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JESSICA RODRIGUEZ
SÃO PAULO
2022
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JESSICA RODRIGUEZ
SÃO PAULO
2022
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BANCA EXAMINADORA
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RESUMO
O presente trabalho busca analisar o panorama geral da Lei 12.318/10, a Lei de Alienação
Parental, desde a sua fundamentação até as alterações trazidas pela Lei 14.340/22. O objetivo é
retomar ao panorama atual a discussão sobre a revogação da lei e sua efetividade para o Direito
de Família e o Direito da Criança e do Adolescente. Nesse sentido, buscou-se analisar a
legislação até então vigente e seus artigos mais importantes, os projetos de lei apresentados no
Senado Federal e na Câmara dos Deputados, as justificativas de organizações não
governamentais e dados do Conselho Nacional de Justiça a respeito do tema. Ainda, busca
apresentar o melhor cenário para sanar as demandas trazidas pelas lacunas apresentadas pela
legislação, utilizando como base pesquisas bibliográficas com base em doutrinas, artigos
científicos, normas e legislação vigente, bom como relatórios do Congresso e do Conselho
Nacional de Justiça.
INTRODUÇÃO
No atual panorama judicial, nas separações oriundas de relação conjugal, está cada vez
mais comum a presença da alegação de alienação parental, praticada por um dos genitores ou
ambos, como forma de controle ou poder sobre a relação e o processo litigioso.
Diante do cenário apresentado e suas consequências, foi criada a Lei 12.318/2010, a Lei
de Alienação Parental, com o objetivo de trazer segurança jurídica para o instituto e orientação
para os componentes do judiciário para a resolução do caso. Ocorre que, ao longo dos anos, a
lei apresentou diversas deficiências em sua aplicabilidade, levantando questionamentos e
posicionamentos perante a sociedade.
Ainda, demais organizações que defendem a revogação da lei, alegam que a lei possui
omissões, o que a torna vaga em aspectos gerais, possibilitando aos genitores agressores,
geralmente a figura do pai, um controle sobre a genitora da criança e a mantendo refém daquela
relação. Argumenta-se também, de que muitas vezes a criança é realmente vítima de alienação
parental e que pela omissão da lei o agressor (a), pode continuar a visita e tendo a guarda da
criança.
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Sua revogação total poderia acarretar um retrocesso ao âmbito judicial familiar e, ainda
mais grave, desamparar menores abusados, permitindo mais liberdade ao guardião abusador e
mais controle do relacionamento conjugal, uma vez que o processo legislativo no Brasil não é
célere. Dessa forma, é preciso analisar as justificativas apresentadas nos projetos de lei e as
mudanças trazidas pela lei 14.340/22, onde certos artigos tiveram seus incisos modificados para
chegar a conclusão mais efetiva a demanda.
Em um panorama geral, a SAP tem seu início a partir das disputas judiciais pela guarda
do menor, uma vez que as separações conjugais são processos carregados de mágoas,
sentimentos de abandono e de traição, pois o matrimônio é o ápice da confiança que se coloca
em um determinado parceiro, além de sonhos e expectativas. Por muitas vezes a ideia de não
ter mais valor para o outro é uma ruptura brusca para a vida daquele cônjuge, gerando
instabilidade emocional e demais mudanças decorrentes da separação.
Esse panorama faz com que diversos genitores encontrem nos atos de alienação uma
forma de agredir o outro, “de maneira inconsciente, movidos por mágoas ou mesmo por
questões transgeracionais, ou seja, a forma como este pai ou mãe alienador foi criado e qual
padrão familiar ele carrega determinará seus comportamentos na vida adulta” (Madaleno, 2020,
pág.46).
O ato em si não é exclusivo apenas de uma parte da relação, podendo ambos os genitores
praticarem alienação parental. Tal situação traz enorme dificuldade no tratamento para
resolução da situação ou diminuir seus efeitos, pois todos os envolvidos entram em looping de
ações maléficas, ou seja, quando um ataca não há defesa pela parte contrária, mas sim uma
reação ao ataque, geralmente usando do mesmo artifício.
Em meios aos ataques, encontra-se a figura da criança, que deveria ser protegida, porém
os efeitos podem ser ainda mais graves. Conforme entendimento de Freitas:
Ocorre que as induções realizadas pelos genitores que praticam a Alienação Parental,
muitas vezes realizadas de forma inconsciente, determinam o comportamento da criança
alienada quando adulto, gerando feridas inimagináveis e possíveis quadros psicológicos graves
afetando toda a sua vida.
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Buscando preencher as lacunas apresentadas na esfera judicial, foi criada a Lei 12.
318/2010, buscando identificar, prevenir e cessar os atos de alienação parental, reafirmando os
direitos concedidos a criança e ao adolescente, no que se refere a convivência familiar, bem-
estar e desenvolvimento psicológico e responsabilidade parental na relação com sua prole, de
acordo com os preceitos previstos na Constituição Federal, no Código Civil, tanto no direito de
família como em outras vertentes e de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Ressalta-se que o referido artigo buscou definir como sujeito ativo qualquer pessoa que
possua, além de um laço afetivo, autoridade, guarda ou vigilância perante o alienado, não se
atendo apenas ao genitor como a Síndrome de Alienação Parental define. A redação jurídica
trouxe tal definição como forma de conduzir o magistrado a realizar um exame aprofundado do
tema, evitando dessa forma, o descarte da possibilidade da prática do ato quando se depara com
outra pessoa na figura de alienador que não seja efetivamente o genitor. Dessa forma,
corroborando para a temática, segue o entendimento de Fabio Vieira Figueiredo e Georgios
Alexandridis sobre:
A lei em si, tem como objetivo a proteção da criança e do adolescente, baseado nos
preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente e na proteção à dignidade da pessoa humana
prevista na Constituição Federal, conforme a expresso no art. 3º, Caput:
Dessa forma, o art. 227 da Constituição Federal, determina que é dever da Família, junto
com a sociedade e o Estado, proporcionar e assegurar a criança e o adolescente direitos como
educação, dignidade, convivência familiar e comunitária, dentre outros, e preservá-los de toda
e qualquer forma de discriminação, exploração, crueldade e violência.
Como bem apontado por Fabio Vieira Figueiredo e Georgios Alexandridis, a prática de
Alienação Parental fere diretamente o direito a dignidade do alienado:
Como bem colocado pela ilustre Maria Helena Diniz a aceitação de simples indícios se
dá pela gravidade da prática do ato, tendo a sua providência natureza cautelar:
“Ante a gravidade dos atos de alienação parental, a lei, no art. 4º, aceita
simples indícios dela (p. ex., indução do menor a optar entre mãe ou pai;
apresentação de companheiro a menor como seu novo genitor; comentários
1. Ex Officio1 locução adjetivo jurídico (termo): realizado por imperativo legal ou em razão do cargo ou
da função (diz-se de ato).
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alienador pode responder pela falsa denúncia, violência sexual, calúnia, dentre outros delitos
anexados a conduta.
“Constatamos que uma lei aprovada com a melhor das intenções, de preservar
a crianças de brigas entre familiares, tem sido distorcida para intimidar mães,
ou pais que colocam o amor aos seus filhos abusados acima da cumplicidade
com o parceiro abusador. É inadmissível que pessoas que conseguem reunir a
coragem de denunciar abusos e enfrentar batalhas judiciais duríssimas sejam
tratadas como alienadoras simplesmente por usar meios legais de defesa dos
direitos de seus filhos, como boletins de ocorrência e processos judiciais.”
(SENADO, 2017, pág. 29)
Diante das conclusões apresentadas, o relatório foi encaminhado para o Senado Federal
onde surgiu a proposta do Projeto de Lei do Senado nº.: 498/2018, solicitando a revogação
integral da Lei de Alienação Parental.
A justificativa seria um retorno para os casos de pais e mães que perdem a guarda do filho
por realizarem a denúncia de abuso feita pelo outro genitor, porém, não conseguem comprovar.
Conforme a norma em vigência quando da denúncia não retorna comprovação, a guarda é
compartilhada entre os genitores ou até mesmo inversa, impossibilitando quebrar o ciclo de
abusos sofridos pela prole.
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Ainda essa esfera, o projeto elucida que as medidas previstas no art. 6º da lei colaboram
para a corrupção aos princípios fundamentais da criança e do adolescente, pois afrontam a
proteção integral e acabam punindo a vítima. Conforme citado anteriormente, em momento
oportuno, determina o Estatuto da Criança e do Adolescente que a proteção à classe é prioridade
absoluta, com fundamento no art. 227 da Carta Magna. Ainda traz em seu próprio Estatuto,
especificamente no art. 4º, a necessidade e dever de todos os envolvidos na sociedade em
preservar prioritariamente a criança e ao adolescente em todos os aspectos possíveis.
Segundo sua justificativa, o uso da alienação parental veio a se tornar mais uma forma
de violência contra a mulher, uma vez que diversas mulheres perdem as guardas de seus filhos
ou o direito de visitação por denunciar os pais abusadores e não ser possível a comprovação.
Nesse escopo o abusador se aproveita da situação para inverter a guarda dos filhos, e continua
a controlar o relacionamento.
Ainda, o relatório identifica que o poder judiciário como um todo, quando falamos do
atendimento a crianças na primeira infância, possui certas deficiências em sua estrutura.
Geralmente, as comarcas possuem equipes técnicas compostas por profissionais habilitados
para atuar na Vara da Família, sendo eles assistentes sociais e psicólogos. Acontece que, em
diversas comarcas as equipes atuam em número expressivamente menor de profissionais, sendo
insuficiente para atender todas as demandas em tempo hábil e com a atenção necessária para
cada caso (CNJ, 2022).
Diante dos debates sobre a revogação ou modificação da Lei de Alienação Parental, foi
sancionada em 19 de maio de 2022 a Lei 14.340/22, originada no Projeto de Lei 634/2022,
modificando a lei em aspectos pontuais, possibilitando introduzir elementos adicionais, porém
mantendo a lei em vigor. De acordo com a explicação de Maria Berenice Dias “mais uma vez
agiu com parcimônia o legislador ao fazer alguns retoques na lei, sem, no entanto, desnaturar o
seu propósito de impedir que ocorra o rompimento das relações parentais”. (IBDFAM, 2022)
O primeiro ponto de destaque é em relação ao art. 4º, parágrafo único da lei 12.318/10.
Com a introdução das modificações passou a redação a definir expressamente os locais para
convivência mínima entre filhos e os genitores e determinação de visitação assistida, quando
há indícios da prática de alienação parental. Dessa forma, o legislador entende que a
convivência deve ocorrer perante o fórum responsável pelo processo em que se discute a prática
do ato de alienação parental ou em entidades conveniadas com a justiça criadas especificamente
para atender essa demanda.
“Aqui fica a reflexão sobre quem será o responsável para realizar a visita
assistida, pois sabidamente os tribunais contam com número reduzido de
psicólogos e assistentes sociais do quadro e estes estão voltados basicamente
para a atividade pericial. Inicialmente, esse artigo me causou desconforto
porque é como se o legislador desse um “cobertor curto”, fazendo gerar uma
delonga nas perícias uma vez que os peritos acumulariam atribuições. Por
outro lado, vejo com certa nobreza a intenção de tentar viabilizar um mínimo
possível, pois não raro as famílias não podem contratar profissionais para
acompanhar o convívio e quando o convívio se dá por pessoas da família,
forma que é feita na atualidade, muitas vezes o que era para ser bom para a
criança acaba sendo um stress, pois nem sempre o adulto que supervisiona o
convívio entende qual é o seu papel e acaba por funcionar como um ‘espião’
durante o tempo de convívio da criança com o adulto solicitante do convívio.”
(IBDFAM, 2022)
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Outra alteração de grande impacto foi a revogação do inciso VII e a inserção do §2º no
art. 6º da referida lei, onde o inciso VII possibilita ao juiz, em ação autônoma ou incidental,
determinar a suspensão da autoridade parental. A lei traz a impossibilidade no tocante a ajuizar
o pedido nos autos da ação que trata sobre a alienação parental, pois encontra escopo na previsão
do Estatuto da Criança e do Adolescente, nos art. 24, 155 e seguintes, onde há a possibilidade
de ajuizar ação para suspensão ou destituição do poder familiar, conforme a redação a seguir:
“Art. 155. O procedimento para a perda ou a suspensão do poder familiar terá início
por provocação do Ministério Público ou de quem tenha legítimo interesse.”
(BRASIL, 1990, art. 155)
A última alteração importante na Lei de Alienação Parental, foi a inserção do art. 8-A,
determinando que quando há o depoimento ou oitiva das crianças e adolescentes nos casos de
alienação parental, estes devem obrigatoriamente observar os termos da Lei 13.431/17, a Lei
do Depoimento Especial.
5. Considerações Finais
O objetivo do presente artigo foi apresentar o panorama jurídico envolvente entre a Lei
12.318/10, as propostas de revogação da referida lei e a Lei 14.340/22, lei que trouxe mudanças
ao texto original da lei 12.318/10.
A grande polêmica que traz debates sobre a efetividade da lei é quando falamos da
alienação parental usada como artifício de genitores abusadores para perpetuar sua prática, em
alguns casos, afastando o genitor guardião que também é vítima.
Desse modo, pode-se afirmar que a melhor solução para o panorama da lei de alienação
parental no ordenamento jurídico brasileiro é a sua manutenção, porém trazendo melhorias para
a interpretação da lei e efetividade da proteção à vítima, como as mudanças aplicadas pela lei
14.340/22.
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6. REFERÊNCIAS
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DINIZ, Maria H. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. v.5. Disponível em: Minha
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