dessa situação,
entretanto, as leis e os costumes eram tão complicados que as pessoas que não eram
educadas (e a educação relacionava-se ao conhecimento das Escrituras) eram também
incapazes de saber o que se esperava delas. Nesse sentido, podemos dizer que não havia
saída para esses pecadores da classe social dos pobres, eles eram cativos. Fica uma
pergunta: porque Jesus escolheu os pobres e oprimidos como público alvo de seu
ministério?
Para Nolan, a resposta a esse questionamento é respondida através do sentimento
mais acentuado em Jesus nos quatro evangelhos: a compaixão.64 O autor explica que a
palavra compaixão não exprime com fidelidade tudo o que o vocábulo grego transmitia,
isto é, compaixão, na língua portuguesa, não é capaz de expressar em inteireza o que
Jesus sentia. Isso porque o verbo grego slapgchnizomai, é derivado do substantivo
splachnon que significa vísceras, entranhas ou coração, ou seja, as partes interiores do
sujeito de onde surgem as emoções mais fortes. E, provavelmente, devido à esse tão
forte sentimento, Jesus partiu para libertar as pessoas de toda forma de sofrimento e
angústia.
Nolan continua sua exposição mostrando que, na época de Jesus, existiam
médicos, mas eram poucos. Logo, destacavam-se os curandeiros, adivinhadores e
exorcistas (pessoas a quem os pobres recorriam a fim de livrarem-se de suas doenças
e/ou de seu ‘pecado’). Sabemos, pelos relatos neotestamentários, que Jesus curou a
muitas pessoas, mas o fato é que ele era bem diferente desses profissionais de sua
época.65 Pois Jesus de Nazaré tinha a preocupação de estabelecer contato físico com as
pessoas doentes66. Embora usasse preces, Jesus não confiava em fórmulas mágicas, mas
no poder da fé, afinal não foi por acaso que tantas vezes foi usada a expressão “a tua fé
te salvou”67.
Nolan afirma que a motivação de Jesus para realizar milagres era a compaixão e
que seu único desejo era libertar as pessoas de seus sofrimentos. Além disso, ele
desejava despertar a mesma compaixão e a mesma fé nas pessoas ao seu redor, pois ele
acreditava que somente isso poderia tornar o poder de Deus efetivo entre eles.

64
NOLAN, Albert, Jesus Antes do Cristianismo, São Paulo: Paulus, 1987. p.48.
65
Ibid, p.51-59.
66
Mt 8.3; Mc 1.31; 1.41; 6.56; 8.23.
67
Lc 7.50; 8.48; 17.19; 18.42.
79

Mais do que curar os doentes, Jesus misturou-se socialmente com eles. Embora
isso, para nossa sociedade, não seja algo tão espantoso assim, Nolan lembra com muita
propriedade que:
Nas sociedades onde existem barreiras entre as classes (...), a separação é mantida por
meio de tabu em relação à mistura entre os diferentes grupos. Não se partilha refeição ou
banquete, não se faz celebração, não se participa de diversões com pessoas que pertencem
a outros grupos sociais. No Oriente Médio sentar-se à mesa com alguém ou partilhar
refeição constitui forma de associação e amizade particularmente íntimas.68

Jesus, ao contrário das demais pessoas de sua época, não respeitou esse tabu. E
por isso, ficou conhecido como “comilão e beberrão, amigo de publicanos e
pecadores”69. Nolan enfatiza que o fato de Jesus sentar-se à mesa com os pecadores
representava perdão implícito de seus pecados. O’Connor vem reforçar esta
compreensão:
Um convite para uma refeição era sinal de aceitação. Resultava da confiança e oferecia
proteção. (...). A hospitalidade que Jesus dispensou aos cobradores de impostos e aos
pecadores teria sido inevitavelmente interpretada à luz de parábolas como as do grande
banquete (cf. Mt 22, 1-10), do convidado sem traje (Mt 22,11-14) ou da parábola das dez
virgens (cf. Mt 25, 1-13). Nesta o banquete simbolizava o Reino de Deus e para os
excluídos teria sido natural entender a escolha de Jesus por tais companhias como a
afirmação de que eles herdariam o Reino de Deus.70

Naquela época, a compreensão comum era a de que, os pecados eram dívidas que
se deviam a Deus e o perdão significava o cancelamento da dívida.
Perdoar em grego (aphemi) significa cancelar, desobrigar ou libertar. Perdoar alguém é
libertá-lo da dominação da história de seu passado. Quando Deus perdoa, ele esquece
nosso passado e retira as consequências presentes ou futuras das transgressões.71

Os gestos de Jesus demonstravam que era isso o que ele tinha em mente. Ele
esquecia o passado das pessoas. Tratava-os como quem não tinha mais dívidas com
Deus e que por isso, não precisavam mais ser castigadas ou rejeitadas. Embora Jesus
não tenha expressado isso em palavras, nota-se que elas não eram necessárias, assim
como o pai do filho pródigo não precisou dizer por meio de palavras que ele o havia
perdoado. A acolhida de Jesus valia mais que qualquer palavra.

3.2. O Reino de Jesus: uma análise a partir do Evangelho de Lucas

Para fins de contextualização, segundo Bosch72, o evangelho de Lucas foi escrito


provavelmente na década de 80 do século I, durante o reinado do imperador Domiciano.

68
NOLAN, Albert, Jesus Antes do Cristianismo, p.60.
69
Mt 11.19.
70
MURPHY-O’CONNOR, Jerome, Jesus e Paulo: vidas paralelas, São Paulo: Paulinas, 2008. p. 82
71
NOLAN, Albert, Jesus Antes do Cristianismo, p.64.
80

Lucas fez uso das seguintes fontes: o Evangelho de Marcos e a Fonte de Ditos (ou Q).
Além disso, o destinatário do texto eram comunidades em transições devido à Guerra
Judaica que levou Jerusalém à destruição e transformou o judaísmo.

A igreja cristã, que iniciara como um movimento de renovação dentro do judaísmo, havia
passado por uma transformação quase completa nas quatro décadas precedentes. Ela já
não estava atraindo um número significativo de judeus para a fé em Jesus Cristo. Para
todos os efeitos práticos, havia se tornado uma igreja gentílica.73

A igreja para a qual Lucas endereça seus escritos era uma igreja de segunda
geração que tinha perdido o fervor e a dedicação, características dos conversos da
primeira geração. Essa segunda geração já não esperava com tanto entusiasmo a volta
de Cristo.
A fé da igreja era posta à prova em pelo menos duas frentes: a partir de dentro: houve um
esmorecimento do entusiasmo; a partir de fora, havia hostilidade e oposição tanto por
parte de judeus quanto de pagãos. Além disso os cristãos gentílicos se deparavam com
uma crise de identidade.74

Ao perceber essa crise, Lucas resolve ajudar esses cristãos, pois ele entendia que:
A história de meio século não podia ser simplesmente ignorada, mas precisava ser
reinterpretada (cf. Schweizer 1971:137-146). Lucas ofereceu essa reinterpretação de um
modo singular. Ele sustentou que os cristãos do seu tempo não estavam realmente numa
situação menos vantajosa do que os primeiros discípulos de Jesus, que o Senhor
ressurreto ainda estava com eles, particularmente através de seu Espírito que os estava
orientando continuamente para assumirem novas aventuras. Jesus ainda estava presente
em sua comunidade, em seu “nome” e em seu “poder”, através dos quais o passado
adquiria eficácia.75

Vimos a quem se endereçava os escritos lucanos e seus motivos para escrevê-los.


Porém, outro aspecto importantíssimo do evangelho de Lucas, que pensamos que os
cristãos de todas as eras não podem perder de vista é a versão do sermão de Jesus na
sinagoga de sua terra natal, Nazaré, em que ele aplicou a profecia de Is 61.1 a si mesmo
e a seu ministério. Para efeitos práticos, Lc 4.16-21 substituiu a “Grande Comissão” de
Mateus como texto-chave para entender a missão de Cristo e a da Igreja.76
Na passagem de Lc. 4. 16-30, destacam-se: o lugar central dos pobres e
marginalizados e o fim da vingança. Sem dúvida, percebemos o quanto esses pontos
norteiam o ministério de Jesus. Sobre os pobres e marginalizados, Lucas mostra que

72
BOSCH, David, Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, São
Leopoldo: Sinodal, 2002. p.114.
73
Ibidem.
74
BOSCH, David, Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, p.114
e 115.
75
Ibid, p.115.
76
Ibid, p.113.
81

Deus toma partido deles devido à situação de injustiça a que eles eram submetidos. Os
pobres são convidados a participar do Reino, não porque sejam melhores do que os
ricos, Lucas não aborda a questão de um ponto de vista meritocrático, antes, é a situação
injusta e miserável em que o pobre se encontra que faz com que o Deus do Reino
intervenha em seu favor.77
Bosch defende que esse ponto de vista é mantido em todo o evangelho lucano,
como podemos observar na bem aventurança dos pobres e nos ais dirigidos aos ricos 78,
na parábola do rico insensato79, na parábola do rico e do Lázaro80 e no comportamento
de Zaqueu81.
Além dos pobres, vemos que as crianças no tempo de Jesus também eram
desprezadas e desvalorizadas, mas Jesus diz que “quem não receber o reino de Deus
como uma criança de modo algum entrará nele”82, neste texto o que está em jogo,
segundo Rubio, é a gratuidade do Reino e não o caráter das crianças.
Em relação ao Reino de Deus, procurem ser como crianças, que recebem algo do adulto
sem pensar que se trata de uma obrigação, de uma exigência ou de algum merecimento.
Não sejam como os adultos que pensam que têm direitos em sua relação com Deus, que
este fica obrigado a pagar-lhes o salário que merecem pelo seu bom comportamento! Não
sejam como aqueles que estabelecem uma relação comercial com Deus!83

Aqui, podemos dizer que o objetivo de Jesus era comunicar o Reino de Deus
como um dom, um presente, que ultrapassa os limites dos sistemas meritocráticos do ser
humano. Se Jesus exigisse de nós a pureza da criança para adentrarmos no Reino,
provavelmente, poucos de nós o alcançaríamos.
Além dos pobres e das crianças, outro grupo que te destaque no ministério de
Jesus são os pecadores. Em Lucas, eles também são convidados para participarem do
Reino. Vale ressaltar que o termo pecador no Novo Testamento designava não somente
pessoas de má conduta, mas também pessoas consideradas impuras: cobradores de
impostos, pastores, estrangeiros e até mesmo doentes.
Na parábola do fariseu e do publicano84, sabemos que, embora o fariseu se
considere justo, também é pecador. Mas como confia em suas próprias obras, não se
deixa atingir pela misericórdia de Deus. Ele quer o salário pela sua própria justiça e

77
RUBIO, Alfonso Garcia, O encontro com Jesus Cristo vivo, São Paulo: Paulinas, 1994. p.37.
78
Lc. 6.20-24
79
Lc. 12.16-21
80
Lc. 16.19-31
81
Lc. 19.1-10
82
Lc. 18.17
83
RUBIO, Alfonso Garcia, O encontro com Jesus Cristo vivo, p.38.
84
Lc. 18. 9-14
82

rejeita o dom de Deus. Rubio destaca que nem todos os fariseus compartilhavam dessa
atitude farisaica. Entretanto, este tipo de comportamento: “Constitui uma tentação
constante para a vida eclesial. Seria como uma espécie de planta parasitária que
acompanha a árvore frondosa da vida cristã, podendo, se a pessoa ou a comunidade se
descuidar, sugar-lhe a vitalidade.”85
Jesus veio para os doentes. Os sadios não precisam de médico. Então Jesus
acolhe aqueles que reconhecem que dele precisam. Ele come com os pecadores e
hospeda-se na casa de alguns deles86. Essas atitudes de Jesus com relação aos pobres e
marginalizados de seu tempo constituíram um sinal da atuação do Reino de Deus na
história humana.
Sobre o fim da vingança, Lucas retrata o momento em que Jesus está na sinagoga
e lê Isaías 61. Bosch destaca que, originalmente, este trecho foi dirigido aos judeus que
retornavam do exílio babilônico e estavam desanimados devido à perda da liberdade e à
destruição de sua terra. No texto de Isaías foi feita, a esses ex-exilados, a promessa da
inversão daquela condição em que se encontravam. Israel além de se recuperar, acertaria
as contas com seus opressores87.
Retornando ao cenário em que Jesus lê essa passagem, podemos dizer que seus
ouvintes naquele contexto, tinham a expectativa de serem libertos da dominação
romana. Entretanto, Jesus surpreende a todos quando lê somente a primeira parte de Is
61.2: “apregoar o ano aceitável do Senhor” e não lê “e o dia da vingança de nosso
Deus”. Ao fazer isso, Jesus omite elementos que se referem à Israel e à Sião, e também,
os elementos que são hostis aos gentios.88
Bosch destaca que há outras passagens em que Jesus omite o tema da vingança.89
Para este autor, essa atitude de Jesus é intencional, tanto pela repetição de omissões
quanto pelo acréscimo:
‘E bem-aventurado é aquele que não achar em mim motivo de tropeço’ (Lc. 7.23). Em
outras palavras: bem-aventurada é toda pessoa que não se ofende com o fato de que a era
da salvação difere daquilo que ela esperava, que a compaixão de Deus para com os
pobres, os excluídos e os estrangeiros – inclusive para com os inimigos de Israel –
suplantou a vingança divina!90

85
Ibid., p.41 e 42.
86
Lc. 15.1-2 e Lc. 19.5-7
87
BOSCH, David, Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, p.142
e 143.
88
Ibidem
89
Lucas 7.22. Em resposta à João, Jesus emenda diferentes passagens: Is 35.5, Is 29.18 e Is 61.1,
omitindo novamente as referências à vingança que estão contidas nesses textos originalmente.
90
BOSCH, David, Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, p.145.
83

Assim como este episódio, em outros textos em que Lucas conta sobre os
samaritanos91 percebemos a recusa de Jesus em adotar sentimentos vingativos em
relação a eles. Assim, vemos que durante seu ministério, Jesus adotou uma postura de
resistência não-violenta e uma postura de amor ao inimigo em palavra e ação. Na
comunidade de Jesus, não há espaço para vingança.
Além disso, importa salientar, o caráter gratuito do Reino de Deus. Na oração do
Pai Nosso92 Jesus ensina a orar pedindo a vinda do Reino, que é um dom gratuito pois
vem pela ação e pela iniciativa de Deus. Rubio destaca que o Reino:
Constitui um dom tão valioso que não existe esforço humano capaz de conquista-lo ou de
comprá-lo: só pode ser recebido como dom. Ao ser humano cabe abrir-se a esse dom
estupendo, acolhendo-o com alegria e gratidão. (...) Em relação ao dom do Reino de
Deus, a atitude fundamental do ser humano resume-se na abertura, na receptividade, no
acolhimento. Como ponto de partida para receber o dom do Reino, é indispensável que o
ser humano reconheça a própria incapacidade de auto-salvar-se.93

Assim, percebemos o quanto o evangelho de Lucas contribui para a nossa


compreensão da proposta de Jesus com relação ao Reino de Deus. Nele podemos
constatar que Jesus entendia o anúncio do Reino como sua missão94, declarou que o
Reino é dos pobres95, enviou os discípulos a pregarem o Reino de Deus96, falou dele às
multidões97, enviou os discípulos a curar e anunciar a vinda do Reino 98, orientou-nos a
priorizar o Reino99, comparou-o ao grão de mostarda e ao fermento100, afirmando que o
Reino está entre nós101

3.3. A vida de Jesus como anúncio do Reino

Baseando-se em fontes neotestamentárias, Pagola102 afirma que a causa à qual


Jesus de Nazaré dedicou sua vida foi o Reino de Deus, pois este era o núcleo central de
sua pregação, sua convicção mais profunda e envolvia tudo aquilo que ele dizia e fazia.
O termo Reino de Deus aparece 120 vezes nos evangelhos sinóticos. Jesus falava
constantemente dele, mas nunca explicava em que ele consistia. Pagola acredita que os

91
Lc 10.25-37 e Lc 17.11-19.
92
Lc.11.2
93
RUBIO, Alfonso Garcia, O encontro com Jesus Cristo vivo, p.41 e 42.
94
Lc.4 .43.
95
Lc.6.20.
96
Lc.9.2.
97
Lc.9.11.
98
Lc.10.9.
99
Lc.12.31.
100
Lc.13. 18-22.
101
Lc.17.21.
102
Cf. PAGOLA, Antonio. Jesus: aproximação histórica, Ed. Vozes, 5ª ed, 2012.
84

ouvintes de Jesus sabiam do que ele estava falando, afinal como já vimos, “o Reino de
Deus” fazia parte das aspirações de Israel. Para Pagola, o Reino de Deus é a chave
hermenêutica para compreender o sentido que Jesus dá à sua própria vida e para
entender o projeto que ele quer ver realizado. A declaração: “Eis que o Reino de Deus já
está entre vós”103 surpreendeu os ouvintes de Jesus, pois Israel ainda estava dominado
pelos romanos e os camponeses permaneciam oprimidos pelas classes poderosas.
Entretanto, Jesus falou e atuou movido por uma convicção: Deus e sua força salvadora
já estão aqui, a intervenção decisiva de Deus não é apenas um sonho distante, é algo real
que já se pode perceber agora, já se pode sentir sua presença salvadora.
Enquanto os contemporâneos de Jesus falavam sobre uma futura manifestação de
Deus, Jesus dizia que o reino já chegou, está aqui. O anúncio de Jesus, segundo Pagola,
demonstra que:
não se deve pensar numa vinda visível, espetacular ou cósmica do reino de Deus. É
preciso aprender a captar sua presença e seu senhorio de outra maneira, porque “o reino
de Deus já está entre vós. (...) Jesus (...) procura (...) convencer a todos de que a vinda de
Deus para impor sua justiça não é uma intervenção terrível e espetacular, mas uma força
libertadora, humilde mas eficaz, que está aí, no meio da vida, ao alcance de todos os que a
acolherem com fé. (...) A acolhida do reino de Deus começa no interior das pessoas em
forma de fé em Jesus, mas se realiza na vida dos povos na medida em que o mal vai
sendo vencido pela justiça salvadora de Deus.104

Para Pagola, Jesus de Nazaré deixa bem claro que a vinda de Deus é algo bom,
que Deus não vem para ajustar as contas com quem não cumpre os mandamentos, muito
menos para impor domínio religioso. O reino de Deus não tem a ver com religiosidade.
Pagola constata que: “O que preocupa a Deus é libertar as pessoas de tudo quanto as
desumaniza e as faz sofrer.”105 Diferentemente de João Batista, Jesus não fala da ira de
Deus, mas de sua compaixão. “Deus não vem como juiz irado, mas como pai de amor
transbordante”.106 Pagola analisa o Reino não como a vitória dos bons sobre os maus,
mas sugere que:
Se Deus vem reinar, não é para manifestar o seu poderio acima de todos, mas para
manifestar sua bondade e torná-la efetiva. É curioso observar como Jesus, que fala
constantemente do “reino de Deus”, não chama a Deus de “rei”, mas de “pai”. Seu
reinado não é para impor-se a ninguém pela força, mas para introduzir na vida sua
misericórdia e encher a criação inteira com sua compaixão.107

103
Lc.17.21
104
PAGOLA, Antonio. Jesus: aproximação histórica, p. 122, 123.
105
Ibid., p. 124.
106
Ibid, p. 126.
107
Ibidem
85

É interessante notar que embora Jesus conhecesse as escrituras, ele, na verdade,


relatava sua própria experiência de Deus; o que ele ensinava era diferente de tudo o que
havia sido ensinado até então.
Jesus não cita as Escrituras para convencer as pessoas da compaixão de Deus. Ele a intui
contemplando a natureza e convida aqueles camponeses a descobrir que a criação inteira
está cheia de sua bondade. Ele “faz nascer o sol sobre bons e maus e faz chover sobre
justos e injustos”. Deus não reserva seu amor apenas para os judeus nem bendiz somente
os que vivem obedientes à lei. Tem compaixão também dos gentios e pecadores. Esta
atuação de Deus, que tanto escandalizava os mais fanáticos, comove Jesus.108

Pagola esclarece que o reino de Deus, apresentado por Jesus era muito simples,
estava ao alcance de todos os que o ouviam e, que além disso, ele também anuncia o
reino através de um processo de cura individual e social. Entretanto, Jesus não
reivindica para si o poder de cura, para ele é Deus quem está atuando com poder e
misericórdia. A saudação usual com que Jesus despedia os enfermos e ‘pecadores’ era:
“vai em paz”. Essa expressão demonstra que:

Jesus lhes deseja o melhor: saúde integral, bem estar completo, uma convivência feliz na
família e na aldeia, uma vida cheia das bênçãos de Deus. O termo hebraico shalom ou
“paz” indica a felicidade mais completa; aquilo que mais se opõe a uma vida indigna,
infeliz, maltratada pela enfermidade ou pela pobreza. Jesus entende o reino de Deus como
um reino de vida e de paz.109

Para Jesus os milagres não eram uma fórmula mágica para suprimir o sofrimento
humano no mundo, mas constituíam-se em sinal para mostrar de que forma é preciso
agir para acolher o reino de Deus na vida humana. Por isso Jesus a sua atuação está
atrelada à geração de uma sociedade mais saudável. Ele anunciava a todos a boa notícia
de Deus: não haviam exclusões. Refletindo sobre o comportamento de Jesus de Nazaré
podemos nos questionar: o que Jesus esperava concretamente?
Pagola mostra que a irrupção de Deus requer transformação. Para ele o anúncio do
reino de Deus está intimamente ligado com um despertamento da esperança e uma
convocação à mudança na maneira de pensar e agir. Essa questão elucida-se ainda mais
quando percebemos que para falar de conversão, Jesus, nos evangelhos, utilizava o
verbo metanoein, que significa justamente mudar a maneira de “pensar” e de “agir”. Ao
que parece Jesus queria ver um povo no qual se pudesse dizer que Deus reinava.
Pelo que sabemos, Jesus nunca teve em mente uma estratégia concreta política ou
religiosa para ir construindo o reino de Deus. O importante, segundo ele, é que todos

108
Ibid, p. 127.
109
Ibid, p. 129.
86

reconheçam a Deus e entrem na dinâmica do seu reinado. Não é um assunto meramente


religioso, mas um compromisso de profundas consequências de ordem política e social.110

Entretanto, embora Jesus não tenha elaborado uma estratégia política ou religiosa,
os escritos neotestamentários nos mostram que ele não só denunciava o que era oposto
ao reino de Deus, como também, nunca se calou, sempre que podia, sugeria um estilo de
vida que estivesse de acordo com o reino do Pai. Pagola lembra que:

Ele vê as pessoas angustiadas pelas necessidades mais básicas: pão para por na boca e
roupa para cobrir o corpo. Jesus entende que, entrando na dinâmica do reino de Deus,
essa situação pode mudar: “Não andeis preocupados com vossa vida, com o que
comereis, nem com vosso corpo, com o que vestireis. [...] Buscai antes de tudo, o reino de
Deus e essas coisas vos serão dadas por acréscimo”. Ele não apela com isto a uma
intervenção milagrosa de Deus, mas a uma mudança de comportamento que possa levar
todos a uma vida mais digna e segura.111

Jesus mostra a seus ouvintes que se Deus chega oferecendo a todos seu perdão é
necessário exercer o mútuo perdão e o cancelamento de dívidas. Neste sentido, o
evangelho de Lucas, mostra que Jesus vem proclamar o grande Jubileu de Deus.

De acordo com o relato de Lucas, Jesus inicia sua atividade atribuindo-se estas palavras:
“o Espírito do Senhor está sobre mim, me ungiu para anunciar aos pobres a boa notícia;
enviou-me para proclamar a porque libertação aos cativos e a vista aos cegos; parada
liberdade aos oprimidos e proclamar um ano de graça do Senhor”.112

Embora o reino de Deus já esteja a caminho, sua força salvadora ainda é


experimentada de maneira parcial. Para que ela se já experimentada em sua plenitude,
Jesus convida-nos a viver agora mesmo no reino de Deus, mas ao mesmo tempo
ensinando-nos a viver clamando: “venha a nós o Teu reino”. Por isso:

Jesus fala com toda a naturalidade do reino de Deus como algo que está presente e, ao
mesmo tempo, como algo que está por chegar. (...). O reino de Deus não é uma
intervenção pontual, mas é uma ação continuada do Pai, que pede uma acolhida
responsável, mas que não se deterá, apesar de todas as resistências, enquanto não alcançar
sua plena realização. Já está “germinando” um mundo novo, mas só no futuro alcançará
sua plena realização.113

Nesse sentido, podemos dizer que, a vida de Jesus anunciou o reino de Deus que
já está aqui, mas embora o reinado já exista, ele ainda é uma semente, e esta semente

110
Ibid., p. 134.
111
Ibid, p. 136.
112
Ibid., p. 138.
113
Ibidem.
87

necessita ser semeada no mundo, o que é, sem dúvida, neste momento, papel de seus
discípulos.
Maria Clara Bingemer114, oferece uma grande contribuição no estudo da missão
de Jesus. Segundo ela, o Reino de Deus além de ser dom e graça, é também missão e
tarefa, pois o próprio Jesus além de empenhar suas forças neste projeto, também
ensinou aos que o seguiam a fazerem o mesmo. Bingemer, demonstra que a primeira
coisa que Jesus fez em seu ministério apostólico foi reunir uma comunidade. Veja
como:
A comunidade de discípulos, tal como aparece nos evangelhos, era um grupo
relativamente amplo. Não se limitava apenas “aos 12”. Assim consta expressamente em
Mt 8,21 e 27,57. O mesmo se dá em Mc 4,10 e 10,32. Pode-se afirmar que foi um grupo
numeroso: 72 deles foram enviados por Jesus a uma missão especial (Lc 10,1.17). (...).
Em repetidas ocasiões, os evangelhos distinguem nitidamente esse grupo do povo em
geral (...). Tratava-se, portanto, de um grupo de pessoas diferenciadas d resto do povo,
com vínculos que as uniam muito estreitamente, afetiva e efetivamente. Pode-se, por
conseguinte, afirmar que constituíam uma comunidade.115

Bingemer destaca que na comunidade de Jesus, exige-se uma atitude fundamental:


o serviço aos outros. Sendo assim, não há espaço nesta comunidade para ambição ou
desejo de poder ou estruturas de dominação. Este pode ser o motivo de Jesus ter
proibido aos seus discípulos títulos de honra como: “pai, senhor, mestre, doutor”. Esses
termos são proibidos em Mt 23, 8-10. A autora destaca que na comunidade de Jesus
todos são irmãos e que neste grupo deve reinar a igualdade e a caridade. Nesse sentido,
Bingemer elucida que:
O seguimento de Jesus e a pertença à sua comunidade implica uma extrema atenção e
uma disponibilidade incondicional para servir as necessidades básicas, materiais e
corpóreas dos seres humanos: dar pão aos que tem fome, água aos que tem sede, vestir os
nus, evangelizar os pobres e libertar os cativos. Tampouco se trata de um programa para
santificar almas mediante uma conversão apenas individual e interior dos corações. Jesus
não se limitou a converter os indivíduos, mas desde o primeiro momento deixou claro que
seu Pai tinha um projeto que ultrapassava em muito os limites da subjetividade
pobremente pessoal. Trata-se de um projeto para transformar a realidade no sentido do
senhorio de Deus, a construção de uma nova humanidade. 116

Foi por essa causa que Jesus formou um grupo de discípulos. Neste grupo se
viveu o desapego total de bens, o compartilhamento, a não imposição ao outro, além de
desfrutar da companhia de Jesus e aprender com ele como relacionar-se com ricos e

114
Cf. BINGEMER, Maria Clara, Jesus cristo: servo de Deus e messias glorioso, São Paulo: Paulinas,
2008.
115
Ibid., p. 64-65.
116
Ibid., p.70.
88

pobres, marginalizados e classe dominante, religião estabelecida e poder público. O


objetivo desse grupo era visibilizar o projeto de Deus para o mundo, isto é, tornar-se
sinal do Reino.
Nesse sentido, o ministério público de Jesus ofereceu um novo paradigma para a
humanidade. A pessoa de Jesus é a proposta de um novo modo de ser humano, bem
diferente dos padrões propostos pelo mundo até então. Em face de uma sociedade
focada no ter, no prestigio e na soberba, Jesus oferece uma comunidade centrada na
partilha, no serviço e na solidariedade. A missão de Jesus foi o anúncio do Reino e a
formação de uma comunidade que visibilizasse esse reino para a humanidade. Para ela,
Jesus entendeu que, para a implantação do Reino, é necessária a existência de uma
comunidade que viva e pratique os princípios e valores do Reino.
Destacamos, então, que assim como a prioridade de Jesus foi o anúncio do reino e
que ele o fez, não somente com palavras, mas com sua vida, as comunidades cristãs
atuais deveriam também trabalhar no sentido de dar visibilidade ao Reino de Deus, que
já está entre nós.
89

4. REINO DE DEUS COMO MODELO DE UMA ECLESIOLOGIA


RELEVANTE

Neste capítulo, nossa proposta é demonstrar como a tensão entre o “já” e o “ainda
não”, característicos do Reino de Deus segundo a visão neotestamentária, pode nos
auxiliar no estabelecimento de uma eclesiologia mais saudável, biblicamente coerente e,
por isso, mais relevante para o mundo. Vale lembrar que uma visão escatológica que
privilegie somente o além (isto é, o “ainda não” do reino de Deus) imobiliza a igreja em
sua missão; por outro lado, a missão cristã que abandonar a esperança da plenitude em
prol da prática no presente (isto é, o “já” do reino) descaracteriza o que a fé cristã num
Deus Criador-Salvador propõe.
Nesse sentido, falaremos sobre a tensão entre o “já” e o “ainda não”; analisaremos
a igreja de Atos dos apóstolos e enfim, pensaremos sobre o papel da Igreja hoje,
lembrando que não há como negar a existência da tensão escatológica entre o “já” e o
“ainda não” e que, portanto, a Igreja deve constituir-se como instrumento que demonstre
que o Reino “já está entre nós” e como sinal antecipatório da plenitude do “ainda não”,
oferecendo esperança à humanidade.

4.1. O Reino de Deus como anúncio escatológico para a prática eclesiástica

Embora possa parecer demais afirmar que a escatologia interfira na eclesiologia,


Bosch constata que: “existe atualmente um amplo consenso de que a escatologia
determina o horizonte de toda a compreensão cristã, (...).”117. Ainda sobre isso, John
Stott acrescenta: “Uma compreensão equilibrada da tensão existente entre o “já” e o
“ainda não” seria de muita ajuda para a unidade cristã, (...)”.118
Isso significa que, independente de qual seja nossa compreensão escatológica, ela
afeta diretamente nossa compreensão de missão e, consequentemente, nossa prática
cristã. Em outras palavras, uma escatologia específica também determinará uma
eclesiologia específica. Se é assim, torna-se necessário refletir sobre essa tensão
escatológica entre o “já” e o “ainda não” para julgar a maneira como se pensa a igreja e
sua missão.
A ênfase na escatologização com sua fixação na volta de Cristo negligenciou os
problemas deste mundo e uma historicização exacerbada preocupou-se demais com o

117
BOSCH, David, Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, p.606.
118
STOTT, John, Ouça o Espírito Ouça o Mundo: como ser um cristão contemporâneo, São Paulo:
ABU, 1992. p. 420
90

mundo a ponto de excluir a dimensão transcendente. Esses dois pontos de vista opostos
entre si representam compreensões excludentes que trouxeram grandes prejuízos à
compreensão e prática cristãs. Nesse sentido, podemos afirmar a necessidade urgente de
uma alternativa que vá além delas. Faz-se necessário um olhar escatológico que seja
voltado para o futuro sim, que não perca a dimensão da esperança, mas que também não
abandone o aqui e o agora. Precisamos de uma escatologia que esteja constantemente
envolvida na tensão criativa entre o “já” e o “ainda não”. E a partir desta escatologia
mais coerente com a fé bíblica, precisamos refletir sobre a prática eclesiológica que dela
surge. Em conformidade com esta ideia, John Stott afirma que:
A base teológica para esta tensão vai ser encontrada no próprio ensinamento de Jesus
acerca do Reino de Deus. Todo mundo concorda que o reino se manifestou claramente
em seu ensino, como também que ele anunciou a vinda desse reino.119

Assim, o principal critério para julgarmos essa tensão é o critério cristológico.


Jesus Cristo, revelação de Deus, deve ser nossa base tanto para compreender as
Escrituras quanto para produzir teologia. Neste sentido, também a escatologia deve estar
baseada em princípios cristológicos, já que é:

a existência de Cristo [que] comunica-lhe a necessária vitalidade histórica, libertando-a,


desta forma, de qualquer tentativa de uma interpretação conservadora do status quo,
inibidora, portanto, de uma atitude crítica diante da vida (MOLTMANN, 2003b:214).120

É na kenosis (esvaziamento) e na encarnação do Cristo de Deus que surge a


esperança daquilo que haverá de acontecer. Através de Jesus vimos e vivenciamos,
mesmo que de forma incompleta, os sinais antecipatórios da vinda do Reino de Deus. A
maneira pela qual Jesus viveu e anunciou a vinda do Reino de Deus e a sua expectativa
quanto à plenitude desse Reino, devem ser a lente interpretativa pela qual a Igreja cristã
formulará sua prática. Dessa forma, se o próprio Jesus, em seu ministério terreno,
ensinou e viveu de forma a implementar “já” o Reino de Deus, quanto mais nós, seus
discípulos, temos que buscar fazê-lo da mesma forma, enquanto aguardamos o “ainda
não” do Reino manifestar-se. Nesse sentido, Bosch destaca que:

O envio dos discípulos para os confins da terra (At 1.8) foi a única resposta que [eles]
obtiveram para sua pergunta de quando o reinado de Deus seria inaugurado em sua
plenitude. Não existe, pois, a opção de engajar-se ou na história da salvação ou na história

119
STOTT, John, Ouça o Espírito Ouça o Mundo: como ser um cristão contemporâneo, São Paulo:
ABU, 1992. p.422
120
BARROS, Levy da Costa. O fututo na promessa - Perspectivas da escatologia de Jurgen
Moltmann. p. 250. Disponível em pdf em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-
ims/index.php/ER/.../940, acessado em 04/11/2014 às 15:33h.
91

profana. A história da salvação não constitui uma história à parte, um fio separado que se
desdobra no interior da história secular. (...) A escatologia cristã perpassa, logo, todos os
três tempos: o passado, o presente e o futuro.121

Assim, entendemos, como Bosch, que o Reino de Deus já veio, está vindo e virá
em plenitude. O reino de Deus já veio com Jesus122. O reino de Deus está vindo na
medida em que cada cristão se engaja para, assim como Jesus, sinalizá-lo123. E temos a
esperança de que virá em plenitude124. O que não pode nos escapar, como cristãos, é a
certeza de que Deus já governa e de que nós somos, aqui e agora, os embaixadores
desse reino. Como diz Stott:

Jesus disse que o seu povo deveria impregnar a sociedade como sal e luz. A partir destes
modelos, pode-se deduzir que Jesus esperava que os seus seguidores influenciassem o
mundo para o bem. Afinal, ambas as coisas [o sal e a luz] refletem coisas práticas e
efetivas na vida.125

Além disso, Jesus em seu ministério terreno nos ensinou a orar dizendo: “venha o
teu reino; seja feita a tua vontade, assim na terra, como no céu.126”. Essa oração coloca
em Deus a dimensão do “ainda não” do Reino de Deus, entretanto, ela não tira de nós a
responsabilidade do “já”, de manifestar esse reino aqui e agora, denunciando as
estruturas de poder e qualquer realidade anti-reino de que tomemos conhecimento.
Bosch conclui que com a morte e ressureição de Cristo:

Vivendo no campo de força da certeza da salvação já recebida e da vitória final


assegurada, a pessoa crente se engaja na urgência da tarefa à sua frente. Nesse sentido, a
escatologia está acontecendo agora mesmo. (...). Em vez de procurar saber o plano de
Deus para o futuro do mundo, perguntamos pelo engajamento do cristão no mundo (...).
Não mais se vê o mundo como um empecilho, mas como um desafio. Cristo ressuscitou,
e nada pode permanecer como costumava ser.127

Aqui vale acrescentar Barros que recorre à Moltmann para afirmar:


O que Moltmann quer reacentuar é uma das mais cristalinas verdades da fé cristã, a saber:
o centro do Novo Testamento é o Cristo ressuscitado, o qual é nele anunciado,
prenunciado e prometido. Em Cristo as promessas de Deus se tornam a mais radical das

121
BOSCH, David, Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, São
Leopoldo: Sinodal, 2002. p.606-607. [grifos meus]
122
Lc.17.21
123
Jo. 14.12
124
Ap. 21.5
125
STOTT, John, Ouça o Espírito Ouça o Mundo: como ser um cristão contemporâneo, p.435 [grifo
meu]
126
Lc. 11.2b
127
BOSCH, David, Missão Transformadora: Mudanças de Paradigma na Teologia da Missão, p.607.
92

realidades. NEle se cumpre prolepticamente (um ato com potencialidades a serem ainda
manifestas) o futuro Divino (MOLTMANN, 1964:336).128

O que temos visto hoje, com muita frequência, nos discursos teológicos
conservadores é uma linguagem escatológica confusa, que poucos compreendem, que
mais se parece um quebra-cabeça de mil peças, onde se esconde a vontade de Deus.
Hoje vivemos em meio à ameaça de destruição total da natureza e, com a violência e a
injustiça crescendo em níveis alarmantes. Diante dessa realidade, não podemos adotar,
por exemplo, os parâmetros de escatologia da comunidade de Qumran, “para a qual o
irreversível juízo de Deus viria sobre os ímpios, razão pela qual esta comunidade
deveria separar-se do mundo e adotar uma vida de passivo e expectante isolamento.”129
É óbvio que isolar-se do mundo e adotar a passividade como estilo de vida,
práticas que por muito tempo vigoraram entre algumas comunidades de fé, e porque não
dizer, ainda hoje estão aí, tem como consequência efeitos desastrosos para a prática
pastoral e para prática cristã de sinalização do Reino de Deus. Analisando desta
perspectiva, podemos concordar com Barros e afirmar que:
Um cristão que procura orientar sua vida por tal perspectiva jamais se sentirá convocado
a ser instrumento de Deus pela paz, pelas mudanças sociais visando a maior dignificação
da vida, pela preservação do meio ambiente na amplitude de sua biodiversidade. Uma
elaboração teológica que aliena o ser humano de sua própria história referindo-se a um
tempo futuro trans-histórico não merece o título de escatologia, (...)130

Acreditamos que a afirmação por muito tempo difundida em comunidades de fé


de que o propósito desta vida é exclusivamente preparar-nos para a outra vida, deve ser
rechaçada. Aqui, mais uma vez Barros recorre à Moltmann para dizer que:
Ao contrário disto, esta vida deve, isto sim, ser compreendida como tendo significação
interna em si mesma. Ela é a antecipação do futuro, mas não quer isto significar que o
presente já não seja ou tenha em si as marcas antecipatórias deste mesmo futuro. EM
CRISTO RESSUSCITADO O FUTURO JÁ COMEÇOU (MOLTMANN, 2003b:66).131

A escatologia cristã é algo muito sério para parecer-se com um happy end de
histórias infantis. Ela não pode ter os olhos voltados somente para o fim, até porque o

128
BARROS, Levy da Costa. O fututo na promessa - Perspectivas da escatologia de Jurgen
Moltmann. p. 251. Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/ER/.../940,
acessado em 04/11/2014.
129
BARROS, Levy da Costa. O fututo na promessa - Perspectivas da escatologia de Jurgen
Moltmann. p. 251. Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/ER/.../940,
acessado em 04/11/2014.
130
Ibidem.
131
Ibid., p. 252. [grifo meu]
93

fim é intrínseco a uma história que o determina de certa forma. Barros nos esclarece
que:
Na raiz da crítica de Jürgen Moltmann está a percepção de que as formas conservadoras
de interpretar o futuro (amplamente difundidas em ambiente protestante latino-
americano), são, em verdade, o mascaramento de uma atitude hostil ante à realidade que
se vive hoje. Uma tal compreensão não permite que surja a mínima identificação da vida
e da criação como um convite ao engajamento, à militância transformadora.132

Uma consequência disso é a visualização da promessa exclusivamente para além


da história, alimentando dessa forma um comportamento resignado e uma fuga diante
dos problemas impostos pela vida. Quando, na verdade, a dimensão do “já”,
implementada por Jesus, deveria, de fato, levar-nos a um engajamento pela redenção de
toda a criação. Barros salienta que:
Para Moltmann é qualidade intrínseca desta promessa manter os crentes inquietos
enquanto estes não virem a realidade na qual estão inseridos ser transformada em
correspondência àquela desejada por Deus. A promessa infunde, pois, insatisfação no
coração dos justificados, o que não permite que estes se reconciliem com um mundo onde
ainda não esteja presente, nem cumprida ou realizada, a vontade plena de Deus, a saber
Sua justiça e verdade. A promessa Divina é um conceito que anuncia uma realidade ainda
não existente, (...), um lugar que não é ainda real como um ato concreto, mas que o é
enquanto instrumento inspirador das ações dos filhos e filhas de Deus no mundo, uma vez
que estes nisto se inspiram para fazer-se agentes históricos.133

Entretanto, vale lembrar que nossos esforços aqui para a implantação de uma nova
ordem social e política, por melhores que sejam, no máximo sinalizam o reino, porém,
jamais concretizarão totalmente o projeto do Reino de Deus. Isso por que, segundo
Bosch, a “transformação de Deus difere das inovações humanas. (...) Ele está sempre à
nossa frente”.134 Ou, como diz Stott:
Assim, pois, embora esteja certo defender a justiça social e tentar melhorar ainda mais a
sociedade, tornando-a mais agradável a Deus, nós sabemos que ela nunca será perfeita.
(...) Somente Cristo, ao voltar novamente, irá erradicar o mal e entronizar a justiça para
sempre. E esse dia nós aguardamos com ansiedade.135

Porém, nossa constante preocupação, é que isso não seja motivo de acomodação e
neutralidade. Pelo contrário, a certeza da vitória por parte de Deus e o exemplo de Jesus
de Nazaré, deveriam nos servir de motivação para o engajamento na transformação das

132
Ibidem.
133
Ibid., p. 255.
134
Ibid., p.608.
135
STOTT, John, Ouça o Espírito Ouça o Mundo: como ser um cristão contemporâneo, p.436
94

relações de desigualdade que permeiam nossa sociedade afim de sinalizarmos desde


“já” e onde estivermos o “ainda não” da plenitude que virá.

4.2. O Reino de Deus na prática da igreja cristã primitiva: uma leitura de Atos dos
Apóstolos

O livro de Atos dos Apóstolos traz preciosos detalhes sobre as primeiras


comunidades de fé; através deste escrito lucanos, podemos obter informações históricas
e teológicas sobre a Igreja do primeiro século.
As igrejas cristãs primitivas tornaram-se sinais do reino de Deus em meio à
sociedade judaica e gentílica. De fato, justamente porque foram sinais desse reino de
paz, justiça e alegria, a igreja descrita em Atos dos Apóstolos caía na graça de todo o
povo (cf. At 2.47). O que pretendemos nesse tópico é justamente refletir, ainda que
brevemente, sobre essa comunidade de fé que servia como sinal para o reino de Deus.
Barreto136 contribui para caminharmos na direção da construção de uma
compreensão da identidade das primeiras comunidades cristãs. Através do livro de Atos,
ele destaca que a dinâmica de fé desenvolvida por estas comunidades contribuiu para a
afirmação delas no mundo judaico-pagão do primeiro século.
O livro de Atos dos Apóstolos pinta o quadro da gênese do cristianismo. O
material recolhido e organizado por Lucas mostra a ligação entre a Igreja de Jerusalém e
a expansão do Cristianismo ao mundo pagão. Dentre inúmeras possibilidades:
Com efeito, a abertura ao paganismo sinaliza o universalismo missionário subjacente à
própria gênese da fé cristã. O autor é cuidadoso nesse sentido, pois estabelece de forma
crescente o mandato missionário de Jesus aos Apóstolos no momento que imediatamente
precede a ascensão (At 1,8). Portanto, Jerusalém converte-se em ponto de partida do
Evangelho; Judéia, Samaria e os confins da terra passam a ser imagem do destino
abrangente da nova fé.137

Em linhas gerais, percebemos o quanto o ideal comunitário dessas primeiras


comunidades de fé tornou-se um elemento de grande importância para o cristianismo
antigo. Os principais textos lucanos que caracterizam a identidade dos primeiros cristãos
são: Atos 2.42-47, 4.32-35, 5.12.16.138 Esses textos oferecem pistas cruciais para
compreendermos como se configurava a convivência dos primeiros cristãos. Barreto
136
C.f. BARRETO, Alfredo Rafael Belinato. Koinonía cristã: pressuposto hermenêutico da
comunidade primitiva dos atos dos apóstolos. Disponível em: www2.pucpr.br/reol/index.php/
10CT?dd1=5633&dd99=pdf, acessado em 29/10/2014.
137
Ibid., p.414 [grifo meu]
138
COMBLIN. José. Atos dos Apóstolos. Volume I: 1-12. Comentário Bíblico. Petrópolis: Vozes, (São
Bernardo do Campo: Imprensa Metodista e São Leopoldo: Sinodal) 1987. p.105
95

destaca que, apesar da palavra koinonía ser usada por Lucas apenas uma única vez em
At 2,42, de fato ela é o ponto chave para compreensão daquelas comunidades:
a definição da koinonía foi dada pelo próprio Lucas ao escrever que “todos os que tinham
abraçado a fé reuniam-se e punham tudo em comum: vendiam suas propriedades e bens, e
dividiam-nos entre todos, segundo as necessidades de cada um” (2,44-45). Essa
concepção recorre em 4,32 onde se lê que “a multidão dos que haviam crido era um só
coração e uma só alma. Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas
tudo entre eles era comum”.139

O autor destaca que em Atos 2.42, Lucas demonstra quatro dimensões diversas de
koinonía nas primeiras comunidades de fé: “E perseveravam na doutrina dos apóstolos
[1], e na comunhão [2], e no partir do pão [3], e nas orações [4].”140 De acordo com este
texto, a koinonía é o fundamento da autocompreensão da comunidade primitiva. A
comunhão não estava reduzida à justiça e ao estabelecimento de um modo de vida
igualitário mas também incluíam as dimensões da espiritualidade e da comunhão entre
irmãos. Assim, os quatro níveis verificados neste versículos sintetizam o ideal
comunitário cristão retratado pelos escritos lucanos.
Nesse sentido Barreto cita Dupont para observarmos que:
A  à qual, segundo At 2,42, os primeiros cristãos se mostravam
assíduos, esclarece-se pelo que 2,44 e 4,32 referem da maneira de terem eles “tudo em
comum”. Esta não reside simplesmente no fato de juntos
participarem (...) dos mesmos bens, ou na solidariedade resultante desta participação
comum; adquire uma tonalidade ativa, a saber, os cristãos tiram as consequências dessa
solidariedade, praticando com perseverança a  colocando tudo o que
possuíam em comum. Sua atitude é o oposto do egoísmo individualista do “cada qual
para si”7; é o cuidado pelo outro (Fl 2,4; 1Cor 10,24.33; 13,5; Rm 15,2), a exemplo de
Cristo que, “sendo rico, fez-se pobre por nosso amor (2Cor 8,9). Esta
consiste mais especialmente em pôr tudo à disposição dos
necessitados, sem nada reservar para si só; assim aparece como a manifestação concreta e
o sinal sensível da união dos corações e das almas.141

Barreto, entretanto, assinala que a compreensão apresentada por Lucas sobre a


significação de koinonía não é unívoca. E, a partir de uma categorização fornecida por
Phillippe Menoud na obra La vie de l’Église naissante, afirma que:
De acordo com o autor a koinonía cristã presente nos Atos dos Apóstolos pode ser
traduzida em quatro níveis referentes à:

139
BARRETO, Alfredo Rafael Belinato. Koinonía cristã: pressuposto hermenêutico da comunidade
primitiva dos atos dos apóstolos - Disponível em: www2.pucpr.br/reol/index.php/
10CT?dd1=5633&dd99=pdf, acessado em 29/10/2014, p. 415 e 416.
140
Atos 2.42
141
DUPONT apud: BARRETO, Alfredo Rafael Belinato. Koinonía cristã: pressuposto hermenêutico
da comunidade primitiva dos atos dos apóstolos. Disponível em: www2.pucpr.br/reol/index.php/
10CT?dd1=5633&dd99=pdf, acessado em 29/10/2014, p. 416 e 417.
96

1. Comunhão espiritual entre si e com os apóstolos;


2. Comunhão material, pondo em comum os bens temporais;
3. Comunhão eucarística, unindo os fiéis a Cristo por meio do sacramento;
4. Comunhão eclesiástica; unidade dos crentes manifestada na coleta em prol da Igreja de
Jerusalém (cf. Rm 12,13). 142

De fato, a koinonía é uma categoria fundamental para a interpretação da


identidade comunitária dos primeiros cristãos. Em nível espiritual, a koinonía cristã
caracterizava-se pelo compromisso de conservar a fé recebida dos apóstolos;
preocupavam-se tanto em conhecer a doutrina quanto em vivenciá-la na comunidade.
Esse nível espiritual de conhecimento da doutrina é motivação para a comunhão, e aqui
verifica-se um limite muito tênue entre o aspecto espiritual e o aspecto material da
koinonía. Naquelas comunidades a comunhão dos bens materiais “era expressão e
manifestação concreta das ações realizadas no interior da comunidade primitiva, no
intuito de pôr em prática o vínculo primário da comunhão fraterna”143. Além disso,

É válido ressaltar que o fato de os cristãos colocarem tudo em comum corresponde em


certa medida ao elemento de continuidade entre o sentido espiritual e material da
koinonía. Deste modo, a comunhão de bens aliada à comunhão espiritual são aspectos
complementares que conferem estabilidade e autenticidade à mensagem cristã.144

Assim sendo, a interrelação que existia entre o sentido espiritual e o sentido


material da koinonía cristã conduzia a uma comunhão subjetiva das almas e do coração
(Cf. At 4,32) correspondente a união concretizada na partilha dos bens. Comblin145
critica a ideia de que em Atos dos Apóstolos a igreja era ideal. Sua tese é a de que o
autor de Atos escreveu para uma comunidade ou um conjunto de comunidades
homogêneas em que conviviam judeus e não-judeus. Os não-judeus eram prosélitos ou
pagãos que tinham deixado a idolatria e adoravam o Deus de Israel.
Comblin apresenta três problemas que existiam nesta comunidade: o primeiro
desafio foi o da comunidade de mesa, onde os judeus, por suas crenças, recusavam-se a
compartilhar a mesa com não-judeus. O segundo problema era que os judeus estavam
sendo rejeitados pelo seu povo e sendo expulsos da sinagoga por se tornarem cristãos. O
terceiro problema era os gregos e romanos que estavam ligados ao Império.
No primeiro desafio, a questão da comunidade de mesa, vemos que, para os
judeus, mesmo os conversos ao cristianismo, comer com pagãos era contaminar-se.

142
Ibid., p. 417.
143
Ibid., p. 420.
144
Ibid., p. 421.
145
COMBLIN. José. Atos dos Apóstolos. Volume I: 1-12. Comentário Bíblico. Petrópolis: Vozes, (São
Bernardo do Campo: Imprensa Metodista e São Leopoldo: Sinodal) 1987. p.9
97

Comblin explica que “sociologicamente, essa repugnância pode explicar-se pela


vontade de afirmar com força a sua identidade como povo distinto dos outros.” 146 Para
aquela cultura, a comunidade de mesa era uma forma íntima de comunicação. Ao
contrário do que se pensa, os judeus não eram contrários à conversão dos pagãos. O
problema maior era comer com eles. Entretanto, Lucas atribui um grande valor à
comunidade de mesa147; para ele, judeus e pagãos devem estar na mesma mesa. Para
justificar a importância da comunidade de mesa, Lucas mostra que foi essa a prática de
Paulo, que era considerado pelas comunidades lucanas como líder e fundador. E
também, invoca a autoridade de Pedro quando narra o episódio da conversão de
Cornélio.148
O segundo problema relacionava-se aos judeus que estavam sendo rejeitados por
seu povo. Isso ocorreu porque, após o desastre de 70 (destruição do Templo em
Jerusalém pelos romanos), os judeus queriam reagrupar-se de forma ainda mais rígida.
Assim, estes judeus (sobretudo do partido farisaico) começaram a pressionar os judeus
que haviam se tornado cristãos para que eles se definissem. Para os judeus não
conversos, os que haviam se convertido estavam comprometendo a identidade de Israel.
É preciso lembrar que neste momento ainda não havia uma divisão entre judaísmo e
cristianismo. Nesta situação, os judeus conversos sentiam-se culpados, pois não queriam
deixar de ser fiéis a Israel. A resposta que Lucas propõe a eles é a seguinte:
Para ser cristão um judeu não deve renunciar ao seu povo. Longe de sair do seu povo, ele
pertence à parte mais fiel. Pois os cristãos são os verdadeiros continuadores de Israel.
Eles são fiéis aos profetas. Os judeus cristãos sempre foram fiéis a Israel. Mas quem fez
oposição a Deus que se manifestou pelos profetas e pelo seu Filho Jesus? Os chefes de
Israel, os sumos sacerdotes, os doutores, os chefes das sinagogas. Quem não observa a
Lei? Quem desrespeita o templo de Deus? Os chefes de Israel. Estes sempre
desobedeceram a Deus, enquanto os cristãos sempre foram observadores da lei e
respeitosos do templo. Por conseguinte, os judeus-cristãos não devem deixar-se
impressionar por supostos chefes de Israel que sempre foram traidores.149

Sobre o terceiro problema, a presença de gregos e romanos na comunidade cristã


que estavam ligados ao Império, Lucas não poderia ir contra o império. Logo faz o
possível para deixar claro que é possível ser cristão e servir o Império. Contudo, é

146
Ibid., p. 13
147
Lc 14.15-24
148
At 10,1-11,18
149
COMBLIN. José. Atos dos Apóstolos. Volume I: 1-12. Comentário Bíblico. Petrópolis: Vozes, (São
Bernardo do Campo: Imprensa Metodista e São Leopoldo: Sinodal) 1987. p.17
98

preciso observar que a fé cristã não se rendeu ao Império romano; antes, de acordo com
Lucas, a igreja serviu-se deste para a prática da sua missão.
Outro problema envolvia a presença de ricos e pobres nas comunidades lucanas.
Classe que nunca antes, no mundo antigo, ocuparam o mesmo espaço, agora estavam
juntas. A solução de Lucas é a comunhão. Devido à comunhão que se instaurou
naquelas comunidades no livro de Atos não se fala mais em “pobre” 150 porque na
comunidade em que há a koinonia, a distância entre ricos e pobres desaparece porque os
ricos distribuem seus bens e os põem à disposição da comunidade. Na comunhão os
pobres deixam de ser pobres e os ricos se libertam do amor ao dinheiro.151
Em Atos 5.12-16 vemos que as comunidades lucanas viviam cercadas pela
admiração e respeito do povo pois a presença de Deus era evidente nela. Apesar de seus
problemas internos, era sem dúvida, uma comunidade que sinalizava o Reino de Deus.

4.3. A igreja cristã como sinal do reino de Deus

Aqueles que desejam seguir a Jesus deveriam de fato perguntar-se: “o que é para
ele o mais importante, o centro de sua vida, a causa à qual se dedicou por inteiro, sua
preferência absoluta?”152. E, ao lermos os textos neotestamentários, podemos afirmar,
como já o fizemos no capítulo anterior, que Jesus dedicou a sua vida ao Reino de Deus.
Percebemos claramente que:
O que ocupa o lugar central na vida de Jesus não é Deus simplesmente, mas Deus com
seu projeto sobre a história humana. Jesus não fala de Deus simplesmente, e sim de Deus
e seu reino de paz, compaixão e justiça. Não chama as pessoas a fazer penitência diante
de Deus, mas a “entrar” em seu reino. Não convida, simplesmente, a buscar o reino de
Deus, mas a “buscar o reino de Deus e sua justiça”. Quando organiza um movimento de
seguidores, que prolonguem sua missão, não os envia a organizar uma nova religião, mas
a anunciar e promover o reino de Deus.153

Será que estamos prolongando a missão de Jesus ou sabotando-a? Temos


demonstrado ao mundo a compaixão de Deus? Temos nos preocupado, assim como Ele,
em olhar para os marginalizados? Temos semeado gestos de bondade? Temos ensinado
as pessoas a confiarem na paternidade de Deus? Essas são algumas das propostas
inerentes ao Reino de Deus. Essas são algumas das propostas inerentes ao Reino de
Deus. Contudo, este tema permanece desconhecido para grande parte das igrejas e dos
cristãos. Porém, não ter esse tema como prioridade é esquecer-se de que sinalizar o
150
Atos 4.34
151
Cf. COMBLIN. José. Atos dos Apóstolos. Volume I: 1-12, p.31-37
152
PAGOLA, Antonio. Jesus: aproximação histórica, p. 568.
153
Ibidem.
99

Reino de Deus é a vocação maior da igreja, nossa tarefa última. Não podemos deixar de
anunciar que o:
projeto de Deus é nosso objetivo primeiro. A partir dele se nos revela a fé cristã em sua
verdade última: amar a Deus é ter fome e sede de justiça como ele teve; seguir a Jesus é
viver para o reino de Deus como ele viveu; pertencer à Igreja é comprometer-se com um
mundo mais justo.154

Borges155 afirma que a igreja é o sinal antecipatório do reino escatológico. Ele


defende que: “(...) esta etapa histórica da comunidade de fé não é o Reino definitivo, e,
por isso mesmo, ela não é perfeita, temos, também, que admitir que nem por isso
estamos desobrigados a buscar a verdade, a justiça e o amor.”156
Nesse sentido, é papel da comunidade cristã ser sinal antecipatório da presença
salvífica de Cristo na história humana. A igreja deve ter como objetivo a construção de
uma sociedade mais fraterna, a fim de sinalizar para a humanidade a direção em que se
deve marchar para visualização do Reino de Deus. A igreja que quer atuar plenamente
no já e apontar a direção do ainda não deve sentir-se motivada constantemente a buscar
o amor, a justiça, a santidade... enfim, uma vida que torne real o anúncio do Evangelho.
Assim, a comunidade cristã não pode esquivar-se dessa tarefa; sua condição escatológica
não é um privilégio, mas uma forma histórica de manifestar ao mundo as maravilhas do
Senhor. Em outras palavras, o anúncio da esperança do Reino é a primeira e principal
tarefa da Igreja.157

Então, podemos constatar que a igreja pode se constituir como agência


sinalizadora do Reino quando busca as dimensões do “já” e do “ainda não”, trabalhando
a libertação, mas também a salvação. Realidades como essa fazem-nos vislumbrar o
“ainda não”, no “já”, presente aqui na história humana. A igreja pode sinalizar o Reino
pois crê que o Jesus ressuscitado vive e age em seu meio através do Espírito Santo que:
está presente em todos os acontecimentos da vida cristã, em que reina o amor, em que a
justiça é promovida e a paz é alcançada. Assim, o Reino definitivo nós “já” sentimos nas
relações fraternas, pois o céu começa em cada um que promove a vida. O desfecho final
“ainda não” chegou, mas temos a firme esperança de que na hora certa chegará (...)158

154
Ibid., p. 569.
155
C.f.: BORGES, Fantico Nonato Silva. A índole escatológica da igreja: um estudo do “já” e do
“ainda não” à luz do sétimo capítulo da Lumen gentium. 2010. 193f. Dissertação (Mestre em
Teologia) – Pontifícia Unversidade Católica do Rio de Janeiro (PUC RIO), Rio de Janeiro, 2010.
Disponível em: http://www2.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0812673_10_cap_04.pdf (acessado
dia 4/11/2014 às 4:09h).
156
Ibid., p. 154.
157
Ibid., p. 155.
158
Ibid., p. 156.
100

A tensão escatológica do “já” e do “ainda não” torna-se visível quando a igreja se


compromete com a libertação, a promoção da vida, a defesa da dignidade das pessoas e
com a disseminação dos valores do Reino.
A Igreja não pode permanecer apática à realidade dos que estão à sua volta,
permanecendo com os olhos fitos somente no “ainda não”, pois apesar de viver à espera
dele, essa esperança pressupõe um constante compromisso com o próximo, afinal, a sua
missão é sinalizar o “já” que consumou-se na encarnação de Jesus e o ainda não, que
virá com a plenitude da salvação. Assim, tudo o que constituir-se em obstáculo para
realização dessa missão deve ser combatido.
Por isso, a igreja deve caminhar vivenciando o reino na comunidade em que está
inserida, mas, ao mesmo tempo, anunciando o “ainda não” da plenitude, com o objetivo
de somar cada vez mais pessoas para trilhar junto o caminho do Reino. Ela passa a estar
conectada com o fim da história salvífica quando se permite viver a tensão entre o “já” e
o “ainda não” da plenitude futura. Os cristãos devem ser desde “já” um referencial da
realidade que “ainda não” veio plenamente, mas virá. Sinalizar o reino que anunciamos,
mesmo que ainda o experimentemos com nossas limitadas expectativas, é fundamental.
Essa referência ao futuro esperado, desperta, (...), um constante desejo em buscar as
coisas do alto, e viver de tal modo insatisfeito com as estruturas deste mundo [fazendo
nossa parte para transformá-las]. A tensão entre o “já” e o “ainda não” gera, na vida cristã
(...), uma tendência escatológica, que penetra todas as dimensões da vida (...).159

Nossa vocação é ser sinal da presença de Jesus no mundo. Assim como Ele não se
esquivou diante das estruturas deste mundo, especialmente diante das estruturas de
poder e dos grupos especialmente massacrados por elas, nós devemos como discípulos
dele dar continuidade ao projeto do Reino de Deus pelo qual Ele deu sua vida.
Neste sentido, a tensão entre o “já” e o “ainda não” da plenitude das promessas deixa-se
transparecer na vida de cada fiel em Cristo, isso para que, chamados à vida cristã,
estarmos com o Senhor e, estando com Ele, vivermos na santidade. (...) Esse chamado a
ser santo não é uma coisa para o futuro, mas, sim, experiência para o hoje da história. Isso
porque a santidade é marca da vida cristã. Um cristianismo que não produz santidade de
vida, justiça, amor e paz é considerado estéril e infrutífero.160

É importante ressaltar que o conceito de santidade não consiste em ser separado


do mundo. Como bem aponta Rienecker e Rogers: “a palavra [hágios, santo] indica a
forma do caráter de Deus cujos atributos perfeitos fazem com que Ele seja separado de

159
Ibid., p. 117.
160
Ibid., p. 118. A palavra hebraica geralmente traduzida por santo é a palavra kadosh, que corresponde à
palavra grega agios, que na origem significavam simplesmente separado. Cf., a respeito: http://
www.dicionarioinformal.com.br/santidade/ (acessado dia 28/10/2014).
101

Sua criação”161. Ora, a passagem explicada acima é a de 1ª Pedro 1.16: “Porquanto está
escrito: Sede santos porque Eu sou santo”. Na continuidade desse texto, a carta de Pedro
orienta a “andar com temor durante o tempo da vossa peregrinação” (1ª Pe 1.17). Nesse
sentido, ser santo implica em ingressar no mundo, mantendo um bom testemunho de
vida em Cristo. Analisando este versículo, o mesmo livro afirma que a palavra indica
conduta, comportamento, modo de viver, estilo de vida. A palavra é usada para denotar a
atividade pública, a vida em relação com os outros. Sendo santos, como membros de um
povo santo, eles teriam de mostra sua santidade em todo tipo de relacionamento com
outras pessoas.162

Nesse sentido, nossa responsabilidade enquanto discípulos de Jesus, por Ele e


para Ele santificados, é tornar o reinado de Deus visível ao mundo, manifestando a Boa
Notícia de que ele já está entre nós, vivendo de maneira concreta e coerente o amor à
Deus e ao próximo. De fato, viver a tensão do “já” e do “ainda não” é complexo pois, já
experimentamos o Reino e, ao mesmo tempo, ainda não o temos plenamente. Entretanto
sabemos que:
A fundamental realidade escatológica da Igreja coloca cada cristão dentro da dinâmica do
futuro que os aguarda. Os membros da Igreja (...) vivem guiados pelo sentimento de
incompletude, de ausência e, por isso, anelam (...) [pelo ainda não]. Esse impulso vital
para Deus não é alienante e descompromissado; é, antes de tudo, um caminhar com e para
Deus, buscando construir, no concreto da vida, as condições para que venha logo o Reino
do Senhor. As ações cristãs têm, neste intento, um forte peso de responsabilidade, com
relação à visibilidade da presença da graça na vida humana.163

Dessa forma, percebemos o quanto esta tensão escatológica estimula os cristãos a


atuarem de forma a visibilizar o Reino de Deus. Tamanha é esta responsabilidade,
entretanto temos o Espírito a nos capacitar e impulsionar. E então vamos percebendo
que:
O “já” iniciado tem abertura profunda, que orienta para um futuro e determina uma
atitude de vida no presente. Conscientes da esperança, que o chamamento de Cristo
oferece, o Povo de Deus lança sua vida na certeza da salvação. E diz como Paulo: “já não
sou eu quem vivo, mas é Cristo que vive em mim” (gl2,20). Essa certeza, “já” iniciada”,
orienta a caminhada para o “ainda não” consumado.164

161
RIENECKER, Fritz & ROGERS, Cleon. Chave linguístca do Novo Testamento grego. São Paulo:
Vida Nova, 1995. p. 554.
162
Ibidem.
163
BORGES, Fantico Nonato Silva. A índole escatológica da igreja: um estudo do “já” e do “ainda
não” à luz do sétimo capítulo da Lumen gentium. 2010. 193f. Dissertação (Mestre em Teologia) –
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC RIO), Rio de Janeiro, 2010. p.126. Disponível
em: http://www2.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0812673_10_cap_04.pdf (acessado dia
4/11/2014).
164
Ibid., p. 127.
102

Fica claro, para nós, que, a realidade da Igreja ainda não é a etapa definitiva.
Sendo assim, a Igreja não pode ser o ponto de chegada, ela é na verdade, a linha de
largada. Nossa vida, enquanto cristãos, deve ser uma estrada onde o “já” do Reino seja
sinalizado constantemente e que também esteja aberta às possibilidades do “ainda não”.
Sinalizar o “já” do Reino e estar atento ao “ainda não” de sua plenitude implica em que
cada cristão deva responsabilizar-se por seus irmãos de caminhada, afinal, caminham
juntos pela mesma estrada e, também requer uma atenção especial ao próximo,
convidando-o a caminhar pelo mesmo caminho. Desse modo: “(...) a tensão
escatológica implica, em cada fiel, um agir em função do Reino, um vivenciar “já”, no
presente, os elementos da esperança última.”165 Em consequência disso, nota-se que:

O Reino “já” presente nas palavras de Cristo, sobretudo na sua ressurreição, vai
direcionando a comunidade de fé à consumação da esperança. Neste sentido, o Povo de
Deus antecipa real-simbolicamente essa esperança-última, em todo seu conteúdo de
sentido, justiça e verdade. Ao seguir Jesus ela “já” pode ser na história um sinal
antecipatório da plenitude da Esperança. Essa experiência de já antecipar a graça, como
expressão do reino presente, faz parte fundamental da comunidade cristã. (...) Mas esse
antecipar implica um “ainda não” (...). Assim, a esperança implica um futuro, “ainda não”
alcançado, esperança que se efetiva na realidade da Igreja (...).166

Entendemos assim que a Igreja é como uma semente do Reino, que deixando-se
germinar, tem potencial para tornar-se sinal escatológico da esperança final. Em outras
palavras, a igreja é sinal do reino, e é nessa perspectiva que ela encontra o impulso pra
desenvolver sua missão.

Ela na sua caminhada, sob a proteção e a guia do Espírito, inspira e anima seus membros
a caminharem para a plenitude da esperança sem, no entanto, descuidarem das obrigações
inerentes à vida cristã. Por ter consciência de “ainda não” possuir a plenitude da
esperança, a Igreja infunde no coração de seus membros o desejo de progredir no
conhecimento e no amor de Deus. 167

A Igreja tem a função de fazer com que o “já”, através da experiência da graça,
aqui neste mundo, seja uma profecia do “ainda não”. O “já” só será profético na medida
em que a Igreja construa, através do serviço, as condições necessárias para que o “ainda
não” possa, de fato, ser sinalizado para a comunidade. Podemos dizer que, a realidade
da Igreja, deve incluir diariamente a tensão entre o “já” e o “ainda não”, pois embora a

165
Ibid., p. 129.
166
Ibid., p. 133.
167
Ibid., p. 136.
103

Igreja viva na promessa do ainda não, ela sabe que não pode descuidar da missão de
desde “já” visibilizar o Reino de Deus na comunidade onde se encontra, aqui na
história. A infidelidade a essa missão pode fazer com que a Igreja perca a sua
identidade, deixando de ser agência sinalizadora do Reino.
Para se fazer parte da comunidade de Jesus. a principal atitude exigida era a
disponibilidade incondicional para servir o outro. Jesus não tolerava que ninguém se
impusesse sobre ninguém, e não havia lugar em sua comunidade para poder ou
dominação. Nesse sentido, Bingemer acrescenta que:
O seguimento de Jesus e a pertença à sua comunidade implica uma extrema atenção (...)
para servir as necessidades básicas, materiais e corpóreas dos seres humanos: dar pão aos
que têm fome, água aos que têm sede vestir os nus, evangelizar os pobres e libertar os
cativos. Tampouco se trata de um programa para santificar almas mediante uma
conversão apenas individual e interior dos corações. Jesus não se limitou a converter os
indivíduos, mas desde o primeiro momento deixou claro que Deus seu Pai tinha um
projeto que ultrapassava em muito os limites da subjetividade pobremente pessoal. Trata-
se de um projeto para transformar a realidade no sentido do senhorio de Deus, a
construção de uma nova humanidade.168

Em seu ministério público, Jesus propõe um novo paradigma de humanidade.


Tudo o que ele faz sugere uma nova forma de ser humano e oferece uma possibilidade
diferente (dos padrões até então conhecidos) de construção de sociedade. A comunidade
de Jesus é um modelo de convivência baseada no projeto do Reino de Deus; a
comunidade do Reino é baseada na partilha, no serviço e na solidariedade.
A missão de Jesus foi o anúncio do Reino e a formação de uma comunidade que
visibilizasse o Reino para o mundo. Ele percebeu que o fator principal para a
implantação do Reino de Deus era a existência de uma comunidade que vivesse e
praticasse aqueles valores. Assim sabemos que somente quando a comunidade reproduz
o modelo da comunidade de Jesus é que podemos dizer que ela está sinalizando o Reino
de Deus.

168
BINGEMER, Maria Clara, Jesus cristo: servo de Deus e messias glorioso, p. 70.
104

5. CONCLUSÃO

Para finalizar a presente pesquisa gostaríamos de destacar a importância que o


estudo deste tema tem para a prática cristã nos dias atuais. Vimos que, apesar de o
Reino de Deus constituir-se como tema central da pregação de Jesus, este já era um
tema que perpassava as expectativas messiânicas do povo de Israel. Entretanto, as ideias
de Jesus foram revolucionárias, pois a sua concepção de Reino de Deus era diferente do
que até então tinha sido difundido, sua proposta de Reino baseava-se em seu
relacionamento com o próprio Deus. Para Jesus de Nazaré, Deus era um Pai amoroso
que incluía a todos, especialmente os marginalizados pela sociedade.
Exatamente por isso ao pensarmos sobre o Reino de Deus, temos que lançar um
olhar sobre a vida e pregação de Jesus de Nazaré pois ninguém, até hoje, ansiou pela
efetivação do Reino tanto quanto Ele.
O evangelho de Lucas, neste sentido, contribui, efetivamente, para
compreendermos a proposta de Jesus com relação ao Reino de Deus. Baseados neste
texto neotestamentário, podemos constatar que o anúncio do Reino era a missão de
Jesus. É nesse sentido, portanto, como propõe Pagola, a chave hermenêutica para
compreender o sentido que Jesus dá à sua própria vida e para entender o projeto que ele
quer ver realizado, é o Reino de Deus.169
Devemos compreender que a vida de Jesus foi um sinal antecipatório da vinda do
Reino de Deus. E que nós, como seus discípulos e discípulas, devemos esforçarmo-nos
para que a nossa vida também seja um sinal enquanto aguardamos o “ainda não” do
Reino manifestar-se em plenitude.
É importante desenvolvermos a consciência de que a dimensão do “ainda não”
do Reino de Deus não nos exime da responsabilidade de desde “já” manifestar esse
reino aqui e agora, denunciando qualquer projeto anti-reino. Sabemos porém que nossos
esforços aqui serão somente para sinalizar o reino, porém, jamais concretizarão por
completo o projeto do Reino de Deus. É óbvio entretanto que isso não pode ser para nós
uma desculpa para desencadear comodismo ou qualquer paralisia. Pelo contrário, o
exemplo de Jesus de Nazaré deveria nos impulsionar a um engajamento para
transformação das relações sociais de desigualdade para sinalizarmos desde “já” e onde
estivermos o “ainda não” da plenitude que virá.

169
Cf. PAGOLA, Antonio. Jesus: aproximação histórica, Ed. Vozes, 5ª ed, 2012.
105

As igrejas cristãs primitivas tornaram-se sinais do reino de Deus em sua época


porque o sinalizaram através da sua koinonia. Da mesma forma nossas igrejas hoje
deveriam sinalizá-lo. Isso porque o principal papel da comunidade cristã é ser sinal
antecipatório do Reino de Deus. A igreja precisa desenvolver atitudes a fim de
influenciar a sociedade, tornando-a mais fraterna, e dessa forma, sinalizar para a
humanidade a direção em que se deve marchar para visualizar o Reino de Deus. A igreja
que queira viver as dimensões do “já” e do “ainda não” deve esforçar-se para
demonstrar o amor e executar atos de justiça para que o anúncio do Evangelho não se
configure apenas em palavras.
A tensão escatológica entre “já” e o “ainda não” é visibilizada quando a igreja
passa a ter compromisso com a libertação, a promoção da vida, a defesa da dignidade
das pessoas e com a disseminação dos valores do Reino. A Igreja não pode ficar
indiferente ao mundo à sua volta, esperando somente a manifestação futura do Reino. A
espera pela plenitude pressupõe um constante compromisso com o próximo, afinal, a
missão da igreja é sinalizar o reino que consumou-se na encarnação de Jesus e o reino
que virá com a plenitude da salvação. Ela deve caminhar vivenciando o reino na
comunidade em que estiver inserida, mas, ao mesmo tempo, anunciando sua plenitude.
É preciso sinalizar o reino que anunciamos, ainda que o experimentemos através
de nossas limitadas expectativas. Nossa responsabilidade é tornar o reinado de Deus
visível ao mundo, espalhando a Boa Notícia de que ele já está entre nós, vivendo de
maneira concreta o amor a Deus e ao próximo.
Somos como sementes do Reino e ao sermos lançados ao mundo temos que nos
deixar germinar como sinalizadores da esperança final. Temos a função de fazer com
que o “já”, pela graça, aqui neste mundo, seja um ato profético do “ainda não”. O “já”
só será profético na medida em que construirmos, através do serviço, as condições
necessárias para que o “ainda não” possa, de fato, ser sinalizado para a nossa
comunidade. Podemos dizer que, devemos caminhar diariamente nos trilhos da tensão
entre o “já” e o “ainda não”, pois embora vivamos confiantes na promessa do ainda não,
sabemos que não podemos descuidar da missão de desde “já” visibilizar o Reino de
Deus em nossa comunidade, aqui na história. A infidelidade a essa missão pode fazer
com que percamos a nossa identidade de cristãos, pequenos Cristos, deixando de
sinalizar o Reino e de transmitir a verdadeira esperança à humanidade.
106

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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